Fortaleza Nobre | Resgatando a Fortaleza antiga : Gentilândia
Fortaleza, uma cidade em TrAnSfOrMaÇãO!!!


Blog sobre essa linda cidade, com suas praias maravilhosas, seu povo acolhedor e seus bairros históricos.

 



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domingo, 6 de dezembro de 2020

Solar da família Gentil - Atual Reitoria da UFC

 


José Gentil Alves de Carvalho nasceu em Sobral em 11 de setembro de 1867. Foi o maior empresário do Ceará. Em 1909, já residindo em Fortaleza, adquiriu a chácara de Henrique Alfredo Garcia, na Av. Visconde de Cauipe (atual Avenida da Universidade), no Benfica.

A casa que existia no local foi demolida em 1918. No terreno, José Gentil ergueu, no mesmo ano, um belíssimo palacete para ser a sua residência. O projeto foi do Dr. João Sabóia Barbosa. Em torno do palacete, José Gentil construiu vilas e ruas com residências de vários tamanhos e estilos, praças e áreas verdes.

Lugar que ficou conhecido como Gentilândia.

Família do Coronel José Gentil no palacete que hoje é a Reitoria da UFC. 
Foto de 1953.

Em 1956, a propriedade foi comprada pelo primeiro reitor da UFC, Prof. Antônio Martins Filho, da Imobiliária José Gentil S/A pertencente aos herdeiros de José Gentil.

Ampliação do Solar da família Gentil
(já adquirida pelo reitor) em 1964.

De acordo com o site oficial*, um ano após a compra, o Reitor Martins Filho resolveu demolir o casarão, construído em 1918, mandando projetar, pelo Departamento de Obras da UFC, a atual sede da Reitoria. Conforme sugestão do Reitor, o projeto elaborado pelo departamento de obras mantinha as mesmas linhas arquitetônicas da casa construída segundo o plano do Dr. João Sabóia Barbosa. O palacete projetado consta de duas alas laterais unidas por um corpo central conservando a torreta que já existia no projeto de João Sabóia.


Casa de José Gentil - Reitoria UFC - Nirez


O interior do palacete foi enriquecido pelo Reitor com duas escadarias de bronze e latão. Móveis de estilo foram adquiridos, assim como lustres de cristal, alguns comprados na Bahia, para ornamentação de vários salões.

Reitoria em 1965

No terreno onde se encontra a atual Reitoria da UFC, ergueiram-se duas casas, posteriormente demolidas para dar espaço às atuais proporções do parque em torno do edifício e possibilitar a construção da Concha Acústica.

*



quarta-feira, 29 de agosto de 2018

Bairro Benfica - Por Arlene Holanda (Parte II)


Cruzamento da Av. da Universidade com Av. Treze de Maio, anos 70.
Podemos ver a reitoria da UFC e a fonte das sereias.
A chegada da Universidade Federal do Ceará transformou radicalmente o Benfica, as formas de convivência da população com os espaços sociais. A aquisição do palacete Gentil e de imóveis e terrenos circunvizinhos, em meados do século XX, corresponde com a debandada da elite para outras plagas, dessa vez o Meireles e a Aldeota. Os imóveis adquiridos pela Universidade ficaram livres da demolição quase fatal, mas não escaparam das adulterações inevitáveis à adaptação aos novos usos. A presença do Campus impactou no preço dos imóveis e dos aluguéis, expulsou uma fatia significativa da população menos favorecida.


Antigo portão da Reitoria da UFC. Arquivo Jards Nobre
Até hoje os preços do Benfica batem com os da Aldeota, do Meireles e de áreas consideradas mais nobres. Casarões antigos, cujas ações de preservação têm sido negligenciadas pelo poder público, deram lugar a prédios de apartamentos – como é o caso da casa de Rodolfo Teófilo. Atualmente, pode-se afirmar que já não existem casarões cujo uso social seja residências. O tempo e suas urgências transformaram e transformam a paisagem diuturnamente, num ritmo frenético: uma nova fotocopiadora surge, um ponto de venda de celulares e acessórios, sorveteria, pizzaria, american-bar, self-service... Grades florescem da noite para o dia, nos fazendo ver tudo enquadrado, como na canção de Adriana Calcanhoto.

Sim, o Benfica ainda é o bairro universitário, embora nem mais quieto, nem mais bucólico, nem mais tranquilo, talvez nem mais tão alegre. Mangueiras testemunhas da glória dos Gentis teimam em resistir, sufocadas em meio ao asfalto. Cadeiras na calçada – comuns até o fim do século XX –, não vejo mais. 


Estádio Presidente Vargas por volta de 1960. Acervo Marcos Siebra
Em dias de jogo no PV, carnaval de rua, manifestação ou eventos na UFC, trailers disputam lugar nas calçadas. Lembro-me das duas últimas vezes que tomamos cerveja (tomamos é uma maneira de dizer, só Ricardo tomou) e comemos churrasquinho “de gato” no Benfica: uma vez na Waldery Uchôa, esquina com Adolfo Herbster. Era carnaval. Outra na Marechal Deodoro, na curva da antiga Cobal (Companhia Brasileira de Alimentos), ao final de um jogo do Fortaleza contra não sei qual time. Ricardo conversou com os barraqueiros – era seu costume. Perguntava de suas vidas, onde moravam... Quase sempre vinham de bairros bem distantes, vender ali porque a “praça” era boa. Pretendiam zerar o estoque de churrasquinhos, cachorros-quentes, latinhas e refrigerantes de 2 litros vendidos a retalho em copos descartáveis.


Avenida da Universidade - Benfica
E assim vão se costurando histórias, de todo mundo, do mundo todo, de que nem sabe das histórias dos casarões sobreviventes, dos Gentis, dos bondes... Histórias dos milhares que passam na rua, nos ônibus lotados, dos torcedores exaltados, dos que carregam grossos volumes de ensaios fotocopiados, teclam com sofreguidão, matam aula no Pitombeira, namoram nos bancos das praças, se drogam, se enlevam, transgridem, se manifestam, se comovem. Histórias dos que têm saudades, do vivido e do não vivido... E, por isso mesmo, fazem questão de inventar tudo de novo, pela magia das palavras-fada, capazes de eternizar cada instante e... transformá-lo em histórias!


Parte I




Benfica / Arlene Holanda.- Fortaleza: Secultfor, 2015. (Coleção Pajeú)

sexta-feira, 31 de julho de 2015

Bar do Chaguinha - O melhor Bar do Benfica



No dia 02 de fevereiro de 1956, Francisco Ferreira Neto e sua esposa Aradenes Duarte (chamada carinhosamente pelos fieis frequentadores de D. Ará), ambos piauiense, se estabeleciam em nossa capital e abriam um pequeno negócio, na rua João Gentil, 291, onde permaneceu até final de 1991. Se instalou depois no prédio onde funcionou a Mercearia e Armarinho do Sr. Jocana rua Padre Francisco Pinto, 144, esquina com João Gentil.

Há mais de cinco décadas, O Bar do Chaguinha, tradicional reduto boêmio do Benfica, ainda mantinha o cardápio praticamente igual ao da inauguração. As cervejas sempre geladas e as receitas de Aradenes Duarte, esposa do proprietário, que é quem ainda prepara todos os tira gostos da cozinha regional servidos no local. Os pratos são elogiados por todos, mas o destaque vai para o carneiro assado e cozido, além da carne de sol com macaxeira. Seu Chaguinha trouxe a proposta da comida simples e caseira para agradar os clientes.


Chaguinha hoje está com de 85 anos e D. Aradenes, 83. Dedicaram toda uma vida ao bar, foi através dele que conseguiram criar as três filhas do casal.

"Isso aqui pra gente não é um bar, é nossa segunda casa", explica Vanda Duarte, uma das três filhas de Chaguinha, que sempre ajudou os pais a 'tocar' o estabelecimento, desde quando o mesmo funcionava do outro lado da rua Francisco Pinto.

Arquivo da página Oficial do Bar


Fundado há 59 anos no bairro Benfica, o bar onde ninguém entra sem camisa e onde brigas são proibidas é considerado pelos frequentadores como o mais antigo de Fortaleza. O que o diferencia dos demais, conforme os clientes, é o 'clima' familiar.



O Bar do Chaguinha encerrou suas atividades no dia 25 de julho de 2015

"Qualquer coisa que escrevamos aqui não vai conter todos as palavras que descrevem os sentimentos experimentados nesse final de semana, portanto vamos começar por onde der...

O Bar que já foi alvo de várias matérias jornalísticas em jornais, revistas, trabalhos de faculdade ontem encerrou uma era...

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Encerrar é muito forte, digamos que a história que tinha que ser contada foi escrita da melhor maneira possível. Querer florear mais que a história propriamente dita seria uma imitação falha.
... No mais, despedimos-nos por aqui com um até breve e um muito obrigado ao Sr. Francisco Ferreira, Sra. Aradenes, Vanda e Família pelos serviços prestados. Foi um prazer!"

Esse texto-despedida não é Oficial do Bar, é de um anônimo apaixonado.




De acordo com Vanda, a decisão de fechar as portas do estabelecimento se deve à avançada idade dos pais, responsáveis até hoje por atender os clientes. 

"Papai e mamãe estão cansados pelo 'peso' da idade. Sei que isto aqui é a essência para ele estar vivo, é um lugar onde ele conversa com os amigos, mas pesa pra ele."

"Já dei o que tinha de dar. Mas olha que comemoração bonita. Não é todo mundo que consegue isso no fim de um bar. Vou sentir mais falta é dessa clientela. Vou sentir muito", desabafa Chaguinha. Em clima de despedida, mas sem se deixar abalar, ele segue seu trabalho.


Conhecido como Seu Lunga do Benfica, seu Chaguinha administrou tudo com a ajuda da esposa, Aradenes. Foi com muito suor que conseguiu sustento a partir do bar, além de fazer grandes amigos.

“Foram 60 anos de luta. Eu tenho 85 anos, já estou cansando. Minha mulher, que me ajudava, também, está cansada. Meus filhos já estão criados. Então ninguém vai mais continuar. Quero distância desse negócio de comércio”, desabafa.


Clique e veja o discurso de despedida do Seu Chaguinha

Os planos são alugar o prédio para algum interessado, na base de um contrato, onde uma das cláusulas será a de não utilizar seu nome. 
“Não poderá utilizar meu nome. Se quiser, que coloque no dele. Vamos alugar nas condições que a gente exigir”, explica.

Lotado, como de praxe, o prédio amarelo de esquina não comportou todo o público presente para celebrar a despedida. Vanda antecipa que há a possibilidade de uma reabertura pontual para comemoração de 60 anos do tradicional e saudoso reduto do samba.




Para matar a saudade:



Créditos: Página Oficial do Bar, Lígia Costa (Jornal O Povo), 
Hayanne Narlla (Jornal Tribuna do Ceará) e pesquisas diversas.

segunda-feira, 22 de outubro de 2012

Avenida Carapinima - Um símbolo do Benfica II



"...Outro motivo de atração da rua era a proximidade do Chateau da Santa, palavra vinda da influência francesa, bem nítida naquela época, como eram chamados os cabarés de luxo. No Chateau da Santa,  moravam e trabalhavam lindíssimas mulheres, vindas de São Paulo, Rio de Janeiro, Maranhão e de outros Estados, dava uma fugida no final da noite para ver o vai e vem dos carros importados no local. Eu era então um rapazote, tinha mais ou menos uns dez anos, estou falando dos meados dos anos 50. Estou falando de tempos em que as galinhas passavam até de um quintal para o outro... tempos singelos onde os moradores se integravam. Estava também a Carapinima próxima ao REU, Residência dos Estudantes Universitários, onde tanques enormes eram destinados à criação de peixes. Numa época em que ninguém falava da preservação do meio ambiente, os peixes eram intocáveis, as árvores eram protegidas e nas escolas todas  as crianças plantavam uma no Dia da Árvore.
Mas, para ser sincero, do ponto de vista da preservação dos pássaros, muitos passarinhos eram capturados, como rolinhas, galos de campina e até pássaros grandes, todos vendidos na feira do bairro da Gentilândia. Havia ainda o que chamo ágora, uma esquina da Rua Carapinima, a ágora Carapiniana fazendo esquina com a Rua Francisco Pinto. Ali tudo se discutia, todos os assuntos, e se planejavam alguns namoros. Este ponto tinha um efeito de reunir os jovens da rua. Era um território neutro para os debates das lideranças radicais ou não. Era também um ponto onde se discutia a vida privada, onde se procurava descobrir segredos da vida alheia, enfim, um ponto estratégico de interação entre jovens e adultos que vinham de outras ruas como a Dom Jerônimo, Joaquim Feijó, Valderi Uchoa, João Gentil e Francisco Pintoformando um elo entre os rapazes dos bairros próximos. Esses encontros, marcados por tantas histórias, funcionava em frente a Bodega do Seu Chiquinho. Era um ponto bem sortido sobre uma alta calçada, implicando na subida  de alguns degraus que serviam de assento, principalmente para aqueles que haviam  bebido alguma coisa e estavam tontos ou ligeiramente ébrios. Gente de todos os níveis ali se reunia. 


José Brasil, um dos fundadores do Clube Nacional, agremiação dos Correios e Telégrafos, estava sempre por ali fungando e tomando rapé. E foi um dos descobridores de  craques do nosso futebol, como Pacoti, um grande artilheiro do Vasco da Gama...
Só havia dispersão dos encontros em dias de muita chuva... Os assuntos principais, além da política, futebol e mexericos, eram música e cinema, os temas preferidos. 
As chanchadas da Atlântida eram imitadas e alguns pretendiam copiar Oscarito e Grande Otelo.
Quanto aos filmes de Hollywood, os épicos religiosos de Cecil B. de Mille com os “Dez
Mandamentos” e “Cleópatra”. Outro diretor consagrado era o mestre do suspense, Alfred
Hitchcock: “O Sexto Sentido” e “Os Pássaros”. Também havia os  interessados em música clássica e gostavam de se destacar pela sua cultura. Adotavam um linguajar excêntrico e enchiam-se de vaidades para falar de Mozart, Strauss, Beethoven, List e Tchaikovski. Alguns cantavam imitando Mario Lanza. Ali aprendi que Lanza foi o maior tenor popular depois do italiano Caruso, consagrado como o maior cantor de ópera de todos os tempos. 


Havia ainda gente fascinada por carros. Discutia-se a qualidade de marcas, mecânica e o efeito da maresia sobre os veículos. Em Fortaleza já existia  a FORMASA, revendedora da linha FORD. A sensação do final da década de 60 foi o Ford Gálaxie 500, belo e imponente. 

Lançamento do Ford Gálaxie 500 - Acervo Guilherme da Costa Gomes

Este exemplar, o primeiro modelo de Gálaxie a chegar a Fortaleza, foi recuperado pela família do empresário Gerardo Matos, proprietário da dita revendedora, e é uma relíquia para exposições. O Gálaxie começou a ser fabricado no Brasil na década de 60, tinha bancos inteiros, ar condicionado e direção hidráulica. 

Naquela esquina cada um se sentia importante, um tipo de dono do mundo... Às vezes os transeuntes, mesmo os mais respeitáveis, não escapavam as sátiras.
Contudo, os frequentadores da esquina tinham o mérito de exaltar as pessoas do bairro. Era o caso do Sr. Moisés Laerte Pinto que eu já mencionei, e que por conta de sua atividade
religiosa kardesista, excluía a ideia de ambição comercial e o Professor Antonio Viana Filho, professor, poeta e poliglota e um dos homens mais cultos que eu já conheci. Este homem não recebeu o reconhecimento do mundo intelectual  e da mídia, pois mereceria assento na Academia Cearense de Letras
Outro assunto  também cogitado era falar de Artes. Havia unanimidade com relação a obra do cearense Antonio Bandeira, celebridade da pintura internacional que quando vinha de Paris visitava sempre a sua irmã Julia, que morava em frente a minha casa. Dizia-se que ele era o único pintor brasileiro a viver do produto de seu trabalho. Além de se comentar da sua finura e paciência no trato. Em 1960 o seu sobrinho Dandão, nosso amigo Francisco Ivan, mais tarde, uma vítima do latrocínio em nossa Capital, hospedou-se com um amigo na casa do tio na Rua República do Peru, em CopacabanaDepois de muitos goles, chegaram ao apartamento do pintor onde encontraram muitas telas armadas destinadas à inauguração de um órgão do governo em Brasília. Bisnagas à mão, desfiguraram toda a obra do pintor. Mesmo assim, Bandeira manteve alojado o sobrinho em atenção à irmã, mas dispensou seu amigo. Podemos desse episódio concluir sobre o caráter generoso do grande Bandeira. Infelizmente ainda não mereceu do povo brasileiro o reconhecimento pelo seu inegável talento artístico, e sequer seu nome foi indicado na relação de Cearense do Século XX pelos nossos próprios conterrâneos...


“Ao longe despontava um minúsculo ponto de luz, que se ampliava lentamente. Antes de atingir a parte curvilínea da via férrea, o possante farol alumiava a rua. Deslizando imponente e mítica, sobre duas paralelas de aço, a Maria Fumaça dividia os bairros do Benfica e Porangabuçu. O barulho cadenciado e sinfônico opunha-se ao silêncio. Um terremoto prazeroso. O apito ecoava. A cortina fumígena deixava o gostoso cheiro da lenha queimada. Foram-se seus tempos gloriosos. Ficaram as saudades. A velha “Maria” não mais viaja pachorrenta pelos trilhos, mas viaja pelos caminhos da alma sobre os
dormentes do coração, das lembranças, talvez mais reais que a própria realidade.”


Quando olho a Avenida de  hoje em que a pacata Rua Carapinima se transformou, vejo o desaparecimento da maioria das casas de então, tudo imposto em nome da modernidade nas obras do inacabado metrô de Fortaleza. Não tive a intenção de produzir um documentário, contudo, reconheço que ele deveria existir com a finalidade de preservação da história urbana da cidade. Gosto de escrever explorando idéias e sentimentos. Nas minhas lembranças tudo é tão claro como se fossem visões, mas sou consciente que só posso chegar até o redescobrimento de valores e belezas da vida, aparentemente perdidos no tempo. Espero que alguém possa escrever sobre a Rua Carapinima, até mesmo um romance nos moldes de Os Meninos da Rua Paulo” do  escritor húngaro Francisco Molnár. Este livro que eu li rapazinho, tomado por empréstimo da Biblioteca Circulante do Colégio Sete de Setembro na Avenida do Imperador, onde também estudei,  é a saga da meninada dos arrabaldes de Budapeste, em 1889, portanto, no final do século XIX. Esses meninos lutaram firmemente por um terreno, mas nas palavras do autor “ganharam a guerra, mas perderam a terra, porque ali devia subir um arranha-céu”. Gosto do registro do cotidiano, parte integrante da história humana. Gosto de preservar as tradições e os valores do passado, independente de que os fatos tenham contornos diversos e um maior  ou menor grau de importância. Retratar o cotidiano é dizer como se comportam os habitantes das cidades. É tratar das múltiplas formas de comunicação humana, dos rumos e linguagens, neste caso, do meu tempo. Identificar a rua é também revê-la, revisitá-la... A identificação da área é somente uma parte da dinâmica de retorno à realidade. Esta dinâmica reforça,  na forma e no conteúdo, a fusão entre o tempo passado e o tempo presente. Ver uma parte da  rua com a morte decretada pelo ritmo da expansão urbana, é verificar a força dos interesses por um sistema de transporte moderno, contudo, não desapareceu o universo em transformação, aparentemente soterrados, pois persevera nos seus habitantes a importância do humanismo bebido nos nossos lares e escolas e presente na formação de cada um de nós. Não desapareceu o denominador comum, o reviver em torno da Igreja dos Remédios e da Universidade que tanto modificaria o bairro do Benfica.


Igreja e Universidade nortearam as aspirações dos bons pais em relação ao futuro dos seus
filhos. Neste momento, a rua parece um monte de areia e pó, mas examinada pelos olhos
nostálgicos da memória dos que ali moraram ficam evidentes os fundamentos que a tornaram um traço de união de muitas famílias, ligadas tanto geográfica como afetivamente. Cheguei à conclusão que não interessam os rumos truncados, desfeitos e desviados da vida dos moradores da Carapinima. Nenhum desses fatos pode anular a importância do acontecido no próprio ato de fazer e refazer continuamente a ação humana, complementando o curso de uma História maior. 
Extinguiram-se as serenatas e  as canções de amor passaram a ser objeto de contratos. Onde foi parar o romantismo? Também se cantava na igreja em homenagem aos noivos e em louvação ao Senhor... Essas atividades não passam, hoje, de mais um meio de vida, de sobrevivência.

O silêncio do  passado...

As pilhérias dirigidas a alguns personagens que por ali passavam não tinham a intenção de ofender. Alguns apelidos dados eram até bem pertinentes e, às vezes, incorporados pelo próprio personagem faziam com que tudo parecesse uma piada. O Ivan, impecável nas suas
vestimentas, recebeu o apelido de Ivan Cabeção e nunca se aborreceu com isso. De fato tinha a cabeça grande...  Claro que em alguns casos as pessoas não aceitavam o apelido. Era o caso do Sr. José Rocha, chamado de Jacaré. Ao vê-lo a turma gritava: “joga o 15 na víspora ou no bingo porque hoje vai dar Jacaré”, e o tempo fechava... De qualquer forma, aquele espaço físico testemunhou relações sociais hoje dispersas, mas mantidas então mesmo com a
influência de padrões culturais diferentes. A esquina era  o próprio show, substituindo o
computador e a influência da TV. Aliás, falando-se em show, alguns tinham uma bela voz e
cantavam no melhor estilo romântico de Pat Boone, canções como April Love, BernardineJambalaya. Interpretava ainda canções de Elvis Presley (It’s Now or Never, Love me Tender), Nat King Cole (Unforgettable, Monalisa), Neil Sedaka (Oh Carol, Bad Girl) e dos Beatles (Twist and Shout, Help). Naquela esquina eram marcados muitos encontros entre os amigos para juntos irem às diversas festas de casamentos, aniversários e batizados. Claro que só iam os convidados. Marcadas pela animação essas festas aconteciam no contexto familiar, em alguns casos com festa dançante na sala da frente, e uma boa música na radiola. Mais fáceis de frequentar, eram as festas de bairros, como as quermesses e as festas juninas. No caso das quermesses, figura obrigatória era o irradiador, o que hoje chamamos locutor. O interessante aí eram os recados que ele dava antes de colocar as mensagens sonoras oferecidas por moças e rapazes. Dependendo da situação amorosa  escolhia-se a música para esse tipo de comunicação. Nelson Gonçalves era quase sempre o cantor escolhido e as músicas preferidas eram: Boneca de Trapo, Fica Comigo Esta Noite e A Volta do Boêmio. Também Altemar Dutra fazia muito sucesso com Que Queres Tu de Mim, Contigo Aprendi e Brigas. Quando a moça ou o rapaz não queria se identificar, usavam-se as iniciais O.X., ou seja, Ontoim Xofer ou então se usava chamar a atenção de alguém das iniciais 13-12-4 – correspondente à quantidade de letras do nome da pessoa para quem a música  era destinada. O alto-falante gritava e aumentava a pretensão de conquistas e, ao mesmo tempo, proporcionava o retorno de amores perdidos e o reatamento dos amores interrompidos.


Em geral eram instalados tanto nos postes como nos galhos de árvores e eram usados não só nas quermesses, mas nos comícios eleitorais. Tentou-se mesmo colocar altofalante nas festas do Sábado de Aleluia quando do animado julgamento do Judas. Dois estudantes de Direito, Expedito e Afonso Nunes de Sena, este mais tarde juiz, exercitavam-se na oratória. Ao julgamento do Judas, seguiam-se festas no bairro, principalmente na casa de
Dona Julia Bandeira e em todas as casas da redondeza havia várias iguarias, como também acontecia nas festas que homenageavam Santo Antonio, São João e São Pedro. Aliás, a Semana Santa era celebrada com rigor. Na Semana Santa as imagens eram cobertas, tal como hoje com tecido roxo. A Páscoa era sacrossanta. Os pais, em sua maioria mandavam os filhos confessar-se na igreja e o jejum e abstinência não podiam ser violados. As rádios tocavam músicas sacras e a visitação ao Horto da Igreja dos Remédios, reproduzia as cenas da Paixão de Cristo. Fazia-se a Via Sacra recordando-se a Paixão de Cristo. Nesta época de pesar não se jogavam peladas na rua e nem havia reuniões na “ágora”. Farra mesmo era o dia de Sábado de Aleluia, quando se queimava o Judas não sem antes se fazer à leitura do seu testamento. A festa do Afonso se realizava num terreno baldio ao lado de sua casa e na leitura do testamento já se sabia que alguns iriam ser atingidos  pela rima popular e iriam figurar no rol dos herdeiros. Mesmo com a vigilância dos pais, sempre se podia provar às escondidas um pouco de vinho ou então um pouco de sangria, que era o vinho com água e açúcar.


Já havia advertências sobre o perigo do uso dos balões, contudo eles não eram rigorosamente proibidos até porque não eram tão modernos como os de hoje. Por força dos ventos, os balões vinham da Gentilândia e passavam pelos céus da Carapinima. Com o céu estrelado era um espetáculo maravilhoso, ainda porque cortar papel  de seda colorido e pedaços de bambu para armar os balões era um acontecimento na vida da meninada, tal qual fazer as bandeirolas para enfeitar os terreiros onde se dançava a quadrilha. Por conta dos ensaios anteriores das quadrilhas, muitas vezes os flertes já se faziam namoros. Em volta da fogueira a festa era armada. Eram montadas com pedaços de madeiras nas coxias da calçada, e nelas eram assados milhos e batatas doces. Também se levava muito a sério a escolha de padrinhos e madrinhas de fogueira e pelo tempo afora os afilhados tomavam a benção aos
padrinhos. De fato era uma beleza ver a rua toda iluminada com fogueiras e com as roupas
típicas e alegres com estampas coloridas. Nessas festas evitava-se o uso de bebidas alcoólicas.
Serviam-se sucos, refrigerantes e aluá de abacaxi, resultado da imersão das cascas num pote
de barro com água pura por cerca de três dias. Depois de coado podia ser adoçado com açúcar
ou rapadura. Em torno da fogueira, cadeiras na calçada, a conversa fluía sem fim... Comia-se
canjica de milho verde, totalmente diferente da servida no Sul do Brasil, o pé-de-moleque tipo de bolo de massa de mandioca com ovos, manteiga, castanha e açúcar preto, ficando com uma cor escura. Daí o seu nome. Às vezes acontecia um pequeno acidente com os fogos de
artifícios mas eram usados foguetes, traques, estrelinhas e os rabos-de-saia, pois não tinham
direção certa e soltavam fagulhas. As músicas que animavam festas e conversas eram por toda a cidade de Fortaleza os baiões, xotes e xaxados inspirados em temas do sertão e quase  sempre cantados por Luiz Gonzaga, o Rei do Baião.

Com essa história da minha rua e do bairro onde ela se inseria como núcleo polarizador associado às peculiaridades da Fortaleza de então procuro contribuir para a reconstituição dos costumes, linguagens e fatos da época. Tempo em que o retrato da namorada guardado na carteira de notas tinha escrito o tradicional “não me esqueça”. Estou ciente de que muitas coisas não se pode restaurar, mas o meu propósito ao falar da Rua Carapinima é falar dos tempos de uma cidade mais segura e de um tempo compartido e dividido entre a casa e a rua. O interessante é que nessa rua, nesse bairro conviviam pessoas de vários níveis intelectuais. Ali viveram a escritora Marta Brasil, autora de livros didáticos, a Professora de Canto Dona Guilhermina, o Dr. Antonio Ferreira Antero, um dos engenheiros fiscais da obra do Cristo Redentor, no Rio de Janeiro, o famoso farmacêutico José Arthur de Carvalho e Dona Almerinda, fundadora do Colégio Santa Cecília, mais tarde entregue as Damas da Instrução Cristã. Isto sem falar do  meu pai Luiz Aragão, contador, professor e autodidata em botânica, além do famoso filósofo Antonio Viana, o famoso fotógrafo Fernando Leitão e o erudito ecologista Guimarães Duque, um dos maiores estudiosos das xerófilas em todo o mundo. Tinha também o Dr. Carlos Ribeiro, proprietário de grande parte dos terrenos do bairro, avô do atual senador e ex-governador do Ceará, Tasso Jereissati, e que era simples, caridoso e generoso. Era um dos tipos mais querido do bairro, chegando a distribuir frutas de seu sítio com os moradores da rua, havia também a Dona Estelaprofessora que educou muita gente no bairro, irmã de um jornalista, o Sr. Murilo que escrevia para o jornal “O Nordeste”. Não posso esquecer o também jornalista, deputado e presidente do Conselho de Finanças do Município, Antonio de Pádua Campos, que morava num bairro que se confundia com o Benfica, que era a Gentilândia. Bastava atravessar a Avenida Visconde do Cauípe que já estava na Gentilândia. O estudioso de piscicultura Rui Simões de Meneses e sua mulher Mariana, uma grande bióloga. O poeta e professor Antonio Damásio da Cunha e o professor Moreira Campos, da Academia Cearense de Letras e Conferencista na Universidade de Colônia, na Alemanha, sua obra daria um livro. O professor de desenho e trabalhos manuais Jaime Alberto da Silva, pai da folclorista Elzenir Colares. É uma lista inumerável falar de tantas pessoas que tiveram sucesso profissional e moraram naquela rua e naquele bairro.


Paulo Maria de Aragão
(Advogado e professor universitário)

Continua...

Parte I
Crédito: Carapinima: A história de uma rua -Regina Stela Ferreira Moreira 
(Formada em jornalismo pela Faculdade Celso Lisboa (Rio de Janeiro)


segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Avenida Treze de Maio - Antiga Avenida Flor do Prado


A avenida surgiu na década de 50, por ordem do prefeito, Acrísio Moreira da Rocha.


Nos anos de 1910, em um arrabalde de Fortaleza, São João do Tauape, no encontro das atuais avenidas Visconde do Rio Branco e Pontes Vieira, havia diariamente, dezenas de comboieiros vindos do interior que ali paravam, diariamente, para descanso e reorganização dos seus trabalhos: troca, venda e compra de todo tipo de mercadoria trazida do interior. A este ponto de encontro os nativos deram-lhe o nome de Tauape, significando tauá-barro, pé-caminho; caminho de barro. Por invocação a São João, foi erguida uma capela no local, daí surgindo o nome de São João do Tauape, (1948) segundo o historiador Márlio Falcão.
Os mercadores já se encontravam próximo do seu objetivo, o centro de Fortaleza, mas não era justo seguir toda vida cidade adentro com bois, cargas em cavalos e jumentos pela avenida Visconde do Rio Branco, afinal, gerava tumulto e perigo entre os moradores das casas, atrapalhava os carros e o bonde da Visconde do Rio Branco, que percorria toda avenida até a "terceira" parada, isto é, o final da linha, próximo da esquina onde funcionou o Cine Atapu, da Cinemar, inaugurado em 11.03.1950, conforme relata o historiador Miguel Ângelo de Azevedo - Nirez.

A cidade de Fortaleza crescia e necessitava de cuidados essenciais, não podia permitir mais o ingresso de animais a sujar a avenida e centro da cidade. Nasceu então a idéia do traço de união. Abrir novas ruas e avenidas, antes da cidade, para facilitar a vida de todos. Foi justamente aí que planejaram unir o São João do Tauape com o Benfica, por uma estrada calçamentada e iluminada, já que existia um precário caminho. Seria uma importante avenida que desse acesso aos mercados, outros bairros e dezenas de ruas facilitando as intercomunicações entre bairros. O meio mais fácil seria seguir pela mata rumo ao oeste (futura Av. 13 de Maio) descendo nas férteis terras de pousada e boa caça e pesca, onde havia o encontro de riachos e açude na Fazenda Canadá, do doutor Pergentino Ferreira. Todos os meios de transportes seriam beneficiados. Seguiriam com as suas mercadorias por toda avenida, sem impedimentos, até o bairro Benfica ou Prado, passando por diversas ruas atingindo os objetivos, relata Geraldo Nobre, do Instituto Histórico do Ceará.


O então prefeito de Fortaleza, Acrísio Moreira da Rocha, providenciou, juntamente com sua comitiva, um encontro de amigos com o dono das terras. Teria sido discutida na Fazenda Canadá a criação (hoje no local da sede desta antiga fazenda Canadá, encontra-se construído o Conjunto Residencial Segredo de Fátima) de "uma grande rua que beneficiasse a todos da região, facilitando o acesso para vários bairros". A resposta do dono das terras ao prefeito foi de que ele teria ao seu dispor, não só uma rua, mas terras para uma avenida inteira, se assim o desejasse, reafirma Silvio Theorga, neto do doutor Pergentino Ferreira, então com 13 anos de Idade, quando assistiu toda reunião naquela tarde na sede do Fazenda Canadá.
A grande obra da prefeitura ligaria o bairro São João do Tauape ao antigo Prado, hoje Gentilândia ou Benfica. Naquele tempo o mato alto descia dos dois lados da estrada até o riacho. Quem desejasse vir desse ponto da estrada, isto é, do São João do Tauape para o Prado, teria de seguir uma nesga de terra até a altura de um grande riacho (Aguanambi – no inverno, um grande alagado) atravessá-lo de canoa ou vir pela velha ponte e seguir pela estrada de terra vários quilômetros até próximo ao Prado (altura do CEFET) antigo local de corridas de cavalo.
O prefeito Acrísio Moreira da Rocha, logo determinou que fossem iniciados os trabalhos de limpeza da área, cortada a mata, feitos os canais de seguimento do riacho e calçamentada a estrada onde seria a grande avenida. Nos primeiros momentos todos a chamavam de Flor do Prado, relata o memorialista Marciano Lopes, dizendo da constante ornamentação, beleza natural e ligação com o Prado.

Paralelo a tudo, em 09 de dezembro de 1952 chega a Fortaleza, vindo da Europa, a imagem peregrina de Nossa Senhora de Fátima em visita a algumas Igrejas. O povo, muito devoto, ficou impressionado e o bispo auxiliar de Fortaleza, Dom Eliseu Simões Mendes lançou a ideia da criação de um templo. O doutor Pergentino Ferreira logo se prontificou a doar uma quadra na futura avenida. O que foi feito em 19 de outubro de 1952. O esforço incomum e a enorme motivação fizeram com que Paulo Cabral de Araújo, o novo prefeito de Fortaleza depois de 1952, juntamente com padres e políticos, apoiassem o projeto e fizesse brotar a ideia de um belo santuário para homenagear a santa. Foi formada uma comissão e passaram a visitar vários empresários, e, o engenheiro Luciano Pamplona logo se pôs a elaborar o projeto da Igreja. Veio a pedra fundamental em 28 de dezembro de 1952. Em pouco tempo a Igreja foi edificada, e no ano seguinte, com a nova vinda da imagem santa de Portugal, com a Igreja ainda por terminar, recebeu a imagem peregrina que aqui permaneceu de 14 a 16 de dezembro de 1953, onde foram realizadas várias missas, mas a inauguração somente foi possível em 13 de outubro de 1956.

A inauguração da Igreja de Fátima foi ao ar livre, com a presença de dez mil pessoas. Nesta ocasião muitos convidados estiveram presentes e logo que chegaram subiram ao palanque que foi armado para as autoridades. Centenas de pessoas impediram que o Dr. Pergentino Ferreira e sua senhora, D. Argentina, subissem ao palanque para receber as homenagens. Foi terrível, o tumulto também foi grande e quem tomava conta do palanque não deixou mais ninguém entrar depois da superlotação. Segundo palavras do Stélio, neto do Pergentino.
No dia 12 de outubro de 1955 foi indicado o 1° vigário da paróquia, o padre Gerardo de Andrade Ponte, onde permaneceu por 19 anos. O seu atual vigário é o padre Manoel Lemos Amorim.
A grande surpresa foi quando a Igreja de Fátima foi vítima de tentativa de assalto pela primeira vez. Quanta admiração de todos os moradores ao ouvirem o sino tocar apressado altas horas da noite pelo primeiro e principal ajudante do padre Gerardo Pontes. O Antônio de Souza, providenciou logo fazer alarde quando notou a presença de estranhos. Esta ação de tocar o sino da Igreja várias vezes altas horas, convenhamos, ainda hoje significa acontecimento grave. Logo, dezenas de moradores surgiram silenciosos e espantados no meio da noite e todos com as suas armas em punho, a tomar conhecimento do ocorrido. Ele dormia no andar superior e ao pressintir que alguém entrara na igreja e estava na sacristia, acordou. Não foi à toa quando apanhou a pedra que estava na soleira da porta e a soltou escada abaixo quando pressentiu que o meliante estava subindo. Dizem que o pessoal que trabalhava na obra de construção do canal, para colocação das lages de cimento armado, pois trabalhavam até altas horas da noite, viram quando alguns homens transportavam uma pessoa nos braços e passaram por eles rumo ao Cocorote, localidade das imediações da Base Aérea de Fortaleza. Não se soube mais nenhuma informação.

O terreno da Igreja englobava o quarteirão inteiro, por isso pensou-se em ampliações e, foi-se construindo a casa paroquial, salão, Instituto Educacional, quadra de esportes, muros de proteção etc. Hoje nas dependências desta quadra funciona o orgulho da avenida 13 de Maio, o Colégio Santo Tomás de Aquino, que completou 49 anos de fundação. Este colégio sempre contribuiu com a comunidade de Fátima e já formou, em nível de terceiro grau, muitas autoridades do Estado do Ceará. O seu atual diretor, Vicente Amorim declara: "Em toda nossa existência, nunca deixamos cair o nível de ensino e sempre mantivemos o respeito aos preceitos católicos".
O bairro tomava corpo dia a dia e a Av. 13 de Maio virou atração turística até para quem visitava a cidade, pois todos queriam conhecer a Igreja e passar por esta grande avenida calçamentada e iluminada. Assim, nos seus primeiros momentos, sem deixar de ser bucólica e, mesmo em transformação, os moradores ainda assistiam, naquelas manhãs sertanejas, silenciosas e convidativas a passagem de poucos carros e passeios de pessoas nas matas, riachos, lagoas e trilhas de todos os lados, pois não havia centros comerciais ou movimento de carros, somente duas ou três mercearias. Logo a empresa de ônibus Severino Ribeiro passou a servir o bairro e, alguns ônibus circulavam pela Av. 13 de Maio de hora em hora até o centro da cidade. Um ônibus vinha pelo bairro José Bonifácio até atingir a Av. 13 de Maio e outro pela Visconde do Rio Branco até alcançar a Av. 13 de Maio.


Os ônibus, verdadeiros calhambeques, eram todos de madeira recobertos por flandres, demoravam muito a passar e em determinados pontos de espera, surgiam sempre cinco ou seis pessoas, pois poucos tinham o luxo de possuir carro e trabalhavam no centro da cidade, até os que com o tempo se tornaram grandes empresários e donos de lojas famosas do centro da cidade. Para quem estava no ponto de ônibus, era esquisito, permanecia em vigilância olhando de um lado para outro; quando o ônibus despontava ao longe, pois eram poucos os carros que trafegavam na 13 de Maio, sempre alguém estava a gritar para quem vinha se chegando ao ponto: "corre... lá vem um ônibus", e quem não vinha em desabalada carreira. Ninguém podia perdê-lo, senão teria de ficar mais de uma hora a espera de outro. No ônibus, sempre lotado, havia o cobrador circulando apertadamente no meio dos passageiros, em pé, do começo ao fim do ônibus, com várias moedas na mão a cobrar a passagem, entregar a ficha correspondente e passar o troco de cada um. Para descer do coletivo como também era chamado, esticava-se a mão, como ainda hoje, para um dos lados extremos do teto e puxava-se a sinaleira; em alguns, este objeto constituía-se de um chocalho de cabra na extremidade a produzir barulho suficiente; ao puxar o barbante fazia tremer o dito objeto ao lado do motorista que entendia precisar parar. Era sempre uma longa e barulhenta viajem, pois os ônibus de madeira percorriam todo o calçamento da 13 de maio. Para servir as ruas internas do bairro, a Empresa São José do Ribamar comprou do "poierão" um ônibus e implantou, nos anos de 1960, precária linha de micro ônibus com relativo sucesso. Poeirão era o nome de um morador de um vilarejo ligado ao Bairro de Fátima.

Foto Fortalbus
Em se tratando de comércio, a Av. 13 de Maio passou muitos anos quase com o mesmo formato. Muito depois da inauguração da Igreja, surgiu a primeira sorveteria na esquina da rua Napoleão Laureano, logo transformada em bar com umas poucas cadeiras na calçada. Era uma atração inédita permanente a sorveteria e bar 'A Normalista', frequentado por todos. Fora do centro da cidade, alguns se arriscaram a tomar cerveja, sorvete, ou comer no local um sanduíche de primeira linha chamado mixto quente. Duas mercearias maiores serviram muito tempo ao bairro, a Pontista e o Simeão. Logo depois, em 09 de março de 1959, surgiu a Panificadora Central, que serviu ao bairro muitos anos. Na 13 teve também a presença de um restaurante, na esquina da rua Padre Leopoldo Fernandes, o B'arbras.
Em se tratando de diversão, antes da missa, nos finais de semana, assistiam-se jogos amistosos entre Fortaleza e Ceará no areal em frente a Igreja de Fátima, hoje Praça Pio XII.
O único clube próximo a Av. 13 de Maio chamava-se Maguary Esporte Clube, muito frequentado pelos que moravam na 13 de maio. Pelos anos de 1965 surgiu o único clube do bairro chamado S.B.F.Sociedade Bairro de Fátima, ponto de encontro de todos os jovens que moravam na Av. 13 de Maio, bairro de Fátima e adjacências, capitaneado em primeira instância por Mauro Benevides, um dos moradores do bairro.



Hoje o comércio da Av. 13 de Maio atingiu a maturidade, possui vida própria e não deixa a desejar; identifica-se com o dos grandes centros e tem seu equilibrado movimento em cada quarteirão. O comércio funde-se ao do bairro de Fátima e possui o eterno estigma de ser calmo, pois não existe aglomerado de pessoas, prédios ou de veículos. Ao longo da avenida encontram-se vários bancos importantes, lojas de renome e sempre com estacionamentos disponíveis. Suas casas comerciais são amplas e diversificadas servindo desde vestuário, boutiques de alimentos, sorveterias, panificadoras, pousadas, loja de delicatessens, cursos, restaurantes, supermercados, shopping center, farmácias, lojas de automóveis, hospitais etc., e é servida por inúmeras linhas de ônibus, além de, no seu final, encontar-se com a estação do Metrofor, localizada na esquina da Av. 13 de Maio com a Av. Carapinima. Outras importantes instituições da Av. 13 de Maio são o 23° Batalhão de Caçadores do Exército, instalado em 23 de novembro de 1944. O CEFET, antiga Escola Industrial de Fortaleza, Universidade Federal do Ceará, no campus do Benfica e IBGE; no bairro de Fátima, Instituto de Educação (antiga Escola Normal Pedro II) e Conselho Estadual de Educação, UECEUniversidade Estadual do Ceará e vários colégios e centros de estudos, além de centros comerciais diversificados etc.



Quando falamos em moradia, na Av. 13 de Maio ou Bairro de Fátima, lembramos que muitos moradores optam atualmente por negociar sua residência para que sejam construídos modernos prédios residenciais, sendo visível a nova fase futurística que o bairro está vivendo com bastante sucesso, tendo em vista as dezenas de edificações novas no bairro com prédios de até mais de 20 andares, e com chances de vir a ser novamente o segmento mais procurado da cidade, tanto pelo lado mais acessível, promissor, quanto pelo lado mais cultural e próximo do centro tradicional da velha Fortaleza, dizem alguns corretores de imóveis.



Créditos: Livro Grãos de Areia - Tohama Editor e fotos do Arquivo Nirez

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