Fortaleza Nobre | Resgatando a Fortaleza antiga : Bonde Praia de Iracema
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Blog sobre essa linda cidade, com suas praias maravilhosas, seu povo acolhedor e seus bairros históricos.

 



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quinta-feira, 30 de junho de 2011

Memórias de Celsa Gomes



Manoel Preto, Jacaré, Tatá e Jerônimo - Foto de 1942

Ela mora no meio da rua dos Tabajaras, herdada do jangadeiro Tatá, seu primeiro marido. Aos 83 anos, muito bem conservados, Celsa é uma sábia contadora de histórias.

Quando Jacaré, Manuel Preto, Tatá e Mestre Jerônimo se aventuraram, em 1941, da praia do Peixe ao Rio de Janeiro, a bordo da jangada São Pedro, sem bússola, para reivindicar a situação dos pescadores junto a Getúlio Vargas, ela tinha apenas 16 anos. Somente 10 anos depois, viria conhecer e casar-se com Raimundo Correia Lima, o conhecido Tatá. Ela é Celsa Gomes Soares. "Eu era Lima, do Tatá, mas agora é só Gomes Soares". Aos 83 anos, mora na Praia de Iracema, na mesma casa herdada do finado Tatá, falecido em 1971, atropelado. "Quando a gente se casou, eu tinha 26 anos e ele 64. Ele tinha idade de ser meu avô. Ele me pediu para depois que morresse eu não vender a casa." E assim ela fez. 
No meio da rua dos Tabajaras, a casa se destaca entre lojas de artesanato, restaurantes e algumas poucas residências que ainda restam. Cheia de plantas, decorada com quadros antigos e fotografias na parede, a casa é um grande corredor. Hoje, a história se inverteu, vive com o segundo esposo bem mais jovem que ela, José Brasiliano Soares, desde 1975.

Celsa fala com a boca, as mãos e os olhos. Sorri e se emociona. Sua história de vida desenha um retrato vivo da Praia de Iracema, embora tenha nascido no sertão, em Salva Vidas. "Fica a três léguas de Quixeramobim", mapeia. Veio para Fortaleza em 1946, durante a seca, trabalhar na casa da família Gentil. Foi ser cozinheira. A mansão estava localizada à beira da praia. Hoje, a casa é o sindicato dos engenheiros particulares e fica logo no final do beco, em frente onde Celsa mora atualmente. 
No dedo anelar da mão esquerda, a aliança de ouro ainda marca as lembranças vividas naquele bairro. As histórias na memória relembram o primeiro encontro com o jangadeiro. "Toda noitinha, ele passava para a praia aqui pelo beco. Tinha muita gente que trabalhava lá comigo. Ele passou uma vez e puxou assunto. Perguntou se a gente gostava de ir à praia. Logo se engraçou comigo. Eu já era noiva quando conheci o Tatá. Me apaixonei, desfiz o noivado e casei. Ele era mais velho e tinha mais juízo.(risos). Eu fui a 4º esposa dele"

Orson Welles e os pescadores

O batom vermelho nos lábios se destacava sobre a pele negra e combinava com o vestido longo que usava. "Paulinha que mandou pra mim da França. Ela manda é muito, tenho um vestido de seda chinesa. Às vezes, manda as fazendas bonitas também. Esse aqui tem mais de 10 anos." 

Paulinha e Sadi foram os filhos que ainda teve com Tatá, já passando das seis décadas de vida. O caçula, que tem o nome do pai, Raimundo Correia Lima Júnior, na boca da mãe, ganha o apelido de Sadi. Com menos de um ano de diferença, Paula Maria Lima Martin é, carinhosamente, Paulinha. "Minha filha conheceu o francês tomando banho de mar. Aqui, na Praia do Lido (atualmente praia em frente ao restaurante Tia Nair). Eu não queria que ela se casasse. Ela tinha 18 anos e ele era 20 anos mais velho. Casaram. Foi lindo o casório, lá na Catedral. Mora lá, com ele, até hoje. Paul Pierre." E a história se repetiu. 

Sadi também foi embora, com 21 anos. Encontrou uma australiana, lá em Belém do Pará. "Tão linda ela. Os olhos verdes da cor do mar. Lá na Austrália já teve cinco filhos. Cada um com uma mulher diferente". Atualmente, vive com a chilena Cinthya. "E tá esperando mais uma menina, agora pra dezembro". Sadi é músico e não seguiu o desejo da mãe de ser marinheiro, mas atendeu aos anseios do pai, ficando longe do mar. Ele não queria que o filho seguisse a sina de pescador. 

Já foi à França três vezes visitar a filha, mas a última foi em 1983. "Hoje em dia eu não vou mais, não. Esses aviões tudo doido, caindo". Prefere ficar por ali, nas imediações da sua Praia de Iracema. Antigamente, adorava caminhar no calçadão da Beira Mar. Ia até o Ideal, cedinho. Agora, se aproxima do mar somente quando José a leva. "A gente senta, come uma pipoca, toma uma água de coco. Antigamente, tinham as piscininhas aqui na frente. A gente tomava banho. Era bom. Agora tá tudo poluído, tudo sujo." Passear na Beira Mar, tem que ir de carro. O joelho não permite mais a caminhada e o esforço físico. 
Foto, Brasil, CE, Fortaleza, Rua dos Tabajaras
A Rua dos Tabajaras - Foto de Mario

Aos olhos de Celsa, o tempo andou mexendo na arquitetura do bairro e na sua rua. "Com o tempo, está tudo diferente. Nem dá mais pra ver o mar daqui. Os engenheiros fizeram uma puxada ali em cima. Tampou a minha visão", reclama. A reforma do calçadão da Praia de Iracema tem causado alguns incômodos. Antes, os atletas usavam o espaço para o esporte, "agora, eles vêm fazer cooper aqui, no calçamento. Passam em frente de casa, em vez de ser lá pela praia, pelo calçadão", conta incomodada Celsa.

Ainda com um pé no sertão, passa as manhãs escutando o Reouvindo o Nordeste, programa da Rádio Universitária. Luiz Gonzaga é a trilha sonora predileta para cozinhar seu peixe frito com leite de coco. "Na casa onde eu trabalhava a gente só comia comida boa. Aí eu me acostumei... (risos). Garoupa, Pargo. Adoro!" 


Ela reclama do barulho noturno da Praia de Iracema, da sua vista do mar que se foi, mas também sonha em reformar a casa. Na televisão, assiste de tudo. "Só não gosto muito de novela imoral. Eu tenho vontade de escrever uma carta para o (Luciano) Huck. Ele ajeita casa, né!?" Extremamente ativa no lar, agua as plantas, varre a casa, e lava o terraço. Disposição não falta para as atividades domésticas. "Só não lavo roupa"

Na rua, todo mundo conhece Celsa. Na comemoração dos 80 anos, ganhou uma grande festa. A casa de forró mais conhecida da cidade fica na mesma rua de sua residência. "Paulinha tava aqui para organizar a festa. Eu lembro que fiquei cansada de tanto ir buscar gente no aeroporto. Teve a ajuda da cônsul francesa. A Fernanda, amiga da minha filha. Elas se juntaram e fizeram as batucadas lá no Pirata. A gente é muito amiga do Júlio. Paulinha, quando vem da França com as amigas, ninguém paga nada", conta orgulhosa. 

Sobre o bairro, fala afetuosa. Nem ela, nem José querem deixar a Praia de Iracema. Ir para a França? Nem pensar. Aqui ela tem José, "lá, tenho medo de me botarem na casa dos velhos". O companheiro é técnico fiscal de obra da prefeitura, passa o dia trabalhando fora. Celsa diz ter medo de morrer sozinha em casa. "Uma vez eu caí e não conseguia me levantar. Eu tava sozinha. Tentei me levantar na cadeira e ela virava pra cima de mim. Até que eu tive a idéia de ir até a cama e consegui me levantar. Eu peço é muito pra nossa senhora não deixar eu morrer só aqui em casa"

Os planos para o futuro dependem da vontade de Deus. Somente por um motivo, sairia do bairro. Nem só o dedo do homem é capaz de provocar mudanças na Praia de Iracema. "Eu peço a Deus que essa onda não venha. Vai acabar com tudo, com as casas da gente. E se não sair, morre todo mundo também". Conta Celsa que a onda terá mais de 50 metros e que ela virá até 2013. "Os pastores é tudo rezando na beira da praia. O governo tem que saber e avisar a gente. Eu sei que já tá despregando uns gelos por acolá. Eu até já sonhei, todo mundo correndo. Vai ficar só as cabeças dos morros".
 
Continua...

Fonte: Jornal O Povo

sábado, 19 de junho de 2010

O bonde (VI) - Praia de Iracema

A fotografia dos anos 30 nos mostra um bonde elétrico da Ceará Tramways, Light & Power em Fortaleza. Está perto da Praça do Ferreira, na rua Pedro Borges esquina com Floriano Peixoto, em Frente à Mercearia Leão do Sul

“Verdes mares bravios da minha terra natal, onde canta a jandaia nas frontes da carnaúba! Verdes mares que brilhais como líquida esmeralda aos raios do sol nascente, perlongando as alvas praias ensombradas de coqueiros! ... Além, muito além daquela serra, que ainda azula no horizonte, nasceu Iracema. Iracema, a virgem dos lábios de mel, que tinha os cabelos mais negros que a asa da graúna, e mais longos que seu talhe de palmeira. O favo do jati não era doce como seu sorriso; nem a baunilha recendia no bosque como seu hálito perfumado.” José de Alencar - Iracema.

Com certeza foi Iracema, a Jandira do Jaguaré - Ubirajara, do romance de Alencar, a musa inspiradora da antiga Praia do Peixe, que veio dar nome à Praia de Iracema, tão decantada por poetas, artistas, músicos e compositores que tantas evocações fizeram e deram “adeus Praia de Iracema”.

A terra dos amores que o mar carregou, como bem sintetizou - o maestro e compositor Luís Assunção - Ah! Quantas ruas foram tragadas pelas impetuosas ondas do mar, que se enfureciam com embates como se a natureza estivesse a se degladiar no resgate do território que propunha a recuperar com as suas próprias forças. E assim ruas e mais ruas, casas e mais casas, foram de repente se transformando nesse mar imenso, belo e traiçoeiro... Como o tempo passa rápido hein! E inexorável com a nossa lembrança, fazendo nessa azáfama do cotidiano procura apagar em nós os momentos bem vividos na claridade das noites de luar, o passeio que se fazia à Praia de Iracema, para ver e ouvir as juras de amor ao luar, tendo o céu por testemunha e depois se dirigir ao restaurante do português Ramon - para saborear a deliciosa sopa de cabeça de peixe, de “cangulo”, que somente ele sabia preparar tão afamada sopa, sem se falar na “peixada do Ramon”. Ah! Tempo bom que não volta mais...

A bem da verdade, a extensão da linha do bonde da Praia de Iracema, era relativamente pequena e foi inaugurada no dia 12 de janeiro de 1914, denominada linha da Praia; mas era muito movimentada como meio de transporte por atender a diversas classes sociais, desde os comerciários que trabalhavam nos armazéns da praia e outros estabelecimentos, comerciantes, funcionários públicos da Secretaria da Fazenda, estudantes e famílias que ali residiam até os que moravam nas pequenas casinhas à beira-mar. Apesar de curta extensão, o bonde “Praia de Iracema” fazia o seguinte trajeto: saía da Travessa Morada Nova detrás da antiga Assembléia Legislativa e dobrava à direita na Rua Floriano Peixoto até atingir a esquina da Travessa Crato; entrando à esquerda em frente à Catedral (Sé) seguindo pela Av. Alberto Nepomuceno até alcançar a esquina da Av. Pessoa Anta, onde funcionou por longos anos o “Café Gato Preto”, que depois dos anos 50 passou a pertencer aos “Irmãos Abiatá”.

Bonde da Praia na Avenida Pessoa Anta

O bonde seguia pela Av. Pessoa Anta até chegar ao majestoso prédio de alvenaria de pedra lapidada, onde funcionou por longos anos a Alfândega do Ceará e hoje Caixa Econômica do Ceará, esquina com a Rua Almirante Tamandaré, onde entrava à esquerda até alcançar a Rua dos Tabajaras, quando dobrava à direita, chegando ao ponto final na Igreja de São Pedro (lado direito). Ali, estacionava fazendo a última parada.

Na esquina da Rua dos Tabajaras, lado direito, havia o Departamento de Portos, Rios e Canais, que mais tarde mudou para Departamento do Porto e Vias Navegáveis, chefiado pelo nosso muito querido e estimado primo Dr. José Euclydes Caracas, pai do Dr. Hélio e Heliana Mota Caracas e, do lado esquerdo de quem entra na Rua dos Tabajaras - o Departamento de Obras Contra Secas, chefiado pelo ilustre e respeitado Dr. Antero, pai do ilustre Presidente (atual) do Tribunal do Trabalho, Dr. Antônio Carlos Chaves Antero. Havia uma singularidade no terreno onde existiam as casas de dois chefes e, eram inusitadas edificações constantes de vários depósitos de alvenaria em forma de tubo (cone) que serviam para armazenar cimento que vinha do exterior e àquela época ninguém sabia qual a sua serventia.

No início da Rua dos Tabajaras, existiam as melhores casas, das famílias que costumavam veranear na Praia de Iracema ou, às vezes, alugavam-nas para “passar tempo” como se costumava dizer.

De volta, o percurso do bonde era quase o mesmo. Somente à altura da Secretaria da Fazenda fazia uma ligeira curva e seguia pela alameda em frente ao Quartel da 10a Região Militar e entrando à direita na Rua Crato e logo em seguida dobrava à esquerda na Rua General Bezerril defronte ao Departamento de Correios e Telégrafos, seguindo pela mesma rua até chegar na Travessa Morada Nova.

Merece ressaltar que no seu ponto inicial, ou seja, na mencionada Travessa Morada Nova, os passageiros do bonde “Praia de Iracema”, por muitas vezes, ouviam os acalorados discursos dos senhores deputados no plenário, no horário das sessões da Assembléia Legislativa, diferente das discussões que se desenrolavam no Instituto Histórico e Antropológico do Ceará, o qual ocupava a parte térrea (lado oeste) do mesmo prédio, cujos sócios apresentavam suas teses e trabalhos de cunho científico nas diferentes áreas de abrangência do saber humano.

Lá estiveram e ainda estão os expoentes máximos das letras e das ciências, que tão bem sabem representar a nossa cultura, projetando o Ceará no mais alto patamar do cenário cultural do País, como têm dado inequívoca prova de sapiência que dignifica nossa terra, tão bem representada por seus sócios.

O nosso passageiro ilustre do bonde que fazia a linha Praia de Iracema é o insigne desembargador Lauro Nogueira, professor catedrático de Direito Constitucional da Faculdade de Direito do Ceará, autor de excelente trabalho jurídico acerca do “O Parlamentarismo e o Presidencialismo”.

Era casado em segundas núpcias com a Dra. Maria (Menininha) Cavalcante, uma das primeiras médicas do Ceará, especialista em obstetrícia, mãe da Srta. Glorinha Maria Cavalcante Nogueira, residente num lindo “bangalô” de dois pavimentos na Rua dos Tabajaras, 460 que se constituía numa das mais bonitas casas daquele logradouro.

Bonde perto da Antiga Catedral da Sé, anos 30 - Foto restaurada por Adolpho Quixadá, outrora pertencente ao acervo de Nirez (Miguel Angelo de Azevedo), encontrada por Adolpho Quixadá na propriedade do engenheiro agrônomo Dr. José Vieira de Moura, também residente em Fortaleza. Antiga Sé (Catedral) de Fortaleza. Segundo Nirez, "no dia 11/09/1938 foi rezada a última missa na velha Catedral e em seguida ela foi demolida juntamente com seu cruzeiro cujos santos que o enfeitavam estão hoje no Museu São José do Ribamar, no Aquiraz." Agradecimentos a Nirez, Adolpho Quixadá e ao Dr. Moura.
Segundo Nirez, "existiam na época vários estabelecimentos fotográficos", sendo os de maior porte o Foto Salles e o Aba Film, "que vendiam postais, e este é um deles", mas "não é do Foto Sales porque os de lá trazem letras em branco com o nome do logradouro (geralmente com os 'enes' e 'esses' invertidos) e o nome 'Foto Salles'; os da Aba Film também traziam o nome; deve ser de um foto menor, como Foto Novo (do Josias Benício), Foto Nelson (do Nelson Moura), etc."
Época - Nirez esclarece que "a Sé foi demolida em 1938, logo a foto é anterior; a iluminação pública elétrica é a partir de 1935, logo a foto é anterior, pois vemos vários combustores de gás hydrogeno-carbonado" Prosseguindo, Nirez explica que, embora não possa garantir, "pelo tamanho das palmeiras, a foto deve datar de 1932 ou 1933."
Ponto de focalização - Ainda respondendo a Quixadá - "É prevesível que tenha sido tirada da Pensão Bitu?" - diz Nirez: "Tenho quase certeza de que a foto foi colhida da janela do andar superior da Pensão Bitu depois Hotel Bitu, de Bartolomeu de Oliveira."
Dados históricos da paisagem: Respondendo à pergunta de Adolpho Quixadá - "No pitoresco jardim foi onde existiu o Forum recentemente demolido?" -, Nirez explica: "O local onde foi demolido o Forum Clóvis Bevilaqua tinha antes um prédio térreo construído para a Secretaria da Fazenda e que com a construção em 1927 do novo prédio da Fazenda, passou a ser ocupado pelo Museu Antropológico e Instituto do Ceará. Foi demolido para construção do Forum que foi implodido."

A Praia de Iracema era o aprazível bairro preferido por famílias de várias camadas sociais, que alugavam casas para veranear; outras fixavam suas residências como o ilustre e festejado escritor de imorredouras saudades, Moreira Campos, e distinta família, pai da querida e imortal escritora Natércia Campos Sabóia, minha amiga que fez parte da Diretoria do Ideal Clube onde exerceu a diretoria de cultura e arte com muito brilhantismo. Outras famílias que ali residiam como a do dr. Híder Correia Lima, pai de Emília Vorreia Lima - Miss Brasil, Dr. Hugo Rocha, Dr. Abner Brígido (Bié); a família do Sr. Tancredo de Castro Bezerra, casado com C. Maria Júlia, amiga da minha avó Victória Dias da Rocha Silva, por quem tínhamos grande afeição, bem como a sua filha Ivonise e família; Antônio Figueiredo - Figueiredão - do famoso Tony’s Bar que funcionou ao lado do Ed. Praia Hotel Iracema; e o prédio na rua Tabajara que serviu de início como sede do Ideal Clube, o Praia Clube, hoje vizinhança, o Bar Mincharia, Vivenda Morena da família Porto, depois recanto dos boêmios, poetas e cantores - o tradicional “Estoril”, cuja estrutura, boa parte era de taipa. O mais requintado do bairro era o Hotel Pacajus, de frente para o mar, sem esquecer o restaurante do português Ramon, mais tarde surgiram novos restaurantes como Estoril e Lido, todos em suas épocas e muito afreguesados. Durante as décadas de 1950 até aproximadamente a de 1980, o restaurante Lido predominou na preferência da freguesia. O proprietário um casal francês - Charles, ganhou a predileção do grande público, que lotava aquela casa de pastos diariamente com pratos dos mais variados tipos de refeições, lagosta e camarão em todas as suas nuances atraindo turistas, e nós os donos da terra, os estrangeiros que por aqui passavam e vinham passear ou residir. O restaurante era um grande “galpão” cuja coberta no seu início era de palha de carnaúba que mais tarde foi substituída por grandes tesouras de madeira com cobertura de “telha-vã”, que dava excepcional aparência àquela construção, com meias-paredes, onde sobrepunham-se tapumes com vidraças colocadas que fechavam as três faces do galpão para dar a mais bela visão do mar. Quando enfurecido nos meses de janeiro e fevereiro, causava o mais belo espetáculo das ondas que se debatiam contra o arrimo de volumosas pedras que serviam de amparo e resguardo da estrutura do inesquecível local de tanta simpatia dos fortalezenses que para lá se dirigiam também, para apreciar os embates das ondas e sentir de perto o aroma da maresia que se espalhava por todo o recinto.
Os jovens se sentiam atraídos pelas marés, por ser o casamento de lua e sol, ao contemplar, dava mais disposição ao amor, no crepúsculo vespertino ou matutino quando o amor fala sempre mais alto...
Mas tudo isso é quando se é jovem... Oh juventude!
Jovem há mais tempo que é a forma mais suave de não se dizer que atingiu a terceira idade ou velhice. É como um filme que já foi visto e deixou “suplício de saudade”, reprisado volta à lembrança do amor, igual ao sabor do queijo ralado... Ah juventude ingrata! que rouba tudo de nós, deixando somente as marcas no rosto, riscado pelo cinzel do tempo, rugas que só servem para amparar as lágrimas do desgosto, embora outras “rolam no coração” como diz o poeta.
Mas deixemos de filosofar para chegar à realidade e dizer que nesse local hoje se ergue um belo “arranha-céu”, que a modernidade tudo move em nome do progresso, foi outrora território marítimo para banhistas.
Entretanto, perderam os moradores daquele paraíso terrestre, o privilégio de banhar os pés com as brancas espumas das ondas do mar, porque essas se tornaram artigo de raridade para quem está nas alturas, já nem se lembra mais que ali existiu o velho restaurante Lido, com afinado conjunto musical a entoar lindas canções na época em voga. Ali residiam as famílias Gentil, Rola, Paulo Egídio de Menezes, Maurício Sucupira com sua bela voz e seu vizinho Roderico Braga, ponto de encontro dos bons amigos, Albano Amora, Mamede e Dra Menininha Cavalcante. Ainda o sobrado existente do Sr. João Leopércio Soares, pai de numerosa família, dentre os filhos a ilustre educadora Wilma Maria de Vasconcelos Leopércio, proprietária do primeiro colégio da Praia de Iracema, o Colégio São Pedro, que durante muitos anos dedicou-se ao ensino das crianças que residiam na Praia de Iracema e adjacências, dando inequívoca prova de sua bondade e desprendimento das coisas materiais.

“Os bondes, que foram consagrados na música popular brasileira, também foram excepcional veículo de mensagens comerciais, com cartazes que se imortalizaram na história da propaganda. No Ceará, um contrato de 30 de dezembro de 1926, assegurava ao Dr. Victor Pacheco Leão, diretor da ‘Empreza Cearense de Annuncios’, a exclusividade para a colocação de ‘reclames’ nesses veículos, que poderiam ser afixados em partes internas predeterminadas e nas pranchas laterais externas. O contrato assegurava os direitos, anteriormente cedidos a Luís Severiano Ribeiro, de colocação de anúncios de filmes. A Ceará Tramway ressaltava seu direito de não afixar em carros os anúncios que, no seu entendimento, atentassem, por qualquer forma, contra a moralidade pública, como sejam os reclames de remédios para moléstias venéreas e outros”. - Ary Bezerra Leite - História da Energia no Ceará.

Podiam ser apreciados nos bondes os mais chistosos “reclames” de remédios que, à época, eram tidos como os mais eficazes e causavam verdadeiro prodígio; assim observemos:

“Veja ilustre passageiro O belo tipo faceiro Que o senhor tem a seu lado E, no entanto, acredite Quase morreu de bronquite Salvou-o o Rum Creosotado”
“Que calor, que dia quente! Rim doente? Tome Urodonal E viva contente! Rá, rá, rá, rá!...”
“Pílulas de vida do doutor Rossi Faz bem ao fígado de todos nós! Rá, rá, rá, rá!...”
“Eu vou formar, eu vou formar Um batalhão de garotas bonitas Sempre sorrindo, sempre cantando P-A-L-M-O-L-I-V-E!”

Ainda as procissões de São Pedro - protetor dos navegantes - carregando em vulto no andor para junto dos pescadores percorrer de jangada, comemorando o dia que lhe é consagrado - 29 de junho - fazendo a travessia pelo oceano Atlântico, cujas águas se multicoloriam de verde, azul e cinza porque já são lustrais, era um belo espetáculo digno de ser visto.
Assim a Praia de Iracema das encantadoras noites de luar, em que as famílias apanhavam o bonde e para lá se dirigiam para apreciar o luar que à luz da lua e, somente ela, era testemunha das confidências amorosas dos casais inspirados no luar deixavam entoar aos ouvidos da amada, como forma de oração, transbordando do peito numa exaltação ao amor que comprimido até aquele momento, deixava transpirar numa prova de eterna confissão à deusa perfeita, que, quando levado a sério, transformava-se em feliz enlace matrimonial.
Para muitos passantes, simples galanteios propiciados e emanados pelo entusiasmo da beleza da lua que lá do alto, se pudesse falar, talvez dissesse: - O mar bramia contemplando a prateada lua que, melancólica, esperava as carícias das borbulhantes e agitadas ondas, que cresciam para o alto e se esparramavam na areia branca da Praia do Peixe, formando saliência e reentrância na areia, tornando festiva a noite prateada pela luz da lua.
Até o aljôfar que saltava das ondas do mar, beijava em gotas a face dos pares que passeando na praia se recreavam dos festivos momentos como se estivesse a galantear os passeadores daquelas noites que testemunhavam o luar de agosto...
O céu, essa abóboda celeste de um azul turquesino, incrustado de estrelas, que lá de cima cintilavam num acender e faiscar de luzes, na plenitude da fosforescência espraiava luminosidade nas águas do mar, beijando com branca espuma a areia por onde pisava Iracema; cruzando com os casais de namorados que só se apercebiam de sua presença quando confundiam-na com os delírios de amor e seus lábios de mel. Volta! Vem novamente festejar novos luares! Ou, matar quem vive de saudades, oh! filha de Araquém!

Zenilo Almada Advogado 



  Crédito: Artigo publicado no Diário do Nordeste - Fortaleza. Ceará - Domingo, 19 de janeiro de 2003


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