Fortaleza Nobre | Resgatando a Fortaleza antiga : Das antigas
Fortaleza, uma cidade em TrAnSfOrMaÇãO!!!


Blog sobre essa linda cidade, com suas praias maravilhosas, seu povo acolhedor e seus bairros históricos.

 



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segunda-feira, 1 de junho de 2020

A saga de Rodolfo Teófilo no combate a varíola

Rodolfo Teófilo foi um grande farmacêutico, que presenciou toda a trajetória da terrível epidemia de varíola que o Ceará jamais tinha visto que foi a de 1878. Indignado por conta do descaso do poder público, ele se propõe a combater a varíola com os próprios recursos. Tendo aprendido a produzir a vacina ele passa a imunizar a população pelo sertão a fora, montado em um cavalo, tenta barrar a proliferação da doença. Vacina esta que foi descoberta em 1796, pelo médico inglês Edward Jenner. Este fato repercutiu por todo o mundo civilizado, que há séculos perdiam vidas por conta da varíola.







Crédito: Seara da Ciência
Pedro Magalhães (Professor da Faculdade de Medicina da UFC)


segunda-feira, 25 de fevereiro de 2019

Crônica O telefone

O telefone chegou ao Brasil em 1877. O primeiro aparelho foi fabricado nas oficinas da Western and Brazilian Telegraph Company, especialmente para D. Pedro II. Foi instalado no Palácio Imperial, no Rio de Janeiro. Dois anos mais tarde, em 15 de novembro de 1879, era feita a primeira concessão para estabelecimento de uma rede telefônica no Brasil. Quem ganhou a concessão foi Charles Paul Mackie. Mais um ano, e estava formada a primeira companhia telefônica nacional, a Telephone Company of Brazil, criada em 13 de outubro de 1880. Em 1883, a cidade já tinha cinco estações de mil assinantes. A primeira linha interurbana também é de 1883. Ligava o Rio de Janeiro a Petrópolis. A novidade logo se espalhou para o resto do País. A primeira concessão para outros estados foi realizada em 18 de março de 1882. Foram atendidas as cidades de São Paulo, Campinas, Florianópolis, Ouro Preto, Curitiba e Fortaleza
 
"Tem dia que amanheço com vontade de escrever, conversar, contar histórias hilariantes de quando eu era bem jovem e também algumas até depois de adulto bem entrado nos "junhos". Este tal de computador em muito colabora para isto. Por falar em computador, lembrei-me da internet, que coisa boa, fantástica! No meu tempo de jovem não havia nada disto, para se escrever era no lápis ou na máquina de escrever. lepo, lepo, lepo...
Vocês bem sabem, a comunicação era feita através de telegramas, cartas e até recados, era tudo muito demorado, mas já havia naquele tempo os tataravôs dos internautas. Era o "correspondente", a gente se correspondia com moças do Rio de Janeiro, de São Paulo, do Rio G. do Sul, e de muitas outras plagas, era "chique". Acredite, este vai e vem de cartas deu até casamento... Eu mesmo conheço um caso. Telefone, pelo menos do meu conhecimento só prestava mesmo o local. Lembro-me que havia aqui em Fortaleza uma empresa estrangeira, parece que seu nome era "International" (ITT)*, que fazia ligações nacionais e internacionais. Certo dia, recebemos um telegrama via "Western" (companhia estrangeira de telegramas), de meu tio Neige, irmão de minha mãe que morava em Belo Horizonte "avisando" que ia telefonar dia tal, hora tal via ITT. Dia e hora aprazados, fomos lá, o papai, a mamãe e eu, para o posto da ITT lá na rua Castro e Silva, após quase uma hora de espera, por fim a porta se abriu e um jovem alourado meteu a cabeça para a sala de espera e respeitosamente disse:

-Mr. Júlio e senhora, cabine nº 1, "please" !
Eu achei aquilo muito bonito, ave Maria!

Lá se foram, entraram na cabine e aí começou a gritaria. Primeiro minha mãe, depois o papai. Eu quase fiquei preocupado... Por fim saíram, agradeceram ao "gringo" e já na calçada, meu pai parou e perguntou:

-Você entendeu alguma coisa?
-Quase tudo...E você?
-É... Entendi que ele vem em janeiro.
- Em fevereiro, Júlio!

Na nossa casa, ali na rua Tereza Cristina tinha telefone, era uma extensão da beneficiadora de sal, Usina União. De minha mãe lá pra casa, o nº era 4424. Tempos depois meu pai comprou um telefone para nossa residência, seu número, 8677. Aí estava, pelo menos para mim, se iniciando uma era de "contatos imediatos" com namoradas e amigos, se incluído ai os ''trotes", alguns famosos.

O tempo passou e quando eu já morava na Avenida do Imperador, certo dia recebi um telefonema de uma jovem, de voz muito meiga, dizendo ela que realmente não me conhecia e que havia "pescado" meu nome de um caderno de "disparate" de uma amiga, por que havia me achado interessante. Caderno de "disparate" para quem não sabe, era um caderno onde a proprietária do mesmo pedia para seus amigos e amigas respondessem ali, mil e umas perguntas feitas ao longo de inúmeras páginas, algumas até indiscretas para a época. Ser convidado para responder um caderno de "disparate" era uma verdadeira lisonja. E conversa vai conversa vem, estes telefonemas duraram muitos dias, o fato é que ela nunca me forneceu o número do telefone dela, sempre dando desculpas esfarrapadas que o pai ou os irmãos podia atender e isto podia complicar. Naquela época Fortaleza já possuía alguns "point" mais ou menos chiques: as tertúlias do Maguari aos domingos, as do Náutico durante as férias, dia de quarta feira. 

Fachada do Bar do Anísio. Acervo Roberto Aurélio
Na Beira-mar recém-criada, tinha os bares, o Bem, o bar do Anísio, o Baiuca, do meu amigo Nilbio Portela. Além destes, contávamos ainda com o Lido, restaurante muito chique e o Tony's, bar e sorveteria da moda. As praias eram a do Náutico, a "piscininha" da praia de Iracema e a do Lido. Pois bem, um belo dia esta jovem que se dizia chamar-se Suely telefonou-me e disse que ia sair com umas amigas para a casa de uma colega que estava aniversariando, e de lá iriam dar uma esticada até o Anísio, e perguntou se eu não queria ir até lá para nos conhecermos. Estranhei um pouco, porque moça sair assim de turma era raro, mas a "liberdade" estava começando. Fui. Lá encontrei meu amigo Ferraz. Estava só, sentei-me com ele e pedi uma dose de cuba libre, e logo passei a relatar o motivo de minha presença ali. Não demorou muito chegou um grupo de moças e ocupou uma mesa não muito longe da nossa. Aí o Ferraz disse:

- Não olhe agora, mas na mesa logo ali ao lado acaba de chegar umas seis moças.
-Que tal elas são?
- Não dá pra ver, mas são pessoas de "linha".

Logo começaram a nos observar e a rir, no que nós correspondíamos. Não demorou uma delas levantou-se, e o Ferraz observou:

- Lá vem ela!
Dei uma olhada de relance e logo fiz a análise: não era nada daquilo que ela falou, embora tivesse um rosto simpático. Era determinada. Acercou-se de nós e atacou:

-Qual de vocês dois é o Clóvis?
Meu companheiro adiantou-se e disse:
- Eu sou o Ferraz.
E mais rápido do que imediatamente eu me apresentei:
- Eu sou o Paulo.

A jovem pediu desculpas e foi se afastando, quando o Ferraz que era bastante enxerido, disse:

- Se você quiser mudo de nome... Ela se deu calada por resposta.

Depois ela ainda ligou umas duas ou três vezes, justifiquei minha falta ao encontro e disse que ia viajar para o sertão onde ia passar as férias. Foi a última vez que conversamos.

Depois desta e de outras mais, eu prefiro ficar sonhando como o Nelson Gonçalves em Escultura:

"Cansado de tanto amar, 

Eu quis um dia criar
Na minha imaginação, 

Uma mulher diferente,
De olhar e voz envolvente 

Que atingisse a perfeição.

Comecei a esculturar 

No meu sonho singular 
Essa mulher fantasia.
Dei-lhe o nome de Dulcinéia, 

A malícia de Frinéia,
E a pureza de Maria,

Em Gioconda fui buscar
O sorriso e o olhar,
Em Du Barry o glamour. 

E para maior beleza
Dei-lhe o porte de nobreza
De madame Pompadour.

E assim de retalho em retalho
Terminei o seu trabalho, 

O meu sonho de escultor 
E quando cheguei ao fim 
Tinha diante de mim,
Você, só você meu amor".

Conselho de amigo experiente: nunca arrisque encontros respaldados na descrição que a pessoa faz de si mesma, ou na imagem que você formou da pessoa a ser encontrada. É melhor ver para depois marcar o encontro.

Clóvis Acário Maciel





*Firma americana International Telephone & Telegraph (ITT).

sexta-feira, 12 de maio de 2017

O Roqueira - Ceará Moleque


Ainda se conserva, entre os antigos de Fortaleza, uma vaga reminiscência da festa do Dia dos Rei, que se efetuava na Igreja do Rosário.
Festa de pretos, mas levada com grande pompa e luxo, as negras escravas ostentando grossos cordões de ouro, brincos e joias de valia, que suas bondosas senhoras lhes emprestavam para que se apresentassem com o espavento e brilho exigido pela importante cerimônia da missa e coroação dos reis.


Conserva a tradição a fama destas festas e recorda o poder despótico de que os reis ficavam investidos nesses afastados e famosos dias: podiam dar ordens a quem quer que fosse, prender ou soltar qualquer dos seus súditos; e conta-se de que um deles que, para mostrar para quanto prestava, mandara amarrar em um poste, no pátio de Palácio, um pobre negro com o olho para o sol.


Imagine-se o que faria esse Pedro Cru africano com os seus senhores se, pelos vaivéns da sorte, viessem, um dia, a ser seus escravos!
Um negro malcriado e pernóstico viveu aqui, lá pelos anos de 1840; e como gozasse de certa influência entre seus pariceiros foi escolhido rei mais de uma vez.
Porque tinha o nariz grande e as ventas muito acesas, era conhecido por 'venta de roqueira', ou, simplesmente, Roqueira.

Segundo os bons exemplos dos homens de então, tinha em casa a sua Marcela, teúda e manteúda. Não temos certeza de que fosse escravo; mas, pelo que vai a seguir, parece-nos que era negro forro.
Certa vez, tendo sido eleito rei, pediu a Antônio Antunes, poeta malicioso e satírico, que escrevesse um discurso laudatório, para ser lido logo após a missa solene.
Antunes, que não era gente e concentrava em si espírito do Ceará-moleque, irreverente e acanalhado, compôs uma versalhada exaltando a "Sua Majestade".
Chegado o momento oportuno, começou a ler os versos, perante a corte e a assistência.

Roqueira, assentado no trono, de coroa na cabeça, tendo ao lado a sua rainha, impava de satisfação e de orgulho.
Antunes continuava, muito sério, a desenvolver, em meio à aprovação ingênua dos pretos e fingida dos brancos, a lista de virtudes e qualidades do monarca.
O penúltimo verso, infelizmente, a tradição não conservou, mas, ainda mais do que os outros, exaltava o rei. O último porém, dizia assim:

Para mostrar que sou rei,
Marcela me ponha nu,
Toque-me fogo no ...;
Verão que estrondo darei.

Por pouco a igreja não desabou ao troar da gargalhada que se seguiu. Um escândalo!
A alusão ao apelido era clara.  Roqueira não perdeu o aprumo; mas todos viram que ficara "reinando" (os nossos antigos empregavam o verbo reinar no sentido, também, de se estar impando de raiva, mas em silêncio).
Quando a festa terminou, Roqueira agradeceu, com um riso amarelo, os cumprimentos dos que se iam. Passados dias, Antunes levava uma derreadela de pau, que o deixara bem convidado.
Era a vingança de Roqueira.
Conta John Lingard, na sua History of England, que certo rei inglês mandara açoitar um poeta que fizera uns versos menos respeitosos e alusivos a Sua Majestade.
Aplicado o castigo, dissera o soberano aos cortesões: "Vejam com isto, estes poetastros, a sorte que os espera se ousarem menoscabar o rei  de Inglaterra".

Roqueira não sabia disto, porque, se soubesse, teria carregado a mão ainda mais; e se Antunes conhecesse o fato, teria tido mais cuidado com a língua porque, ainda naqueles tempos, era perigoso debicar um poderoso, embora fosse ele rei de um só dia.

05 de janeiro de 1938


Fonte: Livro Fortaleza Velha de João Nogueira - 2ª Edição - 1981

quarta-feira, 9 de março de 2016

Das antigas - Vacinogênio Rodolfo Teófilo


 Vacinogênio Rodolpho Theóphilo - Assis Lima

"O Pirambu ainda não existia, embora no Álbum de Vistas publicado em 1908, nos mostre a Praia Vila dos Pescadores, que ficou constatado como Arpoadores. A urbanização do Grande Pirambu só viria com a seca de 1932, onde passaram a existir campos de concentração, e com a segregação dos retirantes, formou-se um povoado, mas com a coisa ainda desordenada. Foi graças ao empenho do Padre Hélio Campos, que a coisa tomou formato, e o bairro foi urbanizado. Bom, até então a filantropia permeava no Aldeamento Moura Brasil. Foi lá onde Rodolfo Teófilo, voluntariamente realizou sua missão em ajudar o próximo.


 Praia do Arpoador - IBGE

Foi construído bem próximo da linha do Bonde do Jacarecanga, o Vacinogênio Rodolfo Teófilo, de onde ele podia melhor assistir a grande demanda, no Morro do Moinho* no Jacarecanga.
A avenida na época denominava-se Tomaz Pompeu, mas que com a extinção dos bondes em 1947, o trecho fora reformado e passou a levar o nome do industrial Pedro Philomeno Gomes, bem como a Rua Tijubana ficou como Francisco Lorda. A Rua Senador Alencar que ia até o inicio da Vila Operário da Fabrica São José, fora interrompida.


Cruzamento da Avenida Francisco Sá com a hoje Avenida Filomeno Gomes. Nirez

Com a inauguração de mais hospitais em Fortaleza e leprosários, o Vacinogênio foi desativado, servindo o prédio por sua assepsia como uma espécie de necrotério. Depois com a derrubada de casas, tanto pela Estrada de Ferro, como a pedido da Prefeitura para aumentar o Cemitério São João Batista, a casa ficou como depósito de material de construção. O autor destas linhas ainda alcançou essa edificação que desapareceu, junto com uma casa de Força da Companhia Light em 1969. Tudo hoje é o muro do Cemitério."

Assis Lima
(Radialista/Escritor)

*Morro do Moinho: Local hoje onde se encontra o Instituto Médico Legal (IML)

segunda-feira, 26 de outubro de 2015

Raras imagens de Fortaleza em 1963


Reportagem exibida pela extinta TV Tupi em 1963. 
Vemos lindas imagens sobre a nossa cidade. 
Infelizmente o áudio está corrompido, mas vale cada cena!!!



Agradecimento mais que especial a amiga Isabel Pires

terça-feira, 29 de setembro de 2015

O famoso Cabaré da Leila



Em
Sábado, Estação de Viver - Histórias da Boemia Cearense, o historiador Juarez Leitão recupera o passado da cidade, no que tange a vários aspectos, inclusive à vivência da noite, da boemia, do cultivo do sexo, deixando à mostra as personagens que compunham uma Fortaleza alegre, doidivanas, noctívaga, e, nesse contexto, detalha a experiência pessoal de Leila (Foto ao lado)¹ e seu papel na caracterização de uma urbe numa época anterior à revolução sexual.


Já nos finais dos anos 60, e por toda a década de 70 o melhor cabaré de Fortaleza era a CASA DA LEILA, na Maraponga*. Suas mulheres eram altas, elegantes, muitas, louras naturais de olhos claros. Vinham do sul do país, de Santa Catarina, do Paraná e do Rio Grande do Sul. Tudo gente fina, educada, algumas se diziam universitárias e comentavam coisa de política, música popular e variedades culturais. Dentre elas havia uma mulata, alta, belíssima, chamada Mércia, que mostrava uma carteira de estudante em Ciências Sociais da Universidade Federal de Minas Gerais. Nesse tempo havia um vendedor ambulante de livros, o Curió, que assegurava ter vendido várias coleções e enciclopédias às meninas da Leila. Umas intelectuais? (...)



Leila fora a mulher de mais sucesso da Oitenta**. Ali angariara bons e generosos amigos, ganhando condições para montar sua própria casa. Casarão amplo, com alpendres, arcadas, grande salão com dois ambientes, confortáveis sofás, mulheres com roupas habillées, falando baixo, sorrindo. Educadíssimos também eram os garçons, sobretudo o Oliveira, todos de smoking, trazendo a bebida em bandejas de prata. Um primor. (...) 

O baronato de Fortaleza se orgulhava de contar com uma casa de tão alto nível e quanto aqui aportavam cantores, jogadores famosos e artistas de TV, todos, invariavelmente, eram levados à Leila.

A famosa Leila. Crédito: Valeska Ferreira

Mas até a fidalga Leila entrou em decadência. Envelhecida foi abandonada pelos amantes ricos, e terminou por se apaixonar por um de seus garçons, acho que o próprio Oliveira, O cabaré resvalou, rápido, para o fim. Veio o diabetes, vieram as desditas. Restava-lhe por último um apartamento no Edifício Champs Elysées, na Aldeota, onde morava sua filha adotiva, Kátia. Resolveu vender o imóvel e ir embora para o Rio de Janeiro. O genro e a filha não concordavam e entraram com mandato na justiça para impedir a transação. Revoltada com a ação dos parentes, Leila saiu pelas ruas e ficou perambulando pela Praia de Iracema, dormindo ao relento. Quando encontrava um conhecido, pedia um auxílio, mas não aceitava conversar sobre seu drama. Alertada do paradeiro da mãe, Kátia foi apanhá-la. Estava muito doente e precisava ser hospitalizada. (...) ...fechou-se num mutismo com claros sinais de depressão. (...) Destruiu seus álbuns de retratos e não quer falar nada de sua vida. (LEITÃO, 2000, p. 247)

Leila, que não mais está entre nós***, poderia ter tido ou ter sua vida narrada em um romance: tantos textos ficcionais trazem a figura da prostituta para o centro da cena. A Margarida, de A Dama das Camélias, de Alexandre Dumas Filho, Lucíola, de José de Alencar, Nana, de Émile Zola, bem como a Léonie de Aluísio Azevedo, em O Cortiço. Se o esplendor e as misérias de sua biografia não cobrem, porém, detalhadamente as páginas de nenhum livro, em compensação sua presença nos registros sócio-históricos, como os aqui transcritos de Juarez Leitão, é como uma chave para a decifração de como as posturas diante do sexo são fatores importantes para entender a vida em sociedade.

Impossível falar do famoso cabaré, sem lembrar do saudoso humorista Espanta:



¹ O nome verdadeiro de Leila, de acordo com um de seus vizinhos, era Geralda:

Conhecia a Dona Geralda (nome verdadeiro da Leila) pois morávamos no mesmo prédio, localizado no encontro das ruas Costa Barros e Antônio Augusto. Ela andava num Opala Diplomata verde metálico, ela mesmo dirigindo. Morava bem e costumava não receber pessoas em sua casa. Uma mulher muito elegante, educada e caridosa. Teve uma época que uns amigos passaram um sufoco e ela abriu as portas de sua casa e os abrigou até que fosse resolvido o problema. Ela era uma pessoa muito respeitada no condomínio e todos gostavam muito dela" Mário Parente

Antes era a casa do Dr. Pontes Neto.

** Ainda de acordo com o pesquisador Juarez Leitão, o nome Oitenta devia-se “ao número da casa, na rua Governador Sampaio, 80. Era uma casa de certo nível com luz negra, suítes e bom serviço de bar. As mulheres era atraentes, bonitas e já não tinham restrições ou tabus.”.(LEITÃO, 2000, p. 247)

*** Ouvi dizer que a famosa Leila morreu em 1998 de câncer, mas conforme depoimento de Marcos Alves, ela faleceu de complicações vasculares:

"Leila morreu de complicações vasculares, inclusive teve sua perna amputada no IJF. Não lembro ao certo se era diabética, pois faz muitos anos que a tratei no IJF"



Observação: Se você tem foto da Leila, de suas "meninas" ou do seu cabaré, colabore com o site (a foto será creditada, claro!) e envie para: fortalezanobre@gmail.com



Crédito: COUTINHO, Fernanda - Maraponga (Coleção Pajeú) - 2014
Desenho da ilustradora de moda Laura Laine




segunda-feira, 10 de agosto de 2015

A Fortaleza da década de 70 em vídeo


Vídeo maravilhoso, onde vemos nossa Fortaleza Nobre em 1973.
Uma relíquia, sem dúvida!

Crédito: Joice Nunes



"Chorava, ainda criança, sempre que via os álbuns de casa. "Mãe, por que tu foi pra essa festa sem mim?", perguntava inconsolada. "Mãe, cadê essa roupa? De quem era essa casa? O que era essa bebida no teu copo?". Acho que imagem parada não era suficiente. Eu queria a legenda, o contexto, ouvir o resto daquela gargalhada que meu pai escancarou em 1973. A música que saia daquela roda de seresta. "Mas você não era nascida ainda", respondia minha mãe. Mas não tinha jeito. Queria abraçar Milena criança pra ela desfazer aquela tromba de abuso. Queria não ter perdido um segundo. Queria ver em movimento a Fortaleza onde meu irmão nasceu."       Mariana Marques

sábado, 13 de junho de 2015

Sindicato dos Portuários - Meu Baú de Memórias - Patrícia Borges (Parte II)


Lembram que falei que o baú de memórias da Patrícia Borges era recheado de relíquias? Não?
Vejam AQUI.
Pois é, não tinha como postar todas as preciosidades numa única postagem, por isso tive que dividir! :)
Divirtam-se!


Em pé, vemos Vital Félix de Souza







 






Sr. Silveira (em pé), já foi presidente do Sindicato.






Aproveito para compartilhar com vocês algumas notícias sobre o Sindicato:




 

Continua...

Sobre as fotos da Patrícia, quem souber algo a respeito dos eventos, reconhecer alguém nas fotos ou alguma autoridade, escreva nos comentários, assim, juntos vamos desvendando essa história, ok?

E se você também tem fotos relíquias e gostaria de vê-las aqui no Fortaleza Nobre, basta enviar para fortalezanobre@gmail.com 


Leia também: A Greve dos Portuários


quarta-feira, 22 de abril de 2015

Fortaleza antiga - Assassinato de José Nogueira


Em 1914, não havia no Ceará quem não conhecesse o Instituto de Humanidades, do Professor
Joaquim Nogueira
. Capaz de rivalizar com outros importantes centros educacionais da região, como o Liceu do Ceará, a Escola Normal ou o Ginásio São Luiz, o Instituto tinha como característica mais marcante a engenhosidade de seu diretor em criar novos métodos de aprendizagem. Assim, dificilmente deve ter havido alguém no Ceará que não tivesse ouvido falar da dor de Joaquim ao perder seu único filho, José de Mendonça Nogueira, assassinado aos 22 anos.

Joaquim Nogueira conheceu um desespero só externado
em outras grandes tragédias. Um sofrimento sem medidas, sem limites e sem pudores, tendo como cenário a paisagem urbana de uma cidade em crescimento. Uma tristeza acima de qualquer palavra, e que no entanto começou e teve fim exatamente pela força das palavras,
quando Sixto Bivar, num final de outubro, acusou José de ser filho de um ladrão.




Instituto de Humanidades do Professor Joaquim Nogueira

A discussão não vinha daquele dia. Há muito estava se desenrolando uma carga desagradável de denúncias contra a Tipografia Escolar, da propriedade de José Nogueira, por parte da Firma Comercial H. Barroso, da qual Sixto era representante. A divida, no valor de 200 mil réis, se referia a despesas que teriam sido efetuadas em 1912, apresentando contas vencidas e não pagas. O professor Joaquim só veio a tomar conhecimento do fato no dia em que o filho foi parar na Delegacia de Policia, vítima de uma tentativa de agressão por parte de Sixto.


Cortejo até o cemitério pela então rua das Flores (Castro e Silva).
 Revista Fon Fon e Acervo Lucas

A Delegacia ficava na Praça do Ferreira, próxima ao Café Java, centro de concentração econômica, cultural e popular da cidade. “- O que há?" - perguntou Joaquim Nogueira ao filho, que estava calmamente sentado num sofá, alvo direto dos olhares da multidão curiosa. 


Conforme reconstituição minuciosa dos diálogos, relembrados no livro que fez publicar em maio de 1915, o filho tentou iniciar um relatório detalhado que o pai cortou com brusquidão:
Não quero rodeios. Diga a verdade”.

Multidão acompanha o cortejo fúnebre até o Cemitério São João Batista. 
Revista Fon Fon e Acervo Lucas

Chegada ao cemitério. Revista Fon Fon
A história não era muito longa, e envolvia exatamente uma questão iniciada seis ou sete dias atrás, na Libro-Papelaria Bivar. Sixto Bivar havia protelado para dezembro um pagamento devido a José, amparado numa pretensa divida assumida e não paga por Joaquim Nogueira.

Sixto não havia sido nada gentil. Chamara José de “tapado”, o pai de “gatuno”, e o rapaz só não o agredira graças à intervenção de uma terceira pessoa, presente à discussão. Talvez uma semana houvesse se passado até aquele encontro casual entre os dois, numa tarde quente do dia 28 de outubro, em que José aproveitara para tentar tirar a limpo a acusação.
“-Sixto, você me deve uma satisfação pela injúria que atirou a meu pai”, teriam sido suas palavras. “- A satisfação é essa”, respondeu Sixto, sacando um revólver do bolso e apontando-o para um mais que surpreso José, que no entanto ainda teve presença de espirito para agarrar-se a seu agressor, dar-lhe uns tapas e desviar a arma para o outro lado.

Cemitério lotado. Revista Fon Fon

Os pais visitando o túmulo do filho em 1916. Revista O Malho. Acervo Lucas

“- Um revólver! ”, gemeu o pai espantado, custando a crer que uma discussão sem base tivesse posto em risco a vida de seu único e muito amado filho. Para desassossego de Joaquim, o filho foi liberado juntamente com seu agressor, já que eram, no dizer do escrivão Olegário“dois rapazes de família”. As preocupações de Joaquim Nogueira foram de ordem prática: levar o filho de volta a casa e conseguir o mais rápido possível um advogado que o assistisse num processo contra Sixto Bivar.




Salão do Clube dos Diários frequentado por José Nogueira

Com a tranquilidade da juventude, José não parecia muito preocupado com o fato. Naquela noite, apesar de ser o aniversário do pai, não tinha razões para ficar em casa. Havia primeiro o ensaio do Grupo Dramático João Caetano, ao qual pertencia há algum tempo, e mais tarde a festa promovida pelo Clube dos Diários, que no dia 19 completara seu primeiro ano de funcionamento.


E na calçada do Clube dos Diários, no “sereno” de uma festa que não chegou a terminar...

O pai, ao contrário, estava bastante aflito. Mas preferiu ignorar os apelos da esposa, Olivia de Mendonça Nogueira, que queria ver o filho longe da cidade o mais rápido possível. Dentro de casa, de volta a um ambiente de normalidade, a crise emocional que agitou a família foi rapidamente resolvida. José tranquilizou os pais e saiu. Joaquim tomou o bonde disposto a percorrer praças, avenidas, cinemas e cafés à procura de seu amigo Raimundo Ribeiro, advogado, para resolver de vez a questão. Apesar de apreensiva Olivia foi à casa de sua vizinha, discutir os acontecimentos do dia.


Dia de Finados - Comissão do Clube dos Diários (à esq.) e do grupo dramático João Caetano (à dir.), prestam homenagem em frente ao túmulo. Revista Fon Fon

Ela foi a primeira a se inteirar que algo de muito errado estava prestes a ocorrer. Um pouco depois das 8 e meia da noite, Sixto Bivar cruza a calçada onde ela se encontrava conversando com a amiga, e dirige-se à porta aberta da casa de Joaquim. Um bico de gás incandescente, aceso na sala, recorta a silhueta tensa do inimigo de seu filho. Olivia ergue-se, sem escutar os gritos da amiga preocupada com sua segurança. Com a mesma rapidez com que apareceu Sixto sumiu, aproveitando a escuridão da estreita passagem que ligava a rua à Praça dos Voluntários. Olivia deu a volta no quarteirão, pelas ruas do Rosário e Pedro Borges, e não avistou mais o vulto temido. Pensa em levar o caso ao Posto de Polícia, mas teme o ridículo de estar fazendo um drama de um fato sem grande significado. Um pouco mais tarde resolve recolher-se para dormir, mas não antes da aproximação de dois meninos, em desabalada carreira, à procura de Joaquim Nogueira para uma conversa particular. A esta hora, seu filho já estava morto. 


Praça dos Voluntários

Joaquim, por sua vez, esperava o bonde numa esquina da Praça, para voltar para casa, quando percebeu que muitas pessoas o cercavam com curiosidade. A noticia da morte correra veloz, mas foi preciso um guarda civil chegar até ele e disparar à queima-roupa as palavras que nenhum pai deveria ouvir: 
 Mataram seu filho.

Todo este longo e doloroso relato foi escrito pelo próprio punho do professor, e publicado no jornal "Folha do Povo" a 15 de dezembro de 1914. Encarando de frente a morte do filho, Joaquim Nogueira mergulhou fundo na análise dos fatos, procurando as razões para um gesto
tão sem sentido. No dia de seus 48 anos, ele e a esposa ficaram de repente privados do único filho que tiveram, daquele em quem depositavam tantas esperanças e tanto afeto. O imenso desespero sentido foi canalizado para um movimento solitário de deixar sempre viva a imagem do filho, o que se concretizou na publicação de um emocionante livro dedicado ao rapaz.

Prometia muito, o jovem José. Desde pequeno, com seu traje de marinheiro, sabia manter a mesma expressão concentrada das fotografias posteriores, braços e pernas disciplinados ao comando do retratista de sua infância. Com 12 anos José prestava serviços de aluno auxiliar no internato do Instituto de Humanidades, mantido pelo pai.




Foto ao lado: Jornal Nortista de 1914

Aos 18 já era proprietário da Tipografia Escolar, um presente paterno de enorme responsabilidade, que complementava com a representação das mais vendidas revistas nacionais e estrangeiras do tempo.
Fon-Fon, O Malho, Careta, Revista da Semana, O Tico-Tico, Ilustração Brasileira, as delícias dos leitores brasileiros, chegavam todas ao Ceará pelas mãos interessadas de José Nogueira.

O teatro, através do Grupo Dramático João Caetano, centralizava o interesse de José na arte da representação. E a fotografia, uma curiosidade de grande penetração, era também outro foco a atrair a atenção do incansável José, que desde os 15 anos empregava no aperfeiçoamento desta arte muitas horas de lazer, fazendo do próprio rosto o modelo para novas experiências com ângulos e luzes.

Hermann Lima o conheceu por volta de 1913, na Fotografia Olsen, e o chama de “primeiro amigo" num capitulo das memórias “Poeira do Tempo" (José Olympio, 1967): 

“Rapaz de simpatia fascinante, pouco mais do que adolescente, vivo, alegre, espirituoso, duma beleza viril e duma elegância fácil, a que as boas roupas de casimira inglesa acentuavam o charme natural, José Nogueira era um príncipe encantado”.

Assim o escritor se referia a ele, numa admiração não reduzida pela passagem do tempo. “Era adorado pelas moças, do mesmo passo que amigo de quase todos os rapazes da alta roda, que ele frequentava como sócio dos melhores clubes da terra: o Iracema e os Diários”.

E na calçada do Clube dos Diários, no “sereno” de uma festa que não chegou a terminar, deu-se o encontro entre os dois rapazes. Seis tiros selaram a sorte de José, ensanguentando sua camisa, manchando o chão de pedra, sua queda repercutindo no Brasil e em todos os lugares onde o pai conservava amigos.

A noticia do crime foi publicada nos jornais de Fortaleza, em revistas no Aracati, publicações de Sobral e Baturité, atravessou o Estado rumo ao Sul para chegar ao Rio Grande do Norte, Paraíba, PernambucoAlagoas, chegou à Bahia, Espirito Santo, às revistas cariocas que representava. Foi noticiada em Minas Gerais, São Paulo, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Para o Norte, a morte de José foi lamentada no MaranhãoPiaui, Belém, Território do Acre, e atingiu Portugal, Espanha, FrançaItália, Honduras, Venezuela, Argentina e Uruguai.



De todos os lugares vieram telegramas, cartas e cartões de pêsames, no papel tarjado de negro exigido pela etiqueta da dor. Desde o dia seguinte ao crime, 29 de outubro, até o mês de janeiro, a correspondência do luto foi incessante. Enviaram seus sentimentos amigos como Francisca Clotilde, Ana Facó, Carlos Câmara, Rodolfo Teófilo, Júlia VasconcelosBeni Carvalho, Padre Bruno Figueiredo - mais tarde Monsenhor Bruno -, Antônio Bezerra, Alba Valdez, Antônio Sales, Dolor Barreira, Cruz FilhoBarão de Studart.

No dia do sepultamento assinaram o livro de presença 1.297 pessoas, um imenso cortejo enlutado, repartindo com os pais a perda do filho, numa cerimônia dolorosa que parou a cidade. Com tudo isto, Joaquim Nogueira não conseguiu a condenação do assassino de José.
Talvez o fato do patrão de Sixto, Hermínio Barroso, ser no momento Secretário da Fazenda, e mais tarde Secretário do interior, tenha pesado de alguma forma para o veredito emitido pelo júri no dia 9 de março de 1915. Pelo menos esta era a justa suposição de um pai revoltado, descrita explicitamente em publicações posteriores.

José de Mendonça Nogueira passou a ser parte da história do Ceará, graças ao incansável esforço de seu pai na busca de uma justiça que não o atendeu.


Fonte: A História do Ceará passa por esta rua. Vol. II de  Ângela Barros Leal, Biblioteca Nacional e pesquisas diversas.

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