sexta-feira, 15 de novembro de 2013

Ladeira do André


Fortaleza é metrópole com poucos logradouros de acentuada declividade.
Na rua Almirante Jaceguai, trecho entre a Avenida Monsenhor Tabosa e rua José Avelino, no bairro Seminário, destacou-se – em especial nos anos 60 – o rampadouro conhecido por Ladeira do André.

A denominação da íngreme via deveu-se à bodega, cujo proprietário possuía aquela graça.

Ali, fatos inusitados registraram-se.
Os carrinhos ingleses Prefect e Anglia, para subir, necessitavam do desembarque dos passageiros, que seguiam a pé até o topo e reembarcavam.

 Foto de uma revenda Ford, em 1951. Os carros expostos são Prefect e Anglia. 


O jipinho Crosmobile, modelo 1952, de nosso saudoso professor padre Tito Guedes, para vencer a inclinação, tinha de tomar velocidade desde a Avenida da Abolição.

Ciclistas desciam tranquilamente. Subir? Só levando a magrela no muque. Os
bêbados? Caminhando para cima ou para baixo era um “valha-me Deus!”.

Um curtume usava toda a extensão das calçadas na secagem de peles de animais para transformar em couro. Além da insuportável fedentina, os transeuntes tinham de andar sobre o pavimento de pedras toscas.

Conheci a Ladeira levado pelas circunstâncias.

Junto à Guarda Estadual do Trânsito submetia-me a exame para conseguir a
Carteira Nacional de Habilitação. Dia das provas práticas de direção. Sob o
humor irritadiço do Inspetor Webster, sentado no banco do carona do jeep da Auto Escola Willys, principiaram-se os testes. Baliza e percurso de dirigibilidade na Avenida Dom Manuel, descendo a rua Almirante Jaceguai. Pela mesma artéria retornando. E, no meio, o mando de frear o veículo e desligar o motor.

“Agora, a minha ordem, você liga a ignição, solta o freio de mão e realiza a subida da rampa! Se o veículo recuar ou estancar, está reprovado! Outra chance somente mês que vem! Pronto, execute!”.

Suores frio, morno e quente escorriam pelos caminhos do corpo. Mesmo havendo treinado inúmeras vezes, naquela data, tudo parecia desigual. O carro era outro. Os pedais tinham alturas e folgas diferentes do anterior e o freio de mão teimava em não obedecer, apesar do grande esforço empregado.

Socorri-me de meu padrinho – Santo Antônio de Lisboa – e fui atendido.
Dos doze examinados, quatro foram aprovados. O “... de Tetéu”, como o alcunhavam os candidatos, era tido e havido como o verdadeiro terror dos aspirantes a motorista.


Geraldo Duarte
 
(Advogado, administrador e dicionarista).

2 comentários:

  1. Muito bom o texto, e engraçado como a gente chega a sentir o peso da subida ao ler o texto.Parabéns pelo blog,minha jóia!!!

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