Fortaleza Nobre | Resgatando a Fortaleza antiga : Praça da Lagoinha
Fortaleza, uma cidade em TrAnSfOrMaÇãO!!!


Blog sobre essa linda cidade, com suas praias maravilhosas, seu povo acolhedor e seus bairros históricos.

 



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quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

Da Praça José de Alencar até os espaços da Lagoinha




Em direção ao oeste, segue a Praça José de Alencar ou Praça do Patrocínio, em homenagem a imagem de Nossa Senhora do Patrocínio, da Igreja do Patrocínio, cuja imagem foi presente do ilustre português,  Joaquim Dias da Rocha, trazida de Portugal, cuja entronização se deu quando o pároco era Padre Barbosa.
Relíquias do lugar
Seguindo a rua General Sampaio, em direção à rua Guilherme Rocha, há várias casas residenciais antigas; a oficina de obras de artes do italiano exímio escultor, Sr. Vicente Raya; Dr. Edmundo Monteiro Gondim; Família Guedes; Família Justa; e, na esquina da rua Guilherme Rocha, o maior ponto de atração para os apaixonados por músicas - "Bar Americano" de propriedade do Sr. Pedro Benício Sampaio, famoso por seu caldo de cana com pastel feito na hora, aluá, canjica e pamonha, tapioca e pão doce. No outro lado, esquina da rua General Sampaio e rua Guilherme Rocha - Antiga rua do Ouvidor (lado nascente), assoma um pequeno edifício, onde funcionou a Caixa dos Ferroviários, que durante longos anos serviu como pagadoria das pensões às viúvas dos ferroviários.

Praça da Lagoinha, onde nas esquinas das ruas Guilherme Rocha e Tristão Gonçalves, existiram as Serrarias Viana e a do Sr. Alfredo Lopes; hoje se encontra por demais desfigurada, longe de sua singularidade. Foto do arquivo Assis de Lima 

Em frente, na outra esquina, um casarão que serviu de residência do Governador do Estado, sede do Ministério do Trabalho, IAPAS, INPS, INSS, hoje Centro de Saúde José de Alencar. Seguindo pela rua Guilherme Rocha, a Igreja do Patrocínio; vizinho, antes de alcançar a esquina da rua 24 de maio, um sobrado onde residiu o Sr. Joaquim Barbosa Maia, irmão do Sr. Lopicínio Maia, donos da Garapeira que vendia especial gengibirra na rua 24 de maio esquina com rua SãoPaulo; vizinho ao sobrado, a mercearia de um senhor, conhecido por Dente de Ouro, na esquina da rua Guilherme Rocha com 24 de Maio, hoje Farmácia Patrocínio. Frente à mercearia do Sr. Dente de Ouro, existiu o prédio que serviu de residência do Governador Acioli, depois Fênix Caixeral, Lojas Brasileira, hoje Shopping Metrô.

Antigo INAMPS (atual CEMJA) – Foto de Conceição Lopes

Antiga loja Brasileiras e hoje o Shopping Metrô 

Folhas de calendário

Pelo outro lado da rua 24 de Maio com rua Guilherme Rocha, a Escola de Datilografia da Sra. Nenen Lopes, irmã do Desembargador Daniel Lopes, cujo prédio tinha um sótão com várias janelinhas, descaracterizava o andar superior, dando as janelinhas impresso de vigílias. Indo pela rua 24 de Maio (lado da sombra), em direção à rua Liberato Barroso, várias residências de pessoas gradas da época, como as famílias: Mamede, Ari Maia Nunes, José Walter Cavalcante, as célebres professoras de línguas - Adelaide e Ifigênia Amaral, filhas de abastados portugueses, cujas aulas eram ministrada pelas mesmas na própria residência, predominando os idiomas inglês, francês e espanhol.
De conversa em conversa

No mesmo lado, destaca-se ainda a residência do Dr. Thomas Pompeu Gomes de Matos e Maria de Jesus, que cultivava a mais seleta e concorrida reuniões de calçada, onde para lá se reunia a fina flor da sociedade fortalezense, por ser também agradável o "papo" levado a efeito na "roda da calçada" que contava sempre com a presença dos doutores Araken Carneiro, Suzete, Vicente Silva Lima, Ari Maia Nunes, Prof. Gomes de Matos, Clodomir Girão; e, na esquina da rua 24 de Maio com rua Liberato Barroso, o prédio do Sr. Mazine, proprietário do Posto de Automóveis Mazine e da primeira concessionária da Gás Butano, após, transferido ao Sr. Edson Queiroz, que impulsionou esse portento econômico. Todos esses imóveis foram demolidos para dar lugar ao famoso "Beco da Poeira", local para comércio e de vendedores ambulantes. Agora voltemos ao lado da Praça José de Alencar, esquina da rua 24 de Maio com rua Liberato Barroso, imóvel de propriedade do empresário Pedro Philomeno Ferreira Gomes, depois deu lugar ao Lord Hotel, considerado o primeiro edifício residencial de Fortaleza dos anos cinquenta.


Casa de Thomas Pompeu 

A Praça José de Alencar também foi palco de grandes manifestações públicas, comícios presidenciais, concentrações religiosas, pregações evangélicas, feira de amostra, Parque Shangai com o famoso "tira prosa", que consistia numa grande haste de ferro com dois barcos acoplados no meio desta, onde acomodavam dois casais em cada lado (espécie de barco), arremessando em direção do alto, até emparelhar-se fazendo ligeira parada no alto, o que causava grande suspense aos participantes da brincadeira, por sentir mal-estar, provocando vômitos, frouxidão urinária aos menos avisados e tonturas aos mais espertos cuja duração era de uns cinco minutos, assim aproximadamente.
Praça da Lagoinha

Praça seguinte, em direção do bairro Jacarecanga, era a Praça da Lagoinha - assim chamada por ter ali existido um pequeno lago. Nas esquinas das ruas Guilherme Rocha e Tristão Gonçalves, existiram as Serrarias Viana e a do Sr. Alfredo Lopes; vizinho em direção à rua Guilherme Rocha, casas de gradas famílias - Sr. Raimundo Arruda - "Arrudinha", casado com D. Irene Barbosa Arruda, educadora laureada e Diretora da Escola Normal, Justiniano de Serpa. Também ali residia a família do Sr. Clóvis Medeiros e mais tarde as irmãs professoras Adelaide e Ifigênia Amaral, poliglotas conhecidas na Cidade, pela exuberância do aprendizado linguístico, guardando distância ou prevenidas contra seus alunos, porque sabiam do seu grau de talento cultural.

Chegando à esquina da rua Guilherme Rocha com Avenida do Imperador (lado do sol), funcionou a mercearia do Sr. Antônio Bandeira de Moura, composta de uma família de cantores nacionalmente conhecidos, como as irmãs vocalistas Cleide e Adamir Moura e os cantores Carlos Augusto Moura e Henrique Moura, depois se instalou a "Padaria Ideal" dos português J. Neto Brandão - Jaime, João e Jorge.


Padaria Ideal na Avenida do Imperador - Arquivo Nirez


Padaria Ideal hoje

Chácaras e chistes

Na outra esquina da rua Guilherme Rocha com Avenida do Imperador (lado da sombra), via-se a casa do médico de renomeada Newton Gonçalves, depois Hotel Imperador. Atravessando a rua Guilherme Rocha na outra esquina, a Farmácia São Francisco; seguindo pela Avenida do Imperador em direção à rua Liberato Barroso, a aprazível chácara do Dr. Eduardo Henrique Girão, casado com a Sra. Maria de Jesus Dias da Rocha, filha do comerciante português Frederico Dias da Rocha e Maria Umbelina Pontes, sem filhos.

Ao lado, a residência da professora de inglês - Miss Sanders; Casa de Luzanira Franco e seu pai Sr. Franco; residência do Sr. Antonio Galdino e vários filhos, sendo aproximadamente nove filhas e um filho, conhecido pela alcunha de Bebê Chorão e, por não terem sido contemplados pela beleza, a meninada inventou a seguinte quadrinha, e ao se aproximarem da casa começavam evocados assim o verso, aqui em destaque: 


Na avenida do Imperador,

Não passa mulher sem homem


As filhas do Antônio Galdino

Estão virando lobisomem

E na pisada, tum, tum, tum!

Na entrada que dava acesso à Casa de Saúde Dr. César Cals, existiu um grande nicho bem emoldurado, onde era vista a imagem de tamanho natural de São Francisco de Assis, cuja redoma resguardava a imagem e no solo, em recanto próprio os fiéis que diariamente acendiam velas, prostrando-se aos pés da imagem, rezavam contritamente, faziam seus rogos, pedindo perdão pelos pecados e imploravam graças.

Quem se dirigia à Casa de Saúde para visitar os doentes, fazia suas orações em favor dos enfermos ali internados. Era uma verdadeira demonstração de fé e penitência no Santuário de São Francisco da Casa de Saúde Dr. César Cals, onde a devoção símbolo maior da cristandade tomava inabalável lugar no espírito de cada um, numa prova de obediência ao Pai Celestial.


Presença do sagrado

Assim Fortaleza mantinha aquela fidelidade e respeito aos ritos e costumes católicos. Por ser mesmo provinciana, podiam ser vistas as pessoas, que volteavam a Praça da Lagoinha, obedecendo aos círculos formados, onde podiam transitar três camadas de frequentadores.

Tudo a começar pelo primeiro circulo das senhoritas da sociedade que por lá faziam seu desfile em companhia de amigos onde também se marcava encontro para os apaixonados rapazes que iam até lá para tirar "linha" como era conhecido o que se chama "paquera" para culminar em namoro.

Vida provinciana

Na segunda alameda ou círculo os rapazes ficavam de pé, observando a passagem das moçoilas para lhes dirigir galanteios e iniciar uma aproximação para entabular uma "lera" e sentarem nos bancos da avenida para ouvir os dobrados das orquestras da guarda policial, que harmoniosamente dos coretos soltavam os mais variados sons de evocações e saudações feitas por militares, como epopeia de vitórias e de glórias dirigidas ao futuro.


A Praça no final dos anos 70

José de Alencar

A Praça José de Alencar é uma homenagem ao escritor, advogado, deputado e ministro cearense José Martiniano de Alencar, um dos expoentes do Romantismo. Sua estátua, localizada no centro da praça, foi iniciativa do escritor e enxadrista Gilberto Pessoa Câmara, irmão de Eduardo Câmara, Maria Câmara (Maroquinha), religiosa Irmã Estefânia da ordem das capuchinhas; Mardonio Câmara, Nair Câmara, e Dom Helder Câmara. Entre as ruas 24 de Maio, General Sampaio, Guilherme Rocha e Liberato Barroso - onde está localizado o Teatro José de Alencar, fundado em 1910, com estrutura metálica importada da Escócia - do lado, esquina das ruas Liberato Barroso com Guilherme Rocha, existe um jardim projetado pelo paisagista Burle Marx, anteriormente era o Centro de Saúde do Estado do Ceará, ocupando grande parte da rua General Sampaio (lado da sombra), onde tiveram inicio os principais consultórios médicos no próprio Centro, para diagnosticar as diversas doenças que se podia acometer. Naquela época a medicina por sua natural precariedade, guiava-se pela intuição da própria doença. 


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Crédito: Diário do Nordeste

sábado, 14 de maio de 2011

Praça da Lagoinha e sua história ferroviária


Foto do dia da inauguração da Praça em 12 de julho de 1930.

Aquela quarta-feira, 12 de julho de 1930, seria de excitação geral. Pelas estreitas, imundas e nuas ruas do Oeste da cidade, mas também pelas avenidas belas, bem cuidadas e pavimentadas em paralelepípedos do lado Leste o assunto era um só: a inauguração da Praça Comendador Teodorico, enfeitada pelo aromático e colorido Jardim Thomas Pompeu com suas flores de mel, margaridas, rosas e até crisântemos refugiados da longínqua Ásia. Entretanto, a atração principal daquela noite seria a tal Fonte importada da Alemanha. Há meses os fortalezenses esperavam para ver de perto o mais novo brinquedo, comprado a peso de ouro, com o parco dinheiro dos munícipes e, como sempre, gasto a rodo pelos governantes. “Ora vejam! Gastar com um chafariz de ferro de enfeite enquanto os bairros mais pobres nem uma bica possuem e se valem da água de cacimbas imundas ou de córregos para onde também são enviados as águas servidas e os dejetos das latrinas”. (Livro A Ordem da Sereia - Em produção) - Leonardo Nóbrega.

Arquivo Assis de Lima

Lagoinha¹ ficava cerca de trezentos metros da rua das Trincheiras (Liberato Barroso), próximo a Praça Marquês do Herval (José de Alencar), com a rua da Intendência (Guilherme Rocha), pois era uma pequena lagoa, de onde os escravos traziam água para seus patrões.
A Pequena lagoa em seguida fora aterrada, reduzindo-se o espaço da mesma e dizem até com lixo.



Foto do acervo Assis de Lima

O trem na Praça da Lagoinha - Foto do acervo Assis de Lima

O Comerciante Abel Costa Pinheiro fornecia água para as casas, em carroças com barris através de uma cacimba que, era forrada com anéis de madeira, cuja construção data de 1850.

Arquivo Assis de Lima

Em 1860 houve a inauguração da Companhia de Água do Benfica; A Cacimba ficou ao abandono até que a Estrada de Ferro de Baturité a reconstruiu em alvenaria e passou a utilizá-la.

Casa de Saúde Dr César Cals - Foto do Acervo Assis de Lima

Arquivo Assis de Lima

Foi construída uma caixa d'água que foi pintada de vermelho. Tinha um cata-vento que acionava a bomba e, ao lado por onde passava os trilhos, tinha uma torneira, pois, era um dos pontos de abastecimento das locomotivas à Vapor.

Eram abastecidas neste local as locomotivas MaranguapePacatuba, Acarape e a pioneira Fortaleza, máquinas adquiridas na Inglaterra construídas por The Hunslet Company Leeds.


Após a inauguração da via férrea foram construídos prédios e, fora dada vida naquelas imediações.

Casa de Saúde São Lucas - Foto do Acervo Assis de Lima
No dia 30 de Abril de 1928 é inaugurada a Casa de Saúde São Lucas, sob direção do Dr. Abdenago da Rocha Lima, na Avenida Tristão Gonçalves, ao lado da Praça da Lagoinha 
(atual Capistrano de Abreu).

Arquivo Assis de Lima

Aos 16 de outubro de 1917 devido ao crescimento da cidade, a linha teve de ser retirada do centro; Houve o desvio no sítio Amaral, bairro de Porangabussu que cortara o Farias Brito (à época Matadouro), sendo acompanhada pela Av. José Bastos, tal como está.



Arquivo Assis de Lima

A Estação de Matadouro foi inaugurada em 30 de dezembro de 1922, homenageando posteriormente o Engº Otávio Bonfim (Chefe da Via Permanente RVC-1923) em 1926.

Voltemos a Lagoinha...

No dia 12 de julho de 1930 era inaugurada a Praça Comendador Teodorico com o Jardim Tomaz Pompeu; Esta praça recebeu do então prefeito Álvaro Weyne a Fonte dos cavalos² (Adquirida na Alemanha) que depois foi parar na Avenida 13 de Maio no cruzamento com a Avenida da Universidade e hoje está na Praça Murilo Borges (BNB).
Após a saída do trem dessa Rua Trilho de Ferro ( Avenida Tristão Gonçalves) ainda por muitos anos, assim continuou sendo chamada.


Casa da Família Pompeu - Foto do livro Centro Histórico de Fortaleza - Ensaio Fotográfico Mauricio Cals

Aos 03 de maio de 1965, na gestão de Murilo Borges, fora inaugurada a estátua do historiador Capistrano de Abreu, cearense de Maranguape.



Arquivo Assis de Lima

Finalizando prevalece a popularidade: Praça da Lagoinha, contudo guardando silenciosamente na etnologia/topográfica, uma página da História Ferroviária.



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¹Antes era uma praça de areia, sem urbanização nenhuma, onde os escravos apanhavam água numa pequena lagoa existente no centro e que de seca em seca foi desaparecendo.
Em 1850 foi cavado um poço forrado de aduelas de madeira.
Com a inauguração dos poços do Benfica em 1860, a cacimba (poço) foi abandonada e o lixo da cidade passou a ser colocado ali.
Em 1884 a estrada de ferro mandou aterrar o restante da lagoa com areia do morro Croatá a fim de preservar a população do alastramento do cólera-morbus.
Foi levantado um cata-vento e uma caixa d`água para abastecimento das locomotivas que passavam pelo Trilho de Ferro, como era denominada a hoje Avenida Tristão Gonçalves.
Hoje existe, no centro da praça, uma estátua sem nome, de autoria de H. Leão Veloso, e na parte que fica a sudeste, uma herma com os dizeres: "Ao Dr. Abdenago da Rocha Lima, homenagem do Instituto de Proteção e Assistência à Infância, no Cinquentenário de sua fundação, 19/05/1963".


²Fonte importada, toda em bronze trabalhado, ornamentada de cavalos e sereias.
O arquiteto responsável pela obra foi Rubens Franco.




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Leia tbm o texto maravilhoso de MCals

Todos os créditos vão para o amigo e colaborador Assis de Lima

segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

Hospital Geral Dr. César Cals



O Hospital recém inaugurado - Arquivo Nirez

O Hospital Geral Dr. César Cals de Oliveira é carinhosamente chamado de a César Cals, por conta da maternidade. Além do afeto, existem também motivos históricos para tão apropriada denominação, conforme relatos que se seguem sobre sua origem e evolução. Tais fatos também explicam, de maneira substancial, a inquestionável e destacada vocação acadêmica sempre existente nesta instituição. A César Cals é abençoada de origem, pois foi gerada na Santa Casa de Misericórdia de Fortaleza, datando esta de 1861 e sendo o Dr. João da Rocha Moreira um dos seus fundadores. Seu filho, o médico obstetra Dr. Manuelito Moreira lançou a semente da César Cals, quando, por sua ideia, foi aprovada, em reunião solene na Santa Casa, a fundação da Sociedade Auxiliadora da Maternidade Dr. João Moreira - Sociedade Civil Beneficente, proprietária da Maternidade e da Casa de Saúde.

Casa de Saúde Dr César Cals - Foto do Acervo Assis de Lima

Praça da Lagoinha, vendo-se o hospital - Arquivo Assis de Lima

Albergada inicialmente na própria Santa Casa, eram precárias as condições de funcionamento da nova instituição. Por isso, os Drs. Manuelito Moreira e César Cals arrojadamente partiram para a aquisição de um terreno na Praça da Lagoinha onde, após quase seis anos de penosa construção, foi inaugurada a sede própria, em 31 de outubro de 1928. No andar térreo ficou a Maternidade Dr. João Moreira com capacidade para trinta leitos e, no andar superior, a Casa de Saúde César Cals, com dezesseis leitos.


O Dr.César Cals de Oliveira foi seu primeiro diretor, liderando com eficiência um grupo de médicos pioneiros, capacitados,  determinados e de grande abnegação. Foi de extrema importância a colaboração das Irmãs Terceiras Capuchinhas, responsáveis pela  assistência de enfermagem e apoio à administração da nova instituição. Com o falecimento do Dr. César Cals, assumiu a direção,  com muito denodo e competência o Dr. José Ribeiro da Frota, permanecendo no cargo até o fim de sua vida. A seguir, foram diretores  duas históricas e destacadas figuras da medicina cearense, respectivamente Dr. José Carlos Ribeiro e Dr. José Galba Araújo. Seguiram-se vários diretores com características pessoais distintas, mas sempre atendendo, dentro do possível, e em função  das freqüentes dificuldades financeiras, os anseios do seleto corpo clínico da César Cals, respeitável em todas as épocas pela  excelência da sua formação técnica e ética,além de uma exemplar abnegação e espírito acadêmico.


Em 1973 aconteceu um fato histórico absolutamente decisivo para a César Cals. Com as mudanças de política de Saúde no Brasil,  este hospital se encontrava financeiramente inviável. Era governador do Ceará, o Sr. Cel. César Cals de Oliveira Filho, que se comprometeu, após análise minuciosa, a resolver o problema. Aos 16 de  julho do mesmo ano, o Governo do Estado assumiu as responsabilidades administrativas da Instituição, recebendo como doação o seu patrimônio e acervo, com o compromisso de continuar prestando, à populalação pobre do Estado, os serviços anteriormente disponibiliza-dos. Assim, a Fundação de Saúde do Estado do Ceará (FUSEC) passou a administrar a CÉSAR CALS, que recebeu novo e vigoroso ânimo. Desde então, só vem crescendo e se fortalecendo em sua abrangência diagnóstica e terapêutica. Hoje é de fato um hospital geral, de grande expressão e com muitos serviços, tendo uma capacidade instalada de 297 leitos.
E quanto à sua vocação, ao seu espírito acadêmico?

Arquivo Assis de Lima

Para melhor compreensão deste aspecto, vale salientar que a Medicina teve, tem e sempre terá em sua composição três  itens: magia, ciência e arte. Quanto mais ciência, menos magia, porém sempre haverá o componente magia, não no sentido anti-ciência. Os três, sabiamente dosados, dão o charme, especialmente  no setor do ensino médico, onde o instrutor, o verdadeiro mestre terá que ser vocacionado e precisa  agir no ambiente adequado. É necessário ressaltar que desde o tempo de Hipócrates (360 a.C) até os dias atuais, o conhecimento médico sempre foi buscado com afinco. A grande diferença está na celeridade das aquisições científicas dos tempos recentes, fazendo-se necessária uma permanente reciclagem e nisto os  mestres são imprescindíveis para ajudar os discípulos a distinguir o joio do trigo, a seguir a orientação sempre atual de William Osler: aprender medicina preponderantemente à beira do leito (“on bed side”) e  eu acrescentaria, nos tempos de hoje, se aproximar cada vez mais do “bed side” e fugir do “bad site” da Informática; esta, se imprescindível, é igualmente nefasta quando mal usada.


Neste contexto, a César Cals tem sido um exemplo maior de instituição médica com alto espírito acadêmico, vocacionada para o ensino desde o seu nascedouro, recebendo com extremo zelo profissionais competentes e éticos. Assim, desde o início, expressivos nomes da Medicina lá pontificaram, tais como Vulpiano Cavalcante, Newton Gonçalves, Paulo Machado, Ossean Aguiar, Pontes Neto, Haroldo Juaçaba e muitos outros até os dias atuais.

Foi pioneira em vários procedimentos cirúrgicos, como a primeira colecistectomia, realizada pelo Prof. Ossean Aguiar. Lá também aconteceram as primeiras cirurgias cardíacas (comissurotomia mitral, ligadura de PCA), graças ao denodo dos cirurgiões professores Newton Gonçalves, Horaldo Juaçaba e Paulo Machado, apoiados inicialmente pelo cirurgião cearense, radicado no Rio de Janeiro, Prof. José Hilário, na década de 50. A Obstetrícia e a Ginecologia prosperaram com solidez, persistindo até os dias de hoje uma grande e brilhante Escola Obstétrica, como é também hoje um grande destaque o Serviço de Neonatologia.
 

Fatos importantes marcaram a vocação acadêmica da CÉSAR CALS. Desde 1952 a Instituição vem mantendo estágio  teórico-prático para o Internato da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará, sendo grande a concorrência dos estudantes para ocupar suas vagas, dado a excelência do ensino. Em 1967, criou-se oficialmente a Residência Médica, reconhecida pelo MEC, nas áreas de Medicina Interna, Cirurgia e Obstetrícia-Ginecologia. Esta Residência, altamente concorrida, tem gerado excelentes profissionais, tanto no aspecto técnico como ético.


Um fato da mais alta importância merece comentários: a auto-sustentabilidade da César Cals. Por ela passaram gerações de excelentes profissionais e atualmente, os que a dirigem com crescente competência, são em sua maioria “filhos da casa” e todos oriundos da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará. Aos que fizeram e fazem a CÉSAR CALS, são todos merecedores da nossa admiração, gratidão e respeito pela abnegação e competência. Aos atuais fica um forte apelo: que jamais percam o ânimo apesar das dificuldades, pois a causa é extremamente nobre. Hoje o Hospital Geral Dr. César Cals é uma majestosa instituição que presta grande assistência especialmente aos menos favorecidos. O mérito é de vocês todos e a gratidão é de todos nós.


Crédito: João Martins de Souza Torres
Médico e Professor da Faculdade de Medicina-UFC
Ex- Diretor Geral do Hospital Geral Dr. César Cals 


segunda-feira, 30 de agosto de 2010

Praça da Lagoinha



Sujeira, monumentos pichados e destruídos, bancos estraçalhados. Este é o cenário atual da Praça Capistrano de Abreu, popularmente conhecida como Praça da Lagoinha. Os transeuntes se resumem a mendigos. Os outros personagens que compõem o cenário da praça são vendedores ambulantes, geralmente de produtos roubados, o que gerou o apelido de ‘feira dos malandros’.

Foto de 1931

Um aspecto curioso é a presença de duas barbearias improvisadas nas calçadas da praça. Com espelhos pendurados no muro da Casa de Saúde César Cals, Chileno e Fofa cortam “barba, cabelo e bigode” por apenas R$1,99. Chileno conta que trabalha há seis anos no local e, como a procura havia aumentado, contratou os serviços de Fofa, há quatro meses, para ajudá-lo a dar conta do recado.
Luis Reginaldo, fiscal do comércio ambulante, aproveitou os três anos de atuação na área para conhecer historicamente os quatro cantos do logradouro onde trabalha. E revela: o maior objetivo da fiscalização é impedir que os ambulantes ocupem toda a praça. Eles se limitam à parte esquerda dela. O trabalho acabou duplicando: além de fiscal, tira onda de guia turístico.
Apesar de abandonada e sombria, a pobreza da praça atrai jornalistas em busca de informações, inclusive históricas,para denunciar o abandono e resgatar o que foi aquele espaço um dia. Quando isso acontece, Reginaldo está a postos. Nunca esquece de ressaltar a história do estudante João Nogueira Jucá, que tem seu busto imortalizado, em bronze, em um canto da praça, esquecido,
sem qualquer placa indicando quem ele é. Nada!

No dia 4 de agosto de 1959, o jovem estudante João Nogueira Jucá passava em frente à Maternidade Dr. César Cals, que fica ao lado da Praça da Lagoinha e funciona neste local até hoje.


No momento de sua passagem, aconteceu uma explosão seguida de incêndio. João entrou no hospital em chamas e salvou muitos recém-nascidos e parturientes. As pessoas gritavam tentando impedi-lo, mas o grito maior foi o de uma mãe: “- Por favor, meu filhinho ficou lá, salve-o pelo amor de Deus!” Depois de salvar todos os ocupantes do hospital, João caiu. Cerca de 80% do corpo do jovem foi consumido pelo fogo. Ficou irreconhecível. Morreu dia 11 de
agosto, coincidentemente o dia em que se comemora o Dia do Estudante. De tal modo, entrou para a história como um símbolo do estudante cearense. Uma vez no ano, dia 11 de agosto, é relembrado seu ato de bravura por meio de homenagem do Corpo de Bombeiros, realizada
na própria praça. Por iniciativa do vereador Tin Gomes, a Câmara Municipal de Fortaleza realizou em agosto deste ano, uma audiência pública marcando o início do Projeto João Nogueira Jucá. O objetivo é resgatar a memória do estudante. O projeto foi pensado para três etapas. Na primeira, pretendia recuperar o monumento em homenagem ao estudante e transferi-lo da Praça da Lagoinha, para o pátio externo do Colégio Liceu do Ceará. O segundo passo era aprovar um Projeto de Lei que declara João Nogueira Jucá, patrono dos estudantes de Fortaleza e dispõe sobre esta homenagem junto à comemoração anual do Dia do Estudante. Por último, a Câmara iria instituir a Medalha João Nogueira, que será concedida anualmente, no dia 11 de agosto, a um grêmio ou entidade estudantil que desenvolva atividades em defesa da vida. Mais um ‘pedacinho’ da Praça da Lagoinha será ‘extraído’. Só restarão as pedras soltas do passeio que se acumulam nos cantos da praça. Uma das mais antigas da cidade, sua demarcação enquanto praça é anterior a 1859. Batizada em 1891 com o nome de Comendador Teodorico, passou a ser chamada de ‘Lagoinha’ porque um dos afluentes do riacho Pajeú passava pelo local e formava uma pequena lagoa, que depois foi aterrada para a construção do espaço público.
A praça que foi bonita e bem cuidada, repleta de bancos, de jovens e de muitas noites de festa, já sofreu inúmeras perdas no decorrer de sua história. Em 1829 havia um coreto em forma de lira, demolido em 2001. Em 1930, um jardim foi construído com fonte luminosa, importada da Alemanha, que hoje se encontra na Praça Murilo Borges, em frente ao Banco do Nordeste.
No dia 21 de abril de 2003, a estátua de Capistrano de Abreu, em bronze, fundida em Paris no início do século passado, medindo 1,90m (tamanho natural) e pesando cerca de 100 quilos, desapareceu da praça, onde estava desde 1964. No mês seguinte a estátua foi recuperada. Estava prestes a ser vendida como sucata pelos ladrões.

Foto de 1950

João Capistrano Honório de Abreu, o homem e o nome da Praça.
Depois de resgatada após o “seqüestrofoi restaurada e devolvida ao seu ‘habitat’. Hoje, os sinais da restauração já desapareceram. O monumento encontra-se pichado e abandonado como o resto da praça. Um dos primeiros grandes historiadores do Brasil, ‘vive hoje’ em meio à história destruída. Talvez o primeiro historiador a dar importância a elementos populares ou menos elitistas, escrevendo uma história sócio-econômica do Brasil.
Cearense, nascido em Maranguape, em 23 de outubro de 1853, Capistrano de Abreu, depois de nove obras publicadas faleceu, aos 73 anos, no Rio de Janeiro.
Passaram-se os anos e o lugar perdeu a ambientação bucólica, onde, nas noites das quartas-feiras, a banda da polícia realizava retreta. Fortaleza vive o dilema da modernidade sem se dar conta de que a organização do espaço urbano não pode ser feita apenas para melhorar o fluxo de carros, sem contemplar a construção de espaços de convivência lúdica, com áreas verdes para caminhar, ler, escrever, contemplar, filosofar, agir...

Foto de Juliana Brito - A Praça na atualidade


Um pouco mais sobre Capistrano de Abreu

O historiador maranguapense, nascido em 1853, saiu do Ceará na casa dos 20 anos para o Rio de Janeiro e lá mesmo passou o resto da vida, que se esticou até 1927. Este homem dedicou-se a estudar a história colonial brasileira, especialmente as relações sócio-econômicas, buscando assim ressaltar elementos mais populares, menos elitistas.

Capistrano de Abreu foi considerado um intelectual brasileiro precursor de trabalhos como os de Gilberto Freire, Sérgio Buarque de Holanda e Caio Prada Júnior. Nada disso teria acontecido se ele não tivesse ido para o Rio de Janeiro sob as asas de José de Alencar ser redator da Gazeta de Notícias.

Por isso, quando a seca de 1915 estourou nos Inhamuns, ele estava pertinho do Pão de Açúcar, pensando na legitimidade de uma inconfidência qualquer – acontecida havia algumas dezenas de anos. Enquanto Fortaleza era invadida por flagelados da seca, enquanto as relações sócio-econômicas do estado passavam por uma mudança histórica, enquanto campos de concentração eram construídos para “abrigar” os miseráveis vindos do interior do estado, lá estava ele, no Rio.

Quando a segunda grande seca estourou, 1932, Capistrano já não estava entre os vivos, e, quando se tornou nome de praça, 1965, o Centro já não era mais o mesmo de seus 20 e poucos anos. Foi em forma de placa que o historiador cearense voltou à capital do Estado para ver o quanto ela prosperou em linhas tortas durante sua ausência.



Fonte - Renata Ribeiro Maciel Lopes, Blog Fortaleza no Centro e pesquisa de internet

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