Fortaleza Nobre | Resgatando a Fortaleza antiga : carnaval
Fortaleza, uma cidade em TrAnSfOrMaÇãO!!!


Blog sobre essa linda cidade, com suas praias maravilhosas, seu povo acolhedor e seus bairros históricos.

 



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quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

Marchinhas - O som dos eternos carnavais


Carnaval da Saudade - Arquivo João Otávio Lobo Neto

Das ingênuas e criativas marchinhas dos anos 30, 40, 50 e 60 às ruidosas músicas da “axé-music”, muitas águas rolaram no Carnaval. A alegria do desfile de de rua e o glamour dos bailes carnavalescos dos clubes elegantes de Fortaleza, nas décadas de 50 e 60, fazem parte apenas da lembrança dos mais nostálgicos. São tempos praticamente esquecidos, que só despertam, na maioria das vezes, o interesse de alguns pesquisadores de nossa história. Os jovens - que hoje se agitam com as “bandas” de barulhentos trios elétricos que ressoam em altos decibéis melodias com letras “sem pé nem cabeça” - nem imaginam como era divertido os carnavais dos confetes e serpentinas, dos pierrots e das colombinas apaixonados.

Lauro Maia e Luiz Assunção foram os pioneiros no cancioneiro carnavalesco do Ceará. Suas canções animaram foliões das escolas e blocos, como o “Cordão das Coca-Colas”, “Prova de Fogo”, “Alfaiates Veteranos”, “Garotos do Frevo”, “Zombando da Lua”, “Escola de Samba Lauro Maia” (depois rebatizada de Escola Luiz Assunção). As músicas de Lauro Maia se consagraram nas vozes de Orlando Silva e dos grupos “4 Azes & 1 Coringa” e “Vocalistas Tropicais” e se tornaram sucessos nacionais.

Carmem Miranda, Lamartine Babo, Emilinha Borba, Virginia Lane, Orlando Silva, Francisco Alves, Ary Barroso, João de Barro, Mário Lago, Dalva de Oliveira, Jackson do Pandeiro, entre outros nomes da MPB que emprestaram seus talentos a famosos “hits” da música carnavalesca: “Daqui Não Saio”, “Alá-Lá-Ô”, “Cidade Maravilhosa”, “As Pastorinhas”, “O Teu Cabelo Não Nega”, “Taí”, “Saca-Rolha”, “Mamãe, Eu Quero”, “Bandeira Branca”, “Pierrot Apaixonado”. Essas marchinhas se eternizaram ao longo dos tempos e continuam até hoje integrando o repertório musical de bailes que sobrevivem ao modismo das micaretas. Exemplo disso é o Carvanal da Saudade, um autêntico revival dos carnavais que ficaram apenas na lembrança...
     Marcos Saudade

Bloco Zombando da Lua - Arquivo Nirez

Qual a importância de Lauro Maia e Luiz Assunção na música cearense e nacional?

     Os dois são importantes, dentro das características de cada um. Lauro Maia, nascido e criado no Benfica, certamente levou mais longe o nome do Ceará porque aproveitou o sucesso de suas composições através de nomes como Orlando Silva, 4 Azes & 1 Coringa, Ciro Monteiro e Vocalistas Tropicais, entre outros. Ao fixar residência no Rio, participou ativamente do Movimento Artístico na década de 1940, sendo inclusive o responsável pelo surgimento do Baião, ao apresentar Luiz Gonzaga a seu cunhado Humberto Teixeira. Luiz Assunção foi um maranhense que se tornou cearense devido a sua grande identificação com a vida da cidade, ele inclusive foi homenageado quando Lauro Maia foi morar no Rio, puseram o nome dele na Escola de Samba Lauro Maia e um grande número de pessoas que conhece a história de nosso carnaval lembra com muita saudade dos grandes desfiles e da música maravilhosa que soava na orquestra da Escola de Samba Luiz Assunção.

     Que contribuição deram ao carnaval cearense?

     Uma contribuição enorme. Antes deles não havia compositores populares criando músicas para as agremiações. Foi Lauro Maia quem iniciou esse ciclo criativo em nossa história carnavalesca. Tanto ele como Luiz Assunção têm até hoje músicas lembradas e que foram compostas para o carnaval de rua, para a Escola de Samba Lauro Maia, depois Luiz Assunção, para a Escola de Samba (hoje Bloco) Prova de Fogo e outros blocos, como O Que Fóe, Galinha, do genial Doutor Bié. O Lauro inclusive foi o primeiro compositor a utilizar o ritmo do nosso Maracatu fora do carnaval, na música Orixá, que tinha versos de Jorge Aires.

     Como foi resgatar a vida e obra de Lauro Maia em livro e disco?

     Sinceramente, este foi um dos projetos mais importantes de toda a minha vida. Primeiro, pela grandiosidade da biografia do Lauro, depois pela beleza e atualidade de sua música e também pela parceria com o pesquisador Miguel Ângelo de Azevedo, o Nirez. Outra coisa importante deste trabalho foi contar com a participação de todos os artistas que interpretaram músicas de Lauro Maia, é realmente um presente ter Teti, Ednardo, Rodger, Lúcio Ricardo, Fagner, Evaldo Gouveia, Falcão, Ayla Maria, Fernando Néri, César Barreto, David Duarte, Aparecida Silvino... É um disco que me agrada sempre, eu escuto cada vez com mais prazer. Tem um time de músicos de primeira e é todo mundo daqui mesmo.

     O que poderia ser feito para resgatar o carnaval de Fortaleza?

      Deveria haver um maior incentivo por parte da Prefeitura de Fortaleza. Afinal estamos falando de uma festa pública, inserida no calendário de eventos da cidade. Para o nosso carnaval de rua se tornar atrativo do ponto de vista do investimento privado, precisa haver um trabalho muito forte junto às agremiações, é preciso chamar os artistas para participar compondo, cantando, tocando, desenhando, somando com o imenso mundo de gente que trabalha há tantos anos pelo carnaval e tem muito amor pelo que faz. O nosso trabalho à frente da Federação de Blocos Carnavalescos tem sido recuperar a dignidade do carnaval de rua, reinseri-lo na rota dos grandes eventos.

Calé Alencar
Maracatu Az de Ouro em 1950 - Arquivo Nirez

Quais foram os mais expressivos compositores cearenses de músicas carnavalescas?

     Os mais expressivos compositores de músicas carnavalescas no Ceará foram Euclides Silva Novo, Mozart Brandão, Caetano Acioly, Luiz Assunção, Paulo Neves, Lauro Maia, Irapuan Lima, Mário Filho, Edigar de Alencar, Waldemar Gomes e Milton Santos.

     Que marchinhas mais famosas marcaram os bailes carnavalescos do passado?

     As marchinhas foram importantes no cenário carnavalesco cearense, mas também os sambas figuraram como sucesso.Tivemos "Tabajara", marcha (Silva Novo - Caetano Acioly) 1930; "Adeus, Praia de Iracema", samba (Luiz Assunção) 1954; "Falta de luz", marcha (Irapuan Lima - Mário Filho) 1955; "Dona Fredegunda", marcha (Mário Filho - Milton Santos) 1958; "Meu bem", samba (J. Guimarães - Milton Santos) 1958; etc.

     Que blocos e escolas brilhavam nos carnavais de rua de Fortaleza do passado?

     Os blocos que brilharam no passado foram "Maracatu Ás de Ouro", "Maracatu Rei de Espadas", "Garotos do Frevo", "Escola de Samba Lauro Maia", "Zombando da Lua", "Escola de Samba Luiz Assunção", "Cordão das Coca-Colas", "Alfaiates Veteranos", "Prova de Fogo", etc.

     Como avalia as festas carnavalescas da atualidade?

     O carnaval teve várias fases, a primeira apesar de ser chamada de carnaval era o ENTRUDO, que reinou até início do século XX, onde se dançava valsas vienenses entre outras coisas; a segunda foi a fase de ouro das marchinhas, dos grandes compositores e intérpretes, das grandes músicas e letras e que durou até meados da década de 60; e a atual fase, dividida entre o espetáculo turístico já superado das escolas de samba do Rio de Janeiro e a música atual de maio-de-ano lançada pela Bahia que descaracterizou o carnaval tornando-o muito mais de fora de época que de próprio período. Já não existem músicas feitas para a festa porque a festa já não existe.

Miguel Ângelo de Azevedo (Nirez)
Escola de Samba Luiz Assunção em 1969
Foto da Exposição Luiz Assunção - Samba de Carnaval

Quais foram as fases marcantes da produção musical feita para o carnaval?

     As décadas de 30,40 e 50. Principalmente a de 30, apropriadamente chamada de “Fase de Ouro”. A partir da cartelização da economia mundial e a consequente dolarização econômica dos países dependentes da América do Norte, como o próprio México (seu vizinho), o Brasil, Argentina, França, Itália, Portugal e os demais que compõem o Terceiro Mundo, o regionalismo foi para o “bebeléu”. Entregar-se de corpo e alma às coisas e costumes da América do Norte passou a ser sinônimo de progresso. O nacionalismo passou a ser pichado como retrógrado, coisa do passado, etc... Tudo aconteceu depois da Segunda Guerra Mundial (1945).

     Quais os mais famosos “hits” carnavalescos?

     Dos anos 30: “Prá Você Gostar de Mim” (Taí), marcha-canção de Joubert de Carvalho, gravada por Carmem Miranda em 1930; “O Teu Cabelo Não Nega”, adaptação de Lamartine Babo, gravada por Castro Barbosa, em 1932; “Linda Morena”, de Lamartine Babo , de 1933, “Cidade Maravilhosa”, de André Filho, gravada por Aurora Miranda (irmã de Carmem Miranda), em 1935; “Pierrot Apaixondo”, de Heitor dos Prazeres e Noel Rosa, 1936; “Mamãe, Eu Quero”, de Jararaca, 1937; “As Pastorinhas”, João de Barro e Noel Rosa, de 1936 e regravada por Sílvio Caldas para o carnaval de 1938; “A Jardineira”, de Benedito Lacerda e de Humberto Porto, gravada por Orlando Silva em 1939. 
Dos anos 40: “Dama das Camélias”, de João de Barro e Alberto Ribeiro, gravado por Francisco Alves em 1940; “Alá-Lá-Ô”, de Antônio Nássara e Haroldo Lobo, gravada por Carlos Galhardo, em 1941; “Aí, Que Saudades da Amélia”, de Ataulfo Alves e Mário Lago, 1942; “Nós, Os Carecas”, de Roberto Roberti e Arlindo Jr. gravada por Anjos dos Inferno, 1942; “Está Chegando a Hora”, de Henricão e Rubens Campos, gravado por Carmem Costa, 1942; “Atire a Primeira Pedra”, de Ataulfo Alves e Mário Lago, gravado por Orlando Silva, em 1944; “Cordão dos Puxa-Sacos”, gravado pelos Anjos do Inferno, em 1946; “A Marcha do Balanceio”, de Lauro Maia e Humberto Teixeira, 1946; “É Com Esse Que Vou”, de Pedro Caetano, gravado por 4 Azes e 1 Coringa, 1948; “Chiquita Bacana”, de João de Barro e Alberto Ribeiro, gravada por Emilinha Borba, 1949; “General da Banda”, de Sátiro de Melo, José Alcides e Tancredo Silva, gravada por Blecaute. 
Dos anos 50: “Daqui não saio”, de Paquito e Romeu Gentil, gravada pelos Vocalistas Tropicais, 1950 -“Serpetina”, de Haroldo Lobo e David Nasser, gravada por Nelson Gonçalves, em 1950;“Tomara que choro”, de Paquito e Romeu Gentil, pelos Vocalistas Tropicais e Emilinha Borba, em 1951; “Lata D’Água”, de Luiz Antonio e Jota Júnior, gravado por Marlene, em 1952; 

Foto da Exposição Luiz Assunção - Samba de Carnaval
Centro Dragão o Mar de Arte e cultura

Sassaricando”, de Luiz Antonio e Zé Mário, gravada por Virginia Lane; “Saca-Rôlha, de Zé da Silda.; “Maria Escandalosa”, de Klecius Caldas e Armando Cavalcanti, 1955; “Vai, Com Jeito Vai”, de João de Barro, gravada por Emilinha Borba, 1957;“Boi da Cara Preta”, de Paquito/Romeu Gentil/Jackson do Pandeiro, 1959.
Dos anos 60: “Me Dá um Dinheiro Aí” , gravada por Moacior Franco, 1960; “Indio Quer Apito”, de Haroldo Lobo e Milton de Oliveira, em 1961;“A Lua é dos Namorados”, gravada por Ângela Maria, 1961.“Cabeleira do Zezé”, de João Roberto Kelly e Roberto Faissal. 1964; “Máscara Negra”, de Hildelbrando Pereira Mattos e Zé Ketti, 1967; “Bandeira Branca”, de Max Nunes e Laércio Alves, gravada por Dalva de Oliveira, 1970.

Christiano Câmara



Crédito: Diário do Nordeste

terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

Bloco Prova de Fogo - 78 anos de história


Cadê Joana, que não vem com a sopa? 
E Mariana, que não traz a minha roupa? 
Não posso mais esperar, estou aflito 
Onde está o meu apito? O meu apito? 
Já é hora do prova de fogo sair 
Até já vieram me chamar 
E eu ainda estou nessa agonia logo no primeiro dia 
Será que eu vou faltar 
Joana, Mariana, eu tenho que a batucada marcar  

Bati Na Porta (Lauro Maia) 

Prova de Fogo - O único bloco de Fortaleza que se conservou tradicional - Nirez

Assim como outras cidades, Fortaleza conheceu o carnaval dos entrudos, das batalhas de confete e serpentina, dos bailes em clubes elegantes, dos desfiles de carros luxuosos e das apresentações de manifestações populares nas ruas, como os blocos de Carnaval, de pré-carnaval e os maracatus.

Bloco Prova de Fogo em 1942 - Arquivo Josi Ladislau

O primeiro bloco a surgir no carnaval fortalezense foi o Prova de Fogo, em 1935. 
Há 78 anos, o bloco participa do carnaval de rua da capital cearense.

Em 21 de janeiro de 1935, é fundado o bloco carnavalesco Prova de Fogo, pelos sargentos do Exército, Otacílio Anselmo*, Carlos Alenquer e Luís Freitas e os comerciários Alderi Pereira e Edson Viana Maranhão (Edson Maranhão).

Em 03 de março do mesmo ano, o bloco faz sua estréia no carnaval cearense. O Prova de Fogo ainda hoje abrilhanta a avenida do carnaval de Fortaleza.


Sr. Waldemar, componente do Bloco Prova de Fogo - 1942
Arquivo Josi Ladislau

O samba "Bati na Porta”, de Lauro Maia em parceria com Humberto Teixeira, foi o hino de guerra do Prova de Fogo no carnaval de 1942:

Bati na porta que cansei

Chamei, chamei, chamei

Ninguém, ninguém me respondeu

E eu fiquei com cara de judeu 

(Qual é, ô meu?)

Voltei, voltei e fiquei contrariado

Tomei, tomei o caminho errado

Agora ando bebendo demais

Independente disso eu sou um bom rapaz.

O bloco Prova de Fogo, é um dos mais tradicionais do Carnaval de rua de Fortaleza.

O Carnaval de 06 de fevereiro de 2005, inicia-se o desfile carnavalesco com o tema "Fortaleza Bela é Prova de Fogo", homenagem ao bloco que faria um desfile comemorativo de 70 anos de fundação, na Avenida Domingos Olímpio.

Desfilaram 8 (oito) maracatus: Vozes d'África, Nação Iracema, Rei Zumbi, Nação Baobab, Rei de Paus, Az de Ouro, Kizumba e Nação Fortaleza
As escolas de samba: Imperadores da Parquelândia, Imperadores da Bela Vista, Ideal, Unidos do Acaracuzinho e Corte no Samba
E os blocos: Garotos do Parque, Garotos do Benfica, Fuxico do Mexe-Mexe, Unidos da Vila e o grande homenageado da noite: Prova de Fogo.




Arquivo Nirez

Em 09 de fevereiro, saiu o resultado do desfile: A agremiação Maracatu Rei de Paus é bicampeã do Carnaval 2005, na categoria Maracatu, com nota 10 em todos os quesitos de avaliação.
A vice-campeã é o Maracatu Vozes d´África.
Em terceiro lugar ficou o Maracatu Az de Ouro.
Da categoria blocos e cordões, As Bruxas conquistam a primeira colocação, seguida do bloco Garotos do Benfica.
O bloco Prova de Fogo que estava completando 70 anos de fundação, e foi considerado "hors-concours".
Na categoria escola de samba, a Escola de Samba Unidos do Acaracuzinho é octacampeã e a Escola de Samba Império Ideal é a vice-campeã.

Arquivo Nirez

No Carnaval de 2007, o bloco provou que a tradição faz a diferença. Último a entrar na Domingos Olímpio, nas primeiras horas de terça-feira, a resposta do público veio de imediato, aplaudindo o cortejo de pé. Com mais de 400 integrantes, o bloco mostrou que estava se renovando a cada ano.
Na época, o passista Francisco de Paula, então com 67 anos, contava que já desfilou em maracatus e, há 7, estava no Prova de Fogo. “Essa tradição não pode acabar”. O baliza Edilberto Queiroz, então com 58 anos, há mais de 30 fazia evoluções à frente do bloco. Ele prometeu lutar pela continuidade do bloco, fundado em 1935.

A comissão de frente, era formada por crianças como Lucas, 6 anos, e, Nícolas  2 anos, filhos de um dos integrantes da diretoria do bloco, Elenilton Lima de Sousa, é sinal de que o bloco terá vida longa.

Curiosidade

Você sabia que existe uma Escola de Samba paulista chamada Prova de Fogo em homenagem ao bloco cearense?




Foto grcesprovadefogo

Tudo começou em um piquenique organizado por Celso e Cristina de Lima em Interlagos, no dia 21 de abril de 1974, reunindo jogadores e torcedores do Santista Futebol Clube. A ideia para a formação da escola de samba partiu de Akimilson de Oliveira Câmara, o Ceará, que sugeriu o nome 'Prova de Fogo', 
uma homenagem ao bloco cearense. A partir daí, aconteceram algumas reuniões na casa de Dona Valdevina, na Vila Mangalot, Pirituba. Dois meses depois do piquenique foi plantada a primeira semente do samba em Pirituba, com a fundação do Grêmio Recreativo escola de Samba Prova de Fogo em 16 de junho de 1974. Ceará foi eleito o primeiro presidente da escola de samba.

Foto Renato Cipriano

Em 1975 a escola apresentou-se pela primeira vez no Grupo Pleiteante. O belo desfile na Rua 12 de Outubro, na Lapa, rendeu à agremiação o título de campeã e uma vaga no Grupo 3. Após a apresentação de 1980, com um enredo sobre histórias de caboclos, a escola passou a integrar o Grupo 2. Ao longo da sua história, a Prova de Fogo apresentou enredos marcantes, como Caboclo, Meninos de Rua, Circo, Magia Cigana, entre outros.



*Otacílio Anselmo e Silva – Escritor e antigo componente da banda de música do 23º BC - Exército) foi o fundador do 1º Bloco de Carnaval da cidade de Fortaleza. O Prova de Fogo, bloco este de tamanha tradição no Carnaval cearense até hoje. O nome do bloco “Prova de Fogo” é citado na música 'Bati Na Porta', de Lauro Maia, gravada pelo grupo musical Quatro Ases & um Coringa, pela Odeon.

Antônio Marrocos


Leila Nobre


Fontes: Cronologia Ilustrada de Fortaleza de Miguel Ângelo de Azevedo, http://www.provadefogo.com.br, Diário do Nordeste, Nirez

segunda-feira, 26 de novembro de 2012

O cordão das "Coca-colas"



O cordão das "coca-colas" foi criado logo após a guerra por um grupo de sargentos da Aeronáutica, como uma brincadeira em cima das moças que namoravam os soldados americanos. Fez sucesso pelos anos a seguir e chegou a ser um dos pontos de maior atração no Carnaval de rua de Fortaleza.

Nos idos de 45, terminada a Segunda Guerra Mundial, os soldados americanos retornavam ao seu país de origem e as "coca-colas" ficaram desativadas. Mas não estavam mortas, tanto assim  que continuavam a desfilar seu charme e sua elegância pelas streets da urbe, motivando as mais variadas reações: as velhas e respeitáveis matronas, guardiãs da sagrada moral cristã, resmungavam, olhavam de esguelha, condenavam as meninas ao fogo eterno do inferno e até benziam-se. "T'esconjuro, filhas do mal!" As muito feias (que me perdoem) e desprovidas dos bafejos da deusa da beleza davam muxoxos e olhares de desdém. Despeitadas! As crianças ficavam boquiabertas ante aqueles mulheraços, verdadeiras afrodites, desafiando os costumes e a chamada Moral vitoriana
_"Mãe, que moça linda!" e a mãe puxando o rebento pela orelha: _"Não olha! É uma 'coca-cola!'..." Quanto aos homens, bem, os homens olhavam em torno, conferindo a possibilidade de uma possível reprimenda e, quando a situação se mostrava favorável, tascavam o infalível fiu-fiu e mais alguns galanteios nem sempre aprendidos nas cartilhas das boas maneira. Alguns até apelavam para a grossura. Vôte!

Mas elas passavam incólumes, sem olhar para os lados, que mulher de classe só olha para frente. E do altos das suas elevadíssimas sandálias Gilda. Pois, como já dizia o poeta Zé de Sales, "os cães ladram, mas a caravana passa". E as "coca-colas" passavam...
E passavam. Pois hoje, elas, que representaram (ou foram) o fenômeno de uma época, são, agora, apenas vagas lembranças de pessoas mais velhas. Nada foi escrito, nenhum registro foi feito. Os preconceitos não o permitiram. Acredito que tenha passado pela cabeça de algum jornalista da época documentar o fato numa grande matéria. Mas os pudores falavam mais alto. Está claro que toda sociedade se levantaria contra a "imoralidade."


Década de 40 - As Coca-Colas com os militares

As "coca-colas" surgiram, simultaneamente, com a chegada dos soldados americanos que aqui instalaram uma base aérea, no alvorecer dos anos 40. Melhor dizendo, elas foram consequência da permanência daqueles militares ianques em nossa capital. O epíteto coca-cola surgiu do fato de elas terem o privilégio de tomar o famoso refrigerante americano que, àquela época, a gente só conseguia "saborear" através dos filmes made in Hollywood. Também, por ser a Coca-Cola um dos mais conhecidos símbolos americanos. Em suma, foi alguma mulher feia e despeitada ou algum machão desiludido quem apelidou as atrevidas moças de "coca-colas."


O cordão das "coca-colas" - Arquivo Nirez

Da mesma forma como faltou, até agora, quem resgatasse a memória das "coca-colas", não surgiu, ainda, um sociólogo ou mesmo um psicanalista para elaborar um profundo estudo sobre o fenômeno. Doce e nostálgico fenômeno do qual pouquíssima pessoas se apercebem. Pois elas representam, há mais de quarenta anos, os anseios das mulheres de hoje: o profundo desejo de liberdade, a emancipação, o assumir as suas próprias vidas.

O que mais causa estranheza e que torna o capítulo "coca-colas" um fenômeno sem explicações é o fato de que, sendo Fortaleza, naqueles idos, uma ingênua província de cerca de duzentos mil habitantes, apenas 10% da população atual, tenha surgido um punhado de moças para enfrentar todos os preconceitos da moral cristã da época, afrontar as próprias famílias e, o que é pior, as maledicências dos vizinhos, numa atitude que, até nos dias atuais, ainda chocaria muita gente.


Soldados americanos dançando no Estoril com as Coca-Colas, durante a Segunda Guerra. Acervo Will Nogueira

Sabe-se que as guerras geram tragédias de todas as espécies, sendo uma delas a prostituição de jovens como única maneira de mitigar a fome e obterem recursos para ajudar familiares. Mas não era esse o caso de Fortaleza, distante dos campos de batalha e sem outras consequências mais danosas, exceto a paralisação das importações, quando o Brasil dependia, em grande parte, dos produtos oriundos da Europa. Por outro lado, essas moças, regra geral, eram bem nascidas, provinham de famílias até tradicionais de nossa terra, viviam bem, moravam bem, não havendo, portanto, o fator carência financeira. Elas namoravam os soldados americanos, assim como um outro grupo namorava os cadetes, da mesma forma como, após elas, outras moças se interessavam pelos sargentos da nossa base aérea. "Ai, da base!..."


Em plena Praça do Ferreira, O Jangadeiro era outro front na batalha das "coca-colas" contra os preconceitos. Ali, elas tinham encontros vespertinos com os soldados do Tio Sam.

Estudando-se mais a fundo a questão, chega-se à conclusão de que se tratava de um punhado de mulheres de mentalidade evoluída, sendo obrigadas a viver numa pequena cidade sem maiores opções, além das monótonas sessões de cinema, do lanche no O Jangadeiro, o passeio de bonde, olhar as vitrinas das lojas mais aristocráticas, fazer o footing nas praças. Os soldados ianques trouxeram outras opções, ajudaram a tirar da rotina, a vida desmotivada da cidade modorrenta. E elas queriam ser diferentes, queriam sair da rotina, ver caras novas, não serem obrigadas a namorar os rapazes locais, conhecidos e manjados.

E como eram as "coca-colas", indagam as pessoas mais jovens, quando escutam falar no assunto. Era mulheres maravilhosas, lindas, elegantes, vistosas, educadas, imponentes. Eram estrelas cintilantes que brilhavam com luz própria, a luz da personalidade e do desafio. Estrelas de um firmamento sem estúdio nem palcos iluminados. Eram mulheres inteligentes, luminosas e iluminadas que souberam viver uma época, tirar proveito de um instante, de uma fase, de um flash da vida para fazer uma eternidade. Pois elas nunca serão esquecidas. Viverão sempre, no coração daqueles que as viram e admiraram, embora (e infelizmente), sem coragem de dizer. Pois, as "coca-colas" eram tabu. E hoje, quando quase todos os preconceitos já ruíram por terra, muita coisa já se apagou da memória.


Mas há de aparecer alguém que faça justiça a essas mulheres tão maravilhosas e incompreendidas na época. Alguém que as efetive na história de Fortaleza. Não como algo burlesco ou ridículo, ao contrário, como uma passagem bela e, por que não dizer, como um original capítulo da nossa cultura.


A Vila Morena, na Praia de Iracema, transformada em clube dos oficiais norte-americanos durante a Segunda Guerra, era reduto das atrevidas "coca-colas", as moças da sociedade local que tinham coragem de enfrentar as críticas e condenações e assumiam a soldadesca invasora.

Que apareça alguém para documentar aquele instante tão alegre da nossa província e as divinas personagens  que se escreva um livro  ou se monte um musical. Que seja um balé ou uma opereta. Uma novela para tevê, até um filme. Para tudo se presta a história das "coca-colas". O cenário seria o velho Estoril, de tantos fatos, de tantas histórias. Pois, foi ali, na bela Vila Morena, que os soldados americanos transformaram em base, que o cordão das nossas alegres "coca-colas" fazia a festa. Uma festa que parecia não ter fim, quando, nas madrugadas, de longe se viam as luzes e se escutavam os cantos e os risos de alegria esfuziantes de uma juventude que queria, antes de tudo, viver.



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Livro Royal Briar de Marciano Lopes

sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

Lauro Maia - Um compositor versátil


A obra de Lauro Maia é o resultado – como não poderia deixar de ser – do ambiente musical da época aliado ao seu talento tanto musical como versátil entre o popular, o popularesco e o clássico (não erudito).
A música popular brasileira foi e ainda é o reflexo do centro das artes concentrado no Rio de Janeiro e em São Paulo: o primeiro com sua música romântica, o samba jocoso e a marcha carnavalesca; o segundo com sua mazurca, rancheira, valsa e canção com sabor de imigração.
Essas influências aliadas às locais como o folclore, o rural nordestino e ainda a presença jazzística existente em grande maioria de nossos músicos, deram à obra de Lauro Maia um sabor todo especial. As influências são naturais e até benéficas desde que não cheguem a descaracterizar o
regional.
Lauro iniciou sua carreira artística ao final da década de 30, quando pontificavam nacionalmente nomes como Pixinguinha, Benedito Lacerda, Ary Barroso, Lamartine Babo, João de Barro, Haroldo Lobo, Custódio Mesquita, J. Cascata, Ataulfo Alves, José Maria de Abreu, Assis Valente, Silvino Neto, Dorival Caymmi, Luís Bitencourt e Leonel Azevedo, para citar apenas os mais cotados.
Os instrumentistas eram Luiz Americano, Dante Santoro, Abel Ferreira, Fon-Fon, GarotoLuperce Miranda, Carolina Cardoso de Menezes, Laurindo de Almeida e os já citados Pixinguinha, Benedito Lacerda e Custódio Mesquita.
Aliando suas experiências urbanas com ritmos da terra, Lauro criou, ainda em  Fortaleza, valsas, sambas e marchas com características nossas, além de peças com ritmos e sabor nativos. Ao mudar-se para a então capital federal, Rio de Janeiro, passou a produzir, como exigia a época, músicas de sabor carioca, embora preferisse quase sempre os intérpretes cearenses por estes serem mais identificados com suas composições.
Embora gostasse de exercitar o jazz quando executava, Lauro Maia nunca deixou transparecer em suas produções essa influência, a não ser em uma única composição, o fox Gosto Mais do Swin (César O Que É De César) que, como o próprio título sugere, foi proposital.
Após conseguir as primeiras gravações de suas músicas e estas obterem sucesso em todo o país, preocupou-se em difundir os ritmos sertanejos do nordeste, ao mesmo tempo em que compunha valsas com o sabor da época para cantores como Orlando Silva; sambas e marchas para os carnavais e também os chamados sambas de meio de ano, obtendo aceitação em todas as camadas sociais.

Lauro poderia ter sido o lançador do ritmo baião, pois foi procurado por Luiz Gonzaga para juntos fazerem o lançamento, mas preferiu encaminhar o sanfoneiro pernambucano a seu cunhado Humberto Teixeira, que teve a felicidade de, junto com Gonzaga, alcançar o mais estrondoso sucesso da época, que foi aquele ritmo, obtendo repercussão não só no Brasil mas também em todo o mundo.
Como executante - ele era pianista - infelizmente, Lauro Maia deixou registrados somente alguns acetatos gravados na antiga PRE-9 (Ceará Rádio Clube) e mesmo assim muitas de suas gravações se perderam com o tempo e o descaso.
Lauro Maia foi, portanto, um compositor versátil, eclético, que não se prendeu ao radicalismo dos ritmos nativos nem se entregou aos apelos externos. Fez a fusão do carioca com o cearense, do romântico com o jocoso, do clássico com o banal, produzindo peças da mais legítima Música Popular Brasileira. Música, porque ele era um catedrático em teoria e em sensibilidade; Popular, porque atingia a massa; e Brasileira porque sabia fazer cheirar à terra tudo o que produzia.




Crédito: Livro "O balanceio de Lauro Maia" de Nirez

domingo, 18 de setembro de 2011

O carnaval fortalezense


Gif Carnaval




Sempre que se aproxima o período do Carnaval, os mesmos questionamentos voltam a servir de polêmica sobre o real conceito que deveria identificar a cidade de Fortaleza nos dias consagrados à folia.

A propaganda oficial para atrair turistas centra seu apelo no fato de que Fortaleza seria, nesta época, um oásis de tranquilidade, cidade ideal para quem deseja fugir da agitação carnavalesca. E as perguntas se repetem: já existiu, de fato, um Carnaval animado na cidade?  Ou nossa gente é inapelavelmente imunizada contra o vírus momino, estando fadada ao desfile em “slow-motion” dos maracatus?


Bloco Turma do Camarão - Arquivo Nirez


O carnaval de Rua em Fortaleza iniciou-se no final do Século XIX, mas foi proibido por um período, em 1905, pelo intendente Guilherme Rocha. Nos desfiles da época eram comuns pessoas fantasiadas chamadas de 'papangus' e 'dominós'. Havia também os 'caboclos', remanescentes dos indígenas de Porangaba (NIREZ, 1993, p. 3). De acordo com Nirez (1993), o carnaval de Fortaleza era mais ou menos animado, conforme a situação econômica e social da época.

Desfile do bloco Prova de fogoCronologia Ilustrada de Fortaleza - Nirez

Desfile do Bloco Prova de Fogo - Arquivo Nirez

Em tempo de revolta ou guerra, era desanimado e em tempo de paz e harmonia era muito animado. Nas décadas de 1910 e 1920, predominava o carnaval de clubes. Na década de 1930, o carnaval de rua começou a se tornar mais popular, quando blocos foram formados por músicos, comerciários e trabalhadores, denominados 'brincantes', com a orquestra na retaguarda. Na frente havia sempre um baliza, que fazia acrobacias com bastão à mão. Esses blocos tinham compositores próprios que geralmente faziam marchas especiais para o Carnaval. Mais tarde surgiram os blocos que dançavam ao som de samba. O primeiro desses blocos foi o 'Prova de Fogo', seguido da 'Escola de Samba Lauro Maia', que se transformaria, mais tarde, na 'Escola de Samba Luiz Assunção'.

O Cordão das Coca-Colas - Arquivo Nirez

O antológico o “Cordão das Coca-Colas”, que reunia a “fina flor” do machismo cearense  Arquivo Diário do Nordeste

"No meu entender, os blocos de sujos eram o carnaval fortalezense”, afirma o escritor e memorialista Marciano Lopes. “Depois que tiveram a pretensão de elitizar nosso desfile de rua, com falsas escolas de samba e maracatus sofisticados, quiseram também impor um excesso de “organização” absolutamente desnecessária. Inibiram e limitaram a apresentação dos sujos, em vez de incentivá-la. Foi uma opção pela utopia.

Desfile de 1950 - Maracatu Az de Ouro - Arquivo Nirez

Maracatu Az de Ouro em 1950 - Foto do acervo do Museu da Imagem e do Som do Ceará

O escritor e radialista Narcélio Limaverde concorda com Marciano, em seu livro “Fortaleza História e Estórias - Memórias de uma Cidade: “Nosso carnaval não se resumia somente a desfiles de blocos, escolas, cordões, maracatus e veículos motorizados (o chamado corso de automóveis). Um grupo de anônimos, os chamados sujos, papangus, como meu pai José Limaverde denominava, dava um colorido especial aos desfiles. Usavam fantasias as mais criativas, além dos tradicionais homens vestidos de mulher, com quengas de coco fingindo de seios.”. Limaverde relembra um folião que marcou presença durante vários anos, portando uma enorme barriga de grávida com uma placa e os dizeres “Meu Destino é Pecar...”. Era uma alusão ao romance que o jornal Unitário publicava em capítulos, diariamente, sob o pseudônimo de Suzana Flag. Só anos depois se soube que o verdadeiro autor era Nelson Rodrigues, famoso teatrólogo de “Vestido de Noiva”.


Carnaval do Náutico - Década de 50 - Arquivo Blanchard Girão


Côrte do Rei Momo Luizão - Arquivo Nirez

Um outro folião “grávido” trazia o cartaz de “Amar foi Minha Ruína”, título de um popular filme da atriz Gene Tierney, exibido em Fortaleza em meados da década de 40. O uso liberado do lança-perfume (cloretil), utilizado geralmente pelos rapazes para cortejar recatadas mocinhas e raramente usado como droga, contribuía bastante para o lado pitoresco da festa e o incremento da euforia local.


Carnaval do bloco do Ideal Clube - Arquivo Nirez

Pesquisadores registram que o carnaval de rua, em sua expressão mais abrangente e popular, nasceu no Rio de Janeiro com um sapateiro português chamado Zé Pereira, inspirador da célebre marchinha ainda hoje executada nos bailes, que saía às avenidas tocando seu bumbo e logo era seguido por espontâneos e excitados foliões.


Anos 50 - Desfile do bloco "Enverga mas não quebra" - Arquivo Nirez

Anteriormente, existia o “entrudo” dos tempos coloniais, quando alguns senhores permitiam aos seus escravos a realização de extrovertidos - e às vezes violentos - folguedos, uns dias antes do início da Quaresma. A elite de então se refugiava em suas casas, apavorada diante de possíveis irreverências e excessos cometidos pelos escravos bêbados.

Décadas mais tarde surgiriam as escolas de samba, assinalando cores mais fortes e cadências mais ritmadas na folia carioca. O mais sério contraponto nacional ao samba era o frevo pernambucano, marca registrada do tradicional e sempre muito concorrido carnaval do Recife.


Irapuan Lima, o inesquecível Rei Momo, ao lado de sua Rainha - Arquivo Diário do Nordeste

Na verdade, os cearenses nunca figuraram entre os mais entusiasmados brincantes do Brasil. Há quem atribua essa evidência à existência de poucos afro-brasileiros no Ceará. Para estudiosos do tema, carnaval dos bons é sinônimo de presença da raça negra, como estão aí para atestar os carnavais do Rio de Janeiro, Salvador, Recife e São Luís do Maranhão.


Cronologia Ilustrada de Fortaleza - Nirez

Diz Marciano Lopes: “A Escola de Samba Luiz Assunção (talentoso compositor de “Adeus, Praia de Iracema”), foi a mais exótica escola de samba do mundo. Estava mais para banda marcial do que para qualquer outra coisa, com seu impecável “pelotão” de músicos (a Escola compreendia apenas os músicos) vestidos à maneira militar, com empertigados dolmãs e vistosos quépis.”

Bloco Zombando da Lua - Arquivo Nirez

Apesar de seus limites, o carnaval de rua fortalezense teve suas peculiaridades. Uma delas eram os exuberantes carros alegóricos das prostitutas, todas elas residentes nas inúmeras “pensões alegres” então existentes no Centro da cidade. Os carros, por vezes, tentavam imitar castelos medievais, feitos de papelão e areia prateada, em um ingênuo e singularmente exótico monumento ao “kitsch”.

Eram também bastante comuns os blocos de homens travestidos de mulher. Mas convém frisar: quase todos eles respeitáveis pais de família ou rapazolas à procura de fazer rir as namoradas, pois travestis, na atual concepção da palavra, poderiam ser contados nos dedos na provinciana Fortaleza dos anos 50 e 60. Os mais populares “assumidos” que ousavam enfrentar (ganhando aplausos, diga-se de passagem) o julgamento do público eram o gigantesco e corpulento Zé Tatá (1m90 de altura), dono de uma das mais visitadas “pensões alegres” - atrás do prédio dos Correios e Telégrafos, e a saltitante Beatriz, excelente nos dotes culinários e famosa por seu cocar de luzes multicoloridas.

Foto década de 50 do baile da Marinha - Arquivo Blanchard Girão

Os blocos mais aplaudidos dos travestis “ocasionais” eram as “Baianas”, as “Meninas do Sputnik”, as “Garotas do Barulho” e o lendário “Cordão das Coca-Colas”, onde cearenses “despeitados” ironizavam as audaciosas mocinhas fortalezenses, louváveis pioneiras (hoje se reconhece) da liberação sexual na terrinha, que ousaram render-se aos encantos dos belos soldados norte-americanos sediados em nossa cidade, durante a Segunda Guerra Mundial. Muitos deles levaram suas amadas “coca-colas” ao altar e, por causa disso, hoje existem inúmeros descendentes de tradicionais famílias cearenses em grandes cidades dos EUA, sobretudo em Boston, para onde inúmeras moças da Rua Pedro I foram então levadas.

Um tanto avesso a qualquer tipo de disciplina, o folião cearense sempre pareceu optar pela ausência quase total de compromisso. Como afirmava o saudoso carnavalesco Antônio Marechal, “cearense gosta de botar uma roupa de mulher, ou bermuda e camiseta, e cair na farra de qualquer jeito”. Gosta de ir às praias e esbaldar-se a valer, sem ter de submeter-se a programações ou horários.

A falta de brilho e originalidade do carnaval fortalezense é também enfatizada pelo professor Gisafran Nazareno Mota Jucá, em seu livro “Verso e Reverso do Perfil Urbano de Fortaleza”. O autor também se refere ao caráter repressivo das autoridades, citando uma hilária nota divulgada pela então Secretaria de Negócios de Polícia e Segurança Pública do Estado do Ceará, advertindo não ser permitido “o uso de fantasias atentatórias à moral, proibindo-se a participação de grupos constituídos por indivíduos maltrapilhos à guisa de blocos e empunhando latas, fragmentos de madeira, reco-recos, espanadores e objetos outros que se possam tornar instrumentos de agressão, sendo os infratores imediatamente encaminhados à Delegacia de plantão”. Essa, sem dúvida, foi a primeira atitude preconceituosa perpetrada contra os ouriçados blocos de sujos, no entender de alguns a única fonte de animação realmente autêntica do carnaval de rua em Fortaleza.

Antigo baile de carnaval do Diários

Outro fator que contribuiu bastante para inibir os foliões locais foi a rígida censura estabelecida nos tempos da ditadura militar, quando era proibido qualquer tipo de manifestação jocosa mais ousada ou de duplo sentido. Os censores da época sempre farejavam supostas mensagens subliminares contra o regime nas mais inocentes brincadeiras e até mesmo pretensos códigos de comunicação entre “subversivos” introduzidos na massa, que utilizariam a descontração carnavalesca para desenvolver sua política marginal.

A única tradição carnavalesca genuinamente cearense, embora vagamente inspirada em seus homônimos pernambucanos, são os dolentes maracatus, com seu ritmo lento e não de todo apropriado à característica euforia do reinado de Momo. Os maracatus pernambucanos possuem ritmo bem mais apressado e agora já estão sendo copiados por alguns grupos locais, sob os veementes protestos dos preservadores das tradições cearenses.

O pré-carnaval de Fortaleza

As raízes do pré-carnaval de Fortaleza nasceram com os 
blocos carnavalescos dos anos 1970 e 1980

Amizade, paixão pela música e tradição de família são alguns motivos que levaram ao surgimento dos blocos carnavalescos de Fortaleza, hoje, vedetes do pré-carnaval de rua, festa que se fixou com força no calendário da Capital cearense. O hábito de comemorar o pré-carnaval nas ruas de Fortaleza começou pela insistência de grupos de amigos que queriam passar a festa momina em sua cidade. Costumeiramente, o destino dos fortalezenses nos dias de carnaval sempre foi as praias do litoral.

“Como todo mundo fugia da cidade no período decidimos começar a festa antes e foi assim que teve início o pré-carnaval de Rua de Fortaleza”, conta Jânio Soares, diretor do bloco Periquito da Madame, um dos mais antigos da cidade. Ele chama para si a autoria da festa urbana que durante os finais de semana de janeiro e fevereiro leva multidões entusiasmadas para as ruas.

“Começamos o pré-carnaval para criar o hábito nas pessoas de ficar em Fortaleza durante o carnaval”, conta. A cidade ainda fica esvaziada durante o feriado da folia, mas ferve em janeiro com os blocos pré-carnavalescos. No entanto, antes mesmo do Periquito da Madame estrear nas ruas, outras pessoas já se organizavam em grupos e celebravam o carnaval.

Em 1974, os moradores do então bairro Tyrol, hoje Jacarecanga, já promoviam uma festa carnavalesca de rua. “O bloco surgiu com a inauguração da Avenida Leste-Oeste, então a comunidade inventou o nome Tyroleste, conta o artesão José Nazareno Barros, mais conhecido como Deusdete, organizador do bloco Vai Tomar na Tyroleste, outro nome antigo do carnaval de rua que foi incorporado ao pré-carnaval.



O Periquito da madame nasceu no ano de 1982 quando um grupo de amigos decidiu sair brincando na Rua Senador Pompeu, no Centro. Hoje, o percurso do bloco é pelo calçadão da Praia de Iracema e a concentração acontece no Largo do Mincharia. O bom humor e a irreverência são as marcas do bloco.

Todos os anos, sai com um tema diferente inspirado em assuntos em voga. Este ano, de verde o periquito ficou marrom e adotou o sobrenome Obran, em homenagem ao presidente dos Estados Unidos, Barak Obama.

A tradição é um dos grandes atrativos do bloco, que desenvolveu laços de amizade em torno da festa.





Bloco de sujo

Do pai, Deusdete herdou o gosto pelo carnaval e, apesar dos percalços difíceis, botou o bloco na rua ao longo de todo esse tempo de forma ininterrupta, às vezes, com mais foliões, outras, com menos, mas sempre com admiradores cativos. A única explicação para a resistência de blocos tão antigos é a alegria do fortalezense. Mesmo sem apoio financeiro, muitos blocos conseguiram se sustentar e carregam um nome de peso na cena cultural.

É o caso da Turma do Mamão, bloco nascido em 1974 para desfilar no carnaval de rua de Fortaleza, como um bloco de sujo. “Hoje, desfilamos na Av. Domingos Olímpio com o samba pesado e participamos do pré com marchinhas e um pouco de samba também”, explica o coordenador do bloco, Raimundo Nonato da Silva Barros, que desde a fundação faz parte dessa turma.

Mais novo, mas não menos experiente, o bloco Que Merda é Essa! já faz parte da história da Praia de Iracema. Há 26 anos, ele surgiu quando os amigos Geraldo Junior, Tereza Mônica, Wagner Costa e Ercinho Ponce de Leon decidiriam investir alegria e irreverência na festa pré-momina.

Os amigos tinham as raízes nos blocos e cordões carnavalescos da Praia de Iracema e do carnaval de Fortaleza, dentre eles Escola de Samba Leopoldina Show e Girassol..

Com instrumentos de sopro, tocando frevo e executando marchinhas, o bloco foi conquistando um público cativo de foliões no decorrer de sua história. Segundo um dos organizadores do Que Merda é Essa!, Joaquim Bezerra Jr., o pequeno bloco cresceu e hoje arrasta até 8 mil pessoas em cada dia de desfile, tudo graças à paixão pela folia de quem faz.



Uma conclusão é unânime: o fator que influenciava de maneira marcante para a contagiante animação de antigos carnavais, inclusive nos clubes, eram as belas músicas especialmente criadas para os festejos. Bastante tocados pelas emissoras de rádio e assinados por compositores do porte de Braguinha, Mário Lago e Lamartine Babo, os sucessos mominos eram também muito divulgados pelo cinema nacional, sobretudo através das chanchadas produzidas pelo cearense Luiz Severiano Ribeiro.

As músicas carnavalescas do passado, longe de apelarem para a sexualidade chula e vulgarizada pela chamada “axé-music”, abordavam temas do cotidiano e suas letras eram sabidas de cor por toda a população brasileira. Outro importante detalhe: todas elas eram interpretadas por cantores do primeiro time do cancioneiro popular nacional, como as irmãs Linda e Dircinha Batista, Dalva de Oliveira, Ângela Maria, Orlando Silva, Nelson Gonçalves, Emilinha Borba e Marlene, entre inúmeros outros.

Temas sociais, políticos e de interesse público foram maliciosamente abordados nas letras dos sambas e marchinhas. Enquanto o cantor Blecaute ironizava os marajás do serviço público em “Maria Candelária, “a alta funcionária que saltou de pára-quedas e caiu na letra O”, a escassez de moradia era satirizada em “Daqui não Saio” e Marlene retratava o sofrimento de humildes lavadeiras das favelas no antológico samba “Lata d´água”.

Fortaleza cresceu muito, os costumes mudaram, o Centro da cidade esvaziou-se e o público, que lotava a Duque de Caxias e a Senador Pompeu, fugiu para as praias dos municípios mais próximos, instituindo o chamado “carnaval de praia”. A mudança foi benéfica para servir como atração turística de cidades como Aracati e Paracuru, a despeito do constrangedor hábito do “mela-mela”, remanescente do “entrudo” dos escravos na época do Império. Muitas cidades, felizmente, já se mobilizaram para evitar esse exercício de mau gosto aliado a um injustificável disperdício de alimentos como ovos e farinha de trigo, justo no momento em que se pretende adotar para a fome uma tolerância zero.

Bônus:






Carnavá Tá Ahi - Carmem Miranda


Vamos Brincar - Carmem Miranda

Não quero saber - Pilé

Bahianinha - Sylvio Caldas
Gamella quebrada - Sylvio Caldas

Eu sou feliz - Ottilia Amorim

Nêgo Bamba - Ottilia Amorim



Gif Carnaval 

Há quem afirme que o fortalezense não precisa brincar o carnaval porque Fortaleza já é uma festa o ano inteiro.
José Augusto Lopes


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