Fortaleza Nobre | Resgatando a Fortaleza antiga : Bonde Joaquim Távora
Fortaleza, uma cidade em TrAnSfOrMaÇãO!!!


Blog sobre essa linda cidade, com suas praias maravilhosas, seu povo acolhedor e seus bairros históricos.

 



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sábado, 12 de julho de 2014

O transporte coletivo em Fortaleza - Entre 1945 e 1960



"Em 1958, os ônibus de Fortaleza eram palcos de todo o inesperado que pode se criar quando muita gente diferente se junta num mesmo espaço a caminho de destinos mais ou menos próximos. Podiam até mesmo ser reflexos diminuídos da grande cidade que se formava, tamanhas suas contradições. Vistas das janelas dos ônibus, de alguma forma, as ruas deixavam de ser caminhos ordenados pelos construtores da cidade para se tornarem veredas imprevisíveis, incertas até mesmo da chegada. Nos ônibus, o acolhimento da racionalidade urbana cedia assento para a aventura das relações humanas em movimento. Para enfrentar os ônibus, o conselheiro Milton Dias sugeria certo alheamento do real, como uma cautela frente à impossibilidade de compreensão do cotidiano vivido.
Então eram eles, os ônibus, por suas incongruências, os lugares possíveis de se
conhecer a gente da cidade."

Patricia Menezes




O CASO DA LIGHT

Andar de ônibus é talvez a aventura capaz de traduzir com mais precisão a realidade da cidade em disputa, pouco se sabe das discussões que envolveram a formação do moderno sistema de transporte de passageiros de Fortaleza. Nos primeiros momentos, esse enfrentamento se deu entre os bondes elétricos da The Ceará Tramway Light and Power e as pequenas empresas de ônibus que se multiplicaram na cidade depois de 1926.



Para o seu João Batista de Paula, o “Batista da Light¹, os maiores problemas que surgiram foram a Guerra e os ônibus. Se, para os ônibus, o racionamento de gasolina durante a Segunda Guerra Mundial trouxera inevitáveis transtornos com o gasogênio – improviso mecânico que permitia o tráfego de automóveis através da combustão de carvão –, para a Light, responsável pela eletricidade e pelos bondes da cidade, as dificuldades se multiplicaram na razão do tamanho da companhia e do seu papel determinante do desenvolvimento urbano de Fortaleza no final dos anos 1940.
Funcionário de carreira, seu Batista foi o único nome cearense que esteve à frente da The Ceará Tramway Light and Power Limited em Fortaleza, – afora o interventor nomeado pelo Governo Federal do Presidente Dutra, já nos últimos meses de funcionamento da empresa. Batista começou a trabalhar em 1914 como contínuo e foi galgando postos até chegar à gerência – o posto máximo da empresa no Brasil – em 1934, em substituição a Mr. Hull², que fora afastado quando a legislação brasileira impediu que estrangeiros exercessem funções de comando no País. Com 40 anos de trabalho na companhia, seu Batista conhecia a Light como ninguém. Lidava com intimidade com os problemas da vida dos trabalhadores e resolvia com desenvoltura as complicadas relações com os acionistas na Europa.


Em 1945, seu Batista pedira à sede da companhia em Londres que enviasse um lote de peças para que ele recolocasse em funcionamento grande parte da frota de bondes elétricos que estava encostada na garagem da Light, no bairro Joaquim Távora, em Fortaleza. Eram, ao todo, 53 tramways. Ele bem sabia
que eram pouquíssimos para atender os 195 mil habitantes da cidade, espalhados
ao longo dos caminhos das nove linhas de carris e em arrabaldes bem mais distantes do Centro. Mas comprar novos bondes e ampliar a instalação de trilhos e cabos elétricos impunha importantes negociações com os capitalistas ingleses. 


A fotografia dos anos 30 nos mostra um bonde elétrico da Ceará Tramways, Light & Power em Fortaleza. Está perto da Praça do Ferreira, na rua Pedro Borges esquina com Floriano Peixoto, em Frente à Mercearia Leão do Sul.


Portanto, resolver o problema de conservação da frota existente, sem dúvida, já
seria um grande benefício para Fortaleza.
A preocupação de seu Batista em aumentar o número de bondes urbanos era coisa que os jornais já estavam cansados de reclamar. A cidade estava se transformando numa metrópole, fazendo da desorganização da circulação e da deficiência do transporte coletivo problemas urgentes. Essas questões haviam
inspirado o Secretário de Segurança Pública do Estado, Raimundo Gomes de Matos, ainda em 1945, a contratar o senhor Rui Toledo para planejar melhorias nos deslocamentos da Capital. Era sabido que o descontrole do crescimento de Fortaleza transbordara as expectativas dos planos urbanísticos anteriores e exigia que o saber técnico tentasse esquadrinhar novamente o movimento da cidade.


Chegando de São Paulo pouco depois da substituição do titular da Secretaria por Romeu Martins, o senhor Rui de Toledo considerou o trânsito de Fortaleza um caos e, no tempo curto de seu contrato, limitou-se a sugerir medidas que visavam “melhorar a educação” das pessoas nas ruas. Recomendou, inclusive, a adoção de traves laterais nos bondes, de forma a impedir que os passageiros subissem por qualquer lado do carro e viajassem dependurados nos estribos, como bochecheiros³. Tais traves, finalmente, poderiam evitar as constantes paradas dos bondes para embarques fora dos pontos, que eram grandes obstáculos ao fluxo de automóveis.
As medidas eram tímidas. Mesmo com a confusão do tráfego e a notória escassez de veículos de transporte coletivo, havia dias que somente 8 dos 53 bondes elétricos entravam em circulação, tão deteriorada estava a frota da Light.


Seu Batista alegava que a companhia não dispunha de peças sobressalentes para reposição, pois a tecnologia dos tramways era inglesa e a crise do comércio
marítimo durante a Guerra impedia que os navios chegassem à Fortaleza.

Não há nervos que resistam à passagem na via pública dos calhambeques da companhia inglesa. São tramways desgastados pelo uso e máquinas corroídas pelo tempo. Controles que descontrolam os motorneiros e desconsertam os tristes passageiros.


Então, restava improvisar. Em janeiro de 1946, um grupo de trabalhadores da Light revelou ao repórter do Correio do Ceará que algumas peças quebradas
eram substituídas por engenhos feitos de cimento e cal pelos mecânicos da empresa, garantindo um número mínimo de bondes circulando, mesmo em
condições duvidosas. Os resultados de tal tática eram os frequentes acidentes e
incêndios espontâneos que revelavam aos assustados passageiros as deficiências
da oficina da companhia. Uma semana depois da revelação, o Unitário publicou o acidente com o bonde da linha José Bonifácio:

O bonde incendiou sua caixa de máquinas provocando, além dos ferimentos em seu guiador, susto nos passageiros que ali viajavam.  Unitário, Fortaleza, 21 jan. 1946. Em março de 1946, a falha nos freios de um bonde causou uma colisão que levou um garoto à morte. Correio do Ceará, Fortaleza, 13 mar. de 1946.

Mas, com o final da Segunda Guerra, a retomada do movimento internacional nos portos brasileiros e o começo da recuperação da Europa, as esperanças do seu Batista de receber a encomenda de peças da Grã Bretanha aumentaram. Ele planejava recolocar nas ruas os bondes elétricos que estavam parados ainda no ano de 1946.

Tomadas as providências para receber o carregamento, seu Batista viajou ao Rio de Janeiro para discutir com as autoridades do governo soluções para a crise financeira da Light. Deixou a gerência e a negociação sobre o dissídio dos
trabalhadores da empresa sob os cuidados de seu imediato, o engenheiro chefe,
Mr. Brown.
Naquele tempo, a Light mobilizava grande número de trabalhadores da cidade. Basta lembrar que logo no começo de suas atividades, em 1913, tratou de empregar, só na operação dos carris urbanos, 64 motorneiros – que guiavam os bondes – 64 condutores – que cobravam as passagens – e 25 fiscais, ou seja,
153 trabalhadores. Com o passar do tempo, o contingente de empregados só fez
crescer, principalmente depois que a empresa substitui a Ceará Gás Company na distribuição de eletricidade para iluminação das ruas, em 1934.

Eram muitos funcionários, se comparados às pequenas empresas de transporte por ônibus que existiam nos anos 1940. Trabalhavam em condições precárias mas, irmanados no embate com os patrões ingleses, formavam um grupo mais ou menos homogêneo. No começo dos anos 1920, criaram a Associação União e Progresso dos Trabalhadores da Light que se transformou, em 1931, no Sindicato de Operários da Light. E no passo da sua organização, já haviam deflagrado grandes greves que chegaram a paralisar a cidade em 1917, 1919 e 1926. Em 1926, o movimento paredista obrigara o Presidente do EstadoJosé Moreira da Rocha, a mobilizar forças para impor medidas de “caráter conciliador e, por último, de pronta reação, [somente quando então] os ânimos se acalmaram voltando os grevistas ao labor honesto e profícuo de sua profissão”. Mensagem apresentada à Assembleia Legislativa pelo Desembargador José Moreira da Rocha, presidente do Estado. Fortaleza: Typographia Gadelha, 1926. 

Os operários de bondes, força e luz eram, portanto, protagonistas de uma longa
história de reivindicações de trabalho.
Enquanto seu Batista estava às voltas com a crise da Light, em 1946, o governo federal regulou o direito de greve. Então, o Sindicato dos Operários em Empresas de Carris Urbanos de Fortaleza encaminhou à Delegacia Regional do Trabalho um memorial descrevendo as muitas responsabilidades dos trabalhadores da Light. No documento, o sindicato enumerava os desafios do aumento do custo de vida, das baixas remunerações e propunha, enfim, um
aumento que variava entre 50% e 80% sobre os salários. Naquele tempo de
escalada da carestia, os trabalhadores da Light ganhavam entre Cr$ 145,00 e Cr$
1.000,00. A fórmula de reajuste escalonado dos ordenados era uma alternativa à
conhecida inclinação da companhia em não diminuir sua margem de lucros. A
Delegacia do Trabalho despachou o pedido à gerencia da Light determinando um prazo de 48 horas para que patrões e empregados entrassem em acordo.

No dia 30 de março o prazo se esgotou, mas a Light não atendeu a reivindicação. Argumentava que não tinha dinheiro para arcar com o aumento. Mr. Brown, “em todo o caso – frisou – na resposta a ser enviada ao sindicato, ‘- Sugeriremos que seja utilizado, para cobrir esse aumento, o saldo resultante do aumento das tarifas de força e luz e cuja aplicação é da alçada do Governo’”.

Ou seja, naquele contrato em que as obrigações da companhia e do Governo não estavam muito claras, tanto os resultados dos aumentos de tarifa de bondes, luz e força quanto as responsabilidades de oferecer o serviço de qualidade à população se confundiam. Aliás, nos anos 1940, a constante das relações entre o Governo e Light era um jogo de compensações no qual os pedidos da empresa para autorização de aumentos no preço dos bondes correspondiam a compromissos de investimentos em novas linhas, cuidados com os tramways ou com a folha de pagamento do pessoal do tráfego. Mas, na maioria das vezes, os aumentos de tarifas não bastavam para cobrir os gastos da empresa. Então, os investimentos no serviço de transporte da cidade ficavam para depois.

Daí decorria o costumeiro desrespeito aos acordos firmados com as autoridades. Pouca gente acreditava nas promessas para minimizar o “castigo dos passageiros de bondes”. O sonho do seu Batista de aumentar a frota tornou-se bravata de 1º de abril em 1946, junto com as ironias urbanas sobre o funcionamento da iluminação e dos telefones, do tabelamento do preço do peixe, da chegada de navios.


Mentiras do Dia:
A Light adquiriu quarenta bondes novos, com assento de veludo e vai manter corrente contínua.

A sensação de que pouco se poderia esperar tornou-se mais concreta quando o vapor Benedict chegou a Fortaleza, em 3 de maio de 1946, com peças capazes de restaurar somente 10 dos bondes elétricos, que, segundo Mr. Brown, depois dos reparos, poderiam ser reintegrados às linhas da cidade em 10 semanas. 
A frustração daqueles que esperavam que os 53 bondes operassem só foi minorada pelas manchetes de jornais que sugeriam benfazejas expectativas do modelo alternativo de transporte coletivo na cidade:

ÔNIBUS ENCOMENDADOS
Segundo o nosso informante que é pessoa merecedora de fé, a Empresa Pedreira”, que explora as linhas de JacarecangaBrasil Oiticica, dentro de três meses, estará com mais 3 ônibus em circulação.
O sr. Jose Setúbal Pessoa, que mantém serviço de ônibus nas linhas de Praia de Iracema, Mucuripe e Seminário, inaugurou um novo veículo e tem encomenda de mais três.
 A “Empresa Salvador”, cujos carros trafegam para Monte Casteloantigo açude de João Lopes, lançou em circulação um carro novo e tem
encomendado mais dois.  

A “Empresa S. Gerardo” e “Severino” que exploram as linhas de Alagadiço, Benfica e Joaquim Távora , estão também com diversos veículos em construção.
Como observam os nossos leitores, nos três próximos meses, o nosso sistema de transportes inter-urbanos terá melhorado consideravelmente, marchando para uma solução definitiva e satisfatória a crise que ora nos aflige.

A comparação da ineficiência da gigante inglesa com as pequenas empresas de ônibus era inevitável. Como explicar que, cobrando passagens ao mesmo preço, os ônibus fossem tão mais confortáveis, seguros e rápidos? Numa leve alfinetada na omissão dos homens públicos, os passageiros acreditavam que “o cúmulo da boa vontade seria a gerência da Light fazer alguns consertos nos calhambeques com que serve à população”.


No dia 14 de maio de 1946, seu Batista voltou do Rio de Janeiro munido da panacéia que tiraria a Light do vermelho. Urgia mudar a matriz de energia elétrica da cidade, substituindo a queima de carvão e lenha por caldeiras capazes de processar óleo diesel na usina do Passeio Público. Era uma alternativa eficiente que deixaria Fortaleza livre dos lapsos de fornecimento e, de uma vez por todas, do fantasma da falta de energia elétrica. Ao mesmo tempo, o diesel colocaria a Light novamente em condições financeiras de operar.
Mas tal mudança, como de costume, exigiria o esforço coletivo, traduzido na elevação das tarifas de força e luz. Afinal, não se podiam esperar novos investimentos da Inglaterra, abalada como estava com os sacrifícios da Segunda Guerra, assim como todos os países do Velho Continente... O dinheiro teria de sair do Brasil. De acordo com o seu Batista, esses mesmos motivos tinham impedido as chegada das prometidas peças para os bondes estragados no vapor Benediet:

Não é verdade que seja velho todo o material recém chegado da Inglaterra. Recebemos Cr$ 600 mil cruzeiros de equipamentos, rodas, engrenagem, etc. Apenas os motores e controles indispensáveis não puderam vir saídos de fábrica. É que não houve meios de trazer os novos. E a não vir nada, preferimos trazer uns usados, em boas condições ainda. Que se compreenda: todas essas dificuldades de transporte em Fortaleza, de vinda de material novo, tudo isso é doença geral, doença do após-guerra. Que é que podemos fazer além do que
fazemos? Onde é que buscaremos bondes novos?


Enquanto isso, motorneiros e condutores esperavam o fim do impasse dos
salários. E, em poucos dias, as alegações de que a Light estava sem dinheiro
caíram por água abaixo. A Justiça do Trabalho determinou o pagamento do
aumento salarial, descartando a desculpa de que a empresa só dava prejuízos. Os juízes consideraram que há tempos a companhia não cumpria seus acordos com o poder público. Na última negociação, por exemplo, comprometera-se, em troca do aumento nas passagens, a retirada dos “bondes da Praça do Ferreira, fazendo-se, em substituição, instalação de trilhos nas ruas Barão do Rio Branco e Liberato Barroso. Além disso havia a junção das linhas Via Férrea com Soares Moreno, o prolongamento da linha Jose Bonifácio e outros serviços [...] A elevação das tarifas e das passagens de bondes entrou imediatamente em vigor, mas os melhoramentos e ampliações que a Light se obrigara ainda [continuavam] a ser esperados pela população de Fortaleza".

Uma devassa nas contas da Light revelou que "a soma dos saldos verificados entre as despesas e a receita da mesma [companhia] depois de 1932,
[ascendia] a elevada quantia de CR$ 26.008.820,35. Ainda mesmo deduzido o
valor dos descontos de previsão reservados anualmente pela empresa, apurou-se
um lucro liquido de mais de dez milhões de cruzeiros". É certo que tal conta,
encomendada pela Justiça do Trabalho, divergia completamente das planilhas
preparadas pelos guarda-livros da Light, que apontavam um déficit muito maior. De qualquer forma, com os novos cálculos em mãos, os trabalhadores pediram a prisão preventiva do gerente da Light, caso não cedesse os novos salários.

Seu Batista estava certo de que a Light não estava em condições de pagar novos salários. Argumentou que só a majoração nos preços de luz e transporte
traria recursos para honrar o aumento, mas sabia que tal solução demandava
muitos estudos do Governo do Ceara. Então, desistiu. Pediu ao interventor federal no Ceará, Ministro Pedro Firmeza, que providenciasse a intervenção federal na companhia.

Em 1° de junho de 1946, sob a orientação do Ministro do Trabalho, o Presidente Dutra decretou a intervenção, nomeando o Capitão Josias Ferreira Gomes novo administrador da Ceará Light.

Continua...


  • ¹  João Batista de Paula nasceu na cidade de Quixadá, estado do Ceará, em 26 de março de 1895.

Filho de José Ferreira de Paula Filho e Maria Carminda do Carmo Paula, ambos analfabetos e trabalhadores rurais.

No ano de 1919 casou-se com sua prima legítima, por parte de mãe, Sarah do Carmo Paula (09/07/1894).
Batista e Sarah do Carmo Paula, mais velha que Batista alguns meses, tiveram três filhos: Margarida Maria de Paula Ventura (26/09/1919), Luiz Gonzaga do Carmo Paula (19/02/1923) e João Batista de Paula Filho (28/07/1925).

Batista começou a trabalhar com 12 anos de idade quando deixou a casa de seus pais, em Quixadá, para ser caixeiro da mercearia de Pedro Gurgel do Amaral, em Senador Pompeu, uma pequena cidade com 30 mil habitantes, localizada às margens do Rio Codiá, no coração do Ceará.

Dois anos depois, em 28 de junho de 1909, mudou-se para Fortaleza. Empregou-se na Casa Correia. De lá saiu para a Casa R. Guedes que funcionava no antigo local do Cartório Pergentino Maia.

Com dezessete anos, no ano de 1912, foi admitido pela South América, no serviço de recebimento de material para a instalação da Usina do Passeio Público e as linhas de bondes, com o salário de 150 mil réis por mês.

Seis meses depois passou a ganhar 200 mil réis.

A South América durou pouco. Construiu alguns trechos da Estrada de Ferro de Baturité, mas em novembro de 1913, faliu e Batista foi demitido.

No ano de 1914, Batista conseguiu emprego de Almoxarife na Ceará Light (Ceará Tramways Lyght and Power Cº Ltd) que no ano de 1911 havia celebrado com a municipalidade um contrato por 75 anos para a implantação e exploração de bondes a tração elétrica, na cidade de Fortaleza.

O seu salário inicial como Almoxarife era de 250 mil réis.

Foi caixa durante seis anos. Depois chefe do tráfego, chefe do escritório, assistente do gerente e, finalmente, em 26 de setembro de 1934, gerente. Foi gerente durante vinte anos.





  • ² Depois de seu afastamento, Mr. Hull tornou-se Cônsul britânico em Fortaleza. Sua influência sobre os destinos da Light, entretanto, persistiu durante toda a gerência de Batista e até mesmo do interventor federal na empresa. A sede do consulado inglês funcionava nas dependências da Companhia, no Passeio Público, até a encampação pela
Prefeitura, em 1948, o que pôde indicar a estreita ligação dos acionistas estrangeiros com as tomadas de decisão para o funcionamento e para a distribuição dos lucros da empresa.




  • ³ OS BOCHECHEIROS


Data: 22/03/1939 - Fonte: O Estado, p. 03

Pegar uma bochecha nos desengonçados carros da Light, no seu percurso em volta da Praça do Ferreira, é vêso antigo da nossa molecagem. É tão grande é o número desses pequenos vagabundos que, por vezes, ambos os estribos dos carros se apresentam completos, impossibilitando de forma absoluta a que nos mesmos se suba ou deles se desça.

Não raro os nossos jornais têm clamado por medidas coercitivas, aliás, de facílima execução, sem que até agora se prestasse atenção ao caso.

Não há dúvida, porém, quanto à necessidade dos mesmos, pelo que as solicitamos.

Os goleiros e os vagabundos estão ali a desafiar a atenção da nossa polícia que, talvez, com um simples guarda e a Madalena fizesse cessar esse abuso. Uma ou duas colheitas lei as naquele local entre a garotada bochecheira e barulhenta, tiraria à mesma esse costume condenável sob todos os pontos de vista.


Grafia da época


Créditos: Patricia Menezes (Mestre em História Social pela Universidade Federal do Ceará). Dissertação: FORTALEZA DE ÔNIBUS: Quebra- quebra, lock out e liberação na construção do serviço de transporte coletivo de passageiros entre 1945 e 1960, Site do João Scortecci, Museudantu.org.br, Arquivo Nirez e Cepimar


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terça-feira, 22 de junho de 2010

O bonde (X) - Joaquim Távora Hoje Av. Visconde do Rio Branco - antiga Estrada de Messejana


Bondes perto do Hotel Excelsior, início dos anos 30

Era a segunda mais extensa linha de bonde a da Avenida do Joaquim Távora, também conhecida como estrada ou calçamento de Messejana, hoje Avenida Visconde do Rio Branco, perdendo apenas para a linha do Alagadiço.
Com rigor ainda se pode observar esse logradouro, apesar de ser quase em linha reta, tem várias denominações as ruas que se sequenciam. Tem início na Av. Alberto Nepomuceno seguindo pela Rua Conde D’Eu, prossegue pela Rua Sena Madureira, atingindo a Avenida Visconde do Rio Branco - (antiga Joaquim Távora, Calçamento ou Estrada de Messejana), numa direção quase reta cuja maior extensão continua pelo Alto da Balança (Ministério da Aeronáutica - Base Aérea de Fortaleza - Av. Aerolândia). Ah! E a Lagoa de Messejana, a admirar a linda estátua de Iracema que será construída a se banhar de cuia naquelas águas lacustres; e sentir de perto a beleza da mansão Castelo, da nossa tão querida D. Lúcia Dummar, a lembrar e recitar os poemas de seu pai, o escritor Demócrito Rocha.
Isso é apenas para avivar a memória dos habitantes desta linda Capital e termos uma ideia deste bairro que se interligava a outros.
Não era todo esse, o trajeto do Joaquim Távora, pois o ponto final da linha era em frente do casarão do Sr. Alberto Costa Sousa, respeitável cidadão de fino trato, muita religiosidade e um dos diretores do antigo Banco Frota Gentil S/A.
Entretanto, desde o Centro da Cidade, a Avenida Joaquim Távora tinha abrangência com os Bairros José Bonifácio, Fátima e adjacências, interligando-se com os bairros de São João de Tauape, Alto da Balança, Aerolândia. E por uma estrada estreita, margeando o rio Cocó com suas águas perenes onde predominava uma vegetação que transpirava o perfume de mata-pasto. de manjerioba, chanana, melão caetano, quebra-pedra, pega-pinto e outros arbustos e ervas que exalavam agradável perfume que envolvia a retentiva dando ao olfato o sabor a contemplar com a visão do lugar vivido na essência do seu puro cheiro - de terra orvalhada; chegava-se a Messejana.

Bonde próximo ao Cine Majestic

Mas deixemos de lado as dilacerantes saudades que, sem avisar nem pedir permissão, invadem ocupando todas as dependências da nossa mente e, de repente, sem agradecer se vão; deixando indelevelmente gravada a figura de um inesquecível panorama a confortar o coração combalido pelo tempo. Mas como as saudades não matam, apenas maltratam, matemo-las.
Ao toque repicado da sineta, o motorneiro dava partida no bonde, assim saía o bonde Joaquim Távora da Praça do Ferreira pela Rua Major Facundo, entrava a esquerda na Rua Pedro I, continuava até ultrapassar as ruas Floriano Peixoto, Assunção, General Bizerril - lado norte, à direita lado sul, rua Solon Pinheiro, contornando o Parque da Cidade da Criança; passava em frente ao Colégio São José do Prof. José Leopoldino da Silva, também professor do Liceu, bem como seu filho José Leopoldino da Silva Filho - Engenheiro Agrônomo e Professor. Depois de alcançar as ruas Pinto Madeira, Pero Coelho e ultrapassar a Av. Duque de Caxias - Heráclito Graça - iniciava a Av. Joaquim Távora - hoje Visconde do Rio Branco - antiga Estrada de Messejana, como era no século passado conhecida - até o número 2.800 - residência do Sr. Alberto Costa Sousa.
Nosso passageiro ilustre do bonde Joaquim Távora, hoje Av. Visconde do Rio Branco e, à sua época Estrada de Messejana, nasceu na aprazível vivenda da família Caracas, de no 736, depois de no 2.008, e é o nosso muito estimado primo, o engenheiro José Euclydes Caracas - filho do professor Francisco Dias da Rocha e D. Leopoldina Caracas. Avós maternos: capitão Pacífico da Costa Caracas, abastado agricultor na serra de Baturité, de grande descortino econômico, fundador da família Caracas, e Ana Felícia de Lima Caracas. Avós paternos: Joaquim Dias da Rocha, negociante português e abolicionista, pertenceu ao partido Libertador - da Sociedade Cearense Libertadora - e entidade Perseverança e Porvir, e D. Francisca de Paula Cavalcanti (solteira), após o casamento Francisca de Paula Dias da Rocha.
Nasceu no dia 22 de maio de 1900 em Fortaleza, na vivenda no 736, do Calçamento Messejana, depois Avenida Joaquim Távora no 2.008 - hoje Avenida Visconde do Rio Branco, vizinho ao Colégio das Dorothéias, local hoje desapropriado pela Prefeitura Municipal para alargamento da Rua Domingos Olímpio.
O ilustre Dr. José Euclydes Caracas, após concluir os preparatórios no Colégio São Vicente de Paula - em Petrópolis, formou-se em engenharia civil pela Escola Politécnica do Rio de Janeiro em 1925. Trabalhou na construção da Estrada de Ferro Centro-Oeste de Minas, em 1931; passou a integrar o quadro de engenheiros do Departamento de Portos, Rios e Canais, com elevado cargo de chefia; membro do Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura - CREA - CE; conselheiro na implantação do Plano Rodoviário do Estado do Ceará; membro da Delegacia do Trabalho Marítimo, credenciado pelo antigo I.A.P.C.. Desempenhou suas funções como engenheiro no acababamento das obras de construção do Edifício São Luís.
Casou com Ana Gouveia Mota, filha de José Porfírio da Mota, Fiscal de Consumo na região Norte do Ceará e de Francisca Barros de Gouveia - todos da cidade de Granja-CE. São seus filhos: Hélio Mota Caracas, engenheiro pela Universidade de Fortaleza, e Heliana Mota Caracas, tendo exercido funções na Companhia Docas do Ceará, ambos com muita projeção na sociedade local.

A foto é de 1936 e pela Rua Major Facundo vemos, por trás do bonde elétrico, a Casa Almeida, o edifício Majestic que tinha um bar, a Farmácia Pasteur, os escritórios de Luiz Severiano Ribeiro, o "Polytheama", o Menescal e na esquina, A Pernambucana. Em frente, o passeio, onde ficavam estacionados os ônibus, os carros de aluguel e onde havia os bancos de duas faces entre árvores e combustores de iluminação a gás.

Ary Bezerra Leite - em História da Energia no Ceará, no capítulo - Os bondes a burro, diz:

“O sonho dos bondes a serviço da população de Fortaleza parecia quase impossível. E, mais uma vez a concessão é transferida pela Lei no 1.631, de 5 de setembro de 1875, agora favorecendo o comendador Francisco Coelho da Fonseca e Alfredo Henrique Garcia. Finalmente, a 3 de fevereiro de 1877, esses concessionários fundam a Empresa Ferro-Carril do Ceará.
Da instalação da empresa para o aparecimento em operação dos bondes transcorreram três anos. Isto porque somente em 1879 são concretizadas as obras civis de construção da estação e sede da companhia, e, a partir de novembro, cumprida a etapa de assentamento dos trilhos, com bitola de 1,40m, que ainda eram de madeira revestida na parte superior por cantoneiras de ferro.
Na manhã do domingo 25 de abril de 1880, a Ferro-Carril do Ceará inaugura sua primeira linha, com 4.210 metros, da Estação na estrada de Messejana (Boulevard Visconde do Rio Branco) à chave na Rua São Bernardo (atual Pedro Pereira), e, a partir desta, interligando a Praça da Assembléia ao matadouro modelo (bairro do Prado).”

Agora, estimados leitores, estamos chegando ao término dos nossos passeios de bonde por esta Fortaleza de antigamente com tantas recordações que ainda permanecem vivas em nós. Com o próximo capítulo sobre os bondes teremos a linha do Prado, e concluiremos nossas reminiscências por esta cidade que nos viu nascer, crescer e, se me for dado a escolha, espero com a morte deitar meu corpo ao solo, a cabeça, ter como travesseiro a pura argila de minha terra natal, deixando-me transformar em pó “porque tu és pó e em pó te tornarás”, e merecer de Deus o perdão e a Mansão dos Justos.

Bonde na Praça do Ferreira - Anos 30

Zenilo Almada
Advogado



Continua AQUI



Crédito: Artigo publicado no Diário do Nordeste - Fortaleza.
Ceará - Domingo, 20 de julho de 2003 e fotos Fortal

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