tinham páginas inteiras reservadas à divulgação e à crítica cinematográfica, além de notas
sobre a programação semanal ou diária das casas de cinema, dispostas aleatoriamente no
De acordo com José Mapurunga, a juventude que frequentava o cinema em Fortaleza,
em especial as sessões de arte, é caracterizada pelo figurino que vestiam, pelo que liam e pelo
que conversavam. O cinéfilo dos anos 60 vestia-se como “
proletariado”, reflexo de uma visão política que aproxima-se das camadas sociais mais populares, proporcionado pelos filmes e pelos livros que compunham o repertório de construção visual e intelectual do espectador da época.
A geração de sessenta em Fortaleza, embora também assistisse a filmes norte-americanos que impunha o gosto pelo rock 'n' roll e o uso da minissaia pelas mulheres, também
era influenciada pelo cinema europeu, que explicitava a revolução sexual, onde mulheres
também poderiam vestir-se da mesma maneira como apenas homens se vestiam antes,
adotando agora o uso da calças jeans e camisa. E assim o faziam. Como opção musical,
tinham a música popular brasileira como preferência, devido a popularização e disseminação desta nesse período e de sua ligação com a brasilidade, também buscada nas produções
cinematográficas brasileiras.
Entretanto, é importante atentar que o esteriótipo visual com que vestiu-se a geração de sessenta não era unânime. Podíamos encontrar a juventude vestida de jeans, camiseta
branca e sandália franciscana, figurino característico da época, mas não devemos nos fechar
nessa única concepção.
Abrigo Central
Isso também se aplica ao mito do livro embaixo do braço. Era comum à geração cinéfila de sessenta em Fortaleza, a cultura de usar sempre um livro embaixo do braço, representado aquilo que estava lendo. Poderia ser
Marx,
Tolstoi,
Freud,
Lênin; algo de caráter valorativo e que simbolizasse um status de intelectualidade.
Entretanto, o arquiteto Fausto Nilo, frequentador assíduo do cinema na cidade de Fortaleza,
afirma esse não ser um hábito praticado frequentemente por ele, mas afirma a existência deste fato e relata:
“Eu tinha um primo que era meu companheiro de formação. Eu morei na casa dele.
As curiosidades eram juntas. A gente via muito cinema. Aí, parava num sebo na Rua Guilherme Rocha e tinha um livro pra vender que era assim: ‘A interpretação dos
sonhos, Freud’. Aí eu olhava pra ele e dizia: ‘Cara, é aquele Freud. Se lembra daquele filme que o cara falou?’. Aí a gente comprou o livro e a gente lia coisas desse tipo, mas não tínhamos interlocutores. A gente lia aquilo só nós e ficava tentando fechar esse mosaico. Então, o CCF e esses jovens intelectuais que foram se identificando na cidade, eles foram ajudando a criar uma teia de sustentação intelectual uns dos outros. E a linguagem era essa: se encontrar no cinema, se ver de longe, depois se conhecer, alguém apresentar e a partir daí, se afeiçoar às características uns dos outros. Era comum desses jovens ler (ou parecer que lia) livros de formação política e intelectual, como Sartre, Marx, Freud. Tinha isso de vê-los sempre com um livro embaixo do braço.” (Fausto Nilo, em entrevista concedida no dia 6 de maio de 2009).
Abrigo Central
A década de 1960 – era associado, no Brasil, a um momento de intenso desenvolvimento econômico e de efervescência cultural, com proliferação de tendências e manifestações no campo das artes e em outros setores de produção de bens simbólicos. Estes aspectos eram comumente reportados nos periódicos cearenses.
Além de representar uma forma de diversão pura e simples, o cinema funcionou naquele contexto histórico, sobretudo, como um veículo por excelência, de disseminação de ideologia e mensagens ligadas aos mais diversos propósitos. É um tipo de lazer sedutor, que logo se universalizou na preferência do público. E em meio a essa trajetória ditatorial que vivíamos em nosso país, o cinema inseriu-se como aglutinador de grupos, catalisador de pessoas e idéias, lugar onde havia a convergência de interesses. Isso se dava não somente no ato de ir ao cinema, mas nas convivências pré e pós exibições do filme, nos salões de espera das casas de cinema, nas filas para entrar nos filmes e nos bares, lanchonetes e restaurantes da cidade.
Cine Diogo
No momento no qual dispomos de um já consolidado circuito cinematográfico comercial variado surge em Fortaleza o
Cinema de Arte do Cine Diogo – melhor dizendo, ressurge
² – como uma opção diferenciada de cinema que, a exemplo de outras experiências
vivenciadas no país, exibiria filmes não identificados com o circuito comercial convencional
que normalmente ocupava a programação do
Cine Diogo. A ideia surge com objetivo de que
os filmes alternativos
³ produzidos na
França,
Itália,
Grécia,
Japão,
Inglaterra,
Estados Unidos, etc., pudessem atrair também um espectador mais jovem.
Cíntia Mapurunga
(recém-graduada em Comunicação Social, com habilitação
em Jornalismo pela Universidade de Fortaleza)
Continua...