Fortaleza Nobre | Resgatando a Fortaleza antiga
Fortaleza, uma cidade em TrAnSfOrMaÇãO!!!


Blog sobre essa linda cidade, com suas praias maravilhosas, seu povo acolhedor e seus bairros históricos.

 



sexta-feira, 22 de abril de 2011

Do fundo do baú



Procurando vídeos antigos, achei esse do Carlos Rilmar. rsrsrs :D
Não lembrava dele, mas lembro muito bem dessa música, vivia tocando na tv.

Sucesso da década de 90, Carlos Rilmar do Vale Cavalcante, nasceu em Fortaleza em 1968, é casado e tem quatro filhos. Fez parte da melhor banda de forró do Ceará, o grupo MASTRUZ COM LEITE, considerada a banda matriarca das
melhores bandas de forró do brasil,onde gravou 4 cds.



1993

1994

1995

1996

Teve a oportunidade de se apresentar em varios programas de nivel nacional como: Domingo Legal(SBT); Som
Brasil
(Globo); Verão Vivo(Band); Gente Importante(Manchete); Edsom Moura (Record) e outros.



O ontem e o hoje


Para recordar: :P

Princesinha do forró


quinta-feira, 21 de abril de 2011

Do Fechamento da TV Ceará até os dias de hoje


Lançada a pedra fundamental em maio de 1959, a TV Ceará canal 2 dos Diários Associados só entraria no ar em 26 de novembro de 1960, ano em que Fortaleza tinha cerca de 500 mil habitantes e apenas 200 televisores, muitos deles adquiridos bem antes, em promoções feitas pelas grandes lojas de então: Casa Parente, Flama, Cimaipinto, Livraria Alaor, Ceará Gás Butano, A Cruzeiro, Armazém Paissandu e outras mais¹. Trata-se de um marco histórico porque a TV Ceará, instalada na Estância Castelo, onde hoje fica a holding do Grupo Edson Queiroz, na Avenida Antônio Sales, foi a primeira emissora de televisão do Estado, servindo de escola pra muita gente boa, como Emiliano Queiroz, Renato “Didi” Aragão, Ayla Maria, Augusto Borges, Paulo Limaverde, B. de Paiva, João Ramos, Wilson Machado, Guilherme Neto, Ary Sherlock, Hiramisa Serra, Karla Peixoto, Assis Santos e muitos outros. Além, claro, de ter revolucionado os costumes e os conceitos da comunicação da época.

O Governo Federal rateou as empresas pertencentes aos Diários Associados, incluindo a primeira emissora de televisão de Fortaleza: a TV Ceará, inaugurada em 26 de novembro de 1960.


Foto: Acervo Célio Cury/Museu da Imagem e do Som
Do fundo do baú: Augusto Borges apresentando seu programa
no auditório da extinta TV Ceará (canal 2), dos Diários Associados.

A primeira Transmissão a Cores no Brasil

A primeira transmissão a cores no Brasil foi realizado, de forma experimental, durante a Copa do Mundo de 1970, via Embratel, quando a seleção brasileira sagrou-se bicampeã. A transmissão oficial ocorreu em 19 de fevereiro de 1972, com a cobertura da Festa da Uva, em Caxias do Sul, autorizada pelo Ministério das Comunicações. As principais emissoras brasileiras, incluindo a TV Ceará canal 2, apenas inauguraram oficialmente as suas programações coloridas no dia 31 de março de 1972, no mesmo dia em que se completou o oitavo aniversário da "Revolução de 1964".

A programação da TV Ceará cumpria a grade do "pool" de emissoras² participantes da transmissão especial, conforme se confere a seguir:


  • 15:00 - Filme "A Vida de Cristo" (pool)



  • 17:00 - Documentário "Brasil Grande", de Jean Manzon (pool)



  • 18:00 - Via Crucis (Rede Tupi, em P&B)



  • 20:30 - Discurso do presidente Emílio Médici (em cores, pool nacional)



  • 21:00 - Show "Rio/SP" (Rede Tupi, cores)



  • 21:50 - Filme "O Cálice Sagrado" (em P&B)


Segundo o jornal Correio do Ceará, durante a semana, as lojas de eletrodomésticos de Fortaleza contabilizaram a venda de cem aparelhos receptores de televisão a cores.
Antes mesmo da transmissão oficial do dia 31, a Embratel transmitiu no dia 29/3 a cores o videotape da partida de futebol Palmeiras 2x1 Santos, realizado no domingo anterior, em São Paulo.

TV Ceará faz vigília em noite de muita tristeza



Eram 20 horas, o auditório estava vazio, ocupado apenas por poucos curiosos e por poucos funcionários da casa. Ao contrário dos tempos áureos, quando a alegria da platéia e os programas davam o primeiro lugar em audiência, o ambiente de ontem, à noite, no auditório da TV Ceará, canal 2, foi de total tristeza e lamentação, tanto quanto um velório. A estação, cassada pelo Governo Federal, fazia uma vigília de despedida, pois aguardava apenas o sinal da Embratel para sair do ar, assim como mais 6 canais de televisão da Rede Tupi.


Embora o decreto de cassação tenha sido assinado na manhã de ontem, pelo presidente Figueiredo, as estações só saem do ar, quando o documento for publicado. Ao aguardar este momento, os funcionários da mais antiga estação de TV de Fortaleza, faziam suas despedidas, alguns ao vivo, relembrando o começo da profissão. Outros, mais tristes apenas ouviam nas entradas das portas do auditório, o fim de uma história construída com muito suor e acima de tudo com amor. Era realmente a despedida daquela que foi a mãe e escola para muitos jornalistas do Ceará.


Passar Fome


Segundo o jornalista Cândido Solares, apresentador dos programas noticiosos da TV Ceará, o fechamento da empresa representa um grave problema social para o Governo. "O pessoal que vinha recebendo o pequeno vale semanal agora vai morrer de fome". São quase 300 funcionários da Ceará Rádio Clube e da TV Ceará.


Há 29 anos trabalhando nos Associados (desde que a TV foi implantada em 1956 [sic]), Cândido disse que "vejo com muita tristeza a cassação da licença da TV Ceará". Ele acrescenta "que não se pode imputar a uma pessoa o que vem acontecendo ao longo do tempo. Há muita coisa que não foi dita, que precisa ser esclarecida", lembra.


Adianta Cândido Colares, apresentador do Matutino PRE-9, que para "saber a verdade do problema é preciso que se faça uma análise completa do assunto, porque até agora só se tem falado de maneira superficial".


Sem nenhuma esperança que a TV Ceará volte a funcionar, sob o controle dos Diários Associados, Cândido salienta que "espero que as autoridades do Governo concretizem o que estão prometendo aos funcionários da TV Ceará, num espaço de tempo, que não se alongue tanto, como acontece em São Paulo onde o pessoal da TV Tupi só tem recebido promessas do Governo".


Como vai ficar?


A realidade da TV Ceará pode ser mais ou menos delineada assim: a empresa não possui outro patrimônio além das instalações e do equipamento. Se esse patrimônio fosse vendido talvez desse para pagar a muita gente, que tem salários atrasados há anos. Pergunta-se quem compra? Se está fora do ar, não teria mais anunciantes, que garantem o equilíbrio financeiro da empresa. Além disso, fora do ar, a empresa dificilmente receberá o dinheiro dos anúncios que firaram fiados. Como o quadro de funcionários é muito grande, a Ceará Rádio Clube não terá condições de pagar a todos um vale semanal. De concreto só tem uma coisa: todos os funcionários vão ficar sem receber seus salários, até que o Governo resolva o problema, de modo a beneficiar a todos.

Cassação do canal 2 provoca protestos



Uma intensa movimentação considerada acima do comum foi registrada ontem nas dependências do edifício Diogo Vital de Siqueira, na Avenida Antônio Sales, local onde funciona a TV Ceará, canal 2. Com a divulgação da notícia da cassação da concessão e o anúncio do futuro fechamento da emissora por parte das autoridades governamentais - medida extensiva a mais seis outras da rede associada - diretores e funcionários analisavam e discutiam entre si as conseqüências que essa medida poderá acarretar. A impressão que se tinha era de a notícia do fechamento causara, como era de se esperar, uma inevitável surpresa entre o pessoal que opera no antigo canal 2, muito embora, já se aguardassem inicativas por parte das autoridades para se definir a situação da rede em todo o País.


Para alguns funcionários, como o produtor Tertuliano Siqueira, o gesto do Governo foi considerado radical, "uma medida de força" assinalou ele, ao argumentar que as autoridades não levaram em consideração certos aspectos da situação de cada emissora em si, tomando a crise como um todo. Analisavam os defensores da manutenção da TV Ceará, como emissora da rede associada, o ponto de vista segundo o qual a empresa local estaria tomando algumas providências no sentido de legalizar os seus débitos para com a União, inclusive, porque a superintendência local enviara ofício ao próprio Ministro da Previdência, Jair Soares, solicitando o parcelamento dos débitos de 60 para 100 meses.


A carta datada de 4 de julho último não fora respondida pelo ministro, fato que segundo se pode depreender causou certo constrangimento entre a alta direção da empresa.Ontem cedo, o clima era de expectativa e de desolação nos corredores do canal 2, com os empregados trocando informações acerca da decisão do Governo de fechar a TV Ceará, ao mesmo tempo em que se discutia quais os rumos a serem tomados assim que se concretizar a medida. Ninguém fora informado sobre nada, chegando-se mesmo a tomar conhecimento da medida através do telenoticioso de outras emissoras.


Todos queriam ouvir alguma decisão dos dirigentes a respeito do fato, muito embora entre a própria diretoria nada de oficial pudesse ser acrescentado além do que fora divulgado pela imprensa. Muito cedo o presidente do Sindicato dos Empregados das Empresas de Rádio e Televisão do Ceará, radialista Aderson Maia e um dos fundadores do canal 2, deslocou-se para a Estância a fim de se reunir com o superintendente e a diretoria do canal 2, tentando encontrar uma fórmula de se posicionar a respeito do fato.


Na sua opinião, a medida era como aguardada, porém jamais ele imaginava que viesse de um modo tão "drástico", fechando as portas a um enorme contingente de trabalhadores no setor de comunicações. "Principalmente porque sabemos da dificuldades do mercado de trabalho para absorção desse pessoal", analisava Aderson enquanto conversava com os funcionários, convidandos-os a uma reunião hoje pela manhã no prédio da televisão.


Para Aderson Maia, a situação do canal 2 tinha possibilidades de ser superada, especialmente quando a direção já iniciara providências com vistas a essa regularização.


"Muito dos nossos funcionários poderiam se considerar em dia", lembrou Maia, fazendo uma comparação com a situação de outros canais da rede associada que foram atingidas pela medida. Ao contrário de São Paulo, argumentara o presidente sindical, jamais ocorreu um movimento paredista denunciando as irregularidades que todos sabiam existir, mas jamais houve uma denúncia sequer de algum órgão que dirige ou mesmo junto à Delegacia do Trabalho. Isso, todavia não implica dizer que o Sindicato da classe desconhecia as enormes dificuldades que atravessa o canal 2, com uma dívida enorme junto ao seu quadro funcional além dos débitos para com a Previdência Social.


"Ocorre que aqui no Ceará, a empresa dava satisfação aos seus sempregados, oferecia uma esperança", aludia Aderson Maia. Explica para tanto a venda da Rádio Araripe do Crato, o terreno onde existe o jardim da emissora e o arrendamento dos jornais Unitário e Correio do Ceará, "havia a esperança de que a situação do pagamento fosse colocada pelo menos em dia". Segundo o presidente do Sindicato, a dependência da rede era que falta crer na tomada de uma posição do Governo, muito embora jamais passasse pela cabeça de seus funcionário num fechamento do canal 2.O Sindicato iniciou ontem contatos com o pessoal da Delegacia do Trabalho no sentido de uma tomada de posição a ser definida nas próximas horas.


"Não é uma tomada de posição da classe, mas tão somente dos funcionários da televisão", ressaltava Aderson Maia.


Vigília


As primeiras iniciativas de protesto contra a decisão do fechamento do canal 2 surgiram logo à tarde de ontem, quando a emissora a partir das 17 horas lançou ao ar a imagem de funcionários e diretores se solidarizando em torno da questão durante quase todo o restante da programação do dia.


A vigília dos funcionários da TV Ceará conseguiu sensibilizar as atenções da cidade. Durante o encontro realizado no auditório da TV Ceará, o apresentador Augusto Borges e todo o corpo de funcionários da empresa conclamaram as autoridades e o povo em geral no sentido de tomarem iniciativas de soliedariedade da classe associada local, transmitindo suas mensagens através do vídeo, ao mesmo tempo em que se apegava para que se encaminhassem telegramas as autoridades, entre elas o Presidente João Figueiredo, no sentido de retroceder na decisão.


A emissora, ao contrário de outros dias, registrou um aumento de audiência fora do comum, quando normalmente o Ibope acusa não mais que três pontos, elevando-se para 12 no horário da vigília. Para ali acorreram os ex-funcionários hoje integrando outros prefixos, políticos e profissionais de diversas outras categorias, solidários a mensagem dos funcionários que se diziam decididos a não sair do ar enquanto não fosse divulgada uma decisão do futuro da classe associada local.O animador Augusto Borges, responsável juntamente com Irapuan Lima pelos dois únicos programas de auditório ainda apresentados no Estado, considerava o fato do fechamento do canal 2 como uma notícia muito triste.


Augusto abatia-se especialmente pelo fechamento do mercado de trabalho a técnicos, operadores, artistas, músicos e "do próprio fortalezense, que nessa casa, tem recebido o melhor tratamento no que se relaciona ao exercício de nossa arte e cultura". Indagava ele, "o que será de todos nós?"Para Tertuliano Siqueira a medida chega como uma forma de pressão do Governo, atingindo principalmente "a cultura cearense que aqui dispunha praticamernte de grandes espaços para se movimentar e promover". O pior de tudo, analisavam os funcionários do canal 2 é que não se deixou esclarecida a maneira como os funcionários irão receber seus vencimentos, durante o tempo de fechamento da emissora, enquanto aguardavam as negociações para a sua venda. "A Caixa Econômica vai pagar, como fez em São Paulo?", interrogavam uns.


Ademais pelo que sabe a Ceará Rádio Clube, emissora que fatura uma média de Cr$ 600 mil cruzeiros mensais, não conseguirá arcar com as despesas de mais de Cr$ 2,5 milhões para cobrir a fatura do pessoal da TV. "A estação vai poder pagar somente o pessoal da rádio", asseverava o superintentende Manoel Eduardo Pinheiro Campos, que se negou a oferecer qualquer informação a reportagem, considerando que uma palavra sua poderia dificultar ainda mais as iniciativas que estão sendo tomadas no Sul.Contudo a uma agência de notícias de âmbito nacional, Eduardo Campos, ao referir-se acerca da cassação, declarou que "recebeu a decisão do Governo como um violendo soco na mandíbula indo diretamente a nocaute".


O radialista Paulo Oliveira, responsável pelo programa "Caso de Polícia", do canal 2 declarou que "se eu me desempregar, acostumado que estou a lidar com gente de toda espécie no meu programa policial, em virtude disso eu sou capaz de tomar de quem tem", numa atitude que demonstra um pouco de excesso, porém explicável para quem como ele verá o pânico, de perder o emprego naquela casa.


José Maria Dantas, participande de um quadro no noticioso "Tupi Aqui e Agora", foi quem resumiu a situação com melhor propriedade. Segundo ele, após o papa João Pauo II ter vindo ao Ceará e pregado o "slogan" do Congresso Eucarístico, "Nunca o 'Para Onde Vais?' foi tão bem colocado para nós da TV canal 2", assinalava.

Fim da Tv Tupi



Matéria do jornal O Povo, um dia após decretado o fechamento das emissoras de  televisão dos Diários Associados, incluindo a TV Ceará canal 2, em 1980.  Na foto, o detalhe do prédio onde estava instalada a emissora.

TV Manchete

Matéria sobre a inauguração da TV Manchete, O Povo, fevereiro de 1984

Anúncio da programação de inauguração da TV Manchete no Ceará

Programação de inauguração da TV Manchete, no dia 12 de fevereiro de 1984

Local de instalação do prédio da Manchete, na Avenida Antônio Sales (Foto: O Povo, 1984)

 
Equipamentos de tape da TV Manchete Fortaleza (Foto: O Povo, 1984)


Inauguração da TV Manchete

Com o fim do conglomerado de comunicações de Assis Chateubriand, em 1980, o Governo Federal rateou as empresas pertencentes aos Diários Associados, incluindo a primeira emissora de televisão de Fortaleza: a TV Ceará, inaugurada em 26 de novembro de 1960.

A concessão do canal 2 acabou ficando para a Rede Manchete, que inaugurou sua nova geradora na capital cearense no dia 12 de fevereiro de 1984 (segundo jornais da época).

O moderno prédio, desenhado pelo arquiteto Oscar Niemeyer, abrigou a nova estação na Avenida Antônio Sales.

A programação do primeiro dia iniciou com um show dirigido por Nelson Pereira dos Santos ("O Mundo Mágico", às 18h30), com a participação de diversos artistas como Ney Matogrosso, Paulinho da Viola, Kleiton & Kledir, Erasmo Carlos, Alceu Valença, Zizi Possi e os grupos Blitz e Roupa Nova.

Em seguinda, a exibição do filme "Contatos Imediatos do Terceiro Grau", sucesso dos cinemas. Desde o início, retransmitiu diretamente a programação gerada do Rio de Janeiro, com uma equipe de jornalismo local dirigida por Ruy Lima, que enviaria matérias direto para os programas da Rede Manchete.

Em maio de 1999, com a quebra da Manchete, a RedeTV! assumiu todas as geradoras, inclusive o de Fortaleza, mantendo o mesmo caráter de repetidora do sinal de satélite e produzindo matérias para os telejornais da rede, sem produzir programas locais.

Redetv!


A RedeTV! Fortaleza só possui duas equipes de reportagem, uma comandada pelo repórter Omar Jacob e outra pela Rita Brito, que faz as reportagens da Região Metropolitana de Fortaleza.

Mas as reportagens são decididas pelo departamento de jornalismo, em São Paulo, SP.
Hoje ambas as equipes estão trabalhando em tecnologia HD digital.

A primeira emissora no Ceará a veicular suas reportagem em HD até 2009.


¹Apenas nomes de Lojas da época, não necessariamente lojas de eletrodomésticos.
² Quando várias emissoras de tv se unem para transmitir um único evento a nível nacional ou internacional.



Crédito - Othon Notícia

terça-feira, 19 de abril de 2011

Fortaleza antiga - A chegada do progresso


Bonde Jacarecanga - Arquivo Assis de Lima


O calçamento de pedra tosca constituía-se, para articulista do jornal Razão, em entrave ao progresso manifesto no crescente tráfego urbano. Em 12 de maio de 1929, ele chamava a atenção dos leitores a essa indesejada  herança do passado. Ao contrário dos que realçavam  o feitio nostálgico que o empedramento conferia à cidade, este enfatizou as necessidades práticas de uma nova pavimentação. 



Ha’ cousas velhas que parece nunca mereceram da imprensa a menor referencia. Correm os annos ás dezenas e ellas por ahi afóra permanecem esquecidas dos chronistas, posto que vistas por toda a gente, a qualquer hora do dia e da noite. A razão do olvido é, commummente, o facto de taes antigualhas não constituírem obstaculos á marcha desse corsel alado, que é o Progresso, ou perigos para aquelles que o cavalgam, na ansia de experimentarem a vertigem dos seus vôos... Encontram-se, porém, em Fortaleza 
velharias que estão no caso de ser vistas, revistas, registradas, e destruidas. São trechos de calçamento visivelmente, sensivelmente, perigosamente, improprios para as necessidades do trafego, que a cada momente [sic] se torna mais intenso. [...] Sejamos amigos do 
Progresso.



Ser amigo do progresso implicava despojar-se de resquícios do passado. Se estes obstarem a modernização da cidade – como parece ser o caso de uma árvore postada no meio de uma rua ou de um trecho de calçamento antiquado –, é motivo suficiente para que sejam riscados da 
paisagem urbana. O progresso, ora pintado como um corcel alado – imagem emblemática, pois bem expressa os anseios de modernização de parcelas da população, naquele tempo –, deveria seguir sua marcha inelutável. 


Fortaleza das carroças


Com efeito, Fortaleza conheceria, na década seguinte, um notável surto de crescimento urbano e progresso material. Pode-se dizer que o período se constitui em marco na história da cidade, uma vez que ocorrem modificações de relevo em sua fisionomia: a substituição da iluminação pública a gás por um sistema elétrico, em 1934; a inauguração do Excelsior Hotel, em 1931, arranha-céu com impressionantes sete andares  – edificado, vale 
salientar, sobre as ruínas do sobrado do comendador Machado, demolido em 1927 (construção que datava de 1825 e guardava a marca de ser a primeira a ostentar três pavimentos, na vila recém-elevada a cidade); por fim, a pavimentação das ruas com paralelepípedos, e, nas vias mais movimentadas, a concreto, em reforma empreendida pelo interventor municipal Raimundo Girão, em 1933.


A pavimentação era mister em função da aceleração que caracterizava o novo quadro urbano. O antigo calçamento se achava obsoleto em relação às novas demandas de tráfego, conforme acusou o comentarista, pois a cidade não se movimentava mais como antigamente, ao ritmo moroso proporcionado pelos meios de transporte da Fortaleza antiga, os bondes puxados a burro e os “cabriolets” alugados ao velho Golignac.


 Em vista da agilidade dos novos meios de transporte, impunham-se disposições de espaço favoráveis às expectativas de quem ansiava por experimentar a “vertigem dos vôos” do 
corcel alado” em que se afigurava o progresso. Para tanto, era necessário um espaço desimpedido de árvores e nova pavimentação,  com a utilização de materiais apropriados aos imperativos da velocidade. Assim, é com entusiasmo que o comentarista do jornal  O Povo saúda os leitores com uma “auspiciosa notícia”



[...] o sr. Prefeito da capital, major Tiburcio Cavalcanti, prosseguindo na serie de iniciativas e realizações que tanto destaque têm emprestado á sua proveitosa administração, vai iniciar dentro de breves dias a pavimentação a concreto das ruas da cidade. [...] 
Fortaleza, comquanto seja uma bela cidade, é inegavelmente mal iluminada e peor calçada. O nosso calçamento é o mais retrogrado dos que existem no Brasil. Pedras irregulares, que  mal se ajustam, que se deslocam, se aprofundam, ou sobem de nivel, fazem o atual 
pavimento das nossas ruas, onde é impossivel o pedestre marchar a passo firme e os veículos circularem sem violentas  trepidações. 
Destarte, a medida a ser tomada pelo snr. Major Tiburcio Cavalcanti é dessas que merecem francos aplausos, mormente em se sabendo que não se trata apenas de pavimentar a concreto as arterias importantes da cidade, mas igualmente de calçar a paralelepipedo as 
demais ruas.


Nessa conjuntura, a fotografia foi convocada a testemunhar acerca da transformação da cidade.


 A objetiva atestava a mudança no registro do que desaparecia (caso do Oitizeiro), mas também foi direcionada para elementos que certificavam o adiantamento da urbe. 


A foto documentava a modernização da cidade na exibição de seus signos mais emblemáticos: pavimentação com placas de concreto, tráfego urbano e canteiros centrais arborizados. O fotógrafo preocupou-se em reunir, na mesma imagem, os meios de transporte comuns ao tempo: o automóvel, o auto-ônibus (em circulação desde 1928) e o bonde elétrico (já em declínio). Rua Major Facundo, em 1935 (Fonte: Lopes, 1998). 



Parece certo afirmar que o tráfego era percebido como índice confiável para se inferir o progresso da cidade. Talvez não seja fora de propósito proceder a um breve retrospecto dos meios de transporte em Fortaleza, pois, além de se afigurarem em signos da modernidade, sua expansão repercute em novas formas de sentir o tempo. 
Os primeiros bondes puxados a burro circularam em 1880, através de concessão da Prefeitura à Companhia Ferro-Carril. O evento “marcou época na vida de Fortaleza”, segundo conta João Nogueira, em texto de abril de 1936. 

Os que ainda restam daquele tempo se recordarão, talvez, da admiração e dos aplausos com que foi recebido, nesta cidade, tão grande progresso 


Bandas de música, fogos de artifício e uma sessão solene da Diretoria, lavrada em ata, marcaram o “memorável acontecimento”, que contara com a presença do presidente da Província, entre outras figuras ilustres que se achavam ali presentes.


O escritor Raimundo de Menezes também recordou, no  programa de rádio Hora da saudade, transmitido pela estação PRE-9, os primitivos meios de transporte da antiga Fortaleza. Em 1937, a radiodifusão, tecnologia incipiente na cidade (havia então uma única emissora), permitiu que seus ouvintes, inclusive os que não podiam ler suas crônicas posteriormente editadas na Gazeta de Notícias, experimentassem um sentimento de nostalgia por tempos idos.



Pequeninos, modestos, dirigidos por um boleeiro, quase sempre enfiado num fraque, os primitivos bondes semelhavam, no formato, uma caixa de fósforos, tendo umas cortinas que escorriam balaústres abaixo, em proteção ao calor do sol e bátegas da chuva. Dois néscios 
burros, cabisbaixos, usando uns grotescos antolhos  de couro, puxavam, valentemente, o veículo, vergastados por cumprido chicote, e atendendo, humildemente, aos seus nomes característicos, berrados a plenos pulmões.



Após explorar o serviço por três décadas, a Ferro-Carril fora vendida, em 1912, à empresa britânica The Ceará Tramway, Light and Power. O novo sistema de bondes à tração elétrica seria inaugurado no ano seguinte, o que, no entanto, não significou o sepultamento da antiga forma de locomoção. 
Conforme certifica o escritor, estabeleceu-se um “tráfego mútuo”: a substituição sucedera-se de maneira lenta e gradual, possibilitando a coexistência das duas formas de tração por certo período. O fato valera anedota de Álvaro Weyne, no jornal satírico  O Automóvel, cujo “Dicionário” foi enriquecido de um novo verbete: Light – Companhia de Bondes que faz Expressos com bondes de burros.


Ônibus da Ligth-Arquivo Assis de Lima

Para além do valor anedótico, o episódio permite entrever a cidade como construção humana contínua. De fato, ela não cresce “em bloco”; é, ao contrário, habitada por tempos múltiplos, marcas de outras eras e vivências a elas ligadas. Ademais, a anedota assinala o caráter incerto de um processo que também conhecia tropeços e retrocessos: no passado, como no presente, 
a realidade não era tão lisonjeira quanto pintavam  os cronistas do progresso, conforme é possível visualizar em nota publicada na Gazeta de Notícias, em 24 de setembro de 1929. 

Fortaleza, em materia de transporte urbano, marcha  na retarguarda das suas coirmãs nortistas. [...] A  Light, de par com um horario defficientissimo mas até certo ponto toleravel ainda conserva a mesma rêde conductora de sempre, ameaçando com a sua calma britannica a vida dos transeuntes imprevidentes. As carroças, que fazem de bonde, continuam a passeiar na nossa urbs, indolentes, os restos de sua longa existencia. Domingo ultimo, uma dellas, a de nº. 58, de 2ª. classe, com a placa «1ª. secção–Estação», ás 10,10, cançou sob o peso dos annos, bem em frente a esta redacção.

Estava no  prégo e não conseguiu reanimar as forças. Outra companheira de infortunio arrastou-a para as officinas. Pobres carroças... não têm direito a uma aposentadoria!...

De qualquer modo, o corcel seguia vencendo, não sem alguma dificuldade, os percalços encontrados no caminho: O último bonde de burro que rodou pelas ruas de Fortaleza foi o de n° 25, guiado pelo velho Fialho, na linha do Alagadiço, a derradeira a ser eletrificada.

O número de veículos conheceria um salto notável, ao longo dos anos trinta. Para atender às demandas de locomoção de uma população que quase dobrou em duas décadas – de 78.536 habitantes, em 1920, para 149.670, em 1940 –, eles mais que duplicariam, no período relativo a esta pesquisa: em 1929 eles eram 600 aproximados, para atingirem a cifra dos 1.287, em 1944.

Ônibus da Ligth-Arquivo Assis de Lima

O aumento do número de veículos em circulação pelas ruas da cidade não se realizaria incólume: em decorrência da intensificação do tráfego entravam em cena os atropelamentos, tragédia inaugurada pela modernidade.

 Quem folheasse o jornal, naqueles tempos de mudança, por certo ficaria alarmado ante a freqüência com a qual ocorriam: automóveis, auto-ônibus e bondes elétricos cotidianamente produziam numerosas escoriações, fraturas e mortes, inclusive. 

Dia a dia a imprensa citadina regista atropelamentos nas varias ruas desta capital, a maior parte devido á desenfreada velocidade desenvolvida pelos vehiculos. Hontem, mais um desses accidentes se verificou nesta cidade, sendo grave o estado da victima. Cerca das 16,1/2 horas, o auto-omnibus n. 507 A O, que tinha placa «Joaquim Tavora» e guiado pelo «chauffeur» Elyseu Alves se movimentava em direcção áquelle bairro, tendo partido da Praça do  Ferreira, o qual desenvolvia, na occasião do desastre uma velocidade de 60 kilometros. No momento em que aquelle vehiculo passava em frente á Igreja do Coração de Jesus, apanhou em cheio o menor José Barros Martins, de 12 annos de idade. Resultou desse violento choque receber o menor, que é filho do sr. Joaquim  Martins, ferimentos na cabeça, facturando a perna esquerda e ainda escoriações generalizadas.

Ônibus da Ligth-Arquivo Assis de Lima

Os periódicos de hoje pouco se ocupam em noticiar os “desastres de rua” (uma vez que já fazem parte de nossa rotina), mas aquele tempo deixou vestígios de como eram percebidos: o espaço que lhes era dedicado indica que se constituíam em eventos extraordinários que irrompiam na calmaria da vida de uma cidade pacata, até há pouco. Entretanto, é possível vislumbrar, entremeado aos relatos de acidentes, algo de laudatório, pois, como ironiza 
João Nogueira, em crônica de abril de 1936, estes incidentes se constituem em índices do progresso e grau de civilização alcançado por uma cidade. 
Dizem certos entusiastas que os desastres de rua estão na razão direta do progresso das cidades e que são o índice  (ou termômetro) pelo qual se avalia o progredir de cada terra. Tais 
acidentes mostram que a Fortaleza tem vida, tem gente, movimento e progride.¬¬ É isso?

Em virtude da aceleração urbana, percorrer os espaços da cidade era tarefa que principiava a requerer atenção constante, reflexos rápidos, gestos bruscos...
O perigo de ser colhido por um “auto”, ao atravessar a rua ou descer do bonde, era considerável. Aos mais jovens  talvez fosse possível a adaptação aos novos tempos – arremessados em um turbilhão, poder-se-iam descobrir portadores de forças que não imaginavam possuir, a fim de garantir a própria sobrevivência.

 Aos de mais idade, porém, restava o recolhimento à segurança do lar ou, em caso de descuido, ao tentar apanhar o bonde, à cama da Santa Casa (na melhor das hipóteses). Ou ainda a crítica velada no jornal. 
A Inspetoria Geral de Veículos, órgão criado no intuito de gerenciar a nova situação, buscou coibir a “volúpia” de velocidade de alguns  chauffeurs prescrevendo normas e punições aos infratores (da multa à suspensão da licença para guiar, e até mesmo a prisão). Em edital publicado a 17 de outubro de 1930, foram estabelecidos limites de velocidade conforme as zonas em que a cidade estava dividida: a marcha dos automóveis no perímetro central era 
restringida aos 10 km/h; 20 e 30 km/h, para as áreas urbana e suburbana, respectivamente; e 40 km/h, na área rural.

No entanto, a tecnologia desenvolvida para os automóveis possibilitava que atingissem, já em 1929, a marca dos 120 ou 130 quilômetros horários Em função do rápido crescimento da urbe, uma legislação adequada à nova realidade não tardaria. O Código de Posturas de 1932 substituiu a lei de 1893, obsoleta, pois não contemplava as novas condições, constituindo-se, 
portanto, em obstáculo ao progresso e urbanização da cidade.
O  Código normatizava construções, dimensões de ruas e passeios, arborização de logradouros (criava até uma Inspetoria de Arborização e Jardins, com a incumbência de decidir sobre poda e derrubada de árvores), “garages” para automóveis, estabelecimentos comerciais e o próprio trânsito. O dispositivo legal apoiaria as ações da municipalidade que objetivavam a modernização da cidade, além de prevenir desvios decorrentes do crescimento desordenado, 
que se verificavam em função da ausência de um plano de urbanização. 
No suprimento de tal demanda, inscreviam-se os esforços de Raimundo Girão com vistas à criação e implementação do Plano de Urbanização de Fortaleza, durante sua administração (1933-4). A medida impunha-se, segundo o prefeito, em razão de Fortaleza ser uma “cidade de progresso rápido”, mas pouco sistemático, acarretando erros que a todo 
instante exigiam a aprovação de leis municipais atinentes à sua correção.

 A elaboração do Plano coube ao engenheiro Nestor de Figueiredo, urbanista com vasta experiência, adquirida no planejamento das cidades de Recife e João Pessoa
O tempo do progresso encontraria expressão e legitimidade na Coluna da Hora, grande torre encimada por relógio com quatro mostradores, erigida na praça do Ferreira, no final de 1933. O artefato confirmava a tendência à verticalidade do mundo urbano, já configurada na edificação do Excelsior Hotel – verticalidade outrora preenchida por árvores. Em  uma cidade retrógrada, onde até o mostrador oficial da cidade, que figurava no prédio da Intendência municipal, costumava atrasar, como que a resistir teimosamente à mudança, o 
novo artefato simbolizava uma aceleração do tempo, representava a adesão ao tempo linear, uniforme, do mundo moderno.

A Coluna da hora, na Praça do Ferreira. O relógio ganhava centralidade, 
impondo uma nova duração à cidade. A verticalidade  urbana também se 
insinuava no Majestic Palace, o maior prédio ao fundo. 


O atraso da urbe não se manifestava apenas em seus cronômetros: a deficiente iluminação pública a gás se constituía em outro elemento que atravancava a marcha da cidade no rumo da civilização.

 A iluminação elétrica de ruas e praças, inovação de 1934, substituiu um sistema abastecido por combustores “antiquados” e em número insuficiente,  na percepção de articulista do jornal  A Razão.

 Não bastasse o apontado, os postes eram acesos alternadamente desde 1914, segundo João Nogueira, em função das dificuldades impostas pela Primeira Grande Guerra ao fornecimento de carvão de pedra, combustível de que dependia o sistema. O  que, no entanto, não o impedia de lembrar o tempo em que “a nossa iluminação pública, se não era a 
melhor, era das melhores do país”, superior, inclusive, à nova iluminação, conforme afirmava em artigo publicado em julho de 1938, dedicado às formas de iluminação pública que a cidade já conhecera. 

[...] mas, valha a verdade: a iluminação das nossas ruas até 1914 era mil vezes melhor que a atual. Os combustores eram implantados em ziguezague, distando cerca de trinta metros um do outro, no mesmo lado da rua. Contribuíam para esta excelente iluminação a pequena 
distância entre eles, sua pouca altura (2m40), a brilhante chama em forma de leque, queimando um gás bem preparado, a tampa pintada de branco, por dentro, servindo de refletor, espalhando a luz pelas calçadas e ruas, e a manga de vidro, inteiriça. Tudo isto no alto de uma coluna de ferro fundido, elegante, esguia e canelada. Eram todos numerados.

Seu juízo em favor da antiga iluminação seria posteriormente questionado.
Mas, conforme o historiador Antonio Luiz Silva Filho pontua, João Nogueira não emitia, na passagem citada, um parecer meramente técnico. Talvez ele postulasse sua preferência ao antigo sistema não porque sua luz fosse mais potente, ou constante, mas porque os velhos postes da Ceará Gás compunham a paisagem da cidade onde criara raízes, nas referências consolidadas ao longo do contato prolongado com o espaço, comunhão desfeita com o aniquilamento dessas referências, e conseqüentemente, do mundo onde se reconhecia.
Por outro lado, como vigilante das tradições da cidade e guardião de sua memória (função da qual se auto-incumbira, no longo e doloroso processo de modernização da cidade), a polêmica que levanta  evidenciava a compreensão de que a inovação não representava benefícios tão grandes que justificassem a mudança de um componente tradicional da cidade (o sistema 
datava de 1867, não por acaso, ano em que ele nascera). O problema apontado nos jornais (a economia na hora de acender os combustores) haveria de ter uma solução. Mais que uma presa do saudosismo ingênuo, João Nogueira se revela um crítico mordaz do progresso sem freios, da mudança radical justificada não por um suposto conforto que dela pudesse advir, mas por seu caráter de novidade. Sua aversão não se direcionava à inovação em si, 
mas para sua busca desmedida, que levava os homens  a esquecerem o passado, suas raízes. 

João Nogueira por certo não desejava uma cidade imutável – tal como a Zora pintada por Calvino, que para facilitar a memorização de seu traçado permanecia inalterada, na infindável sucessão de ruas e casas, portas e janelas, e em função disso “definhou”, foi “esquecida pelo mundo”.

Toda cidade cresce, se transforma (como bacharel em Engenharia ele sabia disso perfeitamente). Mas a mudança não devia se colocar  a serviço do esquecimento. Olvidar as tradições é coisa que não admitia. 

O aperfeiçoamento foi saudado por segmentos sociais envolvidos na transformação da capital que ainda se deixava reger pelos ritmos da natureza, mantendo apagados os combustores quando das noites  de lua cheia – o “contrato com a lua” mencionado por João Nogueira e outros memorialistas, alvo de pilhérias por parte da população. Sua luz potente teria o poder de apontar ao garboso corcel alado do progresso o caminho por onde faria sua apoteose, a passos firmes, porque mais seguros, em  virtude do novo pavimento e da eletricidade que lhe alumiava o chão. 
As mudanças ocorridas nas primeiras décadas do novo século pareciam, assim, concretizar o triunfo da cidade sobre as forças da natureza: após os bondes dispensarem os burros como força motriz e uma árvore que se achava no caminho do progresso ser finalmente derrubada, era a vez de o “contrato com a lua” ser rescindido. O domínio da luz permitia escapar aos 
ritmos da natureza e sua regular sucessão entre dias e noites, constituindo-se em elemento definidor da “artificialidade” do mundo urbano.

 A parceria com o referido satélite era coisa do passado, assunto para cronistas da Fortaleza 
antiga. Quando muito poderia ser lembrada, não sem  uma pontinha de saudade.




Fonte: Tempo, progresso, memória: um olhar para o passado na Fortaleza dos anos trinta -
Carlos Eduardo Vasconcelos Nogueira - 2006

sábado, 16 de abril de 2011

O Cajueiro Botador - Livro Fortaleza Descalça


É com extrema doçura que descobrimos Fortaleza e com riqueza de detalhes vai o autor relatando fatos e pessoas que marcaram decididamente, nossa cidade. Com profundo conhecimento e com uma característica bem particular, Otacílio de Azevedo nos conta como se deu a Inauguração do Teatro José de Alencar, a queda do Governo Acióli, a Inauguração do Majestic e como funcionava o Cinematógrafo de Júlio Pinto. São citados inúmeros e importantes poetas e prosadores, pintores e figuras da sociedade cearense. Os tipos populares mereceram de Otacílio, destaque particular. Assim, o autor nos possibilita uma viagem no tempo da Fortaleza tranquila, pacata, simples e feliz, sem automóveis, sem barulhos enlouquecedores, apenas os das serestas que embalavam as noites de luar e os corações dos apaixonados....

Conheci, logo que aqui cheguei, vindo de Redenção, o célebre “Cajueiro Botador” da Praça do Ferreira. Situava-se em frente da Empresa telefônica – local onde hoje é a Livraria Alaor. A Livraria Alaor ficava na Rua Floriano Peixoto n° 621.

Era o Cajueiro dos mexeriqueiros, dos desocupados... mas também de muita gente boa. No dia primeiro de abril, feriado nacional da mentira, juntava-se ali dezenas de pessoas – homens da sociedade, plebeus, artistas, pequenos comerciantes, brancos e pretos, enfim, toda casta de gente que lia cartazes pregados no tronco nodoso do cajueiro.



Cajueiro Botador - Praça do Ferreira - Foto de 1905 - Arquivo Assis Lima

Era uma gargalhada ininterrupta que vibrava, repercutindo por toda a Avenida 7 de setembro. Os cartazes noticiavam as maiores mentiras, denunciavam mil coisas e, às vezes, a sua leitura provocava discussões e até brigas violentas.

O Café Java, que ficava defronte à Delegacia de Polícia (hoje Caixa Econômica), era a sede do pleito político dos potoqueiros e onde se preparava as chapas para as eleições de mentira.


Café Java - Foto de 1908

De manhã cedo, até ao anoitecer, não se mediam horas, ninguém trabalhava noutra coisa a não ser na eleição dos seus candidatos. Embandeiravam os galhos do velho cajueiro com as chapas e cartazes.


Praça do Ferreira - Foto de 1906 - Arquivo Assis Lima


Soltavam bombas e foguetes sob a música da Banda da Polícia ali postada a executar sambas, polcas e maxixes, às vezes acompanhados de grossa pancadaria...

Faziam parte daquela comuna irrequieta Amâncio Cavalcante, Leonardo Mota, Eurico Pinto, Gérson Faria, William Peter Bernard, Ramos Cotoco, Chamarion, Carlos Severo, Gilberto Câmara, Quintino Cunha, o Rochinha da farmácia, o Pilombeta e muitos outros...

Os que se mostravam contra a brincadeira ficavam loucos de raiva, atiravam no chão os seus chapéus de palhinha, brandiam furiosos as bengalas, praguejavam, ameaçavam e, impotentes, retiravam-se sob o apupo de mil vozes galhofeiras.

O cajueiro, porém, pejado de frutos vermelhos de janeiro a dezembro, parecia rir daquilo tudo: agitava ao vento os seus galhos retorcidos e pesados dos frutos maduros.

[CAFÉ+JAVA.jpg]


Diz Raimundo Girão na sua magnífica Geografia Estética de Fortaleza: era o cajueiro da mentira. Melhor, o suporte da urna em que se elegiam os mitômanos graduados todos os anos a primeiro de abril, considerado o dia nacional da potoca. 

À sua sombra, como um pálio, resguardava a mesa eleitoral que recebia os votos populares no mais animado e vero dos pleitos, tudo ornamentado de bandeirinhas de papel e agitado de foguetes de estouro.

À noite, o nome vitorioso era colocado no cajueiro, havendo discursos, aplausos, urros, os mais calorosos vivas sob o estrépido das palmas.

Em 1920, o prefeito Godofredo Maciel, num gesto frio e desumano mandou que cortassem o cajueiro botador. Houve um levante surdo contra o desalmado prefeito, que muito perdeu na simpatia dos assíduos fregueses do quartel-general onde se reuniam os programadores do memorável dia da mentira.

Era esta a maior festa popular da Fortaleza Antiga.



Revivendo o Cajueiro Botador...


História do Festival de Mentiras

De 1904 a 1920, na Praça do Ferreira, debaixo do Cajueiro Botador (era assim chamado porque botava caju o ano todo), o Ceará assistiu a sua festa mais tradicional, popular e moleca que foi o Festival de Mentiras, realizado, é claro, no dia 1º de Abril. Ali, intelectuais, artistas, bebuns e desocupados passavam o dia escrevendo e afixando papelotes no Cajueiro, com todo tipo de mentiras ou verdades provocantes.
Em 1920, o Prefeito Godofredo Maciel, sentindo-se incomodado com a brincadeira, mandou derrubar o Cajueiro, acabando com a farra. Na última reforma da Praça do Ferreira, foi plantado um novo cajueiro e colocado a seu lado um placa que conta um pouco desta história.


Foto de Jaqueline Aragão

Em 2006, depois de 86 anos sem acontecer o evento, o Escritório do Riso retomou o Festival de Mentiras, realizando-o também nos anos de 2007, 2008 e 2009 no Teatro Chico Anysio. Em 2010, o Festival volta à Praça do Ferreira, seu lugar de origem.





Debaixo do Pé do Cajueiro Botador o organizador do Festival Zebrinha e o grande potoqueiro vencedor do 22º Festival de Mentiras, realizado em 1º de Abril de 2010; 90 anos depois de acontecido, ali, naquele mesmo lugar, o último Festival de Mentiras; mais precisamente em 1920. O nome do vencedor é todo invocado: Delegado Vilas Malas.


Bagaceira - O Mentiroso de 2011



Créditos: Livro Fortaleza Descalça de Otacílio de Azevedo e Blog do Zebrinha

NOTÍCIAS DA FORTALEZA ANTIGA: