Fortaleza Nobre | Resgatando a Fortaleza antiga : Maracatu Leão Coroado
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terça-feira, 24 de junho de 2014

O Maracatu Cearense e sua história (Parte II)




 
"... logo que chegava o rei com sua corte, entrava a missa, que era cantada, com repiques de sinos e foguetes. O casal de escravos sentava-se no trono com ares de quem estava convencido da realidade da cena, representada também pelos reis dos brancos tão ou mais ridículos de cetro e coroa do que ele. Acabada a missa, saía o cortejo real de cidade à fora até o palácio, em que passava o resto do dia a comer, a beber, a dançar, festejando as poucas horas de liberdade que todos os anos lhe concediam os senhores da terra que primeiro libertou os escravos."


Rodolfo Teófilo sobre o ritual de coroação do rei e da rainha da irmandade.


Esse ritual de coroação teria dado origem à vários autos e danças, incorporados ao folclore brasileiro desde o século XVII. Entre eles, o Auto dos Reis de Congo, o Congado e o Maracatu. De fato, o maracatu é parecido com o ritual: um cortejo com música para a coroação de uma rainha negra.


Segundo Calé Alencar, fundador do Maracatu Nação Fortaleza e pesquisador da história do Maracatu no Ceará, a origem do Maracatu em Fortaleza provavelmente seja mais antiga do que imaginamos. Pois os registros dos Autos dos Reis de Congos na cidade datam do final do século XIX e já em 1730 os negros fundaram a Igreja do Rosário em Fortaleza, pressupondo a presença da irmandade do rosário, e consequentemente a coroação dos reis.

Segundo Eduardo Campos o maracatu cearense teria se originado à partir do ritual de Coroação dos Reis do Congo realizado pela Irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos da Capital (representante fortalezense da irmandade do Rosário dos negros).

Nos registros mais antigos, os desfiles de maracatu em Fortaleza ocorriam nas festas do ciclo natalino, nas festas da Nossa Senhora do Rosário e de Corpus Christi, onde não eram bem aceitos. À partir de 1937, com o desfile de estréia do Maracatu Az de Ouro, criado por Raimundo Alves Feitosa (Raimundo Boca-aberta) em 1936, o maracatu cearense passou a assumir a formação de um bloco carnavalesco e a desfilar durante os carnavais, como ocorre até hoje. Além de ter criado o maracatu Az de Ouro, existente até hoje, e ter adaptado o maracatu para os desfiles carnavalescos, Raimundo Boca-aberta foi um dos maiores compositores de loas de que se tem notícia e um compositor dos mais notáveis.


Maracatu Az de Espada

O ritmo do maracatu cearense nas primeiras décadas do século XX, como se pode escutar nos registros de Luiz Heitor Corrêa de Azevedo (incluindo gravações de Raimundo boca-aberta), é semelhante ao coco, com influência da umbanda. Os instrumentos utilizados eram: caixa (sem esteira), ganzá, gonguê, tambor-onça e ferro. A partir da década de 50, por influência do Maracatu Az de Espada, o maracatu cearense toma um novo estilo, inspirado no Auto dos Congos. O novo ritmo, cadenciado e dolente, com um gingado majestoso e solene, é marcante até hoje.

Maracatu Az de Ouro  em 1958.

 Nas décadas de 70 e 80, durante a ditadura militar, o maracatu cearense sofreu uma decadência, tanto na qualidade dos desfiles, quanto na quantidade, chegando ao ponto de só haverem 2 maracatus em atividade. Nesse período, os desfiles de maracatu foram incoerentemente obrigados a apresentar um enredo, apresentando-se na avenida como se fossem as escolas de samba do carnaval carioca.

Maracatu Nação Fortaleza

Felizmente, o maracatu cearense incorporou algumas modificações construtivas, como algumas modificações nas vestimentas e a inclusão dos capoeiristas, e abandonou as modificações inadequadas ao maracatu, como os enredos e os carros alegóricos. Atualmente, no Ceará, existem 2 grupos de maracatu em Itapipoca e 11 em Fortaleza, entre eles, o Maracatu Az de Ouro, o Estrela Brilhante, o Nação Fortaleza, o Maracatu Solar, o Nação Gengibre, o Leão Coroado, o Rei de Paus, o Vozes da África e o Nação Baobab.



Maracatu Az de Ouro em 1950

Maracatu Az de Ouro - 1958

O Maracatu cearense é diferente do pernambucano, em vários aspectos. De início, o maracatu cearense apresentava-se nas festas religiosas da Igreja, apresentando-se hoje como bloco carnavalesco. Em Pernambuco, o maracatu está estreitamente associado aos terreiros de candomblé ou umbanda.




Maracatu Az de Ouro em 1950

Os personagens são diferentes. O cearense conta ainda com o balaieiro, os pretos velhos e uma maior representatividade dos índios. No maracatu pernambucano há várias calungas (bonecas pretas), enquanto que no cearense há apenas uma, levada por uma negra do cordão especialmente designada à essa missão, usada no mastro do estandarte ou até na sombrinha da rainha. Além disso, sempre houve, no Ceará, a tradição de todos os brincantes, com exceção dos índios, pintarem a cara com tinta preta brilhante. No Maracatu pernambucano, os brincantes não pintam os rostos.

Maracatu Rei de Paus

Quanto à musicalidade, o ritmo e os instrumentos utilizados são diferentes. O ritmo do maracatu cearense é mais lento, semelhante ao auto dos congos. Cadente, dolente e solene. O maracatu pernambucano é mais acelerado, usando a caixa com esteira, com ritmos característicos: baque virado e baque solto.

Maracatu Estrela Brilhante em 1953

O desfile de maracatu cearense pode ter até 150 participantes, que se dividem em vário sub-grupos. Com exceção dos índios, todos desfilam com o rosto pintado de preto. A seguir uma breve descrição dos principais personagens, em ordem de aparição:

* Porta-Estandarte, Baliza e Lampiões - São os condutores do cortejo. Os guias, cada um com um lampião, e o porta-estandarte abrem o cortejo apresentando o escudo do maracatu, acompanhados pelo Baliza, que dança e faz acrobacias. 


* Cordão de negros africanos - Representa os povos africanos, que foram vendidos aos portugueses como escravos. 


* Cordão dos índios - Representa os índios brasileiros que acolheram os negros e a eles se uniram na resistência contra os europeus. 


* Cordão das negras - Representam as mucamas das fazendas, carregando utensílios domésticos. 


* Balaieiro - Negro carregando uma balaio de frutas na cabeça. Representa, ao mesmo tempo, uma oferenda aos orixás, e os escravos que saíam às ruas para vender os excessos de produção das fazendas. 


* Pretos velhos - Usando bengalas e fumando cachimbos, o casal de negros velhos representam os terreiros de umbanda e simbolizam o respeito aos mais velhos. 


* Corte - Representam a nobreza. São príncipes, princesas, vassalos, mucamas e por último, o rei e a rainha com roupas coloridas e enfeitadas. 


* Macumbeiro(s) - Uma ou duas pessoas que cantam a loa - geralmente, o líder do maracatu. 


* Bateria - Vários percussionistas com surdos, ferros, caixas e chocalhos.



Veja AQUI a parte I



Fontes: ALENCAR, C. Origem e evolução do maracatu no Ceará, Fortaleza: Banco do Nordeste, 2007, 54p.

AZEVEDO, Luiz Heitor Corrêa de, Music of Ceará and Minas Gerais, CD de áudio, Congresso dos Estados Unidos da América.

CAMPOS, E. O Cotidiano no Ceará escravocrata. Entrevista concedida a José Anderson Sandes, Diário do Nordeste, 25-03-1998.

Portal do Maracatu Nação Fortaleza, Endereço: http://www.batoque.com/fortaleza, Acesso em 12 Out. 2011




Crédito: Blog Ceará de Luz/Nirez



domingo, 22 de junho de 2014

O Maracatu Cearense e sua história



Há pouca documentação sobre a história do maracatu antes da década de 50. Os primeiros registros confiáveis de maracatu em Fortaleza datam do início do século XX, quando Gustavo Barroso descreve, em "Coração de menino", os desfiles que ocorriam na Praça do Carmo (então Praça do Livramento). 


Maracatu Leão Coroado. Foto: Arquivo Nirez



O Maracatu está relacionado à chegada dos africanos em Portugal no fim da idade média. Ao entrar em contato com a religião católica, os africanos fizeram associações entre os santos católicos e as divindades africanas. Uma delas foi a de Nossa Senhora do Rosário. A imagem da Santa tem, ao redor do pescoço, um colar de rosas (rosário), similar ao colar de Ifá (orixá que previa o futuro). Assim, os escravos que chegaram à Europa no Séc. XV passaram a ser devotos de Nossa Senhora do Rosário. Com isso foi criada a Irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos.


Afrânio de Castro Rangel, Rainha do Maracatu Leão Coroado em 1959




Mesmo escravos, os negros construíam igrejas em homenagem à Santa onde se estabeleciam. Uma vez por ano, no dia 7 de outubro, dia de Nossa Senhora do Rosário, os escravos tinham folga. Nesse dia, faziam o ritual de coroação do rei e da rainha da irmandade.

Maracatu Estrela Brilhante em 1953

Segundo relatos de personagens ilustres de nossa terra, o maracatu cearense já se mostrava presente desde meados do século XIX sendo o mesmo conhecido por “congadas ou pelo auto dos reis de Congo” que retratavam os combates entre o Congo e Angola e que daria origem não só ao maracatu mas também a outras expressões culturais afro-descendentes como o reisado, caboclinhos e os pastoris.

Maracatu Estrela Brilhante em 1953


Em Fortaleza a Irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos homens pretos (1871), responsável pela construção do templo católico mais antigo de nossa capital homenageando santa de mesmo nome, foi a principal difusora desta tradição cultural que se realizava geralmente ao termino das cerimônias religiosas e culminavam com a coroação do rei e rainha negra. Esta mesma irmandade sociabilizava o escravo forro ou cativo a sociedade fortalezense da época e possibilitava aos mesmos; auxílio funeral, pensões a viúvas e a possibilidade de lazer nas horas vagas, sobre tudo, aos domingos e dias santos com o devido consentimento de seus senhores “no caso de escravos cativos”.

Maracatu Az de Ouro em 1958 na Praça do Ferreira - Nirez

O ponto culminante das congadas era a coroação do rei e da rainha negra que vinham acompanhados pelo seu séquito real composto por negros trajando cores bufantes dos mais variados tecidos e representando personagens da corte portuguesa. Em geral tais roupas eram usadas e doadas a irmandade para que pudessem ser realizadas as encenações como vestidos de noivas amplamente usados para caracterizarem as princesas e rainhas.
Em determinadas épocas do ano a irmandade era contratada por senhores de engenho ou pessoas abastadas para apresentar seus autos, tais contribuições eram depositadas em um caixa controlado pelo tesoureiro sendo responsável o mesmo pelo controle dos bens da confraria que consistiam desde casas a terrenos espalhados pela cidade.


Maracatu Az de Ouro em 1958 no Centro de Fortaleza


Além da referida irmandade que teria sido o ponto original deste folguedo, em fins do século XIX o maracatu também fazia-se presente em diversos pontos da capital. Segundo o escritor Gustavo Barroso, havia por trás da estação férrea João Felipe o maracatu do Morro do Moinho que saia com seu cortejo real pelo centro em direção a igreja do Rosário onde fazia a coroação de seu rei e sua rainha.

“os últimos reis do Congo que houveram em Fortaleza, minha terra natal, foram o negro Firmino, ex-escravo de meu pai e a negra Aninha Gata. Esta conheci ai por volta de 1897 ou 1898, com pequena quitanda na antiga travessa das flores, entre as ruas Major Facundo e a da Boa Vista, hoje Floriano Peixoto. (BARROSO, 1962, P. 374)

Existiam também os maracatus da rua de São Cosme (atual rua Pe. Mororó), da rua do outeiro (antiga Aldeota – atual região do Colégio Militar), do Beco da Apertada Hora (atual rua Governador Sampaio), do Manoel Furtado, do João Ribeiro localizado ao fim da rua Major Facundo na altura da antiga Praça do Livramento (atual Praça do Carmo). Do negro João Gorgulho (grupo de folguedos africanos – 1910). Segundo Otacílio de Azevedo em seu livro: Fortaleza Descalça;

“vestia-se com roupagem de seda colorida, recheada de fitas e arabescos, minúsculas lantejoulas, vidrilhos e brilhantes pedrarias. Os valetes do rei João Gorgulho vestiam calças de cetim verde, justas ao corpo, coletes violetas, clâmide vermelha caindo sobre os ombros e espadas de papelão dourado. O trono, forrado de fofos de papel de seda salpicado de estrelas, tendo à guisa de cetro uma vara coberta de papel dourado, ficava sobre um tapete de palha de carnaúba colorida, a coroa, feita com folhas de flandres, se apresentava pintada com cores diversas”.


Maracatu Estrela Brilhante em 1953

O maracatu cearense difere do pernambucano pois o timbre de seus acordes são mais lentos e cadenciados sendo o batuque composto por caixas sem esteiras visando acentuar a batida grave, bumbos, surdos, ganzás, chocalhos e triângulos aqui chamados “ferros” responsáveis pela cadência ou ritmo característico do cortejo. As loas ou “músicas do maracatu” sempre relatam fatos ou acontecimentos históricos ligados à cultura afro regionais ou nacionais constituindo as mesmas no chamado enredo do maracatu. Seus brincantes ou “maracatuqueiros” apresentam seus rostos pintados com uma mistura de fuligem, óleo infantil, talco e vaselina em pasta que dão o tom ao chamado “falso negrume” expressão difundida pelo pesquisador cearense Gilmar de Carvalho. O macumbeiro(a) ou tirado(a) de loas puxa o enredo sendo o mesmo respondido pelo cordão de negras que impulsiona todo o cortejo a imitá-las. Geralmente tais “tiradores de loas” trajam roupas femininas semelhantes as de negrinhas ou “mucamas” reais podendo os mesmos virem trajando branco com suas guias ou amuletos.



Maracatu Az de Ouro em 1950 - Arquivo Nirez

O maracatu chegou oficialmente ao carnaval de rua fortalezense por volta de 1937 através de convite feito pelo famoso rei momo Ponce de Leon ao compositor e carnavalesco Raimundo Alves Feitosa conhecido também como Raimundo Boca Aberta, fundador do Maracatu Az de Ouro (o mais antigo em atividade). Em meados de 1950 seriam fundadas agremiações de imenso peso histórico como: Estrela Brilhante, Az de Espadas Leão Coroado. Outros grupos já extintos deixaram saudade como: Rancho Alegre, Nação Africana, Rei de Espadas, Rei dos Palmares, Nação Uirapuru, Nação Gengibre, Nação Verdes Mares e Rancho de Iracema.


Raimundo Alves Feitosa


Continua...

Créditos: Blog Maracatu Rei do Congo, Blog Solar, Nirez e pesquisas na internet


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