Fortaleza Nobre | Resgatando a Fortaleza antiga : Geraldo Duarte
Fortaleza, uma cidade em TrAnSfOrMaÇãO!!!


Blog sobre essa linda cidade, com suas praias maravilhosas, seu povo acolhedor e seus bairros históricos.

 



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sexta-feira, 15 de junho de 2012

Soldado Luiz Gonzaga


Soldado Luiz Gonzaga

“Passou pelo Crato e depois Fortaleza, no Ceará, onde serviu no 23º Batalhão de Caçadores. A tensão política que precedia a Revolução de 30 acabou levando Gonzagão e uma parte de seu batalhão para a cidade de Souza, na Paraíba, onde permaneceram por pouco tempo.”
João Marcelino Mariz

Como Tenente, servia no 23º Batalhão de Caçadores. Designado, juntamente com dois sargentos, organizávamos a festa de confraternização natalina do Quartel. Solicitamos sugestões a todos. Transcorria dezembro de 1968.

Das manifestações, uma mereceu atenção maior. Veio de sargento da Banda de Música. Convidar o ex-Soldado Corneteiro 728, Bico de Aço, para cantar e encantar as famílias dos praças e oficiais.

Na ocasião, não me ative aos detalhes do número, nem do apelido do cantante sugerido. Chamei o músico para indagar a respeito. Solicito e contente pela atenção, não somente informou de quem se tratava como discorreu a respeito.

Referira-se a Luiz Gonzaga do Nascimento, nascido na Fazenda Caiçara, em 13 de dezembro 1912, Exu, Pernambuco, filho de Januário José dos Santos e Ana Batista de Jesus. Ninguém menos do que o famoso e conhecido Luiz LuaGonzaga – o Rei do Baião.

23º Batalhão de Caçadores

Fiquei atônito. Como conseguir tal? O sargento, cujo nome me foge à memória, disse que, mesmo não sendo amigo íntimo do Gonzagão, seu empresário no Ceará era o mesmo que apoiava o conjunto musical dele e poderia conseguir. O coronel João Olímpio Filho, então comandante do Batalhão, aprovou a idéia. Convidar o inigualável sanfoneiro, prestar-lhe homenagem como ex-Soldado do 23 BC e entregar-lhe uma placa de prata registrando o evento.

Dias depois, veio a confirmação da presença. Luiz Gonzaga compatibilizaria ida a Natal, Rio Grande do Norte, com vinda a Fortaleza. Estabeleceu a data e horário. Este, entre 17 e 19 horas. Tudo acertado, nem acreditávamos em tão grandioso acontecimento. Cívico, fraterno-cristão e artístico. 

 
O soldado Luiz Gonzaga posa com sanfona na banda de música do quartel do Exército  - Tokdehistória

Estávamos todos enganados quanto à alegria. Não éramos nós os mais felizes. Luiz Gonzaga suplantou a todos. Emocionou-se grandemente. Riu, chorou, cantou, agradeceu e, até, pilheriou. 

O apresentador, por duas vezes, disse que ele estava “contaminando” os presentes. E ouviu, em tom descontraído: “Menino, contaminação para mim é de doença, muda a rima!” 

Hoje, no Oriente Eterno, deve estar cantando “Acácia Amarela”. Mais uma vez, obrigado inesquecível Rei Luiz Gonzaga!

Geraldo Duarte


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Crédito ao querido amigo Geraldo Duarte, que é advogado, administrador e dicionarista.

Gran Circo Español



Final das tardes. Por mais de uma semana. Garotos e adultos esperavam a passagem do bloco alegre anunciador da novidade. À frente um palhaço com trajes coloridos, simulada calva, colarinho e cintura da calça exageradamente grandes, a cambalhotar e pilheriar. Um anão, um disfarçado em gigante com pernas de pau e uma moça trajada de bailarina, montada em cavalo branco, guiavam o cortejo completado por adolescentes. 

A animação tomava conta do grupo. Cantilenas humorísticas e satíricas do provocador de risos eram respostadas em refrãos pelos acompanhantes, ganhadores de entradas gratuitas.

Acervo do colecionador Luís Cubo

Das portas das casas e calçadas, a curiosidade pública assistia ao alegre desfile anunciador do “maior espetáculo de todos os tempos, com produção espanhola e artistas famosos”.

Parangaba e bairros vizinhos receberiam o grandioso acontecimento circense jamais visto, segundo panfletos de precária impressão, em papel-jornal, distribuído de mão em mão.

Acervo do colecionador Luís Cubo

Chegado o dia da estréia. Mesmo não sendo grande como os circos Garcia, Nerino e Vostok, que raramente vinham a Fortaleza, empolgava o público espectador. 



Espetáculo dedicado às Forças Armadas em Fortaleza, 1945 / Foto Acervo Circo Nerino

Circo Nerino na Praça Clóvis Beviláqua, em 1933 / Foto Arquivo Circo Nerino


Tecido de inferior qualidade, substituto da lona, circundava a arena. Coberta não possuía. Cadeiras, em volta do picadeiro, vinham das casas do respeitável público. As arquibancadas – gerais, como denominadas, – formavam-se por tábuas, escalonadas em níveis diferenciados e fixadas sobre cavaletes. 


Imagem meramente ilustrativa

Uma espécie de tenda servia para acesso dos artistas e, também, de palco. 

A denominação Gran existia no entusiasmo, Circo, no fazer acontecer da magia mambembe e, Español, na nacionalidade dos irmãos Gálvez, os proprietários.  

Foto de 1934 - Em destaque, um circo armado na Praça dos Voluntários

O palhaço com piadas, chistes, saltos e danças, era o artista maior. Trapezistas em piruetas no ar. Acrobatas e malabaristas no desafio à gravidade e ao equilíbrio. Contorcionista com flexibilidade corporal impressionante. Mágico na transformação do ilusório em quase realidade. E, ao final da função, uma peça teatral. Por vezes, ante as inexperiências dos atores, cenas tristes levavam a plateia ao riso. Era o verdadeiro circo de manifestação popular, espontânea.

Geraldo Duarte


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Crédito ao querido amigo Geraldo Duarte, que é advogado, administrador e dicionarista.

sexta-feira, 27 de abril de 2012

Postes e eleições



Poste de madeira em frente a casa. Esta casa localizava-se na atual Rua Conde D'Eu, ao lado da casa dos governadores, onde em 1932 foi construído o Mercado Central (o antigo, o atual é uma feira de regionalismos). Foi nesta casa que em 1824 refugiou-se o Padre Gonçalo Inácio de Loiola Albuquerque e Melo Mororó que ali foi preso e conduzido para a morte ocorrida no dia 30 de abril de 1825. Arquivo Nirez

Vários historiadores defendem ser cíclica a história e o cotidiano leva ao fortalecimento do princípio.

No período antecedente às últimas eleições municipais, a mídia divulgou declarações de políticos afirmando que o presidente da República, por sua popularidade, elegeria quem e o quê desejasse. Até mesmo um poste.

Como não aplicaram a Teoria de Garrincha, isto é, não combinaram com a outra parte – os eleitores – deram com os burros n’água. Seus postes continuam postes. Os índices apontados nas pesquisas não foram transferidos, escafederam-se.



Poste de madeira nos arredores da Estação Central - Século XIX

Em nossa Capital, anos sessenta e setenta do século passado, ao contrário do desejado na atualidade, foram os postes que elegeram os políticos. Isto mesmo, o ontem contrariou o desejo do hoje.

Um sempre lembrado ex-vereador e ex-diretor do Departamento de Iluminação da Prefeitura de Fortaleza, órgão então responsável pela instalação de energia elétrica, aliou-se a um ex-deputado estadual, não menos famoso, e produziram uma inédita e luminosa idéia eleitoreira.

Como nos subúrbios a maioria das ruas não dispunha de energia elétrica, pouco antes das eleições escolheram várias artérias de bairros periféricos, reuniram os moradores e garantiram que todos teriam o desejado serviço público em seus lares.

Quase às vésperas dos pleitos, caminhões da Municipalidade, carregados com os antigos postes de madeira, destinavam-se às ruas dos votantes e deitavam ao chão dois postes em cada quadra.


Poste de madeira na então Rua da Frente (Av. Beira-Mar) na década de 30 - Arquivo Nirez

Muitas alegrias e comemorações realizaram-se por conta do futuro benefício. Os postes estavam ali. Eram a garantia, pensava o eleitorado.

Os candidatos divulgavam atraso nas obras por conta da burocracia, entretanto juravam que logo após a eleição todos teriam a desejada luz nas casas e nas ruas. Tudo ficava na promessa e os postes eram recolhidos ao depósito municipal após elegerem e reelegerem a ambos, com votações de áreas sempre diferentes.

A lembrança restada da tramóia foi o apelido dado ao deputado, formado pelo designativo do sexo masculino, o sinônimo de madeira e a posição horizontal dos postes.



Crédito ao amigo e colaborador Geraldo Duarte (advogado, administrador e dicionarista)

quinta-feira, 26 de abril de 2012

Judas jipeiro



Acervo de Licínio Filho

Nas lonjuras do tempo, a queima ou malhação do Judas tradicionalizava-se.

O marchante Zé Gomes, em dias da Semana Santa, contratava costureira responsabilizada pela feitura esmerada de um boneco, que representava o apóstolo traidor. Com trajes modernos. Terno completo, gravata, lenço no bolso, sapatos, chapéu de massa, óculos Ray Ban e uma pasta de couro preta.

Véspera do Sábado de Aleluia. Forca armada. No alpendre, ocupando lugar de destaque entre os convidados, o nascido em Carioth, Sul de Judá. Testamento, em versos debochados, pronto para leitura. Cachaçada e tira-gostos à beça. O mais sóbrio confundia a Lua com o Sol.

Acervo de Licínio Filho

Relaxaram a vigilância ao desditoso. Daí veio outra tradição da data. Sorrateiramente, grupo de ladrões de Judas, furtou o cúmplice dos sinedritas.
Já madrugada, quando sentida a falta. Festeiros, sem rumo, deram-se a procura.

Há três quarteirões, o Jeep Willys, 1954, famoso “cara alta”, passava a noite em frente à propriedade do dono, Seu Osório. A algazarra dos bebuns o acordou e, pelas venezianas, vislumbrou os bagunceiros e algo mais preocupante. Um homem corpulento sentado no banco do guiador do 4 x 4.

Acervo Guilherme da Costa Gomes

Correu até o telefone. Discou 2874. Rádio Patrulha. E relatou o que vira.
“Um ladrão corpulento está tentando roubar meu jipe. Não consegue fazer ligação direta da ignição porque, à noite, eu retiro o rotor. Venham depressa!”

Acervo agmindaiatuba

Deu o endereço e aguardou. Como um raio, dois fuscas RP chegaram. Policiais armados cercaram o veículo. Alarido dos curiosos. Gritos de ordem dos agentes da lei. E o larápio impassível. Silente. Imóvel.

Era o Judas roubado. Judas jipeiro.


Crédito ao amigo e colaborador Geraldo Duarte 

quinta-feira, 8 de março de 2012

Bodega de um tudo

Diferenciada, a bodega de Antônio Firmino destacava-se. “Tem de um tudo”. Dizia o proprietário, também dessemelhante em hábitos mercantis. Enquanto concorrentes usavam gravura conhecidíssima na época, com figuras de “antes e depois”. Aquela, de um comerciante corpulento, bem vestido, exteriorizando riqueza e, a última, de um magérrimo, mal vestido e demonstrando pobreza. Nelas, os dizeres respectivos: “Vendi a dinheiro” e “Vendi fiado”. Antônio inovou com o letreiro: “Fiado foi até ontem.”.
Pouco mais de metro e meio de altura. Achaparrado e fanho. Jamais alguém o viu rindo, sem o chapéu, o slack de mescla azul e um palito permanentemente ao sabor da língua, dentes e lábios. Em movimento de um canto ao outro da boca. Certa feita, esse vezo levou-o à luta corporal. Freguês indagou-lhe se, depois de sair da latrina, ele continuava com o papel no local do uso. Mas, isso, é outra conversa. A nossa, vem agora.
O estranho entrou na mercearia, postou-se defronte ao fiteiro e ficou a olhar as mercadorias expostas. Carretéis e meadas de linhas, agulhas, zíperes, botões, dedais, sianinha e bicos. Brilhantinas Glostora, Royal Briar e Fixador Gumex. Colônias English Lavander, Leite de Rosas, Leite de Beleza e Perfume Coty. Pílulas de Vida do Dr. Ross. Óleo de Rícino, Limonada Purgativa, Aguardente Alemã e Violeta de Genciana. Afora um mundo de miudezas de armarinho.

O merceeiro, de olho no desconhecido, indagou-lhe se desejava alguma coisa. Resposta rápida. “Como dizem que aqui tem tudo, desejo uma bainha para foice.”. Réplica instantânea: “Tem as medidas?”.
O não esperado, veio, entretanto, dia seguinte, o encomendeiro trouxe a ferramenta e o bodegueiro firmou prazo de três dias para a entrega.
Colocou o instrumento sobre uma folha de papel, riscou seus contornos, com folga, e recortou dois moldes. Chico Sapateiro talhou-os em couro, uniu por costura a curvatura superior e, na inferior, colocou fechos de pressão.
A esperada gozação custou caro ao encomendador. E o dito “Tem de um tudo.” foi acrescido de “Até bainha de foice.”.


Texto do amigo e colaborador Geraldo Duarte do Diário do Nordeste


  • A Mercearia do Antônio Firmino existiu nos anos 50 e início de 1960. Funcionava onde hoje é a rua Rio Grande do Sul, entre as ruas Sergipe e Alagoas, no bairro Demócrito Rocha. Na época, o bairro denominava-se Vila Marupiara ou, mais usualmente, Marupiara. Era a mais sortida e diversificada em produtos da área.

Gafieira Rabo da Jumenta - Bela Vista




Março de 1971. Logo empossado chefe de gabinete da Secretaria de Segurança Pública, atendi a uma comissão de moradores do bairro Bela Vista. À frente, o padre Alberto Oliveira. Depois dos cumprimentos, o religioso expressou o objetivo da visita. Próximo ao templo da Santa Madre Igreja, instalara-se a Gafieira Rabo da Jumenta, “antro do pecado e da perdição”. Estabelecida em prédio abrigando, na frente, um bar, no centro, um salão de dança e, nos fundos, quartos para utilização horária pelos frequentadores. Funcionamento diário. Da boca da noite ao raiar do dia. Amplificador de som, com cornetas irradiadoras fixadas no alto de um poste, dirigindo som ensurdecedor aos quatro pontos cardeais e ouvidos dos paroquianos. Devido aos críticos e inflamados sermões do vigário, vieram às represálias. 

Nas madrugadas, os notívagos satisfaziam seus intestinos e bexigas nas portas da casa santa, afora ações solertes de intimidação e vandalismo. Em sequência, falou a coordenadora da Liga das Senhoras da Paróquia de N. S. de Sallete. Comparou o local a Sodoma e Gomorra. Sinalizador do fim dos tempos. Desencaminhador de jovens. Incentivador de vícios e de prostituição. Além de outras e mais outras acusações que se sucederam. O rosário de queixas continuou com o presidente da Associação dos Moradores denunciando os fumadores de maconha, tratados por “esquadrilha da fumaça”. O salão de danças, rala-bucho ou bate-coxa. O conjunto de cubículos para trocas de interesses íntimos, “matadouro”. “Embuchamento” de moças, coito de vagabundos e ponto de fuampas mereceram acerbadas e indignadas críticas do autoassumido líder comunitário. Com repetidos acenos de concordância e aprovação, os demais acompanhantes mantiveram-se silentes. 


Finalmente, o pároco fez-me a entrega de uma pasta, contendo memorial e abaixo-assinado, requerendo providências contra o forrobodó. À época, Fortaleza não possuía motéis, somente cabarés e rendez-vous. Garanti-lhes averiguações e providências. Dias depois, chegou à comunicação do delegado responsável ao gabinete: “Esta autoridade fechou o Rabo da Jumenta”.

                                  Texto do amigo e colaborador Geraldo Duarte 
(advogado, administrador e dicionarista)  



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terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

Bloco “Ai da Base!”


Anos 50. Choque da Base Aérea de Fortaleza. Caminhão com banco de madeira, ocupando toda a extensão da carroceria, acomodava soldados armados, sentados e voltados para os lados da viatura.

Objetivava conter balbúrdias envolvendo militares da Aeronáutica. Mas, quando chegava, “para não perder a viagem”, havia revista geral. Nasceu, então, um chiste na Capital representando o medo: “Ai da Base!”.

Tal jocosidade denominou um bloco carnavalesco de sujos do bairro Demócrito Rocha. Únicas coisas de cordão momesco: uma, a surrada imitação de estandarte, onde se lia “Bloco Ai da Base!e, abaixo, o desenho de dois cassetetes, em forma de X, encimados por um capacete; outra, a marchinha “Você pensa que cachaça é água”.



O porta-estandarte era o Bira, filho de dona Luzia Barroso. De tão cambota, alcunharam-no Colhões entre Parênteses. A maioria dos brincantes fantasiava-se de mulher. As vestimentas pertenciam às mães, mulheres e namoradas. Os adereços, os mais variados e estrambóticos.

O Valdir sempre tradicionalista. Portava penico de ágata e dentro cachaça e linguiças. Já o Dorival esbaforia-se. Saia justa, blusa decotada, sutiã com farto enchimento, nádegas postiças, sapato salto alto, peruca loura e longa, brincos, pulseiras e outros penduricalhos. Maquiado profissionalmente. Desbundava-se.

Centenas de outros extravasamentos justificados por Momo.

Charanga do Gumercindo intitulava-se o grupo de músicos do apoio. O “Ai da Base!desfilou até 1961.


Geraldo Duarte 
(Advogado, administrador e dicionarista)


segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

Ginasianos de 1958


Igreja Pequeno Grande - Arquivo Carlos Juacaba

28 de novembro de 1958. Manhã ensolarada a iluminar a beleza da arquitetura neo-gótica da Igreja do Pequeno Grande.
Trinta e três felizes jovens, concludentes do Curso Ginasial do Colégio Lourenço Filho, Turma Rui Barbosa, sendo patrono o Dr. Antônio Filgueiras Lima, eram o motivo da celebração religiosa que se processaria.
Um cântico ritualístico, interpretado por um coral afinadíssimo, emprestava um clima confortante e ao mesmo tempo solene.
Familiares, professores e amigos dos novos aspirantes ao Curso Científico enriqueciam, com suas participações, o comemorativo acontecimento.
O educador, poeta e filólogo Filgueiras Lima, diretor do Colégio, como sempre, a vestir terno de imaculado linho branco, fazia-se acompanhar de sua incentivadora esposa, senhora Amazonas, ocupando seus especiais genuflexórios, instalados ao lado do altar-mor.


Foto do Instituto Lourenço Filho no dia de sua fundação, 07 de fevereiro de 1938. Fundado por Antônio Filgueiras Lima e Paulo Sarasate Ferreira Lopes, o Instituto Lourenço Filho (depois Colégio Lourenço Filho), funcionando em prédio na Rua Floriano Peixoto nº 963, entre a Rua Pedro Pereira e Rua Pedro I. Hoje é Faculdade e fica na Rua Barão do Rio Branco esquina com Avenida Domingos Olímpio - Arquivo Nirez

Nós, concludentes, tínhamos lugar na ala esquerda da Igreja e, na da direita, víamos nossos mestres da última série e das anteriores. O matemático Adroaldo Castelo Branco, sósia de Olavo Bilac, paraninfo da Turma e, ao seu lado, os homenageados especiais: jornalista João Hipólito Campos de Oliveira e o historiador José Humberto de Oliveira, professores de Geografia Geral e de História do Brasil, respectivamente.
Lembro-me bem das presenças de alguns de nossos educadores das várias disciplinas, como Sedrim Jucá (História Geral), Agnelo Torres (Desenho), Edmilson Pinheiro (Latim e Português), Lourival Barros (Francês), Antônio Francisco Lisboa (Música), José Delídio Pereira (Ciências) e Gerson Filho (Inglês).



Antes da missa, celebrada pelo padre Tito Guedes, professor de religião e, anos depois, pároco da Igreja da Sé e ascendente ao monsenhorado, cantamos o Hino do Colégio. Findo o ato católico, entoamos o Hino Nacional, com o coral, musicado pelo órgão.
Com nosso meio século de ginasianos, o registro, também, dos 70 anos de fundação do Colégio e a homenagem póstuma aos nossos saudosos colegas Antônio Gaudêncio Anário Braga, Cezar Belmino Batista Evangelista e José Raimundo Araújo Monte (Bu).

 Geraldo Duarte 
(advogado, administrador e dicionarista)



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sábado, 11 de fevereiro de 2012

Marimbondos sem fogo



Sábado. Chovesse ou fizesse sol. Farra dos papudinhos no Boteco do Pezão, Lagoa do Opaia. Do meio-dia até o arrego do último pau d’água.
Chegante primeiro era o catraieiro Chicão, cem quilos, dois metros. Entre caboclo e afrodescendente. Furta-cor, no dito do poeta Olívio Gentil.
Lugar marcado na velha e ensebada mesa, acreditava ser-lhe respeito. Os parceiros bebuns o faziam pensar. Em verdade, possuía relevância maior. O soprar do vento contrário aos assentos dos demais farristas. Não aspirariam a inhaca axilar do marítimo que, somente depois de algumas talagadas e tira-gostos de tripa assada, acomodavam as narinas, imunizando-as da sovaqueira.
Conversas mil. Miolo de pote. Trato da vida alheia. Segundo eles, melhor fazer do mundo.
Puxador de fogo” encrenqueiro, Zé dos Reis, troviscado, mais pra lá do que pra cá, viu na goiabeira defronte a birosca fruto amarelinho. Conseguiu longa vara e, cambaleante, deu-se a catucação da árvore. Despercebido da morada de marimbondos-de-chapéu escondida na folhagem, ao bater na galha, os insetos voaram, ferroando-lhe todo. Susto e dores superaram o efeito etílico. Em desabalada carreira, seguido pelo enxame, rumou para a lagoa e atirou-se n’água.
Dois dos amigos de cachaçada partiram em auxílio. Findo o ataque, ajudaram-no a sair do charco margeador e chamaram ambulância que o levou ao hospital. Nesse ínterim, os demais bebaços entraram no botequim e continuaram a bebedeira. As beijucabas acalmaram-se e retornaram ao enxu. E os biriteiros, à mesa e à folgança, a comentar sobre os “perigosos animais”.
O vate deitou falação. Conhecimentos entomológicos. A irracionalidade dos apoica pallidas.   Insetos da espécie himenóptera, família dos vespíderos, de hábitos noturnos e pacíficos, quando não irritados. Reis atiçou-os. Em defesa, armaram-se. Com seus ferrões provocadores ardência e irresistíveis dores, fizeram-se à luta. Agiram movidos pela lei da natureza. Inimputáveis de culpabilidade!”.

Esticou a falácia. Citou autores e compêndios. Lembrou “Marimbondos de Fogo”, de José Sarney, que Millôr Fernandes descreveu como "um livro que quando você larga não consegue mais pegar".
Chicão discordava do “chove e não molha”. Indignara-se com o sofrimento do companheiro. Vingar-se-ia das “pestes”. Não haveria “turma do deixa disso” que o contivesse.
Pezão trouxe-lhe um cavalete, logo colocado embaixo do cortiço. O mareante preparou uma “bicada de dois dedos rasos de cachaça”, derramou o “gole do santo” e enfiou o resto goela abaixo. Desabotoou a camisa, meteu a mão direita sob a axila esquerda e friccionou-a algumas vezes. Igual procedimento, de forma inversa, deu à mão direita. Viscosas e aciduladas pelo suor estavam aptas a agir. Constituíam-se poderosas armas.
Galgou os degraus e chegou ao topo, próximo ao vespeiro, colocando-as concheadas em derredor e as aproximando vagarosamente. As vespas, em vôos ziguezagueantes, recolheram-se ao ninho. O portuário, raivosamente, abarcou o abrigo dos bichos com as mãos, atritando-as contra o mesmo, em movimentos de vai e vem, reduzindo tudo a pó.
Desceu, voltou a sua cadeira e falou: “Pronto, acabou a guerra!”.
Olívio, temeroso pelo posicionamento de antes, para desarmar maiores zangas, levantou um drinque a Chicão. Asseverou que seu poder superava o do fogo, elemento usado para destruir tais inimigos, aduzindo: “A força de Sansão estava no cabelo. A de nosso querido Chicão, no sovaco!”.
O homem das catraias, mesmo sem abraços dos cupinchas, por óbvios motivos, agradeceu emocionado.

Geraldo Duarte


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Conto publicado nas páginas 119 a 121 do SEGUNDO PENSAMENTO – 2ª Antologia de Prosa e Verso da Associação Cearense dos Escritores (ACE) – Premius Editora: 2011, Fortaleza – CE

terça-feira, 31 de janeiro de 2012

Faquir no Abrigo



Foto de 1950 - Arquivo Nirez

Inaugurado em 1956, o Abrigo Central firmou-se como destacado ícone de Fortaleza. Localizado ao lado Norte da Praça do Ferreira, na área compreendida entre as ruas Floriano Peixoto, Guilherme Rocha, Major Facundo e travessa Pará, constituiu-se palco de marcantes acontecimentos do cotidiano citadino.

Por uma década, pois em 1966 foi inexplicavelmente demolido pela Municipalidade que o edificou, registrou fatos até hoje inesquecíveis.

Por ele, diariamente, transitavam a vida, a cidadania e a política fortalezenses. Pessoas de todas as classes sociais, profissões, credos, raças, sexos e idades frequentavam o simples e aconchegante local de comércio, serviços e, sobretudo, ambiente de encontros, discussões, informações e descontrações dos labores vivenciais.

Lanchonetes, confeitarias, cafés, tabacarias, engraxataria, lojas de vendas de discos, de selos tributários, de jornais e revistas, além de pontos de ônibus motivo de sua construção, ali serviam ao público.

Afora tais, existiam empreendimentos outros. O espaço livre maior servia a acontecimentos vários. Sorteios publicitários de veículos, exposições em geral e eventos extraordinários. Destes, lembro-me o de um faquir denominado Zokan.

 

Encerrado em urna envidraçada e lacrada, contendo cama de pregos, pequena janela para receber líquidos – sua única deglutição –, frestas de arejamento e altura que o permitia sentar-se, ficaria três meses em jejum.

A estudantada do Colégio Lourenço Filho, finda a aula, ia ver o asceta nacional. Por indagar como supria suas necessidades fisiológicas e porque não emagrecia, era convidada a deixar o local.


Artigo do amigo e colaborador Geraldo Duarte



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segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

Novela vivida




Ultrapassava a paixão. Era o viver a novela. Incluir-se em cada cena. Sofrer, alegrar-se, rir, chorar. De viva voz, buscar interagir com o televisor, exigir-lhe respostas. Aplauso, protesto ou manifestação de contentamento mostrava-se de quando em vez.
Dona Luzia transformava-se de telespectadora em participe. Não raro, levantava-se da cadeira e encaminhava-se para junto do receptor. Parecia querer entrar naquele mundo de ficção. Para ela, insofismável realidade.
- Conta à verdade toda! A hora é esta! Deixa de querer ser boazinha! Pronto! Agora está sem jeito, sua tola! Ah, vai chorar, né? Bestalhona! A outra vai te passar para trás! 


Na foto, montagem com cena da TV Ceará. Em primeiro plano João Ramos eKarla Peixoto


E mais um capítulo chegava ao fim com os aconselhamentos, protestos, exclamações e, até, interrogações da aficionada fã.
O calendário marcava um dos anos sessenta. Dois ou três depois de inaugurado o primeiro canal televisivo na Capital. Longe da chegada do videoteipe, os dramalhões apresentavam-se ao vivo. Atores locais, também intérpretes de novelas radiofônicas, formavam o elenco das oito da noite nas telinhas convexas, de cantos arredondados, com imagens de pouco brilho, em preto e branco, além das interferências conhecidas popularmente como “chuvisco”.

Raras casas possuíam o novo entretenimento. Daí nasceu à figura do televizinho, o sem-TV que infernizava a vida dos proprietários do novo aparelho.

Nossa personagem integrava aquele grupo. Todas as noites fazia-se penetra em uma das únicas duas casas dos providos da rua. As salas ficavam cheias. Os que não mais ali cabiam, postavam-se na calçada. Espremiam-se nas janelas e portas das residências para assistir aos programas. 



A privacidade das famílias findava-se. O sossego também. As intervenções inesperadas da idosa senhora chegavam a assustar uns, merecer críticas de alguns e os “psius” da maioria. Ela chegava ao extremo da descompostura aos reclamantes, exigindo suas retiradas do recinto. Enquanto isso, os donos da casa evitavam incompatibilidade com os moradores conhecidos e sofriam resignados e silentes.
Novidades tecnologias sempre têm preços e sacrifícios altos.








Artigo do amigo e colaborador Geraldo Duarte

terça-feira, 10 de janeiro de 2012

O Cine Rex




A Empresa Clóvis Janja & Cia.*, uma saudável iniciativa de circuito independente em nossa cidade, desenvolveu-se em 1940, com a inauguração sucessiva do Cinema Christo Rei, a 6 de junho; o Odeon, no dia 18 de junho; e o Cine Rex, cinema que fez história e deixou saudades.

Em 10 de agosto de 1940 a Empresa Clóvis de Araújo Janja inaugura, na Rua General Sampaio nº 1263, o Cine Rex, com o filme A Enfermeira Edite Cavel, da RKO, com Ana Neagle, Edna May Oliver e May Robson, no local onde esteve, por muitos anos, a Serraria Rodolfo e sua fábrica de pregos.


Matinais do Cine Rex

Semana passada, recebi cumprimentos de um senhor, enquanto aguardava atendimento em posto de serviços. Além do formal bom dia, perguntou-me o nome e, se em meados dos anos cinquenta, frequentei matinais do Cine Rex. De pronto, identificamo-nos e registrou-se longo bate-papo. Revivemos e vivificamos fatos de então.

Aos mais jovens, descreva-se o porquê do contentamento do encontro. O Cine Rex, pertencia à antiga Empresa Cinematográfica Luiz Severiano Ribeiro, situava-se na rua General Sampaio, entre as ruas Pedro Pereira e Pedro I, no lado do Sol, como se precisava o Leste das vias públicas. Cinema popular, semelhante ao Moderno e ao Majestic, pois somente o Diogo era luxuoso, possuía característica diferencial e exclusiva. Único a exibir filmes westerns e seriados, nas matinais domingueiras, em sessão sempre lotada pela juventude. Mais do que lotada. Quem não conseguia cadeira, utilizava o chão como assento ou assistia em pé às exibições. Imperdíveis eram os capítulos dos seriados de curta metragem, semanais, antecedentes ao filme principal. Além dessas atrações, outro motivo concorria para o êxito das matinais do Rex. Já às 8 horas, duas antes do funcionamento do cinema, nas calçadas encontravam-se dezenas de jovens. Com braçadas de revistas e almanaques de histórias em quadrinhos, álbuns de figurinhas, pequenos pedaços de películas cinematográficas e objetos outros relacionados ao mundo dos heróis das telas, faziam do local uma feira de vendas e de escambos. Gibi, Guri, Zorro, Reis do Faroeste, Fantasma, Mandrake, Capitão Marvel, Superman, Batman e outras publicações, até em coleções completas, completavam o sucesso. Estudantes do Liceu, Lourenço Filho, 7 de Setembro, Cearense e Agapito dos Santos, os mais assíduos, solidificaram amizades de lá ao hoje. O interlocutor foi um liceal. Despedimos-nos e combinamos encontrar-nos mais vezes. E, aqui, registre-se uma homenagem a dois grandes amigos dos tempos do Rex, recém-moradores do Oriente Eterno. Os saudosos Jaime Alencar de Oliveira, do Liceu, e Francisco Alberto Paes Soares, o Bulim, do Colégio Lourenço Filho. 



Geraldo Duarte 
(Advogado, administrador e dicionarista)



Pequenas Lembranças de uma certa Fortaleza...

Pequenas lembranças de uma Fortaleza que não existe mais, que ficaram para sempre na minha memória. Tais como as matinês, aos domingos, do Cine Rex, ali na rua General Sampaio, a poucos metros da praça José de Alencar. Lá se reuniam os adolescentes de ambos os sexos, para ver um filme acessível à sua faixa etária. Não era raro encontrar um ou outro colega do Liceu. Numa ocasião vi o Jorge, que estudava na minha classe. Estávamos na fila para compra do ingresso, ele um pouco atrás de mim. Acompanhado de um amigo, ele lia, em voz alta, uma carta que uma namorada lhe enviara. Ria com alguns trechos da carta, aqueles em que a jovem demonstrava mais a atração que tinha por ele. Presenciando aquele exibicionismo de Jorge, eu, que já não era seu amigo, passei a detestá-lo a partir desse seu comportamento reprovável.


Um fato curioso no Rex era o preço da meia entrada: Cr$ 2,40. Por que, como os seus concorrentes, não era cobrado o preço de Cr$ 2,50? E, geralmente, ficava por esse preço, pois a bilheteira não dispunha de dez centavos. Nunca entendi isso.
Lá eu assisti A Princesa e o Plebeu. Fiquei ao lado de duas mocinhas, uma das quais não parava de falar. E uma vez em que Gregory Peck caminhava com uma mão no bolso da calça, ela disse à amiga que o homem que assim procedia era um liso.
Lembranças. Lembranças. 
Francisco Sobreira (Blog Luzes da Cidade)

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Mais registros importantes para a história inesquecível do velho cinema:

Seria indesculpável o não registro do vendedor de 'doce gelado', designativo antigo do picolé, com sua pesada caixa de madeira, contendo um cilindro de zinco, onde eram acondicionados os deliciosos refrescantes. Para suas conservações, entre a caixa e o depósito, gelo em pedras, coberto com serragem, aumentava mais a carga que "seu Jacaré" transportava na cabeça. Por igual, observaram a falta de citações do pipoqueiro e do lançamento da pipoca sem casca, alta tecnologia do produto na época, e do Cícero, mais conhecido como "aqui é raso, aqui é fundo", devido ao acidente que fizera manco aquele comerciante de "cai-duro", apetitoso sanduíche de pão d'água, contendo carne moída com delicioso tempero caseiro. A iguaria era também conhecida por "espera-me no céu"


Lembradas são as garapas ofertadas na Mercearia Vencedora, de propriedade das irmãs Mavignier, na esquina das ruas General Sampaio com Pedro Pereira, defronte ao secular prédio do Dnocs. E, ainda, a residência de dona Diolina, próxima do cinema, onde os pedidos de copos d'água eram tão intensos que a boa senhora, aos domingos, mandava a serviçal colocar um pequeno pote de barro na porta de entrada da casa para matar a sede da moçada. Os "piruliteiros" com seus pirulitos enfiados em tábua com buracos, os vendedores de "chegadim" com suas latas arredondadas e longas, em bandoleira e um triângulo sonante, junto com os de 'cuscuz paulista' com seus tabuleiros, mercadejavam, em altas vozes, suas produções.
A manhã findava-se com o 'The End' da poeira saudável do Velho Oeste na tela de tecido encerado.

Geraldo Duarte 
(Advogado, administrador e dicionarista)

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*Antes de inaugurar o Cine Rex, Clóvis de Araújo Janja já havia realizado importantes construções em Fortaleza:

  • Em 31 de dezembro de 1933 (À meia noite, já entrando o dia 1º de janeiro de 1934), Clóvis de Araújo Janja (Clóvis Janja) construiu em estilo Art-Déco a Coluna da Hora na Praça do Ferreira, construída na administração do prefeito Raimundo GirãoA Coluna da Hora tinha 13 metros de altura e o relógio movido à energia elétrica, com quatro faces, duas em algarismos arábicos e duas em romanos, foi adquirido nos Estados Unidos através da firma Biyngton & Companhia, sob projeto do engenheiro José Gonçalves da JustaFoi demolida em 1966, na administração de Murilo Borges e reconstruída em outro formato, de ferro, no governo Juraci Vieira Magalhães em 1991.

  • Em 07/09/1935 o Escritório Clóvis de Araújo Janja construiu o prédio da nova sede do Liceu na antiga Praça Fernandes Vieira, hoje Praça Gustavo Barroso.


Cronologia Ilustrada de Fortaleza - Nirez




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