Fortaleza Nobre | Resgatando a Fortaleza antiga
Fortaleza, uma cidade em TrAnSfOrMaÇãO!!!


Blog sobre essa linda cidade, com suas praias maravilhosas, seu povo acolhedor e seus bairros históricos.

 



quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

Escola Honório Bezerra - Bairro Ellery




A escola está situada na Rua Capitão Nestor Góes ao lado da praça conhecida como a do chafariz. Nos primeiros anos de sua inauguração, foi a escola do bairro mais procurada pela qualidade do ensino e boa localização. Nos anos 60, um televisor preto e branco foi colocado na escola para que os moradores pudessem assistir a novelas e outros programas televisivos da época... 

A Escola Honório Bezerra foi fundada na gestão do Governador Virgílio Távora em 1964. O terreno de 800 metros quadrados de área foi doado pela Prefeitura Municipal de Fortaleza e teve como patrono o engenheiro Honório Bezerra. É a mais antiga instituição de ensino do Bairro Ellery atendendo a quase 300 alunos (do 6° ao 9° ano do Ensino Fundamental II e do Projeto Educação de Jovens e AdultosEJA I e II). 

O prédio...fizeram um anexo mal feito conforme podemos notar pelo meio fio da rua. Na foto existe uma janela retangular, que é onde ficava o aparelho de TV para as pessoas que não possuíam o aparelho em casa assistirem a programação. No espaço onde hoje estar o anexo, as pessoas colocavam bancos e cadeiras para ver televisão em preto e branco, que era um objeto de luxo nos idos de 1967. Morava a poucos metros desse Colégio e foi minha primeira escola.

Certamente o prédio original era mais bonito, cujo nome era GRUPO ESCOLAR HONÓRIO BEZERRA. Nessa esquina da escola dobravam à esquerda os ônibus da linha VILA ELLERY, os quais vinham do centro no sentido que estar o fusca. Já os ônibus da linha SANTA MARIA dobravam à direita na mesma esquina e seguiam juntos no mesmo traçado até o final das duas linhas que se dava junto ao trilho.



A Escola Possui:

  • 6 Salas de Aula
  • 1 Sala dos Professores
  • 1 Sala da Direção
  • 1 Sala da Coordenação
  • 1 Secretaria
  • 1 Laboratório de Informática
  • 1 Centro de Multimeios
  • 1 Cozinha
  • 1 Almoxarifado
  • 1 Depósito para Merenda Escolar
  • 2 Pátios
  • 3 Banheiros 




A Escola de Ensino Fundamental Honório Bezerra fica localizada na Rua Capitão Nestor Góes nº 400, região noroeste de Fortaleza, distante cerca de 3 km do centro comercial da capital cearense. As vias de acesso são as avenidas Sargento Hermínio, Olavo Bilac, Dr. Theberge, Padre Anchieta, Pasteur e a rua Barão do Crato.



Curiosidade:

Nos anos 60, o lazer das famílias era assistir TV em preto e branco na calçada da Escola Honório Bezerra¹. Com o crescimento do número de habitantes, surgiu a necessidade de se construir outros centros educativos. A Escola do Seu Firmino, de propriedade privada, surgiu logo em seguida. Porém, devido a problemas financeiros, fechou as portas há mais de 15 anos. Em 1974, é fundada a Escola Professor Martins de Aguiar que oferecia aulas de tele ensino da 1ª a 8ª séries. Dois anos após, foi inaugurado o Centro Interescolar de 1º Grau Dona Creusa do Carmo Rocha, para atender aos alunos da 5ª a 8ª séries com cursos profissionalizantes. Muitas dessas escolas cresceram e passaram a atender a outros públicos. Os exemplos mais conhecidos foram a Escola Municipal de Educação Infantil e Ensino Fundamental Professor Martins de Aguiar, Escola Estadual de Ensino Profissionalizante Dona Creusa do Carmo Rocha, e Escola Municipal de Ensino Fundamental Faustino de Albuquerque.




No bairro Ellery, ainda há três Centros de Educação Infantil (Creche Favo de Mel, Creche da Escola Martins de Aguiar e Instituto Dr. Rocha Lima) e duas escolas particulares (Centro Educacional São Mateus; e Colégio Santa Rita). Entre os anos 80 e 90, a comunidade passou por uma transformação: ruas e avenidas foram asfaltadas e ampliadas; o saneamento básico, instalado; lojas, construídas; outros serviços, oferecidos. Nesse período, foram inauguradas a Associação de Moradores, Associação Cristã, além do Posto de Saúde Dr. Paulo de Melo Machado. A época era propícia para as oportunidades de trabalho. Era comum as empresas Brasil Oiticica (fábrica de castanha), Mecesa (metalúrgica) e Thomás Pompeu (tecelagem) contratarem mão de obra local. Hoje a maioria foi reinstalada em outros endereços. O desenvolvimento trouxe também os problemas urbanos. Uma delegacia e um Fórum de Pequenas Causas foram instalados na tentativa de conter a violência que é hoje um dos maiores problemas enfrentados pelos moradores. O bairro é conhecido por ser um dos mais perigosos da capital cearense, com alto índice de homicídios e de jovens viciados em drogas.



Eduardo Girão diz: "O bairro Ellery surgiu na década de 40 de um loteamento chamado Parque Timóteo. Nessa época, existia nas proximidades da Av. Sargento Hermínio apenas uma vereda que ligava os bairros Monte Castelo e Presidente Kennedy, passando pela Av. Olavo Bilac. A maioria das famílias começava a fixar residência e vinha do interior, por causa da seca, em busca de uma vida melhor na capital cearense. Já naquele tempo, o açude João Lopes transbordava alagando as terras da Vila Ellery e adjacências. O açude também servia de lazer para os moradores que tomavam banhos, pescavam e lavavam roupas. Hoje o açude passa por uma revitalização, pois se encontra poluído. As ruas eram veredas em meio ao mato. Cajueiros, azeitoneiras e pitombeiras compunham a paisagem. A maior parte das terras pertencia a família Ellery. Na década de 50, as áreas próximas ao açude começaram a ser loteadas. Os compradores com maior poder aquisitivo adquiriam os terrenos mais elevados, para escaparem das enchentes. Somente em 1956, a Vila Ellery passou a se chamar oficialmente bairro Ellery, por meio de decreto emitido pela Câmara de Vereadores, no governo do prefeito Acrísio Moreira da Rocha."

Salas de aula

Ainda hoje, alguns descendentes da família Ellery, reside no local. 
O Bairro Ellery tem de tudo um pouco, apesar de ser considerado um dos menores de Fortaleza (meio quilômetro quadrado de extensão), há supermercados, pracinhas, lojas, restaurantes, escolas, etc. De lá para cá, o número de habitantes cresceu, já são oito mil moradores. Gente simples e trabalhadora que gosta de bater papo com os vizinhos nas calçadas e não perde o bom humor nem com os problemas da comunidade.

Sala de Informática

A rádio da escola

¹Por volta de 1969, o lazer diário era a ida das famílias assistir a TV pública, em preto-e-branco, que ficava no prédio do Grupo Escolar Honório Bezerra. Iam assistir novelas e programas como a “Família Trapo”. 



terça-feira, 4 de dezembro de 2012

Escola Normal do Ceará - De 1884 à 1922 (Parte II)



Em 1889, pelo Regulamento de 9 de outubro, novas alterações são implantadas,como a duração de três anos do Curso, antes de dois anos, a introdução do curso preparatório e, aparecendo a Instrução Moral e Cívica, os trabalhos manuais, música e desenho. Estabelece-se também a gratificação para Diretor¹.



Pelo Regulamento de 3 de setembro de 1896, extingue-se o curso preparatório, o Curso passa a ser de treze cadeiras, três a mais que o anterior, com a introdução de “Noções de Litteratura”, “Gymnastica” e noções de Psicologia na cadeira de Pedagogia. O ensino não poderia mais ser feito somente através da memorização, por isso foram proibidas as apostilas e as “licções dictadas”, esse deverá ser feito por meio das lições orais “seguidas de interrogações ou de exercícios práticos”



O ensino deverá ser, sempre que possível, intuitivo, das coisas. Em relação ao corpo docente da Escola, estabelece que os professores serão providos por concurso e que serão vitalícios. Nova reforma acontecerá em 1899, e vem trazendo “ligeiras mudanças, dentro do mesmo quadro de comportamento, mostrando que se trata de um só organizador [José de Barcellos], que tenta,experimenta, analisa e conclui visando uma finalidade – a formação segura eeficiente do mestre.” (Sousa, s/d: 115).


As Normalistas

Novo Regulamento surge em 1911, trazendo de volta o curso preparatório. Novamente o cotidiano da Escola continua seu ritmo em meio às tensões político-sociais vivenciadas pelos cearenses. Em 16 de julho de 1912, o Diretor Thomaz Pompeu de Souza Brasil Filho acusa recebimento de ofício do Tenente Coronel Marcos Franco Rabello que, em 14 do mesmo mês comunica haver assumido a presidência do estado para o quadriênio de 1912-1916. Marcos Franco Rabello sucedeu o governo de Antonio Pinto Nogueira Accioly que, após insurreição popular, foi deportado para o Rio de Janeiro, na manhã de 25 de janeiro de 1912. O acontecimento marcou o fim da oligarquia Accioly no Ceará e explica, o afastamento de Thomaz Pompeu de Souza Brasil Filho, cunhado de Accioly, da Diretoria da Escola Normal


Normalistas em passeio na Praia de Iracema em 1938

A sexta reforma da Escola Normal do Ceará tem origem com o projeto regulamentar de João Hippolyto de Azevedo e Sá, e foi expedido em 14 de novembro de 1918. Por essa proposta, a Escola Normal passa a ser o palco das novas idéias pedagógicas. No início do século XX, o debate pela modernização do ensino recebia nova ênfase na reformulação curricular da Escola Normal do Ceará, sob a influência da nascente industrialização, trazendo implicação direta na formação da mulher cearense. Em fins dos anos 10, por ocasião de uma das tantas reformas da Escola, seu currículo assume características tipicamente modernas com a inclusão de disciplinas como “Dactylographia”, “Stenographia”, Inglês e noções de escrituração mercantil”.




Com a I Guerra Mundial (1914-1918), há um maior desenvolvimento da indústria nacional, em virtude da queda nas exportações dos países “envolvidos diretamente no conflito”, desenvolvimento esse combatido pela facção ruralista que insistia numa sociedade agrário-exportadora tendo no café sua principal base de sustentação econômica. “As oligarquias desejavam, a todo custo, segurar a própria história!” (Ghiraldelli Jr., 1987: 26). Contraditoriamente, a expansão cafeeira gera o capital necessário ao incremento industrial que se manifesta, principalmente, na indústria têxtil e alimentícia. 




No campo educacional, as ideias escola novistas se consubstanciam nas reformas educacionais por todo o país, na década de 20. Tais ideias culminam, no Brasil, no movimento que se denominou de “otimismo pedagógico”, caracterizado pela “reestruturação interna das escolas, as mudanças dos conteúdos e métodos pedagógicos, a introdução de técnicas pedagógicas condizentes com a moderna psicologia, etc.” (Ghiraldelli Jr., 1987: 31).




No Ceará, na década de 1920, as novas idéias pedagógicas se manifestam e se consubstanciam no fio condutor dos estudos encetados pelo curso de formação de professores conduzido pela Escola Normal do Estado. Trazido por aqueles que sentiam a necessidade de reforma do ensino, e que acreditavam que essa deveria se dar à luz do novo pensamento pedagógico implementado através do curso normal, tal pensamento aliado à ação especialmente dos professores da Escola e de seu Diretor João Hippolyto de Azevedo e Sá, apoiados pela presidência estadual, teve o poder de incrementar a formação de professores e desencadear a expansão e aperfeiçoamento do ensino elementar através da figura de Lourenço Filho ².




Com a reforma de 1922, a Escola Normal do Ceará ganha novo prédio e passa a funcionar na parte de suas instalações inaugurada em 1923, na Praça Filgueira de Melo. Essa reforma introduziu novos métodos de ensino e novos fundamentos pedagógicos, além da Escola Modelo, o laboratório onde as normalistas desenvolviam a pedagogia experimental. 




A constituição da Escola Normal cearense, após a abertura de muitos arquivos, mostrou-se um processo tortuoso, pontuado por inúmeras reformas e dificuldades de concretização do ideário modernizador inscrito no projeto de criação, manutenção, expansão daquela Escola de formação de professores.




¹ Enquanto na Escola Normal, os trabalhos continuavam no ritmo de suas normatizações e reformas pedagógicas e administrativas, no Brasil a ideia de República ia se fortalecendo e encaminhando-se para sua implantação. No Ceará, a luta pelo poder ia se travando entre diferentes facções políticas que, longe de amparar-se ideologicamente nas novas ideias, buscavam formas antigas de barganhar o poder. Favorecidos pelo sistema federativo com uma maior autonomia na política local, “antigos grupos oligárquicos do Império ... continuam disputando entre si o controle do governo do Estado” (Porto, s/d: 34).

 ² Sobre a Reforma de 1922, ver o Estudo de Cavalcante (2000), onde a autora revela a descoberta de novos arquivos para uma releitura da reforma que ficou conhecida pela historiografia brasileira como a Reforma Lourenço filho.





Reportagem produzida para o programa Conexões. Projeto PETv.
Reportagem - William Santos
Produção - Rosana Reis
Edição - Saulo Lucas


Leia a Parte I
Crédito: Escola Normal do Ceará: impasses de criação e a tônica reformista - Maria Goretti Lopes Pereira e Silva e http://petvufc.blogspot.com.br

domingo, 2 de dezembro de 2012

Escola Normal do Ceará - De 1884 à 1922 (Parte I)


As primeiras iniciativas de constituição da Escola Normal da província do Ceará, aconteceu já no governo de José Martiniano Pereira de Alencar, em 1837, demonstração do real interesse dos cearenses na formação de seu professorado, quando o referido presidente criou, pela Lei nº 91 de 5 de outubro, uma escola normal, que não veio a se efetivar em virtude das precárias condições financeiras da província. Vale lembrar que a partir de 1834, com o Ato Adicional, o governo central delegou às províncias a responsabilidade com a instrução popular, eximindo-se completamente de assumir o ensino primário e, por conseguinte, o ensino normal.


Retornando ao Ceará em 1840, para um segundo governo, Alencar centraliza suas atenções às disputas políticas encetadas pelas oligarquias cearenses e, novamente, não encontra condições favoráveis à fundação da tão sonhada escola normal. Entretanto, o debate sobre a necessidade de formação do professorado continua, e as propostas de fundação de uma escola normal na Província atravessaram quase todo o dezenove, vindo a se concretizar somente ao seu final. Um dos principais debatedores da questão era o Senador Pompeu que, em meados do século, alertava para as péssimas condições da instrução pública no Ceará e da má preparação de seus professores. Segundo Castelo (1970) e Sousa (s/d), ainda nas décadas de 1850 e 1860, os relatórios de presidentes e diretores da instrução Pública continuavam afirmando que uma escola para a formação dos professores cearenses era uma necessidade premente, mas que a província não dispunha de condições financeiras para assumir tal despesa.  Frente a tais dificuldades, a Escola Normal do Ceará só viria a ser novamente criada ao final da segunda metade do século XIX, com a Lei nº 1790 de 28 de dezembro de 1878, que seria sancionada em 28 de dezembro de 1879 e teria o lançamento da pedra fundamental somente em 1881, fato que mereceu ser noticiado pelos principais jornais da época¹.  Esperaria a sociedade cearense mais alguns anos pela fundação da Escola Normal, pois essa só viria a ocorrer em 22 de março de 1884, nascendo, pois, a Escola Normal cearense em fins do século de afirmação, como diz Cordeiro (1997). Afirmação construída ao longo de uma história cheia de reveses, como a instabilidade climática, as disputas de terra, as lutas ideológicas e a disputa de poder tanto no nível nacional, quanto local  entre os grupos constituídos que, “buscavam a hegemonia local e projeção nacional” (Canezin, 1994: 9).



Fundada em princípios filosóficos e educacionais, defendidos por intelectuais da época, como Thomaz Pompeu de Souza Brasil Filho, os professores José de Barcellos e Amaro Cavalcanti, dentre outros, a Escola Normal  do Ceará concretiza, oficialmente, ao final do século XIX os anseios de igualdade, mesmo que fosse de uma “igualdade formal”, presentes na ideia de criação de uma escola pública de formação de professores.  O curso destinava-se a pessoas de ambos os sexos, brasileiros ou estrangeiros, que houvessem sido aprovados em exames em nível de conhecimento correspondente ao ensino primário. Com uma organização curricular de cunho universal e intelectualista, enfatizava o conteúdo das disciplinas restringindo a formação docente à cadeira de Pedagogia.  Constava ainda da lei de criação da Escola, a garantia àqueles que adquirissem o diploma da Escola Normal o ingresso no magistério por nomeação sem a condição de submeter-se a concurso público.  Assim, os critérios de acesso à Escola Normal, segundo essa lei, permitiam a um amplo espectro de pessoas, a candidatura à formação magistério, e buscavam valorizar o Curso com a nomeação direta do normalista para o magistério público.



Vale ressaltar que ao longo das discussões acerca da necessidade de criação de uma escola normal, ações também foram sendo desenvolvidas no sentido de consolidar esse objetivo. Assim é que, em 1880, o professor Amaro Cavalcanti, em viagem aos EUA, foi comissionado para estudar o “systema de instrucção elementar”, daquele país apresentando amplo e diversificado relatório abrangendo o ensino desde o nível elementar até à formação de educadores no Curso Normal.  A seguir, em 1881, o professor José de Barcellos, que já estivera na Bahia, em 1866, para estudar a organização da Escola Normal daquela Província, foi enviado à Europa, onde iria “estudar os métodos e processos do ensino primário aplicáveis à Pronvíncia” (Valdez, 1952: 170-5).

Fundada a Escola em 1884, essa passa a funcionar com base no Regulamento da Instrução Pública de 1881, até que em 1885 teve expedido seu primeiro Regulamento, em 26 de junho. Contudo, nasce a Escola Normal com prédio próprio,  isto é, um prédio construído especialmente para sua instalação, inclusive com duas escolas anexas para a prática das professorandas, uma do sexo feminino e outra do sexo masculino, segundo noticia o jornal O Cearense de 21 e 23 de março de 1884.  Conforme análise do arquiteto Machado (1988), mais de cem anos depois, portanto, a arquitetura do prédio revela o ecletismo de estilos, que utilizam materiais ornamentais, sinalizadores da modernidade, como o vidro e o ferro, e ao mesmo tempo conserva ares de distinção e nobreza próprios dos tempos coloniais.   É importante lembrar, como faz Nosella (1996), que a arquitetura do prédio também traduz formas de pensar, formas de ver o mundo; traduz concepções de sua época. Assim, o prédio da Escola Normal cearense já assumia ares de distinção próprios daqueles que pertenciam ao mundo letrado.

Ao descrever o prédio da Escola Normal, os jornais nos oferecem outra possibilidade de leitura, ou seja, do ponto de vista da relação desse espaço social com o restante da sociedade, isto é, a separação entre o espaço da Escola e sua vizinhança, feita através de muros e grades,  que lhe confere ares de “respeitabilidade e prestígio” próprios do mundo da ciência que só à escola compete desvendar.  Em meio aos movimentos pela libertação da escravatura na Província, a inauguração da Escola Normal constituiu-se “um augúrio do evento excepcional que conferiria ao Ceará o honroso título de Terra da Luz (Castelo, 1970: 195)²



É interessante salientar o fato da Escola Normal do Ceará ter mantida sua continuidade de funcionamento desde que foi criada, diferentemente de tantas outras escolas normais brasileiras, muito embora o afã reformista de seus instituidores tenha lhe proporcionado inúmeras mudanças. Estas vão desde a estrutura curricular, passando por alterações na duração do curso e de seu nome, até à construção de um novo prédio em 1923.  As primeiras modificações surgem já em relação à lei de 1878, com a substituição das cadeiras de Filosofia e Física e a introdução da cadeira de Ciências Naturais.  Apesar das modificações, o Curso, que se propunha a ser profissionalizante, tem como base uma organização curricular propedêutica, centrada nas grandes áreas de conhecimento, o que sugere a concepção de profissionalização do magistério à época, que tinha por fundamento o domínio de conhecimentos universais.   

Já no primeiro Regulamento, de 26 de junho de 1885, acrescenta-se uma nova cadeira ao Curso; mais uma cadeira de formação geral,  a de Francês, passando seu currículo a constar de seis cadeiras: Geografia e História, Ciências Naturais, Matemática, Português, Francês e Pedagogia. Criou-se ainda, o cargo de Diretor da Escola Normal, cuja “nomeação recaiu sobre o professor de Pedagogia e metodologia, José de Barcellos, que no afanoso cargo não recebia nenhuma remuneração”. (Valdez, s/d: 176).

Continua...
                                                       
¹ Vale lembrar que a criação da Escola se dá em plena Grande Seca, no período de 1877-1879, considerada a mais catastrófica de todos os tempos. O livro de Rodolfo Teófilo 'A Fome' publicado pela primeira vez em 1890, relata com riqueza de detalhes as mazelas sofridas pelo sertanejo cearense ... A descrição de Rodolfo Teófilo, das cenas de vida e morte provocadas pelo flagelo que se abateu sobre o Ceará de 1877,  não difere da realidade retratada pelas matérias jornalísticas publicadas no referido ano. Em 1877, a seca torna-se o tema  a ser explorado pela imprensa local tendo em vista a calamidade provocada por esta.  O jornal O Cearense encontra-se quase que totalmente preenchido com notícias referente ao fato.

² “... em 25 de março de 1884, a capital [Fortaleza] abriu o coração e a alma para receber a ansiada Declaração da Liberdade. ... Não era uma lei que se decretava, era uma Declaração de Direito da Liberdade. ... Era sobretudo uma mensagem de fé dirigida ao Brasil, incentivo para que cobrasse mais ânimo para obter – o que somente quatro anos mais faria – destruição da escravatura, traduzida na Lei Áurea de 1888 (Girão, 1984: 171).   



Crédito: Escola Normal do Ceará: impasses de criação e a tônica reformista - Maria Goretti Lopes Pereira e Silva e http://petvufc.blogspot.com.br

sexta-feira, 30 de novembro de 2012

Vilas em Fortaleza



A Vila Diogo - Arquivo Zé Tarcísio

As vilas ainda fazem parte da paisagem urbana da cidade. Localizadas em zonas próximas ao Centro ou na periferia, os seus moradores ainda conservam hábitos que trouxeram da vida rural, como por exemplo: a solidariedade. Outra demonstração da vida pacata de outrora nestes locais, é o hábito dos vizinhos se sentarem nas calçadas, todos os finais de tarde.

A urbanização acelerada transformou não apenas a paisagem das cidades, mas também as relações interpessoais. Nas vilas, independente de onde estejam localizadas, as pessoas se sentem mais próximas umas das outras. E essa proximidade diminui a sensação de insegurança. “Atualmente, a gente só fica na calçada até às 8h (20h)”, afirma Raimunda Silva de Holanda, 80, moradora da Vila Azul, localizada na esquina da Rua Padre Mororó. E justifica: “Hoje, não se pode mais confiar em ninguém”.

Casinha na Vila Diogo - Arquivo Zé Tarcísio

O medo da violência, como relata uma das moradoras mais antigas da Vila Diogo, localizada entre a Avenida do Imperador e a Rua Princesa Izabel, vem interferindo na estética dessas construções. “Antes, a gente só fechava a metade da porta, atualmente, só vai com o cadeado”, admite Sônia Alves, 62, natural de Camocim, há 39 anos moradora da Vila Diogo.

Apesar da modernidade, as vilas ainda guardam um pouco do bucolismo de outros tempos, quando as casas não precisavam de grades e nem de cadeados. O crescimento das famílias fez com que algumas ganhassem um segundo pavimento, como é possível observar na Vila Diogo.

 A Vila Diogo e suas duas saídas, uma para a rua Pedro I e a outra para a Duque de Caxias onde morou o artista José Tarcísio Ramos.

Estes espaços conservam características especiais como o contato com a vizinhança. “Se há uma necessidade a gente sabe que pode contar com o vizinho, garante Sônia Alves, que lamenta ter trocado a meia porta pela grade e o cadeado. No entanto, a falta de segurança não é suficiente para acabar com o hábito que sua mãe conserva até hoje, aos 90 anos: sentar na calçada, todos os dias, no fim da tarde. A gente faz isso diariamente, a partir das 4 horas (16h).

A moradora da Vila Diogo confessa ter saudade do que ela chama de “outras épocas”. Conta que era uma tranquilidade a morada no local, reclamando que os costumes estão sendo alterados. “Antes, todo mundo ficava na calçada até tarde, o que não é mais possível”. A vida era menos corrida, daí as pessoas terem mais tempo para uma conversa mais demorada no início da noite.

Vila Diogo

Durante a semana, assegura que a vila tem mais vida porque há movimentação de carros e pessoas. Agora, aos domingos, a situação muda. “É muito esquisito”, diz Sônia Alves. No geral, avalia a convivência como calma. “De vez em quando aparece um gaiato para mexer no cadeado”, ressalta. Para completar a segurança, a moradora cria uma cadela. “Ela é pequena, mas é esperta”, brinca.

Para alguns moradores, a convivência com a vizinhança é indiferente. São pessoas que chegaram recentemente, portanto desconhecem os antigos laços de amizade que une os antigos moradores da Vila Diogo. “Moro aqui desde 2000 e para mim não há tanta liberdade assim”, admite João Ramalde, 67 anos, aposentado. “A porta tem que está sempre fechada, não pode relaxar”.

Vila Diogo

Algumas vilas sofreram bastante alterações como é o caso da Vila Romero. Ela fica localizada no final da Rua Governador Sampaio, próxima ao riacho Pajeú. A maioria das casas foi remodelada e pouco resta da antiga vila. 

Industrialização provocou mudanças

A urbanização, fenômeno que ganhou impulso no Brasil, sobretudo no século XX, a partir da industrialização, contribuiu para profundas transformações na vida socioeconômica e cultural da população. A mudança da população do campo para a cidade foi uma delas, favorecendo o surgimento de pequenas vilas operárias nas proximidades das fábricas instaladas.

Na Vila Azul, os moradores mantêm o costume de se sentar na calçada, todas as tardes e noite. Foto Diário do Nordeste

Em Fortaleza, a exemplo do resto do País, não aconteceu diferente. A Avenida Francisco Sá é um exemplo e ainda hoje conserva várias dessas construções do início do século passado.

Formadas por pequenas casas, algumas são famosas como as vilas Diogo, Azul e Romero, localizadas no Centro da Capital cearense. Este é o caso da Vila Azul, que fica na esquina da Rua Padre Mororó com a Rua Pedro I. O local é enaltecido por seus antigos moradores por ficar próximo “de tudo”.

O “tudo” inclui o comércio central e o Mercado São Sebastião. “A vila fica no Centro. Mas não precisamos ir ao comércio de lá”, explica Maria Helena de Almeida, 50, há 60 anos mora no local. “A gente compra tudo no São Sebastião”.

A Vila Azul

A Vila Azul é formada por sete casas, esteticamente diferentes, uma vez que as construções sofreram interferência dos moradores. Algumas das construções foram revestidas, outras, conservam a pintura.

Francisco César Simão, 70, natural de Quixadá, cidade do Sertão Central, há 50 anos mora na primeira casa da vila, herança de família. Conta que a vila era totalmente desprovida de infra-estrutura.

“Agora, só falta o asfalto”, enumerando o que já foi conseguido. “Temos água e esgoto”, diz, afirmando que quando chegou só tinha energia.

Vila Azul - Infelizmente esse caminhão atrapalhou tudo!

O aposentado conta que a vida na vila é tranquila, por isso não tem medo de se sentar na calçada. “A gente só não se arrisca ficar até tarde”.

Sentimento semelhante tem a aposentada Márcia Benevides Soares, 78, há quase 40 anos residente na vila. Ela lembra que chegou ao local acompanhada pelo marido, já falecido e por cinco filhos.

“Eu sou feliz por morar num lugar tão tranquilo e seguro, afirma a aposentada.

Iracema Sales

Crédito: Diário do Nordeste

quinta-feira, 29 de novembro de 2012

Casarões no entorno do Dragão do Mar


No início do século XX, esses casarões que hoje emolduram o Dragão do Mar, funcionavam como empresas de importação e exportação. O bairro chamava-se Outeiro da Prainha. Até os anos 50, essa área também acolheu casas de tolerância.

O espaço hoje ocupado pelo Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura. O bairro era chamado de Outeiro da Prainha. Foto da déc. de 20/30. Nirez

Nos anos 80, artistas começaram a se instalar por ali. O artista plástico José Tarcísio (Foto ao lado) foi o primeiro deles. No final dos anos 90, uma parceria entre a Fundação Roberto Marinho e Tintas Ipiranga viabilizou o projeto Cores da Cidade, procedendo a restauração e pintura das fachadas de 58 prédios da área. Eu achei que ficaram lindos e vocês? 

A maioria desses casarões se localizam na rua Dragão do Mar, que foi incorporada ao Centro Cultural e pedestrianizada entre a Rua Boris e o prolongamento da Almirante Jaceguai, às margens do equipamento.

Prédio que já serviu de repartição pública, foi demolido para dar lugar a rampa do Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura. Arquivo Nirez

O Restaurante Buoni Amici’s por exemplo, ocupa dois charmosos casarões com cerca de 100 anos. Em um, fica o Buoni Amici’s Pizza e no outro, o Buoni Amici’s Sport Bar, onde são realizados shows e eventos culturais.



Os casarões são em estilo neoclássicos e foram transformados em bares, restaurantes e casas noturnas.

Prédio do SOEC*, onde hoje é o Centro Dragão do Mar na Rua Dragão do Mar nº 81. Acervo de Manoel Enéas Alves Mota

No final da década de 1980, enquanto a Praia de Iracema fervilhava com os encontros multiculturais em pontos como o Cais Bar, Estoril e Pirata, um pouco mais à frente, nas proximidades da antiga alfândega, apenas casas de prostituição, galpões e velhos casarões abandonados compunham a cena do local. Prédios residenciais e restaurantes finos nem sonhavam em investir por ali, mas foi no meio dessa zona que, em 1983, o artista plástico Zé Tarcísio** decidiu se instalar, ocupando o casarão deixado pelo também artista plástico Hélio Rôla. Um casarão antigo, com pé direito alto, espaçoso e aluguel baratíssimo era o ponto ideal para montar um ateliê de arte.


O Dragão do Mar durante sua inauguração em 1999 e durante sua construção. À frente, à direita, a torre da Casa Boris. Ao fundo, o Seminário da Prainha e a Biblioteca Menezes Pimentel - Fotos de Gentil Barreira 

Foto Fortaleza2007

Depois dele - entre tantos outros -, vieram Tota, Sérgio Pinheiro, Kazane, Caetano, Mestre Pedrinho, Júlio Silveira... No início dos anos 90, o bairro virara um polo de ateliês e galerias de artistas cearenses. Muitos se chegaram atraídos pelos mesmos benefícios de Zé Tarcísio, outros, no entanto, foram na esperança de ver sua arte deslanchar com a abertura do esperado Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura, em 1999***.


Panorama do ateliê do artista plástico e colecionador cearense Zé Tarcísio - Acervo Overmundo

Antônio Severino Batista, mais conhecido como Tota, foi um deles. Ele se instalou por ali em 1997. “Nós fomos com a esperança de vencer, de melhorar. O referencial da cultura do Ceará era lá”, lembra Tota.


Onze anos depois da inauguração do Centro Dragão do Mar, o equipamento que deveria ter atraído ainda mais artistas e equipamentos culturais para o seu entorno assiste a um dos últimos espaços de arte das redondezas dar adeus ao local. A Galeria do Tota fechou suas portas para reabri-la na rua Pereira Filgueiras. “Quando o Dragão foi inaugurado, eu lembro muito bem que eu fui contar as galerias de arte: tinham 28. Onze anos depois, só tinha eu e o Zé Tarcísio”, recorda o artista. “Eu não tenho nada contra o Dragão do Mar, mas não dá mais. Hoje é o ‘dragão dos bares’ ”, desabafa.


Foto Fortaleza2007

Daqueles tempos de abandono, Zé Tarcísio foi o único que resistiu às mudanças (e problemas) atraídas pelo Dragão do Mar para a área. Ele viu o local ganhar nova vida, se encher de gente e, paralelamente, viu a especulação imobiliária fazer seus companheiros deixarem o local para dar lugar aos bares e boates. “Antes era barato, não era uma zona privilegiada. Com a criação do Dragão, a especulação imobiliária começou a querer mais dos artistas e aí foi saindo um, saindo outro...”, pontua. “O Dragão não tem culpa, ele é uma peça necessária”, ressalva.



Sérgio Pinheiro, que manteve seu ateliê por ali entre 1991 e 2007, foi um dos que precisou sair porque não tinha mais condições de pagar o aluguel. “Quando o Dragão surgiu, todo mundo quis, mas como artista não tem dinheiro, os bares ganharam”, diz. Ele conta que, na época, muitos se apegaram à ideia do então secretário de cultura do Governo do Estado e um dos idealizadores do centro cultural, Paulo Linhares, de desapropriar dois quarteirões do entorno do centro cultural para instalar o “Quarteirão dos artistas”, no qual os casarões seriam ocupados de acordo com a concessão do governo. O projeto não saiu do papel.


“O Banco Mundial se interessou, mas o Tasso Jereissati, então governador, achou que não era prioritário na época”, explica Linhares. Para ele, o projeto ainda se faz necessário e tem urgência. “Esse projeto tem que ser feito urgentemente, senão vai degradar. O Dragão era para liderar as mudanças do entorno. A compreensão de que o Dragão precisa dessa sinergia com o entorno é necessária”, conclui.


A atual gestora do CDMAC, concorda que há urgência para resolver essas questões. “Nós temos essa preocupação, mas falta decisão política para fazermos essa articulação”, diz. É necessário uma articulação dos poderes municipal e estadual em busca de soluções para o entorno do Dragão do Mar.

Foto Fortaleza2007

Saiba Mais


No final da década de 1990, os casarões das ruas Dragão do Mar, José Avelino, Boris, e outros ficaram tomados por ateliês e galerias de artes. Inaugurado em 1999, o Centro Dragão do Mar atraiu ainda mais artistas para o seu entorno. Hoje, no entanto, apenas o artista Zé Tarcísio resiste à especulação imobiliária e às mudanças trazidas pelo equipamento. Para o lamento de quem viveu e vive por ali, ao invés de outros equipamentos culturais, o que se vê na redondeza são bares, boates e outros equipamentos ligados ao entretenimento.



*Em 20 de julho de 1971, surge, através da Lei nº 9.498, a Superintendência de Obras do Estado do Ceará - Soec, hoje extinta.


**Quando o artista chegou, o lugar era conhecido como zona do meretrício da cidade, havia ainda alguns escritórios de importação e exportação, lugar de passado glorioso. Zé Tarcísio trabalha e mora no atelier da rua Dragão do Mar até hoje.


Rua Dragão do Mar quase esquina com Almirante
Jaceguai. Foto de 1935 de Robert S. Platt
***O Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura foi inaugurado oficialmente no dia 28 de Abril de 1999, data em que o Governo do Estado “entregou” o equipamento para o povo cearense. No entanto, o Dragão começou a funcionar experimentalmente desde 28 de Agosto de 1998.
O projeto Dragão do Mar é largamente criticado por arquitetos e planejadores urbanos por diversos aspectos, como sua escala monumental, que briga com a das edificações do entorno, o desrespeito aos casarões e galpões antigos, a demolição de alguns sobrados e a falta de referências locais, contrariando o discurso dos arquitetos autores do projeto.

Rua Dragão do Mar quase esquina com Almirante
Jaceguai.
Após um período experimental de oito meses, em 
28 de abril de 1999 

inaugura-se e entra em pleno funcionamento, o Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura, 30 mil m² divididos em salas de exposições, cinemas, teatro, anfiteatro, auditório, planetário, café, ateliê de arte, salas de aulas e espaços para "shows".

Dentro do Centro, são também inaugurados o Planetário Rubens de Azevedo, pelo próprio, e o Anfiteatro Ministro Sérgio Mota.

Os arquitetos foram Antônio Fausto Nilo Costa Júnior e Delberg Ponce de Leon.
Localiza-se na Rua Dragão do Mar nº 81, na Praia de Iracema.



Créditos: Bodega Cearense, Viação Dragão do Mar, O Coração e o Dragão - Perspectivas de vida urbana em uma cidade fragmentada (Vol. 1), Nirez e pesquisas pela internet

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