Fortaleza Nobre | Resgatando a Fortaleza antiga : José Nilson de Oliveira Lima
Fortaleza, uma cidade em TrAnSfOrMaÇãO!!!


Blog sobre essa linda cidade, com suas praias maravilhosas, seu povo acolhedor e seus bairros históricos.

 



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segunda-feira, 4 de julho de 2011

Das antigas - O Padre e o preso



 Abril de 1964 foi talvez pior que março. Para algumas pessoas, os dias não passavam como de costume e o fim de mês não parecia voar. Haviam cortado suas asas e por isso os dias andavam peados, vazios de coisas triviais. O acordar com os galos, o esfregado matinal com a sinhazinha, a hora do homem da carroça d'água e o café coado em pano preto de borra... Nada. Nem o filho que chorava com o ''dordói'' e água morna que devolvia-lhe a vista... Nada. Coisas que todos os dias corriam iguais sendo diferentes. 

Vovô foi quem inventou essa conversa de que o tempo voava. Foi ele. Era pra dizer que os segundos tinham vida e mexiam com a vida dele e a alheia. Nada a ver com rugas e com coisas desinfelizes. Adorava viver o dia, amá-lo à boquinha da noite, dormi-lo e, cedo, estar de pé pra viver outros despropósitos.

Angustiava-se quando caía enfermo. Sinal de que os dias caminhariam empanturrados, golfados. Que não aconteceriam triviais. Era como estar preso, isolado das acontecências e das coisas que seguiam seus inesperados sem ele.

A propósito disso, me enviaram carta de um preso que se angustiou com a desfelicidade de perder de vista o cotidiano dos seus... De perder os dias com os seus. Foi Blanchard Girão, em abril de 1964, ao padre Zé Nilson... Sacerdote do Mucuripe, protetor das meninas alegres. Foi assim: 

''Meu bom e digno padre José Nilson,
Não estaria ausente à sua festa se os acontecimentos que se desencadearam em Abril não houvessem mudado o curso de minha vida. Daqui desta prisão onde me lançaram vi para sempre o adeus de meu Pai. Não assisti à chegada ao mundo de minha filhinha Martha, que está crescendo sem o meu carinho. Nunca mais deitei-me ao chão para servir de montaria a Luiz Carlos e Blanchard Filho. Os dias são iguais, meu amigo, são longos e tristes. Mas, não se surpreenda, ao dizer-lhe que são também cheios de esperança.

A você posso fazer-me entender muito bem. A poucos falaria com tanta confiança e maior certeza de ser compreendido. Sei da grandeza de sua alma, da lucidez de seu espírito, da bondade de seu coração aberto às aflições humanas. Posso lhe confessar tudo que guardo no íntimo de mim mesmo e que só daqui a muito tempo transmitirei, como subsídio à História, aos que respirarem um clima de Liberdade e Direito.

Quando você recebeu, há 17 anos, as vestes sacerdotais, tinha a convicção de que iria encontrar campo fácil à pregação da Doutrina de Cristo a todos os homens. Mas estou convencido de que a experiência lhe ensinou algo bem diferente, variando de camadas sociais, os homens divorciaram-se da doutrina cristã. Os ricos de há muito ergueram altares a outros deuses, aos novos ''bezerros de ouro'' da civilização contemporânea. Adoram acima de tudo o Prazer e o Luxo. Veneram o Conforto e a Glória dos salões. Seus valores morais estão limitados pelo materialismo de sua riqueza. E sei, e você sabe, que eles vão à Igreja. Fingem adorar a Deus. Mas em verdade mentem. São os novos fariseus do templo.

Quando se ajoelham e porventura oram, no seu consciente não acode a lembrança de que, inda há pouco, esmagavam sob o peso da exploração aqueles que constroem seu patrimônio. No seu ''ego'', uma crosta de insensibilidade fecha-lhes os olhos à brutal miséria em que a acumulação de seus bens lança a grande maioria de seus irmãos. E pedem - oh! inconscientes! - e pedem a Deus proteção para esse estado de coisas. E procuram iludir o céu com a oferenda de migalhas de sua mesa atiradas à pobreza faminta e humilhada!

E os miseráveis, meu amigo, será que ainda crêem e amam ao Criador? É difícil definir a alma dessa gente. Se entram na Igreja, não vão aos pés de Deus agradecer a graça suprema que seria a própria vida; vão chorar, meu amigo, vão implorar, vão contar suas desditas ao Todo Poderoso, última instância de seus anseios. Não vemos em seus olhos o brilho da alegria nem a beleza da felicidade. Seus corpos esquálidos, suas vestes em farrapos são o atestado de uma degradação física e social a que foram atirados pelas minorias ambiciosas e desumanas. A vida para eles é uma carga de sofrimentos e desencantos. Ainda aspiram pela lembrança de Deus, mas rastejam às portas do desespero.

E diante de todos, generoso e humano, você vai cumprindo sua missão divina. Conheço bem de perto o seu idealismo. Em muitas oportunidades - permita-me a franqueza - deplorei sua impotência diante da realidade que o cercava. As limitações eram tantas que um fraco recuaria. E você, ao contrário, sempre vibrante, disposto a fazer o mínimo que lhe é possível, rezando para que muitos o imitassem.

Nossos caminhos não sei se são os mesmos. Os fins, tenho certeza. E porque ansiei por uma transformação; porque não concordei com o endeusamento dos novos ''bezerros de ouro''; porque não me embruteci no culto à riqueza nem me insensibilizei ao sofrimento do povo; porque amei ao próximo como reflexo de mim mesmo que ele o é; por tudo isso, meu amigo Padre José Nilson, encarceraram-me. Destruiram o lar de meus Pais; roubaram-me o carinho e o afeto da esposa e de três filhos pequeninos.

A você também roubaram a suprema ânsia de sua vocação, que era, sem dúvida, ver os homens em harmonia, adorando a Deus na justeza da Idéia perfeita de que a vida deve ser vivida com dignidade, com amor, com paz e felicidade, não nesse entrechoque de interesses e ambições que faz do homem a fera a devorar constantemente o próprio homem.

Confundem-se os fins que buscamos. Triste e envelhecido, recalcando nalma a dor mais forte - a dor da injustiça! - a mesma dor do Cristo no tribunal de Pilatos, vou aceitando os meus dias com resignação, convencido de que num futuro não muito remoto a Verdade surja e com ela a Liberdade e o Direito; você, meu amigo muito amigo, também reflete no olhar a tristeza de sua incapacidade de derramar para todos os homens - e não para as minorias privilegiadas - a alegrias de felicidade terrena para a busca do Reino de Deus. Mas, igualmente a mim, tem no coração a plena consciência de que isto não é eterno, de que os homens amanhã encontrarão novamente a Doutrina e serão bons como sempre deveriam ter sido.

E é com essa síntese de nossos sofrimentos e anelos que me transporto à sua festa para, em meio a seus paroquianos humildes do Mucuripe, comungar da mesma felicidade que a todos domina no momento de abraçá-lo como amigo, na autêntica expressão desta palavra.
Vai meu abraço, amigo Padre Nilson. Que Deus escute as suas preces em favor dos pobres e dos bons.
Até um dia.
Blanchard Girão
Quartel do 23º B.C., em 29 de novembro de 1964''.


Crédito: Jornal O Povo

quinta-feira, 15 de abril de 2010

Padre José Nilson - Vigário do Mucuripe




José Nilson de Oliveira Lima, nasceu no dia 05 de junho de 1922, na cidade serrana de Coité (atual Aratuba). Filho de Isabel Oliveira Lima com o latifundiário Adolfo da Silveira Lima, atual nome da praça principal da cidade. José Nilson começou a estudar teologia ainda jovem e obteve a sua ordenação sacerdotal em 30 de novembro de 1947, aos 25 anos de idade. Por muitos anos, foi vigário da Paróquia de Nossa Senhora da Saúde, em Fortaleza. Em outras oportunidades, acabara sendo: diretor do colégio Pe. José Nilson, diretor do colégio estadual Estudante João Nogueira Jucá, diretor do colégio Feliz Amanhã, membro do conselho fiscal da colônia dos pescadores do Mucuripe, vigário cooperador da igreja do Patrocínio, capelão do Patronato, em Cascavel (1949), professor do Seminário da Prainha (1950) e pároco emérito da paróquia Nossa Senhora da Saúde, em 20 de maio de 1950.


O Pe. José Nilson é primo em terceiro grau do Frei Timóteo Francisco Nemésio Cordeiro, mais conhecido como Dom Timóteo, primeiro padre e administrador da diocese de Tianguá. Também é primo em segundo grau, do anfitrião Major Antônio Couto Pereira, que foi presidente do Coritiba Foot Ball Club, durante 17 anos.


Fortaleza perdeu hoje um de seus sacerdotes mais humanistas. Falo do Padre José Nilton. Vigário do Mucuripe, desde 1950, nutria pela categoria de jornalistas um enorme carinho. Inclusive, um parente dele, o Erick Guimarães, está na atividade.


Durante bom tempo, gozei da amizade desse bondoso religioso. Que não tinha preconceito religioso, respeitando todas as denominações com a visão pluralista de quem é sábio.


Diante do crescimento das seitas evangélicas, padre Zé Nilson comentou comigo que “as pessoas que deixam a Igreja Católica e procuram essas igrejas evangélicas, é que não tinham a verdadeira fé que se quer ao cristão católico”.


Educador, sua maior preocupação foi levar ensino aos filhos de famílias do Mucuripe e arredores. Exerceu papel importante junto ao trabalho de transformação do Farol, antiga zona de prostituição, onde sua palavra e orientação nunca faltaram aos seus residentes.


Padre José Nilson morreu aos 88 anos, vítima de falência múltiplas de órgãos. Seu sepultamento será às 16 horas no Parque da Paz.


Nonato Albuquerque



O padre José Nilson, de 88 anos, era pároco da Igreja de Nossa Senhora da Saúde, no Mucuripe, onde atuava desde 1950

Morreu, nesta madrugada (15/04/2010) de quinta-feira, um dos religiosos mais respeitados e conhecidos de Fortaleza: o padre José Nilson.

Vítima de falência múltipla de órgãos, padre José Nilson de Oliveira está sendo velado na Funerária Paz Eterna, onde, às 14 horas, haverá celebração de missa de corpo presente na Igreja da Saúde.
O enterro do Padre José Nilson será às 16 horas, no Parque da Paz.

Jornal O Povo
15 de Abril de 2010

O dia amanheceu mais triste hoje...

O padre José Nilson era muito querido por seus paroquianos, a grande maioria composta por pescadores das praias do Mucuripe e Meireles.
Foi celebrada uma missa de corpo presente, presidida por dom José Antonio A. Tosi Marques, arcebispo de Fortaleza.
Estudei no colégio do padre por 11 anos e assim como a maioria dos alunos, sempre tive um grande carinho pelo padre José Nilson, sem dúvida uma grande perda para todos nós, independente de religião, ele sempre foi uma pessoa muito bondosa e preocupado com as crianças do bairro.



O padre sofrendo em meio a tantas enfermidades, estava em repouso no Seminário da Prainha aos cuidados de Dª Eva (Téc. em Enfermagem).



Pe José Nilson era o único padre que tinha a carteira de pescador, com seus 88 anos, natural de Aratuba, ainda lembrava com carinho de sua ex-paroquia do Mucuripe.

A despedida do santo do Mucuripe

A comunidade do Mucuripe está órfã. Com a morte do padre José Nilson, a população se reúne para agradecer os ensinamentos do homem que fez história na Paróquia de Nossa Senhora da Saúde, acolhendo pobres, pescadores e prostitutas.



Foto de Deivyson Teixeira

Era década de 1950 quando o então arcebispo ofereceu o rebanho que nenhum pastor queria. "É uma paróquia difícil. Ninguém quer o Mucuripe", apelava dom Antônio Lustosa ao padre José Nilson. A proposta era passar seis meses na Paróquia Nossa Senhora da Saúde. O padre transformou esse tempo em 54 anos. Acolheu os pobres, defendeu os pescadores e lembrou-se das prostitutas. Fez história no Mucuripe. Ontem a comunidade, chorosa pela perda, foi agradecer.


Eram muitos os que queriam dizer do padre. Franceni Lima Cabral garantia que ele se sentia realizado porque cuidava dos pobres. "Ele sabia acolher as pessoas. Muitas vezes, erguia a batina até a perna para subir no morro e atender à população", conta. Para Elvira Praciano, o Mucuripe ficou órfão. "Perdemos um pai. Ele se destacava pela simplicidade. Era educado, caridoso, tratava todo mundo muito bem", recorda.


Eva Lima Gregório chorava a falta de um filho. "Eu não o tinha como um chefe. Cuidava dele como cuido dos meus filhos. Ele era o meu bebê", lacrimeja a mulher ao se lembrar do padre que cuidou por 11 anos. Fátima Vieira narra as vezes que levou a água simples para o padre transformar santa. "A gente trazia e ele benzia com tanto gosto. Foi ele que casou minha mãe, me batizou e me crismou", sorriu.





Padre José Nilson benzendo o barco do Sr.  Raimundo Monteiro. Acervo de Isabella Monteiro


A senhora do lado orgulha-se em citar que era amiga do padre Zé Nilson. Tinham a mesma idade, chegaram ao Mucuripe no mesmo ano. "Era um padre bom, um padre santo, um padre dos pobres. Por isso é tanta gente desse jeito na igreja", e apontou a multidão que se apinhava para ver o corpo do padre após a celebração da despedida, presidida pelo arcebispo dom José Antônio Aparecido Tosi, junto com 20 padres.


Após a missa, cinco ônibus partiram rumo ao Cemitério Parque da Paz junto com os carros que completavam o cortejo. Era a comunidade do Mucuripe que seguiria para agradecer. A população cantava. Padre José Nilson foi sepultado sob aplausos e ao som do hino da padroeira, Nossa Senhora da Saúde.


Ao fim da despedida que se fazia homenagem, mais um momento para agradecer o que se havia aprendido com o homem santo do Mucuripe. Com um livrinho na mão, sozinha, uma senhora se encostou ao túmulo já coberto. Antes de começar a cantar, justificou: "Quero cantar para ele. Foi ele quem me ensinou a ler". Dívida de gratidão.

O padre José Nilson de Oliveira Lima nasceu em 5 de junho de 1922, em Aratuba, a 128 quilômetros de Fortaleza.
O padre morreu em um hospital particular, devido a uma insuficiência renal.
Para o padre Gílson Soares, assessor para comunicação da CNBB, a Igreja perdeu uma pessoa que era referência para toda a Arquidiocese, principalmente devido ao seu trabalho social: "Ele tinha um desapego total das coisas. O pouco que tinha era do povo".


Padre Gílson lembra que uma das paixões do padre José Nilson era o time do Fortaleza. "Agora, o time ganha um intercessor no céu", frisa.


Otacília Verçosa, a Tatá, líder comunitária do Mucuripe, trabalhou com o padre por mais de 40 anos. Segundo ela, o padre prestava muita assistência social às prostitutas, conversando e aconselhando.


O seminarista Lauriano Ferreira, que atuou como coroinha do padre José Nilson, frisa o trabalho de evangelização que o padre fazia com a Colônia dos Pescadores Z-8, na comunidade do Mucuripe.

O Povo

A luta do Padre José Nilson como vigário do Mucuripe - Clique para ampliar

Fotos Históricas


Em 17 de maio de 1997, é fundado o Acervo do Mucuripe Padre José Nilson de Oliveira Lima, na Rua Boa Vista nº 26, residência de sua fundadora, D.Vera Lúcia Miranda, a "Verinha", no Mucuripe.

D. Vera cuidou do acervo por mais de vinte anos.
















Fonte: Jornal O Povo/ Blog Gente de Mídia / Cronologia Ilustrada de Fortaleza de Miguel Ângelo de Azevedo (Nirez).


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