Fortaleza Nobre | Resgatando a Fortaleza antiga
Fortaleza, uma cidade em TrAnSfOrMaÇãO!!!


Blog sobre essa linda cidade, com suas praias maravilhosas, seu povo acolhedor e seus bairros históricos.

 



sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Dragão do Mar - Um verdadeiro herói



Num país com muitos heróis de araque, o cearense Francisco José do Nascimento, o Chico da Matilde, é exemplo de homem simples que fez sua vida valer a pena, deixando um legado de força e coragem que merece ser lembrado e seguido.


Todo mundo já ouviu falar na “seca do 15”. Há até quem use a expressão para caracterizar o estado físico de uma pessoa esguia, mirrada, seca mesmo. A falta de chuva que castigou o Ceará nesse ano (1915) foi de fato muito “braba”, como se diz por aqui. Tanto que serviu de pano de fundo para o romance mais conhecido da escritora cearense Raquel de Queiroz: O Quinze. No entanto, o torrão cearense se deve a outros períodos de escassez tão drásticos como o de “15”.

Refiro-me à seca de 1877 a 1879. Na época, mais de um em cada quatro cearenses morreram vitimados pela sede, fome, varíola e cólera. Não havia casa sem luto. Alguns registros dão conta de que no ano de 1878 foram sepultadas nos cemitérios
São João Batista e Lagoa Funda mais de 56.000 pessoas, isso numa população de 124.000 habitantes. Um verdadeiro holocausto.

Alguns poucos e sérios livros de História contam que durante a tragédia cearense foi organizada uma campanha de socorro às vítimas, destacando-se nomes importantes, entre eles
João Cordeiro, então comissário-geral dos Socorros Públicos. Mas naqueles tempos sobressaiu-se um outro personagem. E é sobre ele que este texto vai se reportar: um filho da cidade de Aracati nascido em 1839 na localidade de Canoa Quebrada e que respondia pela alcunha de Chico da Matilde. De batismo, era Francisco José do Nascimento, herdeiro do pescador Manoel do Nascimento, que resolveu tentar a vida na Amazônia e faleceu nos seringais, e da rendeira Matilde Maria da Conceição.

Com a morte do pai, aos oito anos, Chico da Matilde teve que assumir a casa, envolvendo-se no cotidiano do litoral. Como outros milhares de sua época, cresceu analfabeto, fenômeno que, infelizmente, ainda se repete até hoje, exatos 170 anos depois. Só aos 20 aprendeu a ler. Homem do mar por ofício, começou a vida como menino de recados à bordo do navio Tubarão, para depois tornar-se chefe dos catraieiros, os condutores de jangadas e botes do litoral da capital cearense. Em 1859, trabalhou nas obras do
porto de Fortaleza. Depois, empregou-se como marinheiro em um navio que fazia a linha Maranhão-Ceará e, em 1874, foi nomeado prático da Capitania dos Portos
.

Postal raríssimo de 1881 - Jangada de Dragão do Mar

Em Março de 1884, Chico da Matilde vira um herói nacional. Vai do Ceará à Corte, no Rio de Janeiro, levando na bagagem sua velha jangada de guerra. Torna-se um dos primeiros a desfilar pelas ruas, ouve o hino nacional em sua homenagem, recebe chuvas de flores da multidão e finalmente ganha o nome místico que o imortalizaria, também da lavra de Patrocínio: Dragão do Mar. Há relatos de que mais de 10.000 pessoas o saudaram, inclusive com direito a uma comissão de frente composta de 24 musculosos negros que conduziam nos ombros sua embarcação à vela onde estava escrito: Liberdade.

A única lembrança triste deste episódio é que o ícone da libertação dos escravos no
Brasil, a jangada de paus roliços e vela branca, doada ao Museu Nacional, desapareceu alguns anos depois. O jornalista catarinense Raimundo Caruso, no livro "Aventuras dos Jangadeiros do Nordeste", descreve o que pode ter acontecido: “A jangada Liberdade, de Francisco José do Nascimento, era a clássica, de troncos. Símbolo de uma resistência popular vitoriosa no Ceará, foi levada à Capital do Império a bordo de um navio mercante e, mesmo viajando no porão, inaugura a rota das futuras aventuras dos jangadeiros nordestinos em direção ao Sul. A embarcação foi exibida nas ruas do Rio de Janeiro, sob os aplausos da multidão, e pouco depois é doada ao Museu Nacional, onde foi recebida como valiosa peça etnográfica (...). Em seguida a jangada foi transferida para o Museu da Marinha (...), de onde, queimada, feita em pedaços ou desmontada, desapareceu”.



De volta a
Fortaleza, em 1889, ele foi reconduzido, por ordem do Imperador D. Pedro II, ao cargo de prático da Capitania dos Portos. No ano seguinte, com o advento da República, João Cordeiro assume brevemente a presidência do estado e entrega a Dragão do Mar a patente de Major-Ajudante de Ordens do Secretário-Geral do Comando Superior da Guarda Nacional do Estado do Ceará, em reconhecimento à sua bravura.



No ano de 1902, casou-se, pela segunda vez, com Ernesta Brígida, sobrinha de João Brígido. Em 1904, aos 65 anos, o Dragão do Mar volta a participar de causas populares. Desta vez lidera a Revolta dos Catraieiros, movimento de pescadores e chefes de família em reação ao fato de haverem sido sorteados para o serviço militar, tendo que seguir para o sul do país a bordo do navio Maranhão. O Historiador Cale Alencar explica que a revolta se formou porque “o edital de convocação havia sido publicado com apenas 72 horas de antecedência do embarque, tomando a todos de surpresa, muitos deles com oito, dez filhos e alguns já avós. Por toda a Praia do Peixe, a antiga Praia de Iracema, ouviu-se a ordem do Dragão do Mar: ninguém embarca!”
Contudo, à força, o governo embarca os amotinados, não antes de deixar 90 homens feridos e um morto em confronto com os soldados da província. Nessa ocasião, Dragão do Mar lidera uma marcha até o
Palácio da Luz, sede do governo de Pedro Borges, cobrando justiça. O presidente, temendo o pior, recolhe suas tropas. Até seus últimos dia de vida, o herói cearense agiu em defesa das classes menos favorecidas, vindo a falecer no dia 6 de março de 1914, em razão de ataques dos jagunços do Padre Cícero, que lutavam para derrubar o presidente Franco Rabelo.

Em 1999, o símbolo da resistência popular cearense contra a escravidão foi finalmente homenageado pelo
governo do Ceará dando seu nome ao Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura. Em comemoração aos dez anos de fundação, uma série de atividadesfoi promovida, entre exposições, concurso de redação, reedição do livro "Dragão do Mar – O Jangadeiro da Abolição", de Edmar Morel, de 1949, além da confecção da estátua de Chico da Matilde.


Apesar de esquecido pelos livros, Francisco José do Nascimento entrou para história como um verdadeiro herói. Em um país acostumado a venerar em carro público vencedores de reality-shows tão fajutos quantos seus destaques, Chico da Matilde é, e sempre será, exemplo para esta e futuras gerações. Que o Brasil tenha outros jangadeiros como Francisco, homens que fazem da sua vida e do seu trabalho um instrumento para transformar o mundo em um lugar mais justo e igual para todos.


GEVAN OLIVEIRA

Esse texto é simplesmente maravilhoso, me deleitei lendo e relendo várias vezes. Espero que vocês também estejam dispostos a mergulhar nessa fasciante história. Aproveitem!

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Liberdade já!


Foi em Fortaleza que começou o movimento de libertação dos escravos. Um grupo de entusiastas formado por João Cordeiro, José do Amaral, Isaac Amaral, Frederico Borges, D. Maria Thomasia e outros, deu o primeiro grito de alarme, em sessão secreta, na qual ficou deliberado que, na semana seguinte, desapareceriam os escravos de A ou B. Com efeito. Cada membro daquele humanitário grupo, procurava entender-se pessoalmente com os cativos e incutia-lhes a idéia de liberdade. "Tome este bilhete e vá apresentar-se ao meu amigo fulano de tal, você não é mais escravo. É tão livre como eu. Somos iguais em tudo". E despedia com carinhoso abraço e forte aperto de mão o seu novo amigo.

João Cordeiro

http://www.arazao.net/images/maria-thomazia.jpg
D. Maria Thomasia

Aos nomes já citados dos libertadores juntaram-se mais os senhores João Lopes Ferreira, Juntiano de Serpa, Antonio Bezerra, D. Elvira Pinho, etc. Deliberaram a criação de um jornal de propaganda, cujo nome foi "O Libertador". Nele expandiam largamente a idéia nova, que em breve invadiria toda a população cearense.


Antônio Bezerra

Já era intensa a corrente libertadora contra os donos de escravos, os quais prevendo perder sua "mercadoria humana", a sua propriedade, procuravam, a todo custo, desfazer-se dela, tentando embarcar seus escravos para as senzalas do sul, empenhando nisto tosa segurança, mas no ponto de embarque, estava preparada fortissima barreira. Era Francisco do Nascimento, conhecido como Chico da Matilde ou Dragão do Mar. Exercia ele a função de Prático-Mor da Barra. A sua jangada não se rebaixaria, transportando aquela "Mercadoria humana"! Ele opunha-se fortemente ao transporte dos escravos para bordo de qualquer navio.

Libertador - 25 de Março de 1884

Houve luta, e luta renida das autoridades negreiras contra os libertadores. Para tanto, os escravocratas conseguiram a demissão de Frederico Borges do cargo de Promotor público da capital e de Dragão do Mar, por serem libertadores. Mesmo assim, nada conseguiram, porque o povo, em massa, opunha-se contra aquele tráfego humano. Os libertadores cada vez mais, empenhavam maior esforço. A casa das suas sessões era conhecida por "Furna na Rocha Negra" e outra "Furna da Rocha Branca". Ali, lavravam as cartas de liberdade. Em seguida despachavam um portador com a quantia arrecadada, dizendo ser a importância total pela alforria de seu escravo fulano, hoje cidadão brasileiro. O tal negreiro tinha que se conformar porque seu ex-escravo não aparecia mais.

Dragão do Mar

Os conflitos reproduziam-se a cada dia, montavam guarda na praia dia e noite, de modo a não ser possível o embarque de um único escravo sequer. A qualquer hora invadiam o ponto de embarque, viravam jangadas e qualquer outra embarcação que se atrevesse a tentar algum serviço favorável aos negreiros.

Um dia, decidiram libertar todos os escravos em um município próximo. Tomaram o trem e saltaram na Vila do Acarape e uma vez ali, entre grande número de pessoas de todas as classes, depois de eloquentes discursos, declararam livres todos os escravos do município e que para comemorar essa data gloriosa, ficava também mudado o nome do município de vila do Acarape para Redenção. Esse nome de ocasião pegou, e mais tarde, tendo sido elevada a categoria de cidade, foi com o nome de Redenção que perpetuou assim, esse extraordináriop feito.

Em 25 de março de 1884, fizeram eles o mesmo com relação ao municipio da capital, e por fim, com todo o território da então Provincia do Ceará. Os escravos das Provincias vizinhas: Piaui, Pernambuco, Paraiba e Rio Grande do Norte, sabendo não haver mais escravos no Ceará, vinham aqui se refugiar, na certeza de não serem perseguidos.

Na noite de 25 de março fazia gosto ver-se o entusiasmo popular em favor da libertação dos escravos. A capital enchia-se de gente, convidados pelo jornal "O Libertador". A decoração e a iluminação tomaram contas das ruas e residências. Na casa mais pobre, das areias, nos suburbios, via-se, ao menos, uma vela de carnaúba com lanterna de papel de cor, fincada na areia, junto a porta. O municipio do Ceará não tinha mais escravos. Estava livre desta MANCHA.

Fonte: Coisa de cearense e pesquisa de internet

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Lívio Barreto - O caixeiro poeta



Lágrimas tristes, lágrimas doridas,
Podeis rolar desconsoladamente!
Vindes da ruína dolorosa e ardente
Das minhas torres de luar vestidas!

Órfãs trementes, órfãs desvalidas,
Não tenho um seio carinhoso e quente,
Frouxel de ninho, cálix recendente,
Onde abrigar-vos, pérolas sentidas.

Vindes da noite, vindes da amargura,
Desabrochastes sobre a dura frágua
Do coração ao sol da desventura!

Vindes de um seio, vindes de uma mágoa
E não achastes uma urna pura
Para abrigar-vos, frias gotas d’água!

Lágrimas - Lívio Barreto

Lívio da Rocha Barreto nasceu na Fazenda dos Angicos, distrito de Ibuaçu comarca de Granja/Ce , em 18 de fevereiro de 1870.

Filho de José Soares Barreto ( o Águia do Trapiá ) e Mariana da Rocha Barreto. Lívio foi morar na sede Granja, onde chegou em 1878 e aí aprendeu, com o professor Francisco Garcez dos Santos, as primeiras letras.

Cedo, tinha apenas o Ensino Primário, teve que abandonar os estudos para atuar como caixeiro no comércio. Foi quando conheceu o magistrado Antônio Augusto de Vasconcelos que o ensinava, nas horas de folga, lições de Português,
Geografia
e Fran
cês.


O Caixeiro

Exigências de fortuna obrigaram-no a ir, muito criança ainda e muito a contragosto seu, servir como caixeiro de um parente (ofício embrutecedor que o perseguiria pela vida a fora), gastou ele aí a melhor parte de sua infância, incompreendido e anônimo. Mas, não podendo conter os ímpetos de sua alma em anseios de ideal superior, com José Barreto, Luís Felipe, Belfort e outros funda um jornal literário - "O Iracema" - onde aparecem seus primeiros versos, defeituosos ainda, mas já reveladores da inspiração e da originalidade daquele que mais tarde passaria a ser o principal representante do Simbolismo no Ceará, apesar da forte tendência romântica.

Sentindo o meio em que vivia intelectualmente atrasado para seus talentos, resolve seguir para Belém do Pará, em junho de 1888, onde trava conhecimento com o poeta João de Deus do Rêgo, que muito contribui para o seu aperfeiçoamento literário. Regressa dali, em 1891

, doente e acabrunhado de esperanças

(

Com beribéri* e saudoso de casa, retornou ao Ceará. Nesse período, viu-se envolvido por uma intensa e triste paixão que o acompanharia até os últimos de seus versos e suspiros. Ainda em 1891, publicou “Versos a Estela”, além de sonetos e crônicas)

.

Por esse tempo aparece, na sua terra natal, um outro jornal literário - "A Luz" - em que Lívio publica sonetos e ligeiras crônicas humorísticas. Restabelecido no seio carinhoso da família, em fevereiro de 1892, ruma para a bela Fortaleza (

Em fevereiro de 1892, na busca do poético “fugir para esquecer”, dirigiu-se a Fortaleza, passando a trabalhar como caixeiro e a publicar versos no jornal "Libertador".)

, onde se torna um dos fundadores (com o pseudônimo de Lucas Bizarro) da Padaria Espiritual - entidade literária que produzia o jornal - "O Pão" - tendo à frente o talentoso poeta Antônio Sales.


Intelectualmente satisfeito, mas afetado, fora do lar, por dificuldades financeiras, regressa ele como filho pródigo, acontecendo naufragar à altura da Periquara, em viagem no vapor Alcântara (

Porém, desgostoso com o seu ofício no comércio, retornou à Granja (junho de 1982) à bordo do vapor Alcântara que naufragou, lançando ao mar revolto seus livros e um poema inédito.)

, salvando-se a nado, exímio nadador que era. Isto lhe rendeu um belo poema: "Náufrago".


Segundo Artur Teófilo, "O Lívio era magro, pequeno, altivamente petulante.Tinha o olhar penetrante, sem vacilações, a fronte alta e abaulada e uma palidez baça de hepático. Ria pouco e só entre amigos deixava por vezes transparecer sua fina verve elegante, um bocado pessimista e epigramática. Com o vulgo era sisudo, um tanto frio mesmo, com uns longes de bem entendido orgulho. Usava casimiras claras, chapéu de feltro alto, e fumava cachimbo, à noite, embalando-se rapidamente na rede, com um livro de versos nas mãos."


Dolentes 1ª Edição (capa 03)

Dolentes - 1ª Edição


A morte chega cedo demais



Em 1893, ingressou na Companhia Maranhense de Navegação à Vapor, para Camocim.

Lívio Barreto, autor de um único livro - DOLENTES - publicado postumamente por Waldemiro Cavalcanti, faleceu na sua banca de trabalho, em Camocim, fulminado por uma congestão cerebral**, pelas 3 horas da tarde do dia 29 de setembro de 1895, com apenas 25 anos de idade, tempo insuficiente para aprimorar sua arte poética. Mesmo assim, tornou-se o maior poeta granjense de todos os tempos e um dos principais do Ceará.

Lívio Barreto é patrono da cadeira nº 24 da Academia Cearense de Letras.


Lívio Barreto mereceu, das autoridades municipais, ter seu nome ligado a uma importante rua do centro da Cidade de Granja. A denominação poderia abranger toda a extensão da rua, mas o costume inadequado de dar-se múltiplos nomes a ruas grandes levou-a a ostentar dois outros, ao aproximar-se ao Cemitério e chegando ao Rio.

José Xavier Filho


Blog Sue Giersbergen

*Beribéri é uma doença provocada pela falta de vitamina B1 no organismo, o que provoca fraqueza muscular e dificuldades respiratórias.

A doença pode afetar o coração, dando origem a uma cardiomiopatia por deficiência nutricional chamada de beribéri cardíaco.


**

Congestão cerebral é a afluência anormal do sangue aos vasos do cérebro causado por emoções muito fortes e violentas, indigestões, contusões cranianas, alcoolismo, stress, etc. O limão funciona como tratamento auxiliar.


Fontes- Wikipédia, Raymundo Netto e pesquisas diversas pela internet

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Antônio Sales - Um dos maiores nomes da literatura brasileira



Antônio Sales nasceu em Paracuru, em 1868, e morreu em Fortaleza, em 1940. Aos 16 anos veio para Fortaleza, onde foi caixeiro em casas comerciais, ocupando o lazer com leituras, convertendo-se num autodidata. Publicou no jornal "A Quinzena" -órgão do Clube Literário -, (deste faziam parte Oliveira Paiva, Farias Brito e Juvenal Galeno) seu primeiro soneto. Estreou, em livro, em 1890, com "Versos Diversos"-´Trovas do Norte´); HistóriaO Babaquara´), teatro (´O Matapau´) e memórias (´Retratos e Lembranças´). Assinava seus escritos sob o pseudônimo de Moacir Jurema. Foi membro fundador da Padaria Espiritual, a quem coube escrever o manisfesto; fundada em maio de 1892, constituiu um movimento artístico que abrigava jovens dispostos a mudar o panorama das artes em Fortaleza; seu órgão de divulgação se intitulava "O Pão", aludindo, naturalmente, ao fato de que a arte é o alimento do espírito. Anunciava-se como um movimento marcado pela irreverência e proposta de novos conceitos em arte. As sessões da Padaria eram as fornadas, e o ambiente em que se realizassem recebia o nome de forno; os membros eram os padeiros; e o presidente, o Padeiro-Mor. Em nosso Estado, Antônio Sales foi secretário do Interior e Justiça, atuando, também, na política. Sua carreira literária e intelectual, no entanto, foi desenvolvida no Rio de Janeiro, onde se destacou como uma grande expressão de seu tempo. Ainda que haja produzido relativamente pouco, sua obra, tanto poética quanto ficcional, apresenta-se alicerçada em sólidas bases artísticas, merecendo a leitura de grandes nomes do ensaio literário no Brasil, como, por exemplo, Massaud Moisés. O romance Aves de Arribação foi, primeiramente, publicado em folhetins, só depois ganhando a forma do livro. Trata-se de uma grande expressão de nosso Ralismo-Naturalismo, inscrevendo-se, hoje, ao lado de obras como Dona Guidinha do Poço, de Manuel de Oliveira Paiva; Luzia-Homem, de Domingos Olímpio; A Fome, de Rodolfo Teófilo; e A Normalista, de Adolfo Caminha.

"Na sala, uma moça esguia/recorta papeis de cor,/fazendo uma ninharia;/dorme um cão no corredor./e embaixo um nédio gatinho/Olha para o passarinho/como quem diz: - Si eu te apanho!..."
(Antônio Sales)

Poeta, dramaturgo, jornalista, cearense. Antônio Sales nasceu na então povoação praieira de Parazinho, hoje Paracuru. Em 1880 já participava com seus escritos em alguns periódicos da capital cearense como "A Avenida", "A Quinzena", "O Domingo", entre outros. Sem sombra de dúvidas, Antônio Sales, mais tarde, se tornaria um dos maiores nomes da literatura brasileira. Só para não deixar de citar um de seus confrades da época, Machado de Assis, o autor da perdurável obra Memórias Póstumas de Brás Cubas, etc. Ainda moço Sales desfrutara do prestígio de freqüentar a alta intelectualidade cearense, como por exemplo, O Clube Literário, que segundo o professor Sânzio de Azevedo, em nota sobre os Grêmios Literários do Ceará, afirma que o poeta por esses tempos "mal se iniciará na literatura".



De família humilde, Sales chegara a Fortaleza nos idos de 1884 com apenas 16 anos, na época garantiu seu sustento como caixeiro viajante de casas comerciais, às quais lhes suprimiam as poucas horas ao lazer da leitura, fazendo-se, com muito esforço, autodidata. A poesia de Sales cedo surgiu com "Versos Diversos" (1888) e "Trovas do Norte" (1891). Em 30 de maio de 1892, no
Café Java, de Mané Coco, na Praça do Ferreira, Antônio Sales idealiza a Padaria Espiritual que se destacou por sua irreverência postulando a Semana de Arte Moderna de 1922. Curiosamente cada Padeiro se alto denominavam com os respectivos pseudônimos ou "nome guerra", como por exemplo: Antônio Sales ("Moacir Jurema"), Adolfo Caminha (Félix Guanabariano), Rodolfo Teófilo (Marcos Serrano), etc. Era a Padaria Espiritual na sua primeira fase com direito a deboches e gargalhadas que mais tarde, no século XX ganharia, a cidade de Fortaleza o epíteto de "Ceará Moleque" com direito a vaia ao sol e um certo Bode Ioiô que segundo contam era bom bebedor de cachaça e apreciador de boa poesia, além de ter sido eleito vereador desta mesma cidade. Dentre os intelectuais que compunham a primeira fase da Padaria estavam: "Ulisses Bezerra, Sabino Batista, Tibúrcio de Farias, Álvaro Martins, Temístocles Machado, Lopes Filho e Antônio Sales".



Já na segunda fase da Padaria Espiritual, Os Padeiros, voltavam suas idéias às questões políticas e sociais sacudindo o âmago dos literatos nos primeiros anos do golpe da Republica, ou melhor, na transição monárquica - republica no governo de Nogueira Accioly. Foi naquela agremiação literária (Padaria Espiritual) onde Antônio Sales escreveu o seu curioso estatuto - manifesto proibindo a qualquer padeiro recitar ao piano ou escrever versos em língua estrangeira e quem escrevesse em folhas perfumadas seriam sujeitos à pena de vaia ou expulsão. O jornal era O PÃO, veículo por onde eles divulgavam seus escritos denominados de "O PÃO DE ESPÍRITO", arranhando a sociedade burguesa da época.


Faço lembrar um trecho de Adolfo Caminha quando descreveu o perfil social da Padaria na coluna "Sabbatina", ainda na primeira fase em 1892: " (...) Somos obrigados a ir, às quintas-feiras e aos domingos, ali ao Passeio Público exibir a melhor de nossas fatiotas e o mais hipócrita e imbecil de nossos sorrisos. (...) Ocupamo-nos de política, mais de uma política torpe, reles, suja, indigna de ser tocada por mãos que calçam luvas de pelica. A literatura e as artes, por assim dizer, são os melhores tônicos para o espírito." Lê-se no Artigo 2◦, da Padaria Espiritual que os Padeiros se organizavam de um Padeiro-mor (presidente), dois Forneiros (secretários), um Gaveta (tesoureiro), um Guarda - livros (bibliotecário) e os Amassadores (sócios livres). Sabe-se que o programa de instalação da padaria não se deu no Café Java, mas na Rua Formosa (hoje Barão do Rio Branco). Sales que era inovador, jovem e inquieto pretendia que seus artigos repercutissem lá fora, no Rio de Janeiro. E repercutiu! E com seus 48 artigos "cujo fim é reunir rapazes de letras e artes (...) e fornecer pão de espírito aos sócios em particular e ao povo em grande parte", fez voltar os olhos dos homens de letra do Rio para aquela agremiação literária e irreverente que em Fortaleza se formava. No 8° artigo diz bem o compromisso dos Padeiros com a literatura, onde se lê: "VIII – As Fornadas (sessões) se realizarão diariamente, à noite, à exepção das quintas-feiras, e nos domingos, ao meio dia."




Foto dos membros da Padaria Espiritual (Acervo do M.I.S.). No centro da Foto, sentado à esquerda da mesa, o poeta Antônio Sales. Do outro lado da Mesa, Waldemiro Cavalcante. Em pé, entre os dois, Rodolfo Teófilo. Á esquerda de Rodolfo Teófilo, o escritor José Nava, e na extrema esquerda, Antônio de Castro.


Ao lado de Sales, autor de "Aves de Arribação" estava Adolfo Caminha autor de O Bom Crioulo, livro do qual inaugurou o Naturalismo no Brasil, Álvaro Martins, Henrique Jorge e outros de tamanha importância. O Pão circulou tanto durante a primeira fase quanto na segunda num espaço de tempo de 1892 a 1896 somando 36 exemplares. Segundo estudiosos a Padaria Espiritual consolidou a literatura Realista cearense, bem como não podemos deixar de citar, a mola mestra de Rodolfo Teófilo com seu livro A Fome (1890).


Sales foi presidente, ou melhor, padeiro-mor de 1892 a 1894 e dentre outros que tiveram na função de padeiro-mor podemos citar Juvino Guedes, José Calos Junior e Rodolfo Teófilo.
Aos 29 anos, ou seja, em 1897, deixa o Ceará afastando-se quase completamente dos irreverentes poetas da lendária Padaria Espiritual, indo residir no Rio de Janeiro. E entre tantos valores a que chegara às elites literárias nacionais, Antônio Sales vai ao ápice colaborando na fundação da Academia Brasileira de Letras, onde em suas memórias, " Retratos e Lembranças", publicado em 1938, deixa-nos curiosos ao relembrar formação da ABL a qual participara:


"(...) E foi naquela feia e pobre travessa da Rua do Ouvidor que veio ao mundo a Academia Brasileira de Letras. Foi Lucio Mendonça seu verdadeiro criador e pai (...). Devo alertar que ela não foi muito bem recebida com alvoroço, pelo menos por parte de alguns habitantes da roda ilustre (...). Lembro-me de José Veríssimo, pelo menos, não lhe fez bom acolhimento. Machado de Assis, também, fez algumas objeções. Mas Nabuco e Taunay e outros concordaram (...). Restava discutir-se o primeiro grupo de imortais (...)."

O inesquecível Sales viveu plenamente a época de ouro, não só do parnasianismo, mas do realismo e naturalismo brasileiro atuando na literatura por um período de meio século. Em 1920 regressa ao Ceará após vários anos no Rio de Janeiro, trabalhando como jornalista dos periódicos: "Correio da Manhã" e "O País" entre outros jornais da imprensa nacional. Em 1930 participa intensamente de um novo movimento, agora em prol de reorganizar a Academia Cearense de Letras, escolhendo como seu patrono José de Alencar. Sales foi presidente desta mesma entidade de 1930 a 1937.


Em 14 de novembro de 1940, Antônio Sales, é vítima de hipertensão arterial, falece aos 72 anos. Fecharam-se para sempre os olhos do poeta que viu uma Fortaleza que hoje é (para alguns) esquecida, obscura, distante.

Obras


Saiba mais
 
Antonio Sales foi casado com Alice Nava Sales, não teve filhos. Sua esposa era irmã do José Nava, que também pertenceu a Padaria Espiritual,sendo pai do escritor Pedro Nava, que nasceu em Juiz de Fora, em 5 de junho de 1903 – e faleceu no Rio de Janeiro, 13 de maio de 1984) sendo autor de sete livros: Baú de Ossos, Balão Cativo, Chão de Ferro, Beira Mar, Galo das Trevas, O Círio Perfeito, Cera das almas...


Crédito: José Leite Netto, Diário do Nordeste, Francisco José Júnior e pesquisas de internet

domingo, 19 de setembro de 2010

Barão de Ibiapaba e seu famoso sobrado



Barão de Ibiapaba
Joaquim da Cunha Freire

O Barão de IBIAPABA foi o Coronel Joaquim da Cunha Freire, Barão de Ibiapaba, que nasceu no Ceará em 18 de Outubro de 1827 e faleceu no Rio de Janeiro, em 13 de Outubro de 1907. Era filho de Felisberto Correia da Cunha, que faleceu em Piauí em 1832 e de D. Custodia Ribeiro da Cunha, natural de Portugal. Joaquim casou-se com D. Maria Eugenia dos Santos. Dedicando-se a carreira comercial soube acumular avultada fortuna, tendo colaborado para melhoramentos materiais de Fortaleza. Governou a Província varias vezes como Vice-Presidente. Chefe político de grande influência, foi Coronel da guarda Nacional; Presidente da Câmara Municipal de Fortaleza, da Junta Comercial, da Caixa Econômica e Monte de Socorro da Província. Era Comendador da Ordem da Rosa. Foi o 1º Barão desse título, por Decreto de 17 de janeiro de 1874, morava na Rua da Palma nº 50 na cidade de Fortaleza no estado do Ceará.
Joaquim da Cunha Freire era irmão do Visconde de Cauhipe, Severiano Ribeiro da Cunha, nascido em 6 de Novembro de 1831 em Cauhipe, junto à Soure, na Província do Ceará. Titular português, por decreto de 1º de Março de 1873, e faleceu em Fortaleza a 4 de Setembro de 1876; casado com D. Euphrasia Gouvêa que era filha de Manuel Castano de Gouvêa e de D. Francisca Agrella de Gouvêa. Desse casamento tiveram a filha:
1. Luísa da Cunha casada com Guilherme Chambly Studart, Barão de Studart.
O Titulo de Visconde de Cauhipe lhe foi conferido pelo Papa, por Breve Apostólico de 22 de janeiro de 1900. Deixou uma vasta obra científica, literária e histórica - é autor obrigatoriamente citado por quem se dedica à história do Nordeste e, de modo particular, à do Ceará.
Brasão de Armas: Escudo esquartelado tendo o superior da direita e o seu alterno interceptados cada um por três faixas de prata, carregadas cada uma com um a flor de Liz purpurina, e dispostas em banda, e aquelas sobre o campo verde; o superior da esquerda e o seu alterno, carregadas cada uma por nove cunhas azuis colocadas em três palas, de três cada uma, sobre campo de ouro, e com orla carmezim, carregada por sete castelos de ouro, sendo três em chefe e os restantes igualmente repartidos pelos laterais. (Brasão concedido à seu irmão o visconde de Cauhipe por alvará de 16 de Março de 1874. Reg. no Archivo da Torre do Tombo Mercês de D.Luiz I Liv.XXIV,fls.243 v).
N.B. – Esta descrição aparta-se da terminologia heráldica; copiamo-la como o fez o Escrivão da Nobreza dessa época, em Portugal.

Observação – Segundo alguns, o barão teria usado as armas de seu irmão, o visconde de Cauípe, a saber: um escudo esquartelado: no primeiro e no quarto quartel, em campo de sinople, três faixas de prata, cada uma carregada de uma flor de lis de púrpura, as flores dispostas em banda; no segundo e no terceiro quartel, em campo de ouro, nove cunhas de azul, postas 3, 3 e 3. Bordadura de goles, carregada de sete castelos de ouro, sendo 3 em chefe e dois em cada flanco. Para Joaquim da Cunha Freire, seria uma coroa de barão.

RUA MAJOR FACUNDO

Este bonito sobrado que vemos na antiga foto, que data de 1910, pertencia ao Barão de lbiapaba, cujo nome real era Joaquim da Cunha Freire, comerciante nascido em Caucaia em 18 de outubro de 1827, filho de pai brasileiro e mãe portuguesa. O Barão de lbiapaba era irmão do Visconde de Cauípe.
Através de sua atividade comercial, adquiriu grande fortuna e fez melhoramentos na Cidade. Foi presidente da Câmara Municipal de Fortaleza, da Junta Comercial do Estado, daCaixa Econômica e do Monte de Socorro da Província, além de ter assumido várias vezes a presidência da Província, como Vice-Presidente que era. Em 1874 recebeu o título de Barão de lbiapaba. Faleceu no Rio de Janeiro, então Capital Federal, no dia 12 de outubro de 1907.
Na fotografia antiga vemos o sobrado do Barão de Ibiapaba ao tempo em que nele funcionava a firma R. Guedes & Cia de ferragens, louças, tintas e óleos. Pela Rua Major Facundo tinha o nº 46 e pela Rua Senador Alencar os nº 8, 10 e 12.

Pela rua Senador Alencar, depois do sobrado, vêm várias portas que abrigavam casas comerciais até bem pouco tempo, a maioria negociando com artigos para sapateiros. Ao longe, vemos o telhado de ardósia do Palacete Guarani. Funcionou na esquina deste sobrado o Cartório Pergentino.
O velho sobrado esteve ali até a década de 70, quando o deixaram destelhado e um dos invernos daquela década o fez ruir.
A fotografia atual mostra o que há hoje no local, o prédio do Banco Brasileiro de Descontos - Bradesco, que ocupa todo o quarteirão pela rua Senador Alencar. É um prédio de linhas modernas, mas por ter apenas dois pavimentos superiores suas linhas paralelas verticais perdem a finalidade, fazendo-o um prédio anão, que sobressairia muito mais se fosse ornamentado com linhas horizontais.



Crédito: Portal da história do Ceará e Genealogia Freire

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