Fortaleza Nobre | Resgatando a Fortaleza antiga : Clubes
Fortaleza, uma cidade em TrAnSfOrMaÇãO!!!


Blog sobre essa linda cidade, com suas praias maravilhosas, seu povo acolhedor e seus bairros históricos.
Mostrando postagens com marcador Clubes. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Clubes. Mostrar todas as postagens

quarta-feira, 7 de janeiro de 2015

A Cidade dos Clubes - Caça e Pesca (O Clube que deu origem ao lugar)


Numa cidade que procurava agora orientar seu crescimento, os progressistas anos 40a passagem das tropas americanas tiveram impacto decisivo para a efervescência de sua vida social. Proliferavam então em Fortaleza os “clubes de luxo” — tantos, que lhe trouxeram a alcunha de “Cidade dos Clubes”. 

Caminho para o Clube Caça e Pesca-Praia do Futuro em 1972. Foto Nelson Bezerra

O Clube Caça e Pesca visto das dunas da Praia do Futuro na déc. de 70. Foto Nelson Bezerra

A pecha procedia, com efeito, pois (entre muitos outros tantos) os nomes Cearense, Reform, Comercial, dos Diários, Iracema, Líbano-Brasileiro,
Ceará Country e Sociedade de Tiro, Caça e Pesca firmaram-se e lembram agremiações importantes de sua história.

Foto do Clube do Médico em 28 de julho de 1976.


Outros clubes mais atraíam para o lazer social — como o Recreio (na Lagoa Redondae os localizados na área costeira que absorveu a primeira grande expansão da cidade, como o Náutico e o Ideal, e, mais recentemente, a AABB-Associação Atlética do Banco do Brasiltodos estes ao longo da Avenida Beira-Mar — e, já na Praia do Futuro, o clube dos empregados da Petrobras (Associação Desportiva Classista Petrobras Ceará), a ASBAC Associação do Banco Central, a AABEC - Associação Atlética do Banco do Estado do Ceará e a Sociedade Beneficente Portuguesa Dous de Fevereiro, estes localizados após os clubes dos Advogados, dos Médicos e a Praça 31 de Março


Praça 31 de Março. Foto publicada no Jornal O Povo em 29/04/1991


Outro aspecto da Praça 31 de Março


Na Praia do Futuro, há ainda outras sedes sociais de vários clubes e associações.

Na região do Caça e Pesca fica hoje o BNB Clube Praia (que sucedeu o Caça e Pesca), e, nas dunas da Praia do Futuro ergue-se a nova sede do Clube dos Diários, em terreno permutado com a Construtora Marquise pelo de sua sede anterior na Beira-Mar. A mudança do clube deu-se após muita polêmica.
Atualmente, erguem-se dois sólidos blocos residenciais no local onde antes ficava o Diários, uma área que tem o metro quadrado mais caro do Ceará, na Praia do Meireles.

Foz do Rio Cocó/Caça e Pesca

Fortaleza volta-se para o mar e vai acomodar costumes de uma certa elite no seu limite Leste, lugar desabitado a serviço do lazer dos menos abastados e dos visitantes.
A história efetiva deste lugar tem início ao ser criada, ao final dos anos 40, a
Sociedade Cearense de Tiro, Caça e Pesca, em uma construção localizada na Praia do Futuro, no final da Av. Zezé Diogo. A agremiação inaugurou sua sede definitiva em 1952 para a prática, exclusivamente, de caça, pesca e tiro, naquela praia então deserta e isolada. Porém, a cidade foi se tornando metrópole e também ali surgiram muitas construções, entre residências e o pioneiro na área (em seu porte duas-estrelas) Fortaleza Praia Hotel, obrigando à redução progressiva da prática de tiro-ao-alvo e suas modalidades na região.


Caça e Pesca em 1976 - Acervo pessoal de Hugo D'Leon M. Morais

Não demorou muito e aquela moda tornou-se vedada por lei “em lugar transitável, praias e estações balneárias, onde haja a possibilidade de acidentes, mesmo que o material utilizado no esporte não ocasione morte ou danos sérios” (DIÁRIO DO NORDESTE, 1987).


Caça e Pesca em 1976 - Acervo pessoal de Hugo D'Leon M. Morais

Os hóspedes do hotel reclamavam do estampido das armas e as atividades noturnas dos associados — em número que chegou ao milhar — incomodavam a já consolidada vizinhança.



Postal Caça e Pesca


Glória e declínio

Vamos por mais um instante detalhar as características do Clube Caça e Pesca.
Instalado numa área de 26 mil m², cuja área construída, à inauguração, era de 700 m².
Segundo a imprensa, o clube promovia em seus 40 boxes de tiro ativa programação, envolvendo atiradores, inclusive do sexo feminino (o que à época parecia notável), de outras regiões do País, em torneios como o Campeonato Norte-Nordeste de Caça e Pesca.


A tranquilidade da época era tanta que o clube não era murado... Foto dos anos 80
Acervo pessoal de Fátima Porto Belém

Foto dos anos 80. Acervo pessoal de Fátima Porto Belém

A imprensa reporta que uma equipe do clube chegou a viajar “para Santarém (PA), para receber treinamento, mantendo contato com outras agremiações do gênero” (O POVO, 1980). 
Porém, depois deste ápice o clube atravessou um período de inatividade que durou cerca de 20 anos e representou longa fase de depressão. Em 1980, visando retomar as suas rotinas e atrair sócios, o Caça e Pesca, já com um notável volume de barracas de praia nos seus arredores, se fazia divulgar como “o melhor clube da capital”, por contar com “o privilégio de ter em suas dependências mar e rio ao mesmo tempo” (Idem, ibidem).


Foto em frente a piscina adulto. Incrível observar que o clube só tinha a fachada, todo o resto era aberto e dava para a praia. Anos 80. Acervo pessoal de Fátima Porto Belém

Esta tentativa de promoção que apelava à paisagem ecoava uma consciência da valorização dos recursos naturais que se difundia no Brasil e no resto do mundo, como veremos. No entanto, não há registros dos impactos causados pelo clube ao seu entorno — um complexo ecossistema que abrange praias, estuário, mata de transição, dunas e manguezal. A sede do Caça e Pesca foi plena e finalmente reformada em 1984, incorporando um parque aquático para o lazer das crianças e serviços de bar e restaurante. 

“O governador Luiz Gonzaga Mota, o vice-governador Adauto Bezerra, o prefeito César Cals Neto, o comandante da 10.ª Região Militar, Francisco Torres de Melo, o capitão-de-fragata Francisco Nogueira de Oliveira Filho e a Cervejaria Astra receberam títulos de sócios-beneméritos na cerimônia de (re)inauguração” (O POVO, 1984).


A piscina infantil e ao fundo, o mar. Foto dos anos 80.
Acervo pessoal de Fátima Porto Belém

Na oportunidade, foram entregues troféus aos vencedores de competições como a prova de Tiro à Bala (troféu Brahma), prova de Skeet (tiro em pratos voando, troféu Asa Branca, numa homenagem do clube à Primeira-Dama do Estado, D. Mirian Mota) e, por último, uma homenagem de toda a diretoria ao então presidente do Caça e Pesca Otoni Diniz, “dando o seu nome ao troféu da Competição Olímpica” (Idem, ibidem). 
A reforma foi orçada em Cr$ 30 milhões, conforme a mesma fonte.

Caça e Pesca nos anos 80. Acervo pessoal de Fátima Porto Belém

Foto anos 80

"Barracas de alvenaria que tinha uma mesa, tamboretes e armadores, quem chegasse primeiro, armava sua rede, e a barraca era sua!" Fátima Porto Belém


O Caça e Pesca constituía-se em entidade única no Estado, segundo seu vice presidente em 1987, João Alencar Monteiro. Por algum tempo, atraiu os holofotes. Porém, novamente a decadência e o endividamento avolumaram-se e os próprios sócios da agremiação reclamavam, em 1989, da inexistência de maior qualidade no atendimento. Por fim, foi decidida a inviabilidade daquele empreendimento.


Caça e Pesca nos anos 80. Acervo pessoal de Fátima Porto Belém

No salão de dança, parte da cobertura está quebrada e a chuva está prejudicando as paredes e as instalações elétricas. As duas piscinas, inauguradas em 1983, estão abandonadas (DIÁRIO DO NORDESTE, 1989).

Encontro do Rio Cocó com a Praia do Futuro em 2004 - Pedro Itamar de Abreu Júnior

Ao final dos anos 80, o clube empregava 18 garçons e pessoal acessório sem
especialização, que passaram a habitar aquela vizinhança, até que, depois de declarada sua falência estrutural (quando foi posto à venda por NCz$ 300 mil) o BNB Clube o adquiriu. O então gerente do Caça e Pesca, Francisco Hélio de Oliveira, com salários há meses atrasados, sobrevivia “vendendo peixe assado e bebidas numa barraca instalada na beira da praia” (Idem, ibidem). Atividade informal ligada ao usufruto da praia para o lazer e o turismo, que se consolidou ao extremo e tornou-se “vocação”.

No antigo Clube Caça e Pesca, hoje encontra-se a sede praia do BNB Clube.


Hoje, a 30 anos daquela reinauguração, o Zoneamento sócio-ambiental participativo do lugar denominado Caça e Pesca trata de focalizar a aglomeração, de caráter excludente, que se originou nas cercanias daquele clube e terminou por assumir o seu nome.
Tecnicamente, é um olhar transdisciplinar voltado a uma área da periferia urbana da capital do Estado do Ceará, no Brasil de 2003-2004. A propósito, um país que recebeu naquele ano US$ 2 bilhões em divisas originadas do turismo (36% a mais que em 2003, conforme o site maxpressnet.com.br). Citamos o turismo por ser este também um fator de impacto crescente no local.


O Caça e Pesca é hoje, portanto, um “lugar” sobre o qual a malha da cidade avançou, sem que exista documentação organizada específica sobre o processo de sua transformação. É importante que haja alguma providência, já que as decisões sobre o futuro da área, implicam em impactos sobre o manguezal.


Crédito: Marco Antônio Krichanã da Silva


sábado, 8 de junho de 2013

Fortaleza antiga - O lazer e os Clubes Sociais


Na Fortaleza dos anos de 1920 a 1930, assim como outras práticas urbanas existentes, o lazer visando o divertimento ocorria de modo diferenciado. Com o constante desejo vindo por parte da população para criar novos meios de distração e de ocupação, foi necessário fundar ou até mesmo se apropriar de espaços públicos ou privados destinados a reuniões de alguns grupos sociais, estes geralmente compostos pelas classes mais abastadas. Já as classes mais baixas faziam o uso dos espaços que eram possíveis.

Em destaque o prédio onde funcionou o Clube Cearense

Na virada do século XIX para o XX, encontramos variadas áreas públicas e privadas como mediadoras de grandes encontros sociais daquele tempo. No entanto, esses espaços possuíam grande importância para as relações pessoais da população fortalezense, já que segundo Albertina Mirtes de Freitas Pontes (A cidade dos clubes: modernidade e “glamour” na Fortaleza de 1950 – 1970. P.107) “a própria estrutura das moradias, da maior parte da população, não oferecia condições para o convívio e as trocas sociais.” Por isso era necessária a utilização ou até mesmo criação de locais onde os encontros e os eventos sociais pudessem ser realizados com uma maior frequência. 



Destacaram-se como as principais formas de lazer em nossa capital no início do século XX a ida ao teatro, ao cinema, à igreja; era muito comum ainda as rodas de conversas que aconteciam na Praça do Ferreira, em bares ou cafés, as conversas nas calçadas, as idas ao Passeio Público e as festas que ocorriam nos clubes que formavam a cidade de Fortaleza. 

Revista Bataclan de 1923

Todos esses espaços ofereciam diversão a seus frequentadores, mas vale ressaltar que mesmo nos locais públicos existiam as distinções sociais, eles não eram compartilhados de maneira igualitária. Essas áreas dedicadas ao lazer eram na verdade grandes divisores sociais, pois o fato de frequentá-los já denunciava a qual classe social um indivíduo pertencia. 

Clube Iracema - Acervo Sérgio Roberto

Os hábitos que se formaram em torno do lazer, sofreram com o passar do tempo, mudanças significativas. No decorrer da história de Fortaleza, alguns deles acabaram sendo esquecidos e outros reforçados. No entanto, os clubes sociais como locais de lazer ganharam mais evidência e prestígio diante da sociedade fortalezense, na virada do século XIX para o XX. 

Carnaval do Clube Iracema - Acervo Sérgio Roberto

As primeiras ideias referentes a esses clubes sociais vieram por meio da chegada da família Real ao Brasil em 1808, através disso o Rio de Janeiro passou a ser palco de grandes festas que ocorriam nos luxuosos salões ou até mesmos em palacetes, onde era acolhida a parte mais nobre da sociedade daquela época.


Inspirada nas eventualidades que ocorriam no Rio de Janeiro e até mesmo em outras capitais brasileiras, Fortaleza, já em meados do século XIX, realizava festas e reuniões elegantes oferecidas para a sua sociedade, mas como durante esse período a capital cearense ainda possuía traços provincianos; apenas a elite estava apta a participar desses sofisticados encontros sociais. 
(Ao lado, baile no Ideal Clube)

Posteriormente, mas ainda durante o século XIX, surgiram em Fortaleza os clubes sociais, que foram criados por grupos específicos e eram locais destinados ao lazer. 

Ideal Clube

Bloco Meu Ideal é você do Ideal Clube

A cidade de Fortaleza foi marcada no período de transição do século XIX para o século XX pelo surgimento de diversas agremiações, as principais delas eram relativas aos clubes denominados “elegantes”. O primeiro deles, o Clube Cearense foi fundado no ano de 1867, de caráter elitista, possuía uma postura altamente discriminatória. No entanto, como forma de oposição surge em 1884, o Club Iracema, que apesar de ter sido criado como forma de se opor ao “exclusivismo” do Clube Cearense, o Club Iracema era um local de acesso restrito, ao passo que seus sócios eram compostos basicamente por grupos ligados ao comércio e a Alfândega

Revista Bataclan

Os clubes “elegantes” marcaram a sociedade cearense pelas festas que realizavam, especificamente os bailes que ocorriam na cidade com muita pompa e prestígio, e também pela moda que apresentavam. Nessas ocasiões seus frequentadores se vestiam a rigor, tradicionalmente as mulheres trajavam vestidos longos e os homens smokings

De acordo com o tipo de baile e com os seus convidados, os trajes sofriam alterações, sofisticando-se então ainda mais. Essa valorização direcionada ao vestuário em cada solenidade ocorria por parte da “alta sociedade” de Fortaleza que tinha o prazer de se destacar nesses eventos sociais. Os membros desses clubes “elegantes”, em especial as mulheres, costumavam se preparar com bastante antecedência para a ida ao baile; começavam comprando os tecidos mais caros disponíveis no mercado – gaze, seda pura, renda e zebeline; era comum também fazer a encomenda dos mesmos em outra capital, logo após a compra era escolhido o modelo do vestido e encaminhado para as costureiras. 

Deslumbrante Baile no Club Iracema publicado no Jornal A Lucta de 02 de julho de 1914

A imprensa estava sempre atenta aos eventos em geral que ocorriam nos clubes cearenses, assim era comum os jornais que circulavam pela cidade publicarem notas tratando da decoração ou das roupas utilizadas pelas personalidades presentes.

Vale ressaltar que com o passar dos anos, a elite não era apenas a única classe frequentadora desses clubes, por conta do surgimento de um grande número desses locais de lazer foi possível criar agremiações direcionadas para pessoas de outras camadas sociais. Como já citado anteriormente, os jornais reservavam sempre um espaço em suas publicações para notícias referentes aos clubes sociais que ilustravam a cidade de Fortaleza, nas revistas eram publicadas notas sobre as festividades desses clubes de maneira mais sutil quando comparadas aos outros meios de comunicação. 

Através dos arquivos das revistas de época, foi possível perceber que cada fascículo abordava conteúdos distintos desses clubes. As notas sobre eles tratavam dos temas mais variados indo desde exposições de arte, de apresentações musicais, até anúncios sobre chá dançante, manhã dançante, homenagem à bandeira e bailes sociais – festas essas tradicionais, que aconteciam na cidade de Fortaleza. O baile de carnaval era um evento que alterava significativamente os clubes sociais de Fortaleza, as decorações elaboradas tornavam as agremiações mais bonitas e criativas. 



Havia ainda a criação de blocos e de fantasias, estas confeccionadas com muitos detalhes e minuciosos acabamentos, utilizadas por jovens e também pelas senhoras e senhores, o objetivo era ganhar destaque tanto pelo vestuário como pela animação. 

(Ao lado, anúncio na Bataclan sobre uma Exposição Regional de pintura em 30 de outubro de 1923 no Clube dos Diários

Revista Ceará Ilustrado de 01 de fevereiro de 1925

Um fato importante sobre as revistas é a forma como elas abordavam determinados assuntos sociais. Como as agremiações cearenses no começo do século XX ainda eram voltadas para as classes mais abastadas da cidade de Fortaleza, as representações desses clubes ocorriam de formas diferentes nesses meios de comunicação. 

Revista Ceará Ilustrado de 15 de fevereiro de 1925

A revista Ceará Ilustrado por ser um semanário que tratava de assuntos políticos, literários e sociais, era a que reservava mais espaço para as matérias referentes às agremiações. Em seus fascículos a presença desse assunto ocorria com grande frequência, poucas eram as publicações que não apresentavam no mínimo um anúncio limitado sobre os clubes. Uma abordagem dos mais variados clubes sociais podia ser encontrada por meio de notas ou matérias. 
Já a revista Bataclan, fundada em 1926 pela Associação dos Comerciários, era voltada para a elite comercial de Fortaleza. Ela possuía um caráter de arte e elegância; no entanto publicava na maioria das vezes notas sobre os clubes destinados a essa classe social. 
Possuindo um aspecto similar a Ceará Ilustrado, a revista A Jandaia tratava de temas como arte, literatura e atualidades e foi à única revista que não indicou um amplo conteúdo sobre a questão dos clubes sociais. Apresentava informações sobre as práticas de lazer que ocorriam na capital cearense no início do século XX, mas um conteúdo mínimo sobre as agremiações foi encontrado, apenas algumas notas sobre reuniões específicas que aconteciam nesses espaços sociais.


Maria Darlyele Gadelha de Castro 

(Graduanda em Design de Moda)

Imagens: Revista Bataclan,
Revista Ceará Illustrado

Acervo Sérgio Roberto
Arquivo Nirez e
Jornal A Lucta de Sobral




sábado, 9 de fevereiro de 2013

Náutico e o Carnaval da Saudade - 46 Anos


O Carnaval da Saudade é o grande presente do Náutico Atlético Cearense ao folião alencarino e todos que visitam Fortaleza no Reinado de Momo*. É a alegria maior da cidade. A folia saudável. O (re) encontro de gerações. A segurança garantida e a animação da inconfundível orquestra carnavalesca “Brasas 6”.

Sucesso absoluto do IV Baile da Saudade - Arquivo Ivan Gondim

IV Baile da Saudade - Arquivo Ivan Gondim

"Idealizado por mim com a valiosa colaboração do companheiro de Diretoria Hariberto Xavier Onofre, o Carnaval da Saudade foi realizado pela primeira vez em 17 de fevereiro de 1968. Grande sucesso que, no decorrer dos anos, ganhou a aceitação da sociedade cearense, embora seja uma primazia da família “alviverde”.

Uma festa realmente surpreendente, sob todos os aspectos, considerando-se o grande número de sócios participantes, a preservação cultural do cancioneiro popular, a beleza da decoração e, finalmente, o desempenho da orquestra executando um roteiro musical de grande animação, contagiando todas as idades.

... Sinto-me feliz e realizado, certo de que nossa ideia e o nosso trabalho dedicados desinteressadamente ao Náutico... desde a saudosa Praia Formosa, não foi em vão, continua válido e prosperando."

Palavras de Helano Studart Montenegro – Criador do Carnaval da Saudade

I Carnaval da Saudade - 1968

"Quando o nosso querido e ilustre sócio, Helano Studart Montenegro, idealizou, planejou e juntamente com a diretoria de 1968 realizaram em 17 de fevereiro o primeiro Carnaval da Saudade, a grandiosidade do evento foi definido pelo próprio idealizador, como: “Uma festa realmente surpreendente, sob todos os aspectos, considerando-se o grande número de sócios participantes, a preservação cultural do cancioneiro popular”... Acrescento que a aprovação e participação dos eventos subsequentes extrapolaram aos nautiquinos contaminando a sociedade cearense e inclusive com a participação de foliões de outros estados"  João Otávio Lobo Neto

Em 17 de fevereiro de 1968, sábado magro, acontece o I Carnaval da Saudade, no Náutico Atlético Cearense, com o tema "De Zé Pereira a Zé Keti", com roteiro musical elaborado pelo pesquisador Christiano Câmara.

É hora de juntar a turma, combinar a fantasia, separar o confete e serpetina, fazer um bloco e se preparar para a diversão que toma conta dos salões do Náutico Atlético Cearense. Com a ideia de preservar os antigos carnavais, o clube realiza hoje o seu tradicional Carnaval da Saudade.

II Carnaval da Saudade - 1969
Arquivo João Otávio Lobo Neto

Capa do roteiro de músicas - Arquivo João Otávio Lobo Neto

“É uma festa animada, com amigos fazendo blocos, levando estandartes, num clima de brincadeira saudável e familiar”, garante Joaquim Guedes Neto.

O Carnaval da Saudade, que já faz parte da história da cidade, teve sua primeira edição em 1968, conquistou a sociedade cearense, que passou a se reunir no Náutico para uma espécie de Abertura Oficial do Carnaval a cada ano. 

Capa do livreto do III Carnaval da Saudade: Nirez
Arquivo João Otávio Lobo Neto

Carnaval da Saudade de 1970 - Arquivo João Otávio Lobo Neto

Cheio de tradição e história, o Carnaval da Saudade vem mantendo a proposta de relembrar o som e o clima dos antigos carnavais. Por isso o repertório é formado por marchinhas, frevo, samba, marcha-rancho e outros ritmos que marcaram os salões. 

Capa do roteiro de músicas do IV Carnaval da Saudade - 1971
Arquivo Diário do Nordeste

E quando se fala em tradição, é tradição mesmo. Ideias que foram dando certo ao longo dos anos, foram virando marcas registradas da festa. Uma das mais conhecidas é um livrinho que é distribuído a todos os foliões contendo a ordem e as letras de todas as canções que vão ser tocadas na noite.

Arquivo Diário do Nordeste

Arquivo Diário do Nordeste

Alguns desses livrinhos. Carnaval da saudade de 1976-1979
 Arquivo João Otávio Lobo Neto

"Sempre tem um bebo pedindo pra tocar alguma música. Com o livrinho, ele já sabe quando vai tocar a que ele quer”, explica Ary Araripe (ex-presidente do clube)
Outra marca é que a banda começa com o Zé Pereira (considerada uma das primeiras canções carnavalescas do Brasil) e encerra com Está Chegando a Hora (Rubens Campos).

Animado Carnaval da saudade do Náutico - Arquivo João Otávio Lobo Neto

O maestro Zé Maria, da Orquestra Brasas Seis, é músico autodidata e lapidou seu conhecimento no curso de Música da Universidade Estadual do Ceará, o tecladista de 70 anos está há 13 no Baile da Saudade e não pensa em largar sua banda. “Cansa, mas nós... já estamos acostumados. Nosso descanso é na hora das músicas mais lentas”.

Brasas Seis - acervo Keit Luna

Cansaço, inclusive, é uma palavra que também não faz parte do dicionário dos foliões do Náutico. O advogado Adriano Garcia, por exemplo, tem 80 anos e frequenta a festa desde sua primeira edição. “A animação é a mesma nesses anos todos. Hoje, vou com meus filhos netos e bisnetos”. Ele ainda conta que, antigamente, fazia parte da brincadeira deixar o baile já de manhã cedo para ir tomar banho de mar com fantasia e tudo. Embora essa parte não tenha resistido ao tempo e às mudanças da Beira Mar, hoje ele espera o dia amanhecer para aproveitar a carneirada oferecida pelo Náutico para os brincantes mais resistentes.

Carnaval da Saudade de 2005

"A marcha Zé Pereira de 1870, apresentada pelo sapateiro português da Rua São José ao também ruidoso número francês do antigo Alcazar, Francisco Correia Vasques arranjou uma cena cômica que intitulou de Zé Pereira Carnavalesco e montou-a então pela Companhia Jacinto Heller. Era um pequeno ato com a pretensão única de comicidade, sem qualquer outro destaque que não o de apresentar a melodia excitante para a qual o cômico brasileiro escrevera uns versos que, no ano seguinte com a designação de "poesia" seria incluída com o titulo de Viva o Zé Pereira na coletânea Lira de Apolo, como consta da publicação da Biblioteca Nacional - Rio Musical - crônica de uma cidade (1965)" João Otávio Lobo Neto

XL Carnaval da saudade - 2007
Acervo Clóvis Acário Maciel

O Carnaval da Saudade, foi o legado mais importante que restou dos grandiosos bailes que aconteciam no clube antigamente. A tradicional Festa das Crianças, que possui mais de 50 anos, também é oriunda dos primeiros bailes carnavalescos. 

Em 12 de fevereiro de 1977, na festa Carnaval da Saudade, o Rei Momo Francisco José Torres de Sá e Benevides (Titico I e Único) é coroado juntamente com a Rainha do Carnaval de 1977, Heloísa Helena, recebendo das mãos do prefeito em exercício Manuel Sandoval Fernandes Bastos (Sandoval Bastos), a chave da Cidade.

No Carnaval da Saudade de 14 de fevereiro de 2004, são coroados o Rei Momo e a Rainha do Carnaval para 2004, Renato Fagundes Diógens Viana e Amanda Lopes Veloso.

XLI Carnaval da Saudade - 2008
Arquivo Diário do Nordeste

Chegando à sua 46ª edição, o Carnaval da Saudade do Náutico é um dos eventos mais tradicionais do Carnaval de Fortaleza. Com eleição de Rei Momo e Rainha do Carnaval e o repertório tradicional dos grandes bailes, a festa atrai pessoas de todas as idades, sempre no sábado magro, ou seja, um dia antes do Carnaval.

Luizianne Lins curtindo o carnaval da saudade do Náutico - João Otávio Lobo Neto

Saiba mais

A festa foi idealizada em 1968 pelo sócio do Clube, Helano Studart Montenegro, que junto à diretoria realizou em 17 de fevereiro, o primeiro carnaval.

Apaixonado por carnaval desde a infância, Helano Montenegro, na década de 1960 já sentia falta de antigos carnavais. Até que sugeriu ao então presidente do clube, Ary Araripe, que promovesse um carnaval da saudade. "A festa cresceu ano a ano, deixando a casa sempre lotada. É a expressão mais significativa de que o nosso trabalho continua sendo reconhecido", destaca Araripe.

Carnaval do Náutico na década de 50. Nessa época, ainda não existia o Carnaval da Saudade. Arquivo Blanchard Girão

Os dois fazem questão de destacar o papel do colecionador e historiador Cristiano Câmara nessa história de sucesso. Por vários anos, era ele quem escolhia o repertório e o repassava para as bandas. "Cristiano tinha um acervo muito rico", lembra Montenegro, que também idealizou o primeiro folheto, com as letras de músicas, outra marca registrada do evento.

“O Carnaval da Saudade iniciou com a finalidade de preservar os antigos carnavais, e até hoje só tocamos músicas antigas, marchas ranchos, samba enredo, As Pastorinhas, Mamãe eu quero. Nós estamos no ápice do nosso carnaval." 
A festa comporta cerca de 5.000 pessoas e contempla dois setores (um mais perto do palco) Setor A e o outro um pouco mais longe, Setor B.
A maioria dos foliões usa fantasias, faz blocos, cria as próprias roupas. “Eles se preparam mesmo para a festa". 
São cerca de 800 mesas espalhadas pelo grande salão e a orquestra Brasa Seis animando à noite. Cada mesa recebe um livreto com as canções que vão embalar o Carnaval da Saudade. “É uma festa belíssima em que toda a sociedade cearense se encontra. E assim, há anos que não temos confusão nem briga, as pessoas vão com espírito de carnaval mesmo. Tem jovens de 25 até senhores de 90 anos. Os mais antigos vão para reviver antigos carnavais, os mais novos vão para conhecer o carnaval antigo”, garante Joaquim Guedes Neto.

Carnaval da Saudade - João Otávio Lobo Neto 

Carnaval da Saudade - João Otávio Lobo Neto

*Antes o Rei Momo e os Cronistas Carnavalescos apresentavam-se nos clubes e no Corso acompanhados de casais fantasiados de “Romeu e Julieta”, “Sansão e Dalila”, “Tristão e Isolda”, variando a cada ano.

O primeiro Rei Momo de Fortaleza, Ponce de Leon, e a primeira crônica carnavalesca. Publicada no jornal Tribuna do Ceará, de 19/01/1978. Acervo Fernando Antº Lima Cruz

Remota a década de 40 a indicação do Rei Momo do Carnaval do Ceará: Ponce de Leon, que foi deposto por haver sido flagrado comprando pão, em pleno Carnaval, na Padaria Palmeira, ato difamante para um Monarca da Folia... Foi substituído por Luizão I e Único (Maguari). Dispensava corneta real, e apresentava-se no Corso e clubes com o jargão: “Eu cheguei, cachorrão!” Célebre, ganhou concurso de “Melhor Rei Momo do Brasil”, no Rio de Janeiro.

Côrte do Rei Momo Luizão - Arquivo Nirez

Vários monarcas foram oriundos do rádio ou jornal: Cirão I e Único (Ciro Saraiva – Correio do Ceará; Fernando Mendes (O estado); Irapuan Lima (Rádio Iracema); Jadir Jucá (Rádio Dragão do Mar - por sinal casou com a Rainha, a modelo Lucráia Garcia); Bezerrão (“Rádio Dragão do Mar”). Este foi deposto em Sobral, por não esperar pela Rainha, trocá-la por uma “mulher de cabaré” e com ela ingressar na festa do tradicional Derbi Clube Sobralense. Um escândalo para a sociedade. Foi substituído na Segunda-Feira Gorda por Catunda Pinho (Catundão I e Único - Rádio Verdes Mares). Jurandir Mitoso (PRE – 9), magérrimo, foi Príncipe Regente por falta de um “rei gordo”...
Também foram reis: Marcelo (Clube de Regatas Barra do Ceará), Paulão I e Único (filho do deputado Paulo BenevidesPresidente da Assembléia Legislativa); Javeh (alfaiate da sociedade). Uns ficaram tão populares que se elegeram vereador à Câmara Municipal de Fortaleza: Narcílio Andrade e Martins Nogueira.
De tudo isto, o mais importante é que ainda hoje permanece a magia dos Monarcas da Folia, e o Náutico, com o Carnaval da Saudade, faz parte desta história!


Fontes: O Povo, O Estado do Ceará, Cronologia Ilustrada de Fortaleza de Miguel Ângelo de Azevedo e Diário do Nordeste

NOTÍCIAS DA FORTALEZA ANTIGA: