Fortaleza Nobre | Resgatando a Fortaleza antiga : Parque da Liberdade
Fortaleza, uma cidade em TrAnSfOrMaÇãO!!!


Blog sobre essa linda cidade, com suas praias maravilhosas, seu povo acolhedor e seus bairros históricos.

 



Mostrando postagens com marcador Parque da Liberdade. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Parque da Liberdade. Mostrar todas as postagens

sexta-feira, 30 de novembro de 2018

Os Jardins de Fortaleza


Em Fortaleza, a alta incidência de sol foi um fator importante na seleção e nos modos de plantio da vegetação arbórea, em razão da necessidade de sombra como condição favorável à permanência nos jardins públicos. A vegetação constituía um recurso de amenidade climática e remodelação da fisionomia da cidade, trazendo benefícios diretos ao bem-estar da população, à estética e à salubridade urbana.

Desse modo, a seleção das espécies botânicas, especialmente das árvores, nativas ou exóticas, que identificamos nos jardins, podia vincular-se tanto aos seus aspectos ornamentais (floração, atributos das copas, troncos e folhagens) quanto utilitários (sombreamento, rápido crescimento e resistência à estiagem).

Revistas e jornais dos anos 1920 e 1930 ressaltavam a arborização das vias e jardins da cidade, ora enaltecendo as ações realizadas pelo poder público, ora reclamando contra sua escassez, prescrevendo seus benefícios ou ainda apelando à população para conservá-la.

Exemplo disso é uma matéria publicada no Ceará Ilustrado de janeiro de 1925 que enfatizava a necessidade “duma praça intensamente arborisada, onde nas horas de canicula a população pudesse abrigar-se á sombra das arvores”, recomendando o plantio de “mangueira ou outras plantas fructiferas e exóticas” no Parque da Liberdade.¹ A mesma matéria abordava as vantagens do plantio de árvores, bem como apresentava justificativa para a escolha de algumas espécies. Apontava a chegada da estação chuvosa como oportuna para avançar no serviço de arborização da cidade, a fim de facilitar “a péga das arvores”, que deveriam ser “de especies resistentes ás seccas”, citando o oitizeiro, o fícus-benjamim ou a figueira e a canafístula.



De fato, entre as espécies arbóreas, o exótico fícus-benjamim encontrava-se em vários jardins de Fortaleza - espécie de rápido crescimento e copa densa, atributos importantes para garantir a necessária provisão de sombra.


Documentamos ainda a existência dos nativos oitizeiros no Passeio Público e no Parque da Liberdade, castanholas e mongubeiras. Estas últimas, também nativas, já estavam presentes em alguns logradouros da cidade, mesmo antes de serem ajardinados, e eram muito referidas nas crônicas e memórias de escritores locais. Trata-se de espécies umbrosas, portanto, apropriadas ao clima quente. A nativa canafístula, por sua vez, estava presente na Praça Visconde de Pelotas, ajardinada em 1933.


Famoso na crônica histórica fortalezense era o oitizeiro existente junto à Igreja de Nossa Senhora do Rosário, na Praça General Tibúrcio, pois, conforme conta o cronista Otacílio de Azevedo (1892-1978), “sob sua fronde, procuravam refrescante abrigo contra os ardores da canícula” aqueles que ali paravam para conversar sobre arte, política, religião ou a vida alheia.

A presença da vegetação nos logradouros da cidade também foi registrada no Correio do Ceará por um viajante oriundo do Recife em passagem pela capital cearense em 1930, ao ressaltar “suas praças ajardinadas com esmerado gosto” e “a arborização vasta e elegante, que muito concorre para a amenidade do seu clima”.² Uma nota que circulou no mesmo jornal durante o mês de julho daquele ano dirigia às mães de família “o instante appello de, todos os dias, pela manhã, mandarem deitar um jarro d’agua ao pé das tenras arvores e inclinar os seus filhinhos a serem amigos das plantas”. O excesso de sol e a necessidade d’água eram, enfim, desafios postos à implantação e à conservação dos jardins.

Observamos também nos jardins públicos de Fortaleza a exiguidade de elementos aquáticos contemplativos, talvez em razão da evaporação causada pela predominância de dias quentes ao longo do ano, ou por deficiências nos serviços regulares e infraestruturas de abastecimento d’água e/ou por seu custo de manutenção.

A região foi afetada por períodos de estiagem, a exemplo das secas de 1877-1879, 1888, 1900, 1915 e 1919, ensejando medidas como a perfuração de poços de uso público e a criação de obras emergenciais a fim de empregar retirantes sertanejos, provendo-os de trabalho e alimento. A grande estiagem de 1877-1879 impôs dificuldades à operação da Ceará Water Work Company Limited, concessionária que realizava o serviço de fornecimento d’água em Fortaleza, mas que já se encontrava em crise.

Nesse sentido, há relatos que indicam o aproveitamento de recursos naturais para a criação de um lago decorativo no terceiro plano do Passeio Público e de um lago navegável no Parque da Liberdade, em detrimento de fontes e lagos que precisariam ser alimentados artificialmente.



O Passeio Público foi inaugurado por fases a partir de 1880 e, durante muito tempo, constituiu o principal logradouro público ajardinado de Fortaleza. Era estruturado em três planos, correspondentes a três níveis topográficos, entre a cidade e a praia. Porém, segundo o engenheiro e cronista João Nogueira (1867-1947), o negociante Antônio Tito Rocha, que já o explorava para a prática de patinação por volta de 1879, efetuou melhoramentos no “terceiro plano, que foi ajardinado, construiu um lago, que era alimentado pelas águas do riacho Pajeú.



O Parque da Liberdade, por sua vez, começou a ser estruturado em 1890 e foi remodelado e rebatizado de Parque da Independência em 1922. A primeira intervenção consistiu no aproveitamento da Lagoa do Garrote, que “se viu aprisionada em margelas de cimento, para se tornar o lago central de belo jardim público”, descrição correspondente às fotos publicadas no álbum Fortaleza 1910. A lagoa delimitava uma “minúscula ilha”, na qual, já no século XX, foi erguido um pavilhão conhecido como Templo do Cupido. O parque tornou-se um dos espaços de recreação da população, e a antiga lagoa, um de seus atrativos, recanto de contemplação e local para o passeio de barcos.


O Jardim 7 de Setembro, criado na Praça do Ferreira em 1902, dispunha de um conjunto de bacias como parte do seu sistema de irrigação, demonstrando, portanto, sua função utilitária.


Posteriormente, na década de 1930, algumas praças foram dotadas de peças aquáticas na ocasião de seu ajardinamento. Em 1930, foi instalada uma fonte luminosa no Jardim Tomás Pompeu da Praça Comendador Teodorico ou da Lagoinha. A peça foi importada da Alemanha e inaugurada naquele ano, quando a cidade já possuía redes de energia elétrica³, coexistindo com o sistema a gás, e de abastecimento d’água, embora este último serviço atendesse apenas parcialmente a população quando de sua inauguração, em 1926.

Finalmente, a Praça Visconde de Pelotas, onde haviam sido erguidas duas grandes caixas d’água como parte do novo serviço de abastecimento, foi ajardinada em 1933 e dotada de um lago central, de modo que afirmamos a interdependência entre as características do meio e os recursos infraestruturais necessários à implantação e manutenção dos jardins.


Antes que o referido sistema de fornecimento d’água, inaugurado em meados dos anos 1920, pudesse ser disponibilizado para a irrigação de jardins e a alimentação de lagos e fontes, o uso dos cata-ventos foi uma solução significativa no tocante à rega e à manutenção de tais espaços.


CATA-VENTOS PARA A IRRIGAÇÃO DOS JARDINS

À procura de água doce: os cata-ventos nas memórias e no espaço da cidade
Em Fortaleza, deu-se o notável aparecimento de cata-ventos ou moinhos de vento nos quintais das residências e espaços públicos da cidade, os quais utilizavam a energia eólica como força motriz para puxar água de poços e cacimbas.
Embora tais equipamentos estejam fartamente ilustrados na iconografia fortalezense, há poucas informações bibliográficas extensas sobre sua origem, aquisição, funcionamento e contexto de onde foram importados.



Testemunha ocular de sua presença na Praça do Ferreira, Otacílio de Azevedo recorda que, quando chegou à cidade, por volta de 1910, ali, “à falta de óleo, gemia um velho catavento, sobre uma cacimba gradeada. Enchia uma imensa caixa d’água pintada de roxo- terra”. Deparava-se com “um belíssimo jardim - rosas, dálias, papoulas - enfim uma imensa variedade das mais belas flores”. Noutra crônica sobre a Praça do Ferreira, o autor informa a existência de “uma caixa d’água e um catavento, que puxava água para aguar os jardins”.

Em outro registro, o escritor Mozart Soriano Aderaldo (1917-1995), com base em reportagens de época, descreve a feição do logradouro quando ajardinado, em 1902. O autor afirma que “um catavento puxava água para um depósito que abastecia oito tanques destinados a manter viridentes os canteiros floridos situados nas partes em que se dividia o trecho central”.

Segundo ambos os relatos, embora stricto sensu destituído de qualquer função decorativa, o cata-vento da Praça do Ferreira era visivelmente importante para manter viçosos e vistosos os canteiros do jardim.



Enquanto o cata-vento da Praça do Ferreira comparece nas lembranças e escritos de Otacílio de Azevedo e Mozart Soriano Aderaldo, o arquiteto José Liberal de Castro articula a dificuldade de obtenção de água doce em Fortaleza à concepção projetual do Passeio Público. A despeito de sua filiação às matrizes paisagísticas europeias, o passeio adaptava-se às condições topográficas e hídricas locais, visto que “minguava a água na Cidade, obtida de cacimbas, com dificuldades, e elevada às caixas de distribuição por meio de bombas movidas a braço ou por cataventos”. Liberal de Castro afirma que “o agenciamento em patamares procedia do aproveitamento da disposição rampada do terreno, sem quaisquer vínculos com os jardins à italiana, estes animados pela fartura hídrica, em canais, lagos, fontes e cascatas”.



Informações sobre a procedência de tais equipamentos constam na obra do escritor e ex-prefeito (1933-1934) Raimundo Girão (1900-1988). O autor afirma que, no início do século XX, os cata-ventos de Fortaleza, “em geral, eram de fabricação norte-americana, quase todos dos tipos Dandy e IXL”, e, em razão do seu crescido número, ofereciam “sugestivo aspecto” à cidade. Ainda segundo o autor, a população supria-se de água por meio de “cacimbas escavadas nos quintais das casas e elevada por moinhos de vento a rodarem desesperadamente dia e noite”, ao passo que a água potável “era distribuída pelas residências em cargas de quatro ancoretas ou canecos, transportados por jumentos”.
Reafirmando a informação de Girão, José Liberal de Castro registra que os cata-ventos metálicos, existentes “em número incontável” na cidade, eram utilizados nas moradias antes da instalação da rede de distribuição d’água domiciliar, mas também serviam para a irrigação dos jardins públicos. Em suas palavras, “os cata-ventos na quase totalidade exibiam, nas pás, o logotipo da marca Dandy, americana, embora alguns exemplares fossem de fabricação local”, produzidos pela Fundição Cearense.

A arborização da cidade era uma preocupação constante: 









Continua...

¹ É importante lembrar que, naquele ano, a cidade de Fortaleza contava com pelo menos seis jardins públicos: o Passeio Público, o Parque da Liberdade, o Jardim 7 de Setembro da Praça do Ferreira, o Jardim Nogueira Accioly da Praça Marquês do Herval, o Jardim Pedro Borges (ou Caio Prado) da Praça da Sé e a Praça General Tibúrcio, não se dispondo, contudo, de informações sobre seu estado de conservação.

² Nota originalmente publicada em 6/8/1930 sob o título Fortaleza no Jornal Pequeno, editado na capital pernambucana. Cf. Correio do Ceará (16/8/1930, p. 7).

³ No caso do sistema elétrico, para o funcionamento da fonte, foi necessário, contudo, fazer uma instalação especial por um engenheiro inglês.


Créditos: Aline de Figueirôa Silva (Arquiteta e urbanista) - Artigo: À procura d'água: cata-ventos americanos nos jardins de Fortaleza, Mensagens do Governador do Ceará para Assembleia em 1927/1943, Jornal Pátria (1915), Jornal O Ceará (1928), Jornal A Razão (1931), http://bndigital.bn.gov.br, Acervo Lucas, Acervo Fortaleza Nobre e Arquivo Nirez

terça-feira, 22 de agosto de 2017

Cidade da Criança - A Praça Que Veio do Sertão



Uma Fortaleza menina...


"Uma pequena cidade de 35 mil habitantes, lá nos tempos distantes da metade do século XIX, que crescia às margens de um riacho. Sem infraestrutura, com um comércio em torno de uma praça de areia e de duas igrejas. Assim era Fortaleza por volta de 1850, com o córrego do Pajeú descendo do “Oiteiro” (Outeiro-Aldeota) com suas curvas, a Praça Municipal (do Ferreira) e as Igrejas do Rosário e de São José (). Muita criação animal para alimentar o povo, praticamente sem fiscalização, mas para tal precisava de água doce, que não fosse do corrente que passava límpido nos quintais das casinhas, por isso a necessidade de uma lagoa “mais distante”. No final da Rua do Cajueiro, atual General Bizerril, pelo lado sul da cidade de então, havia currais e chiqueiros onde os animais se alojavam, debaixo de cajueiros, antes do abatimento, e ali mesmo o seu comércio, em meio ao matagal. Uma dessas árvores era tão majestosa que emprestava o nome à rua. Sob ela trabalhava o marchante Fagundes, que morava ao seu lado. Conta-se que, passando por ali, a cavalo, o capitão-mor Luiz da Motta Feo e Torres, caiu seu chapéu, e exigiu que Fagundes o entregasse. O açougueiro sequer o respondeu. Como vingança, o governador tentou por duas vezes derrubar o cajueiro, traído pela solidariedade recebida pelo outro. Colegas de corte e demais comerciantes se armaram para defender a árvore. E assim o cajueiro manteve-se imponente. 

Certa vez, ocorreu que, como animal tem sentimento, um garrote tratou de fugir na noite que antecedia à sua morte, embrenhando-se na mata. Somente muitas horas depois foi recapturado, o que lhe valeu, pelo menos, o nome do logradouro: Lagoa do Garrote. Nascia o "bairro" Alagoa do Garrote



Lagoa do Garrote - A Rainha do Nosso Parque 

O crescimento populacional de Fortaleza associava-se mais às secas, que levavam para a sua periferia os flagelados, povo sem instrução, letras e noção de destino, mas disposto a trabalhar para garantir um pouco de sustento. Todos careciam do líquido precioso, ainda que sem tratamento específico, daí a necessidade de criação de poços para o consumo, como chafarizes, servindo como alternativa às ausências e competitividade frente à excelência da Cacimba do Povo, de Jacarecanga, a do Beco do Cacimbão (que ainda se encontra na Praça do Ferreira) e o da bica, ambos no lado velho da cidade, prestativos para todas as necessidades. Foi quando, em 1848, providenciaram um cacimbão no Largo do Palácio (da Luz), isso bem depois do Açude do Garrote, construído por José Martiniano de Alencar quando presidente da província (1834 - 1837). Segundo Artur Eduardo Benevides, que foi Príncipe dos Poetas, a cidade contava com um rio tributário desaparecido por conta dos aterros. Nascia na Praça Clóvis Beviláqua, cortava as ruas a partir da Senador Pompeu até desembocar no Garrote. Já a outra vazão vinha do velho Marajaik (Pajeú) a partir do Outeiro (Aldeota). Porém, já naquele ano a nossa lagoa, usada também para banhos do povo, muitas vezes sem roupas, já não era tão acolhida, estando suja e imprópria ao consumo humano. O presidente Fausto Augusto de Aguiar fez a solicitação de construção de um cacimbão no Garrote, então “de água pantanosa”, a qual abastecia a cidade, e outro no Campo da Pólvora (Praça dos Mártires) por 88$280 réis. Os jornais liberais, de oposição, não perdoavam, fazendo cobranças, como lemos em O Cearense de 20 abril 1848: 
“Lamentamos que continue a população desta cidade a servir-se da lagoa pantanosa do Garrote, e se não tenham podido ainda realizar as ordens do presidente sobre o melhoramento das cacimbas. A lagoa que bebe o povo não é objeto de pouca monta, como alguém pensa, as febres gástricas estão continuando, e podem ser atribuídas à má qualidade da água. Portanto, é mister cuidar seriamente disso”. 
Providenciou-se 60$000 réis a Luiz de França Tavares para os cinco serventes que construíram as duas cacimbas no Garrote.


Foto do Jornal O Estado - Acervo Lucas 

Mesmo diante dos perigos de contaminação, por décadas as feiras de porco, carneiro, peru e hortaliças se estabeleceram no local. Mas diante das denúncias de infestação de doenças causadas pela poluição da lagoa, no início de 1861 o Dr. Joaquim Antônio Alves Ribeiro foi contratado pela província, constatando que nas águas verdes claras e fedorentas existiam matérias estranhas “levadas pelos ventos”, e pelo microscópio verificou-se quantidade enorme de corpúsculos vivos e mortos que povoavam aquele ambiente. Temperatura elevada de 25°C. O jornal O Cearense recomendou à municipalidade “a remoção de mananciais, rasgando o sangradouro até o nível fundo, jogando cal vivo e enxugando para matar as espécies de animais microscópicos que ali se desenvolveram”. Em maio de 1861, parecer do Dr. Ribeiro assim respondeu à pergunta do presidente da província, Manuel Antônio Pinto Duarte de Azevedo: “As águas estagnadas do açude do “Pageú” podem prejudicar o estado sanitário da capital incontestavelmente. O estado atualmente arruinado das suas águas é prejudicial à salubridade pública. Os exames cuidadosamente feitos indicam que convém fazer nesta conjuntura para não privar o publico da utilidade que o açude presta, e torná-lo de maneira que suas águas estagnadas não sejam prejudicadas por meio de suas emanações à salubridade pública. Aproveito a oportunidade para também dizer o meu pensamento relativamente à existência da Lagoa do Garrote porque as suas águas se acham ainda e piores condições do que as do açude, e como tenho estudado ambas localidades, julgo mui conveniente unir a este parecer as minhas ideias relativas ao estado atual, visto que as águas estagnadas da dita lagoa também influem sobre a salubridade pública, e por isto também precisam de remédio”. 


Cidade da Criança em 1935 (Foto M. Guilherme). Acervo Lucas

8 de julho de 1862. Ofício da Câmara ao Exmo Presidente: “A Lagoa do Garrote está sendo hoje lugar de despejo de imundícies, de sorte que a água exala um fétido extraordinário, que não pode deixar de resultar em grande mal para esta cidade na quadra presente. Portanto, pede esta câmara a V. Exc. para que tomando este negócio em consideração, dê suas providências para que seja desinfetado aquele lugar, aterrando-se ou esgotando-se a dita lagoa”. Conclui-se que tanto o Pajeú como a Lagoa do Garrote estavam contaminadas, estando as suas águas não recomendadas para o consumo. Porém, nada de respostas das autoridades. Em 1 de agosto de 1865 foi regulamentado o serviço de limpeza do centro histórico, aos cuidados do fiscal Joaquim de Macedo Maciel, estando aquele logradouro agendado para as sextas feiras. Naquela época, do seu lado sul, existia um terreno mais valorizado que o da lagoa, onde se erguia a Capela de Nossa Senhora das Dores, para a qual a Assembleia Provincial aprovou a doação de 1:000$000 (um conto de réis), inaugurada dois anos após. Na Praça da Liberdade, exatamente no mesmo local em que surgiu, em 25 de março de 1886, a Igreja do Coração de Jesus


Foto ao lado: Gov. Liberato Barroso, pref Cassimiro Montenegro e Dr. João Guilherme Studart, entre outros. (O Malho, 1915) - Acervo Lucas 

José Júlio de Albuquerque Barros, presidente da província, mandou arborizar a praça, assim como a Figueira de Melo, a Boulevard Duque de Caxias e a Conde D’Eu em 1880, ano em que , naquele largo, construiu-se um prédio para guardar equipamentos militares aos cuidados do alferes Berlamino Accioly de Vasconcelos.

Parque da Liberdade pelas Mãos de Trabalhadores Famintos 


O paulista Caio Prado assumiu o governo cearense (1888 - 1889) decidido a valorizar a Lagoa do Garrote, tornando-a um centro de lazer para os fortalezenses. 

Foto ao lado - Imagem aérea de 1938 de J. A. Vieira. Acervo Lucas 

Em termos financeiros deveria se preocupar com os fornecedores e com algumas desapropriações, afinal mão de obra barata não faltava. Tratava-se de mais uma época de seca, a nona apenas naquele século de um total de onze. Não foi tão cruel quanto a de 1877 - 1881, o que não impediu uma nova “invasão” da capital por retirantes, seja a pé, seja sobre animais ou nos vagões da Estrada de Ferro Baturité (EFB). Muitos, infelizmente, não chegaram ao destino. Numa atitude mais política que humana, os políticos governistas indicaram cem desses flagelados para dar início aos serviços. O crítico O Cearense protestou, pedindo mais trabalhadores em obras públicas tendo em vista a gravidade social, com pessoas morrendo de fome, em detrimento dos enormes gastos. Caio Prado duplicou esse número, porém, em julho de 1889, atrasou os pagamentos de modo que em agosto um operário morreu por falta de alimentação. Os liberais encamparam, então, uma série de denúncias contra o presidente. Passaram a chamar a obra de Largo dos Escândalos


Veio o período republicano e tomou posse o primeiro governante da era, o tenente-coronel Luís Antônio Ferraz, ao qual os liberais esperavam em vão se aliar. 

Foto ao lado - Cartão Aba Film (1937). Acervo Lucas

Coronel Ferraz acabou inaugurando o Parque da Liberdade, outrora Lagoa do Garrote, que a partir de 16 de abril projetou-se como Largo da Liberdade, no dia 13 de maio de 1890. Homenageava a data de libertação dos escravos no Brasil (1888). O responsável pelas obras foi o engenheiro militar Dr. Romualdo de Barros, diretor de Obras de Socorro de Fortaleza. Às 9 horas, ao som da banda do Corpo de Segurança Pública, o inédito parque, um magnífico lugar voltado para diversões decorado com bandeiras, com balanços e trapézios, foi entregue diante de uma multidão. À tardinha, das 17 horas às 19 horas, novamente a banda de música, agora para dançantes. Na ocasião, o industrial José Borges Gurjão presenteou o complexo com um canindé e uma arara para a coleção de aves ali existentes, como um pavão de bela linhagem, dando origem ao único zoológico da cidade. Já o Comendador Francisco Coelho foi um dos indenizados por ceder terreno para a extensão do parque, que só seria concluído em 1902, com a construção do muro. Iniciava-se uma reurbanização do Centro, ao mesmo tempo em que em julho era inaugurado ao lado da lagoa o Café Cascata
Obras de ajustes continuaram, como retiradas de casebres, e mais uma vez trabalhadores sofrendo com atrasos salariais.


1890: o primeiro café. Acervo Lucas 

As Bandas nas Praças 

Fortaleza contava com dois belos espaços para entretenimentos: a Praça dos Mártires e a Praça da Liberdade. Em 31 ago 1890, no Largo da Liberdade, a banda de música do Corpo de Segurança Pública tocou as seguintes peças: 

I - Marcha: Progresso da República. 
II - Dobrados. 
III - Fantasia da Ópera Trovador. 
IV - Sinfonia da Ópera O Guarani. 
V - Aliser, a Grande Valsa. 
VI - Valsa Gato Preto. 
VII - Variação da Ópera Sonâmbula, no clarinete. 
VIII - Polka. 

Da mesma forma o 11° Batalhão de Infantaria, que, presente em outras ocasiões, brindou com “Valsa da Esperança”, “Valsa Paula Castro”, “Ermelinda Polka” e “Fantasia Moisés”. 

O Povo Coçando a Cabeça 


Foto ao lado - Parque da Independência (Verdes Mares, 1932). Acervo Lucas 

No dia 31 de outubro de 1890, a Secretaria do Conselho de Intendência Municipal publicou polêmica resolução com mudanças radicais, como nomes de praças, entre as quais a Dr. José Júlio no lugar da Praça da Liberdade (Coração de Jesus). José Júlio Albuquerque, sobralense, antigo interventor federal. A Praça do Mercado, antiga Carolina (atual Waldemar Falcão) passou a José de Alencar; Marquez do Herval a do Patrocínio (atual José de Alencar), e a gloriosa Praça do Ferreira no lugar de Praça Municipal, outrora Pedro II, entre outras. 


Foto ao lado - Festa da criançada em 1939 (Unitário). Acervo Lucas 

Mas o interessante foi a alternativa encontrada para driblar as constantes alterações nos nomes dos logradouros. Conforme o Artigo 1°: “Fica suprimida a denominação existente das ruas da cidade e substituída por numeração pela forma assim denominada: da Rua Formosa (Br. Do Rio Branco) para o nascente todas as ruas serão ímpares, e para o poente pares”

Desse modo, a Rua Formosa passou a se chamar N° 1, a Major Facundo N° 3 e a Rua da Boa Vista (Floriano Peixoto) N° 5, assim como a Senador Pompeu N° 2 e General Sampaio/Visconde de Cahuype (Av. da Universidade) N° 4. Não vingou por muito tempo. 

Parque da Independência 


Foto ao lado: A fachada com o índio. Arquivo Nirez

Durante o governo de Justiniano de Serpa e do intendente (prefeito) Ildefonso Albano, em 1922, lembrando o centenário da independência, o Parque da Liberdade passou a se chamar Parque da Independência. Na ocasião, foi fixada na entrada, sobre o portão, a imagem do índio se libertando, quebrando a corrente. 
1934. O interventor federal Carneiro de Mendonça fez o projeto da Cidade da Criança, tendo o seu sucessor, Meneses Pimentel, professor de carreira, dotado verbas que a viabilizaram, sendo a sua instalação em 1936. Assim, no dia 26 de maio de 1937, o intendente Raymundo de Alencar Araripe e o interventor Meneses Pimentel, durante as comemorações pelos dois anos das suas administrações, inauguraram a Cidade da Criança, ainda que oficialmente permanecesse Parque da Independência pelo conjunto. 


Aulas de balé na escolinha Alba Frota. (O Estado, 1949). Acervo Lucas

Como novidades quatro modernas construções, abrigando uma inovadora escola para crianças de 3 a 13 anos, iniciando com 150 alunos. Num pavilhão remodelado surgiram a biblioteca e a cantina, enquanto em outro os banheiros com chuvisco. No terceiro pavilhão ficou o Jardim de Infância, onde se ensinava canto, balé, penetrando no desenvolvimento das artes. Ao lado deles os parques de diversões com balanços e deslizadores. Lembrando também as inovações charmosas, como a Gruta dos Amores e a Gruta do Cupido. Aos cuidados da diretora Zilda Martins Rodrigues, educadora renomada e escritora, esposa de José Martins Rodrigues, político e jornalista, fundador do jornal O Estado. As professoras, como Isaura Araújo, Francisca Pedreira, Erzila Mendonça, Elizabeth Osório e Diva Moura, no entanto, já reclamavam do pequeno espaço dos prédios e de carências de materiais. 
No ano seguinte, Raymundo de Alencar Araripe criou, segundo o Decreto 367 de 28 de janeiro, o Serviço de Educação Infantil, à frente o secretário Hugo Catunda, outra diretora, Alba Frota e de sua auxiliar Ailza Ferreira Costa, fortalecendo o ensino pedagógico com orientação sociológica e elevando a idade dos alunos até 15 anos. No Parque de Brinquedos, no complexo do Parque Recreio, foram adicionados olas, gangorras e deslizadores, alem de serviço de vigilância a cargo de três mulheres. Em 1939 já contava com 409 alunos e expandia os jardins, dispondo de sala de projeções, ao passo que em 1940 foi inaugurado o restaurante. 

A Volta do Parque da Liberdade 


Restaurador Augusto Cezar Telles Marinho (Tribuna do Ceará, 1977). Acervo Lucas 

Em 1948, entretanto, a Lei 84, publicada em 22 de outubro, durante a gestão municipal de Acrísio Moreira da Rocha, restaurou-se a denominação Parque da Liberdade, desaparecendo Parque da Independência. Uma medida que nunca neutralizou o apego popular, permanecendo até hoje o costume popular à Cidade da Criança. Numa realização aplaudida durante administração do prefeito Evandro Ayres de Moura, em 1977, ocorreu a restauração das imagens da Cidade da Criança comandada pelo escultor Augusto Cezar Telles Marinho. Diante dos sacrifícios, como subir uma escada de onze metros cedida pelo Corpo de Bombeiros, o artista honrou o seu talento, dando à imagem do índio a sua característica de origem, que embora verde foi decidido pelo restaurador mudar para marrom. Assim o fez com o cupido, feito de mármore, com o arco e as asas; a criança Inocência, a mãe e o casal de crianças, fundidas em bronze, nas suas cores naturais, vindas de Milão, Itália


1938 com a velha Igreja do Coração de Jesus (Foto M. Guilherme). Acervo Lucas

Após a desativação da escola, funcionou no local a Fundação da Criança e da Família Cidadã (FUNCI), ligada à prefeitura. Atualmente em obras de drenagem, com muro ao chão, serve de apoio aos serviços no entorno do Centro, como a Guarda Municipal. Aguardamos maior valorização daquele símbolo de Fortaleza, que ostenta, numa área de 26.717 metros quadrados, o carinho e a paixão do cearense, das vítimas das secas aos mais abastados. Carece, e urge, de exploração e de direitos voltados à sociedade, em particular àquela que lhe empresta o nome, a criança."
                                                                                                           J. Lucas Jr 
(Escritor, professor e bancário)


Fontes: Jornais O Cearense, O Estado e Tribuna do Ceará.


segunda-feira, 21 de abril de 2014

Especial Fortaleza 288 anos - Praças da cidade (Parte III)



Limitada pela Avenida Dom Manuel e as ruas Franco Rabelo, Rufino de Alencar e 25 de Março, a praça antes de 1881, era conhecida pelo nome de Praça da Conceição, em homenagem a Nossa Senhora da Conceição da Prainha, pela igreja do Seminário
Já se chamou Praça Senador Machado, em homenagem ao Dr. Antônio José Machado, que foi membro da corte e exerceu os cargos de chefe de polícia do Ceará e deputado federal em 1861.
Chamou-se de novo Praça da Conceição e novamente Senador Machado seis meses depois. 

Recebeu a denominação de Praça do Cristo Redentor, em 1922, em razão ao monumento que abriga uma coluna com Cristo no topo, com 35 metros de altura, montada sobre uma base cúbica. Desenvolvida sobre um eixo vertical gerado por uma escada com 115 degraus. Está revestida e decorada exteriormente com elementos jônicos, frisos, cornijas, moldura e outros detalhes executados com argamassa de cal e areia. Sobre sua base se encontram um conjunto de placas de mármore onde podemos ler a lista dos nomes dos amantes desta luminosa cidade praieira, vinculados à história da cidade através deste singelo e elegante monumento.
O nome foi dado por lei em 1924.


A praça foi construída na metade do século XIX e já foi conhecida como: Praça do asilo, Praça dos Educandos, ou Praça da Escola Normal, ou ainda Praça do Colégio. Era conhecida assim devido o Colégio da Imaculada Conceição fundado em 1867.
Em 1855 o edifício já havia sido construído para abrigar órfãs e foi considerado resultado do crescimento urbano da cidade. É limitada pela Avenida Santos Dumont, ruas Coronel Ferraz, Franklin Távora e 25 de Março

O nome atual (Praça Filgueira de Melo), é em homenageado a Figueira de Melo, que ocupou os cargos de Juiz de Direito, Presidente do Maranhão, Juiz dos feito da Fazenda, Secretário do Governo de Pernambuco, Chefe de Polícia de Pernambuco e membro do tribunal da relação da mesma província, Presidente do Rio Grande do Sul, Ministro do Supremo Tribunal, Chefe de Polícia do Rio de Janeiro, Desembargador do Tribunal do Rio, Deputado geral e provincial de Pernambuco, Deputado geral do Ceará, Senador do Império pelo Ceará e tinha o foro de Fidalgo Cavaleiro da Imperial Casa, ganhou o título de Barão de Sobral.Nasceu em 1809 em Sobral/CE e morreu em 1878 por hemorragia cerebral. Em 1832 formou-se em Direito em Olinda – PE.


Em 07 de março de 1940, é inaugurada a Praça Fernandes Vieira, após remodelação e ajardinamento.
Em 1945, o Liceu do Ceará teve sua administração transferida para as proximidades da então Praça Fernandes Vieira. Ainda que, com o passar do tempo, tenha havido mudança de nome para Praça Gustavo Barroso.

No dia 31 de agosto de 1962, ocorre a inauguração do monumento à Gustavo Barroso com as presenças de Luis Sucupira, Raimundo Girão, Albano Amora e Mozart Soriano Aderaldo.

O nome que batiza a praça é em homenagem ao ex-liceísta Gustavo Barroso. Advogado, professor, político, contista, folclorista, cronista, ensaísta e romancista. Nasceu em Fortaleza, em 29 de dezembro de 1888, e faleceu no Rio de Janeiro, em 3 de dezembro de 1959.


Limitado pelas ruas: General Bezerril, Pedro I, Pedro Pereira e Visconde do Rio Branco. O parque tem uma área de 26.717 metros quadrados e foi iniciada a sua urbanização em 1890, quando recebeu o nome de Parque da Liberdade, referência à libertação dos escravos no Ceará.

Em 1922, recebeu o nome de Parque da Independência, em homenagem ao centenário da Independência do Brasil. Inaugura-se a estátua de um índio quebrando os grilhões no portão de entrada.

No ano de 1936, recebe o nome de Cidade da Criança, pelo notável empreendimento educacional infantil. Jardim de infância para meninos de 3 a 6 anos e Parque para educação física e Social de 7 a 14 anos.

Em 1948, na gestão do prefeito Acrísio Moreira da Rocha, volta a receber o nome de Parque da Liberdade.


Limitada pela Avenida Duque de Caxias, ruas Pedro I, Solon Pinheiro e Jaime Benévolo.

Batizada como Praça da Boa Vista, a Praça foi inaugurada em 1880. Em 1881, em homenagem a José Júlio de Albuquerque Barros, o Barão de Sobral, passou a chamar-se Praça Dr. José Julio.
Em 1886 recebe o nome de Praça do Coração de Jesus, depois da construção da igreja em frente à Lagoa do "Garrote", iniciada em 1878, construída pelo Barão de Aratanha.

Em 1890, por resolução do Conselho da Intendência Municipal, recebe a denominação de Praça da Liberdade.

"Na sexta-feira, 15 de março de 1957, um "estrondo ensurdecedor", no dizer da imprensa local, às 13 horas e 20 minutos, abalou e surpreendeu a população fortalezense". Gustavo Barroso

No ano de 1960, toma o nome oficial de Coração de Jesus.


Veja também:

Parte I

Parte II
Fontes: Livro Cronologia Ilustrada de Fortaleza de Miguel Ângelo de Azevedo, Livro Fortaleza - Praças, Parques e Monumentos de Lídia Sarmiento e José Capelo Filho e Portal do Ceará de Gildásio Sá.

Fotos: Arquivo Pessoal, Arquivo Nirez, Acervo Jornal O Povo e Arquivo Assis Lima.



NOTÍCIAS DA FORTALEZA ANTIGA: