Fortaleza Nobre | Resgatando a Fortaleza antiga : A Cearense
Fortaleza, uma cidade em TrAnSfOrMaÇãO!!!


Blog sobre essa linda cidade, com suas praias maravilhosas, seu povo acolhedor e seus bairros históricos.

 



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terça-feira, 7 de março de 2017

As lojas na Fortaleza da década de 40




Nos idos da década de 40, os proprietários das grandes lojas não se preocupavam em camuflar (ainda bem!) as fachadas das lojas, com vergonha de estarem ocupando prédios antigos, nem tinham, ainda, descoberto a técnica de rebaixar os tetos dos salões, diminuindo o pé-direito dos mesmos e diminuindo, também, consequentemente, a ventilação. Os donos e administradores das lojas de Fortaleza preocupavam-se, principalmente, em apresentar mercadorias de alta qualidade, vendedores educados e asseados e vitrinas de alto nível, melhor veículo promotor de vendas. 
Hoje, infelizmente, quase não se consegue observar os antigos prédios ocupados pelas lojas, visto a quantidade de tapumes que são usados para encobrir o "velho". :(



Naqueles tempos, sem as indústrias de confecções dos nossos dias, que oferecem ao cliente a roupa prontinha, ao gosto de cada um, predominava, na cidade, o comércio de tecidos, obrigando as pessoas a adquirirem as fazendas necessitadas e levá-las à costureira ou alfaiates, conforme o caso ou o sexo. Por isso, as lojas de tecidos ou casas de fazendas, como eram mais conhecidas, tinham esmero em suas vitrinas, caprichavam nos "vestidos" de suas bonecas-manequins que eram montadas por verdadeiros mestres na arte de modelar as roupas, usando apenas o tecido e alguns alfinetes, sem ser necessário cortar pano nem utilizar linha ou agulha. 
A Casa Plácido, do comerciante milionário Plácido de Carvalho, na rua Major Facundo, ao lado do Excelsior Hotel. Comerciava produtos europeus: tecidos, confecções masculinas e femininas, perfumes, móveis, luminárias, leques, louças, cristais e pratarias. Durante a Primeira Grande Guerra, quando a Europa ficou carente de tudo, Plácido, que tinha armazéns abarrotados, revendeu tudo o que o velho mundo necessitava. A preços elevadíssimos.

A expressão Casa, certamente, seria a influência francesa Maison. Quanto à denominação armazém, tão grosseira e desprovida de it só surgiu na década seguinte, quando a cidade começou a perder seu encanto, seu refinamento, seu "chiquê", consequência das violentas secas que se abateram sobre o sertão, despejando milhares de flagelados famintos em nossa capital, originando as favelas, a profusão de mendigos, gerando, enfim, uma nova condição social que  modificou, radicalmente, os costumes da nossa urbe.
Loja A Cearense na rua Barão do Rio Branco. Arquivo Nirez

As principais casas de tecidos na Fortaleza dos anos 40 eram: A Cearense, de Aprígio Coelho de Araújo, localizada no meio do Chamado Quarteirão Sucesso, na rua Barão do Rio Branco. Aprígio, homem de larga visão e de muito bom gosto, mandou construir sua loja inspirado nas grandes maisons parisienses: gigantesco salão, bastante requintado, com ambientes de espera e nichos iluminados para exposições de peças finas. Ao fundo, uma elegante escada em  forma de leque se bifurcava e dava acesso aos salões dos dois andares superiores que tinham imensas rodas vazadas como visores emoldurados por belos gradis de ferro. De linhas art déco, como era comum às lojas chiques daquele tempo, sua frente era rigorosamente simétrica, com duas vastas vitrinas laterais e muitos manequins artisticamente vestidos.

Loja Broadway na "esquina do pecado", ao lado do Excelsior Hotel em 1953. Acervo Lucas Jr. Foto do jornal Gazeta de Notícias
Uma loja que, embora bem menor em instalações, possuía, talvez mercê de seu nome, incrível fascínio na cidade, era a Broadway, de Alberto Bardawill, na esquina famosa das ruas Major Facundo e Guilherme Rocha. Tinha duas vitrinas, uma em cada rua e era o próprio Bardawill quem montava as vitrinas e "vestia" as bonecas-manequins. A casa não tinha maiores atrativos em decoração, porém só trabalhava com tecidos de alta classe e sua clientela, a exemplo de A Cearense, era de primeira linha. Sua fama maior veio do forte vento que soprava constantemente na sua esquina, levantando as saias das moças e  provocando ajuntamento de rapazes, o que deu origem ao epíteto de "esquina do pecado". Aquele vento seria originado pelos altos tapumes da construção do Cine São Luiz que não permitiam a sua passagem pelas galerias laterais obstruídas.
A loja tinha o slogan: “Rianil, a loja azul da Floriano Peixoto”

A Rianil, localizada na rua Floriano Peixoto, entre as travessas São Paulo e Pará, tinha, sem favor, as mais bem arquitetadas vitrinas de tecidos da cidade. Seu vitrinista, verdadeiro artista, fazia trabalhos maravilhosos com as fazendas e as bonecas-manequins. Estas,  eram tão bem "vestidas" que se podia jurar que eram vestidos de verdade, cortados e costurados. Essa loja era toda azul, devido ao nome Rianil, originado de rio Anil, no Maranhão, em cuja capital, São Luís, estava a matriz daquela loja.
A Ceará Chic, no extremo sul da Praça do Ferreira, também tinha vitrinas bem elaboradas, com bonecas muito bem vestidas, e só trabalhava com fazendas de alta qualidade. A sua  vizinha, Rainha da Moda, na esquina e defronte ao Cine Moderno, também vendia tecidos, embora fosse especializada, igualmente, em bolsas, sombrinhas e outros acessórios.


Na esquina das ruas Barão do Rio Branco e Guilherme Rocha ficava As Duas Américas, de Pedro Coelho de Araújo, irmão de Aprígio (já citado). Não era uma loja de luxo, mas era bastante simpática. Tinha apenas uma vitrina, na quina. Não possuía manequins, que eram detalhes de alto requinte naqueles tempos. Já na década de 50, mudou de ramo, passando a ser casa de merendas, para fazer concorrência à Sorveteria Variedades. Com o nome de Cabana fez sucesso durante vários anos, sempre do mesmo proprietário da loja As Duas Américas.

Reclames de 1932 no Jornal Nação

A Casa Ouvidor localizava-se na rua Floriano Peixoto, vizinha à Livraria Comercial. Era uma loja simples, não tinha vitrinas, apenas uma só boneca-manequim colocada sobre um balcão.


Na rua Major Facundo, quase esquina com a travessa Liberato Barroso, tinha a Casa Londres, outra loja sem maiores pretensões, não obstante o nome pomposo. Não tinha vitrinas nem manequins.

Curiosa era a Casa Vênus, na rua Floriano Peixoto, local atualmente ocupado pelo Edifício Sul América. Era uma loja de porte médio e o seu detalhe interessante era uma boneca-manequim que ficava numa das duas vitrinas.  
Esse manequim chamava tanto a atenção do escritor, que ele escreveu:"Eu tinha fascínio pela mesma, pois, sendo menino, ficava a contemplá-la, uma vez que nunca vira, antes, manequim daquele tamanho.
Teria, se muito, meio metro de altura e formas de mulher, linda, com olhos azuis, de vidro. Estava sempre de vestido novo, na moda. Parece que o dono daquela loja tinha carinho especial por ela. Nunca mais vi outra peça semelhante, em nenhuma das cidades por onde andei."

A Granfina também ficava no Quarteirão Sucesso, no local onde está, atualmente, a Casa Pio. Era uma loja feia e sem qualquer atrativo, malcuidada, mal arrumada e de aparência suja. Tinha estoque reduzidíssimo de mercadorias e, para piorar a imagem, exibia um horroroso manequim, "choroso" e extremamente "anêmico". Nunca se via qualquer cliente ali e acho que fechou por falência. Sua vizinha era a Casa Armênia, de seu Carlos Fermanian, genitor do genial músico e regente Vasquen Fermanian. A Loja era um pouco melhor do que A Granfina, porém, sem ser chic, sem ter atrativos.

A esquina do pecado

De linha bem popular, mas badaladíssimas, eram as Casas Novas, de Gutemberg Telles. Se não estou enganado, eram três lojas, localizadas nas ruas Major Facundo e Floriano Peixoto, na confluência dos Correios e Telégrafos. Patrocinavam o programa de José Limaverde "Coisas que o tempo levou", apresentado pela PRE-9, nas noites das segundas-feira. Seu proprietário tinha noções da moderna propaganda, usava faixas e panfletos, além de "pregões" nas calçadas, atraindo os fregueses para o interior das lojas.

Ao lado do prédio dos Correios e Telégrafos, na rua Floriano Peixoto, estava a Casablanca, outra loja de linha popular e muito procurada pois tinha fama de vender mais barato do que as concorrentes. Possuía grandes instalações, sem o mínimo de luxo, mas apresentava movimento constante. De todas as lojas de tecidos existentes na década de 40, foi a única que sobreviveu. Cresceu e formou uma cadeia de lojas, grande centro comercial na Aldeota e já envereda por outros ramos de atividades, prova do dinamismo e tenacidade de seus dirigentes.

Casa Blanca - A sobrevivente

Com exceção da Casablanca, as lojas da década de 40 fecharam suas portas e hoje constam apenas em alguns livros sobre a cidade amada e nas histórias dos mais velhos...

"Todas as demais lojas dos meus tempos de menino e adolescente desapareceram e, hoje, são apenas saudade. Algumas, pelo chic, pelo carisma que possuíam, outras, pela simpatia e singeleza de suas promoções de vendas, numa época em que a publicidade era puro artesanato, sem as sofisticações do marketing de hoje." 

Marciano Lopes




Créditos: Livro Royal Briar - Marciano Lopes/Portal da História do Ceará/Biblioteca Nacional/Arquivo Nirez/ Revista Bataclan 

sexta-feira, 3 de maio de 2013

A Moda Fortalezense no final da década de 20



As mudanças ocorridas no final do século XIX e início do século XX no Brasil foram simultâneas ao período de maior prosperidade francesa.

(Foto ao lado da senhorinha Zezé Guimarães)

A Belle Époque foi o momento de desenvolvimento da França, época de forte poder econômico. Exportava-se o modo de vida francês. Foi um momento de avanço tecnológico e científico. A moda francesa, com seus exageros, era um dos pilares da economia daquele País.

No Brasil, procurava-se fortalecer relações políticas com os Estados Unidos e países da Europa, o que tornou a modernidade brasileira, mais um jogo político do que uma consequência de eventos ocorridos espontaneamente:

A construção da modernidade se fazia nos espaços, na arquitetura, mas ainda nas pessoas, na cultura, na sociedade, ou seja, moldava-se simbólica e imaginariamente, de modo a despertar a sensação de um novo tempo, principalmente aos mais entusiasmados, com os benefícios do progresso. (DOURADO, 2005)


Loja A Formosa Cearense em 1925 
(Loja de modas, tecidos, calçados e alfaiataria, de Cunto & Companhia, dos sócios Salvador Cunto, Vicente Cunto e José Cozza Cunto, na Rua Floriano Peixoto nº 205 (antigo, atual 635), no Edifício Itália, na Praça do Ferreira. Inaugurada em 22 de abril de 1922.)

A Belle Èpoque cearense, que teve inicio na metade do século XIX, se estendendo até o final dos anos de 1920, foi marcada por uma profunda mudança, tanto em termos políticos, quanto em termos culturais, o que refletia na capital cearense, que acompanhava, guardadas as proporções, essa fase de urbanização que ocorria no país. 



A Moda em Paris serviu de inspiração.

Tentava-se enquadrar a cidade nos moldes de civilização Europeus. Assim, a arquitetura local bem como os costumes foram diretamente influenciados por Paris, sendo bastante comum o nome de lojas e cafés em Francês (Um dos principais cafés da cidade chamava-se Café Riche, também havia o Cine Majestic, a Torre Eiffel.).

Foi também o período em que chegaram os bondes e energia elétrica na cidade, ainda coexistindo com os bondes de tração animal e iluminação a gás, uma vez que a substituição da iluminação a gás para elétrica se deu apenas em 1934, conforme Silva Filho (2002):

A tardia introdução da energia elétrica na iluminação pública de Fortaleza provavelmente se deveu menos a uma debilidade técnica e mais à longeva concessão franqueada pela Ceará Gás Company, já que pelo menos desde 1913 a cidade dispunha, embora em grau diminuto, de eletricidade para algumas residências, casas comerciais e repartições públicas, e no final do mesmo ano passava a alavancar o novo bonde.

A iluminação pública, ainda segundo Silva Filho (2002), foi responsável por trazer segurança às noites da cidade, tendo como consequência a maior agitação da vida pública, favorecendo as festividades noturnas.




O avanço tecnológico com o qual a cidade se acostumava, associado às políticas governamentais e as mudanças empreendidas na estrutura física da cidades ofereceram condições propícias para a consolidação do poder das elites.
A segmentação social favorecia o surgimento de espaços físicos em que os mais ricos pudessem acomodar-se e conviver entre si, excluindo, nos momentos de lazer, de seu convívio aqueles que não tivessem poder aquisitivo condizente com os seus.


Assim, Castro (1987) aponta isso quando revela que Fortaleza, durante o seu processo de formação, apresentou características de forte divisão de classes, o que auxiliou no processo de segregação entre as classes mais abastadas e as menos favorecidas. Resultando desse modo nas apropriações de espaços, por parte da elite, em que pudessem relacionar-se:

Desde o princípio de sua evolução, Fortaleza apresentou em seu espaço uma configuração assentada sobre a base de uma forte segmentação social. Ainda no alvorecer do século XIX, os elementos que compunham os círculos sociais mais elevados, ligados às atividades comerciais da cidade “começavam a se agregar isoladamente, ocupando bairros onde pudessem relacionar-se com conjuntos homogêneos, alheios às confusões urbanas". (CASTRO, 1987, apud PONTES, 2005)

O surgimento e a consolidação desse segmento favoreceu também o aumento das práticas sociais na cidade. A partir de 1860, Fortaleza passou a ter uma vida social mais ativa; a fundação do Teatro José de Alencar, as festividades no palácio do presidente foram os primeiros movimentos do lazer social da cidade.


O Elegante Clube Iracema

No meio elitizado da cidade surgiram os clubes sociais; o primeiro,
Clube Iracema¹fundado em 1884, abrigava um pequeno número de pessoas. De uma dissidência entre seus membros surgiu o Clube dos Diários, em 1913.

No Final da década de 20, precisamente em 12 de junho de 1929, surge o clube Náuticoatlético cearense
², que se mantem até os dias atuais.
Os clubes eram responsáveis pela maior diversão da elite fortalezense, bem como por seus encontros e convivências. Eram bastante comuns as festas nos anos de 1928, constantemente havia um anúncio no jornal sobre esses acontecimentos, que variavam entre festas beneficentes à campeonatos esportivos.

Carnaval no Clube Iracema em 1935 - Acervo Sérgio Roberto

O período carnavalesco, que se inicia no começo de fevereiro e se estende até começo de março, era de bastante movimento nos clubes da capital, pois, com a decadência do carnaval de rua, os festejos dentro dos clubes passaram a ter maior visibilidade durante o período momino.


Revista Ba-ta-clan

Além do carnaval, que foi recondicionado pelas novas práticas de sociabilidade, também pode-se perceber uma influência dessas práticas, na moda feminina e masculina da época.


Revista Ba-ta-clan

O jornal O Povo e a moda

Entender como se deu a implantação, a consolidação e características da imprensa cearense é fundamental para a compreensão do material extraído do jornal.
Geraldo Nobre, no seu livro, 'A historia do jornalismo no Ceará' traça um caminho que percorre desde o início do surgimento da imprensa no Ceará, até os anos de 1970.

Surgida em 1824, com o Diário do Governo, a imprensa cearense consolidou-se no período de 1849 a 1859, momento em que a situação política do império normalizou-se. Nesse momento a notícia era complemento de debates políticos, processando-se tanto na assembleia, quanto nas folhas. 
O jornal com seu caráter informativo só veio a ter espaço após o fim das oligarquias, no ano de 1915, sendo iniciado pelo jornal Correio do Ceará.

O jornal O povo, surgido no período dos novos jornais, como classifica Nobre (2006), não era um jornal partidário, mas como afirmou Adísia Sá, teve origem partidária. Seus fundadores, Demócrito Rocha e Paulo Sarasate foram ligados à vida política.

Foto de 1925 do Armazém de Fazendas - J. Albano & Comp.

Segundo Nobre (2006), foi no decênio de 1910 a 1920 que a imprensa cearense assumiu características de permanência, tornando-se definitiva, em relação a seu estado atual. O autor também divide a história do jornalismo cearense em duas fases; na primeira os jornais existiram em função de partidos políticos, ou de outros grupos de opinião e consequentemente, pouca atenção deram ao caráter noticioso, ou mesmo comercial, da imprensa. Com o surgimento do Correio do Ceará, em 1915, o noticiário e a publicidade começaram a ganhar espaço jornalístico e a partir de então, os órgão de orientação política tiveram duração efêmera.

Maravilhosas vitrines da conhecida e conceituada casa de modas A Cearense na rua Floriano Peixoto, 219 - Revista Ba-ta-clan
Revista Ba-ta-clan

Atentando-nos ao espaço ganho pela publicidade no jornal, para o estudo da moda, as propagandas de casas de tecido, modistas, costureiras e lojas de artefatos masculinos, são relevantes para que tomemos conhecimento sobre o que se usava à época, nisso incluímos tanto os tecidos, como as peças de indumentária já confeccionadas, como chapéus, lenços, sombrinhas etc. 

Revista Ba-ta-clan

Revista Ba-ta-clan

As propagandas trazem para o nosso cotidiano os elementos do período de 1920, nelas podemos ver o preço e o tipo de tecido que se vendia, bem como os artefatos que eram expostos, como meias de seda, sombrinhas, joias, chapéus e bolsas. Os tecidos que apareciam nos anúncios eram principalmente seda, brim, algodão, linho, casimiras, cetins. 


Há um anúncio, intitulado de 'Creação de Paris', d'A Cearense, que era uma loja de variedades, nele são expostos fivelas, chapéus e tecidos. Percebe-se além das peças que
compunham a indumentária feminina da época, a influência dos elementos vindos de Paris, conforme descrito abaixo:

Creação de Paris
Chegado pelo D. Pedro I 
Uma linda colleção de artigos para senhora, barretes fêchos e fivellas para vestidos e chapeos, artigos ricos, chiques e originaes, diversas qualidades e tamanhos de applicações para vestidinos de criança o que há de mais rico. Uma grande collecção de lenços para presentes. 
Renda valenciana branca e creme. 
Missanga em diveras cores e em crysta branco leitosa 
Na A CEARENSE (O Povo, 30 de maio de 1928, p.2)

A Cearense (Sede da rua Barão do Rio Branco). Foto Aba Film - Arquivo Nirez


Lindas vitrines d' A Cearense - Arquivo Nirez

Como o anúncio acima, há outros, que aparecem constantemente, trazendo referência dos materiais e peças que compunham a indumentaria da época. 
Outra loja, A maranhense, no dia de saldão divulgou uma lista, no jornal, com os tecidos e preços ao qual vendiam cada peça.

Reclame d'A Maranhense - Revista Ba-ta-clan
(Em 08 de junho de 1921, abre-se em Fortaleza a loja denominada A Maranhense, armarinho, miudezas e tecidos, pertencente à firma Chuairy, Ary & Cia, formada por Salim Milhem Chuary, José Salim Ary e Nadra Salim Ary, funcionando na Rua Major Facundo nº 100 (antigo).

Apesar de haver uma publicidade constante de tecidos e artigos de moda, as publicações que tratavam diretamente do assunto eram escassas; durante os anos de 1928 e 1929, apareceram apenas três publicações.
Uma das publicações, intitulada de “A arte de usar echarpe”, fala de como o artefato deveria ser usado e como algumas mulheres dominavam essa arte:

A arte de trazer uma <<écharpe>> não se limita, de resto, a evitar essa nota pouco favorecedora. Saber collocar com graça uma <<écharpe>> sobre os hombros sem que ella fique pesada, mas com pregas naturaes e suaves, de modo a que as pontas caiam com garridice e bom gosto, requer um estudo profundo e subtil. 
(O Povo, 28 de março de 1928, p.03)

Revista Ba-ta-clan

Ensinava-se também o modo adequado de usar, além de incentivar as mulheres a praticarem em frente ao espelho o melhor caimento da encharpe: 

Nos nossos dias, é a <<écharpe>> que occupa um logar importante no conjuto da <>, tanto pelo seu comprimeto como por suas dobras elegantes e acariciadoras,
que permittem corrigir certos defeitos do busto e tambem das proporções da silhueta. Se as suas dobras se detêm e suavisam ao nível do peito, este parece crescer, o que convém
ás magras. Se, porém, se apertam em um movimento envolvente, o resultado será dar-lhe a apparencia de menor volume, oque muito servirá ás mulheres e busto proeminente e
de talhe curto. (O Povo, 28 de março de 1928, p.03)

Revista Ba-ta-clan

Revista Ba-ta-clan

Outro assunto tornado pauta de uma coluna do jornal O povo foi a roupa de baile. 
A coluna, intitulada de A moda – Toillettes de Bailes explicitava quais as roupas que estavam sendo usadas, na época, durante as festas. Essa coluna foi escrita pela redatora da revista FEMININA, nela aparecem as cores e tendências que eram legitimadas naquele período:

Fiquei admirada de não ver nas reuniões dansantes de moças tantos vestidos de mousseline de seda, florida, quanto os figurinos faziam esperar. Não se podia, entretanto, achar um thema, mais requintado e as formas são deliciodas. Sobre um fundo creme, por exemplo, flores sylvestres, sobre um fundo rosa ou azul, primaveras de um amarello pallido; no corpete, o decote tam graça ao gosto antigo; uma estreita hombreira sustenta o tecido de um lado, enquanto, do outro lado, esse tecido sobe para o outro hombro por um efeito de viez.
( Martine Re'nier, Jornal O Povo, 30 de março de 1928, p. 4)


Há também uma parte do texto que fala sobre a roupa de passeio, mas diferente da primeira que tratava apenas da roupa feminina e adulta, a segunda ensinava às mães como vestir suas filhas:

A moda que tem sempre a sua palavra a dizer na toilette dos grandes, como dos pequenos, determina que o chapeo se combine com o manteau, nas toilettes de passeio. Deve-se
reconhecer, aliás, que isso é encantador e que, assim, as nossas filhas ficam com um ar mais distincto e elegante, correspondendo a idéa que se tem, hoje, da harmonia, em matéria de vestuário. O bege, naturalmente, tem uma grande supremacia nas vestes de passeio de nossas filhas, mas está longe de ser a única côr da moda. Ao contrario, parece estar dominando um gosto pronunciado pelos tons a um tempo vivos e claros, como o amarello limão, o verde amendoa ou o azul ligeiramente cinza, que vae bem principalmente nas meninas louras. 
(Martine Re'nier, Jornal O Povo, 30 de março de 1928, p. 4)

Nota-se que há uma preocupação em como vestir as mulheres de forma “elegante e distinta” desde criança, selecionando cores³ e formas ideais de roupas, mas quase não há referências à indumentaria masculina. O que encontra-se no jornal O povo, falando sobre a moda ou mesmo sobre a roupa do homem, são alguns poucos anúncios que vendem principalmente chapéus.

A elegância das senhorinhas na década de 20 - Revista Ba-ta-clan

Após analisar as edições impressas do jornal O povo, dos anos de 1928 e 1929, foi possível notar que naquele período Fortaleza passava por uma fase de transição, em que a cidade ganhava um novo aspecto devido a política higienista aplicada no País, bem como pela tentativa de modernização e inclusão das cidades no modelo de vida europeu e tudo isso afetou o modo de viver e relacionar-se de seus habitantes.

A elegância das senhorinhas na década de 20 - Revista Ba-ta-clan

A moda, como parte integrante da vida social, também sofreu mudanças. É possível perceber, que tanto homens, quanto mulheres assimilavam as modas vindas do exterior, porém a influência era exercida principalmente sobre a mulher.

A moda feminina importou principalmente os costumes vindos da França, especificamente da cidade de Paris. São constantes os anúncios que dizem trazer novidades da capital francesa, ressaltando a qualidade dos produtos e o fato de serem a última moda parisiense. 

Quando se trata de anúncios masculinos, estes referem-se principalmente a chapéus, nos quais é possível notar influências principalmente americanas e inglesas, salvo algumas exceções que falam de chapéus australianos.
As casas de tecidos e de variedades eram as principais anunciantes de moda nesse período.

As lojas de tecido vendiam a matéria-prima para as senhoras, que as compravam e levavam à modista ou costureira, quando não eram feitos em casa. Era prática bastante comum a cópia de modelos vindos da Europa
No tocante às cores dos tecidos, não foram encontradas referências nos anúncios das casas de tecido, porém, as colunas de moda publicadas à época, revelam o uso de cores claras como beges, rosas e amarelo limão. 
Entende-se que as cores utilizadas nas roupas não eram meros caprichos da moda, ou apenas influências diretas de Paris, havia uma força social que impunha determinadas cores e excluía outras, atribuindo valores a cada uma. 
Fortaleza assimilava a moda, mas não abandonava as tradições. Se por um lado havia vestidos esvoaçantes, sem cintura, como ditava a moda parisiense, por outro não se incorporava o excesso de brilho e as cores extravagantes.

Por fim, foi possível observar também que o jornal ajudava a disseminar a moda, porém não era o principal meio propagador, uma vez que não havia constância na divulgação das colunas sobre moda e indumentária; nem as notas referentes aos clubes tratavam sobre o assunto, não havia também especificação do tipo de traje dos eventos.

Analice Camara Carvalho
(Design de Moda da Universidade Federal do Ceará)


 (896 bytes)¹O clube Iracema fundiu-se com o clube dos diários na metade do século XX.

 (896 bytes)²No dia 12 de junho de 1928, O jornal o Povo publica uma nota curta sobre o surgimento do Náutico Atlético Clube

 (896 bytes)³Tanto Lopes (2011), quanto Ponte (1993) remetem ao uso de determinadas cores na indumentária em Fortaleza; o primeiro afirmava que cores muito vivas e vermelhos eram cores reservadas às prostitutas, já o segundo fala sobre o uso do preto, que transmitia distinção.


Fotos: Livro Terra Cearense de 1925, Acervo Ivan Gondim, Revista Ceará Illustrado de 1925, Revista Ba-Ta-Clan, Arquivo Nirez e Acervo Sérgio Roberto

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