Fortaleza Nobre | Resgatando a Fortaleza antiga
Fortaleza, uma cidade em TrAnSfOrMaÇãO!!!


Blog sobre essa linda cidade, com suas praias maravilhosas, seu povo acolhedor e seus bairros históricos.

sexta-feira, 21 de março de 2014

A saga dos jangadeiros do Mucuripe - A chegada ao Rio e uma nova aventura...


Há 70 anos, quatro jangadeiros entraram para a história...

Em 1941, Manuel Olímpio Meira (Mais conhecido por Jacaré) e mais três jangadeiros - Mestre Jerônimo (Jerônimo André de Souza), Tatá (Raimundo Correia Lima) e Manuel Preto (Manuel Pereira da Silva) - saíram do Ceará com destino ao Rio de Janeiro.
Foram reivindicar junto ao Governo de Getúlio Vargas, melhores condições para a comunidade de pescadores de sua região, tentando fazer com que sua profissão fosse reconhecida e os pescadores pudessem obter seus direitos trabalhistas.

Foi então que a presidente da Associação de são Pedro (entidade religiosa que prestava assistência às famílias dos pescadores), empreendeu juntamente com Fernando Pinto, presidente do Jangada Clube, uma Campanha entre as autoridades e membros da sociedade local a fim de levantar fundos para a realização do sonho dos pescadores.
A campanha foi bem sucedida e ao final, eles conseguiram dinheiro para a construção da jangada e para deixar suas famílias assistidas enquanto ficassem ausentes.

Veremos toda essa travessia através de fotos do filme de Orson Welles de 1942: 
A triste despedida na partida dos jangadeiros





"Às nove horas em ponto, quando soprava um bom nordeste, empurramos a jangada pra dentro d'água. Ia começar a nossa aventura. O samburá estava cheio de coisas, a barrica cheia d'água e os nossos corações cheios de esperança. Partimos debaixo de muitas palmas e consegui ver de longe os meus bichinhos acenando. Mais de vinte jangadas, trazidas por nossos irmãos de palhoça e de sofrimento, comboiaram a gente até a ponte do Mucuripe. A igreja branquinha foi sumindo e ficou detrás do farol. Rezei pra dentro uma oração pedindo que a Padroeira tomasse conta dos nossos filhinhos, pois Deus velaria por nós. E assim começou nossa viagem ao Rio de Janeiro...". 
Jacaré




E lá se foram nossos heróis...


Eles navegaram por sessenta e um dias em condições precárias, enfrentando tempestades, tubarões e calmarias, de Fortaleza ao Rio de Janeiro...


A chegada em Recife...


A chegada em Salvador...


Pedindo proteção em Salvador...


A chegada ao Rio de Janeiro - na época a capital da República - distante 1.500 milhas náuticas (Mais de 2.700 Km), navegando na jangada "São Pedro". 

 




Em 15 de novembro a jangada São Pedro entrou nas águas da Baía de Guanabara, acompanhada por muitos barcos que formavam uma procissão...


















Logo depois, a jangada foi retirada apoteoticamente da água e colocada em um caminhão sob aplausos de uma multidão que se aglomerava para ver de perto a chegada dos heróis. O cortejo seguiu pelas principais avenidas do Rio de Janeiro e na Praça Mauá um palanque estava montado para os discursos. Ao final do dia eles foram atendidos por Vargas.


Getúlio Vargas cumprimenta Jacaré.
Foto: Firmino Holanda

Dos Verdes Mares Bravios mais uma vez parte uma jangada...

"Passados dez anos da viagem dos jangadeiros cearenses ao Rio de janeiro, sede do governo Federal, eis que novamente dos “verdes mares bravios”, referidos no romance de José de Alencar, parte uma nova jangada, dessa vez batizada de Nossa Senhora de Assunção. Apesar de, nessa década, como nos informa Câmara Cascudo em Jangada e Jangadeiros, já está acontecendo a substituição da velha jangada de paus pela jangada de tábua, que acrescenta à antiga estrutura um pequeno convés, os jangadeiros ainda preferem a antiga e é uma dessas que servirá de transporte aos cinco jangadeiros. Quem a fabrica é “Quinta-Feira”, segundo informações dos pescadores, um dos melhores fabricantes de jangada do Ceará; na vela uma pintura de Nossa Senhora de Assunção, padroeira de Fortaleza, pintada pelo artista cearense Antônio Bandeira."

Berenice Abreu de Castro Neves 

Depoimento

“Aquela miniatura de jangada, cheia de detalhes, que ganhei ainda menino, de uma “tia” nordestina, casada com um amigo do meu pai, fez mais sentido quando, maiorzinho, visitei o Museu Júlio de Castilhos e conheci, além de uma jangada de verdade, em tamanho natural, a história fantástica de uma viagem improvável. Aquela precária embarcação que eu via diante dos meus olhos tinha vindo desde muito longe, navegando pelo mar e trazendo a bordo alguns homens.

Foto: Antonio Ronek - Revista do Globo (Acervo Ricardo Chaves)

Foto: Antonio Ronek - Revista do Globo (Acervo Ricardo Chaves)

Esta semana, quase meio século depois, examinando uma antiga Revista do Globo, encontrei o registro documental dessa aventura, que nunca saíra da minha cabeça. Numa bela reportagem de Rubens Vidal com fotos de Antonio Ronek, publicada em março de 1952, estava o relato da chegada, depois de 127 dias e 4 mil quilômetros, da jangada N. S. de Assunção, trazendo de Fortaleza (CE) quatro pescadores e um jornalista. Vinicius Lima, repórter do jornal O Globo, que patrocinava a travessia, aproveitou o desembarque do pescador Tatá – que, enfermo, ficou no Rio, quando a expedição fez uma escala por lá – e juntou-se a Jerônimo, João Pereira, Manuel Preto e Manuel Frade na segunda etapa da jornada.

Foto: Antonio Ronek - Revista do Globo (Acervo Ricardo Chaves)

Foto: Antonio Ronek - Revista do Globo (Acervo Ricardo Chaves)

Foto: Antonio Ronek - Revista do Globo (Acervo Ricardo Chaves)

O objetivo dos viajantes era chamar a atenção e protestar contra as más condições de vida dos pescadores nordestinos. Foram recebidos como heróis por uma multidão e, depois, pelo governador e pelo prefeito.
A jangada foi exposta à curiosidade popular no Paço Municipal e posteriormente recolhida ao Museu – onde, após alguns anos, acabou por desfazer-se.”

Ricardo Chaves (Almanaque Gaúcho)





sexta-feira, 14 de março de 2014

Fortaleza dos bailes e dos Clubes


No final dos anos 70 a cidade de Fortaleza fervilhava aos sons de inúmeras novidades oriundas da produção da chamada indústria cultural e das culturas de massa. Alguns vindos literalmente ‘de fora’ e outros considerados ‘locais’ e ainda não inseridos no contexto maior de comercialização internacional.

Era o caso, por exemplo, do rock, que aportava com força pela musicalidade de Led Zeppelin, Black Sabbath, Ramones e Sex Pistols, entre outros. Já o predomínio do local se matizava nas inúmeras gravações de forró, bem representados em grupos como Trio Nordestino, Três do Nordeste, Luís Gonzaga, Jackson do Pandeiro e tantos outros.

Estudos sobre o rock em Fortaleza dão conta de uma trajetória iniciada ainda na década de 1950 e um predomínio hegemônico do forró, motivo pelo qual se apontaria, até meados dos anos 90, a dificuldade de ‘explosão’ dessa manifestação em Fortaleza, bem como do surgimento e consolidação de bandas e espaços destinados a essas manifestações.


Acervo Portal Messejana

Entretanto, o rock praticado em Fortaleza era ‘regionalizado’, com bandas (ou grupos de bailes) como Os Faraós, Os Belgas, Os Diferentes ou, um pouco depois, O Peso, que seguiam linhas melódicas mais leves e pouco ligadas às perspectivas mais ‘transgressivas’:





Na década de 50, o rock era tocado por grupos de baile — o mais conhecido era Ivanildo e seu conjunto — que animavam as festas de clubes sociais como o Náutico, Líbano e Maguary ... Na década de 60, com a explosão do rock em todo o mundo, esses grupos tocavam os sucessos do momento, além de músicas brasileiras, mambo, bolero e rumba. O grande destaque era Os Faraós, banda de Luizinho (foto do blog do cantor) que ainda hoje toca em festas... 

Outro destaque era Os Belgas, cujo guitarrista Júlio Sena era o maior sucesso. Tanto um como o outro tinha em seu repertório, basicamente sucessos dos Beatles e as versões de Renato e seus Blue Caps. Também vale lembrar d’os Diferentes, que a exemplo dos demais tocava música dos outros, mas a diferença estava no fato de cantarem músicas próprias e fazerem arranjos diferentes para músicas dos outros ... Nos anos 70, destacou-se Luís Carlos Porto, vocalista da banda O Peso, que talvez seja a única banda cearense de rock a ter tido projeção nacional ... No final da década surgiu a banda Posh, fazendo um rock mais para o pop.


Assim, a manifestação nos anos 70 se encontrava na encruzilhada dessas diferentes formas de apreciar e curtir o rock, parecendo ter havido uma apropriação dupla da manifestação:

A primeira, do ponto de vista estético-político, com o surgimento de bandas ‘mais radicais’, com mensagens politizadas e fazendo parte de um ‘movimento’ que atentava contra os pressupostos anteriores do próprio rock e da cultura de massas,— o punk. A segunda, do ponto de vista dessas manifestações na própria cidade de Fortaleza, e de setores de sua sociedade antes relegados ao ‘silêncio’.

Trata-se de uma complexa articulação de manifestações, intenções, padrões estéticos, éticos e práticas de incorporação musical, que dão origem a uma forma inusitada de vivência da cidade e da própria música, que sai dos clubes de elite como o Náutico, Líbano e ou Maguary e passa aos pequenos clubes de periferia, tais como o Apache Clube, o Mênfis Clube do Antônio Bezerra, o Keops Clube, o Detroit, ou ainda o Grêmio recreativo do Conjunto José Walter, entre tantos outros.

É claro que a essa ‘transposição geo-estética’ (ou ‘deslocamento geo-estético’) correspondia uma apropriação de outros setores sociais presentes na cidade de Fortaleza, e, além disso, marcava de forma definitiva a emergência de novos atores sócio-históricos: os jovens pobres.

Situados nas periferias da então pequena cidade de Fortaleza, eles passam a se manifestar de forma muito mais presente e frequente, e, além disso, essa manifestação se dá em um campo particular, próprio, singular e inovador: o campo da arte e do lazer.

Assim, os inúmeros bailes que surgem na cidade são mais do que simples diversão e assumem a conotação de manifestação juvenil, que dentro de uma trajetória própria, em pouco tempo, guardando a sua característica histórica de transmutação, assumiria uma outra e mais radical forma de se manifestar, como veremos adiante.

Os inúmeros bailes geram práticas de sociabilidade, de compreensão estética, ética e musical que são instauradoras de ‘territórios existenciais’ e possuem suas sutilezas e perspectivas próprias. Vejamos como Flor, à época ainda menina, passa a experimentar o que ocorria:

Eu não sei quando é que a coisa virou movimento punk, porque isso vem de um outro movimento. Eu tinha 12 ou 13 anos, conheci essa menina, a Guacira, ela curtia rock e tinha uns festivais de rock que aconteciam no Apache, no Mênfis Clube do Antônio Bezerra, no Keops Clube, lá no Detroit, várias casas de subúrbio, shows de rock com playback. Era Led Zeppelin, Black Sabbath, Pink Floyd, Kiss, heavy metal. E aí começou uma reunião aqui na Praça do Ferreira. Eu estudava no Anchieta e gazeava aula, ficava no meio dessa galera porque eu gostava de banda e curtia essas coisas. E aí a gente começou a se reunir pra ouvir esses sons, e tinha concursos de dança...

Como se pode perceber na lembrança de Flor, iniciava-se na cidade a produção de pequenas festas nos clubes de subúrbio. Nessas festas, uma das estratégias para envolver os grupos eram competições de rock ao som dos conjuntos por eles preferidos:

Sempre nos finais de semana uma leva de fãs gravitava pelos clubes suburbanos atrás de diversão. ‘Competições’ eram travadas entre as diversas turmas. A Turma do Baby do Bairro do Monte Castelo, do Conjunto José Walter, do Parque Araxá entre outras, disputava quem agitava mais parecido com seus ídolos (Robert Plant, Ramones), com direitos a guitarras artesanais, feitas de madeira ou papelão e até troféus para as turmas vencedoras.

Além disso, outro aspecto que se deve considerar é a apropriação da cidade de forma itinerante, não fixa, feita de forma ‘errante’, em deslocamentos pela diversidade de cada bairro ou clube, ou ainda das diversas ‘turmas’ envolvidas:

Essa coisa do rock não era fixa não, o cara fazia um evento e divulgava, uma semana num bairro, outra semana em outro totalmente diferente ou distante. Acho que era isso que perpetuava a adrenalina. De repente o cara já tem a adrenalina lá em cima, aí faz um evento hoje aqui, no outro final de semana não é mais aqui, é lá...

A novidade dessa experiência juvenil que tomava o lazer em suas mãos, articulava os diversos bairros da cidade, se grupalizava a partir de afinidades, identificava grupos distantes e/ou rivais, estabelecia uma rede de relações, de espaços, constituía sua vivência com base em desejos e prazeres dos quais não se dissociava, e, que em breve se tornariam a referência de suas próprias vidas de forma completa.


Os bailes nos quais as diversas sonoridades eram experimentadas em partes específicas para cada estilo musical eram uma prática comum na Fortaleza do final dos anos 70 e dos anos 80. Assim, os amantes de cada tipo de música tinham uma parte específica das festas para se deleitarem, e a elas recorriam nos mais diversos cantos da cidade.

Não há ‘oferta’ de bailes específicos, ou seja, de festas com a predominância de uma única manifestação musical, que só aparece, ou se torna forte, predominante, em meados dos anos 90. Talvez isso indique o pequeno número de frequentadores dos estilos que depois comporiam o underground em Fortaleza, juntando-os numa estratégia de produção, venda e consumo que atendia naquele momento suas expectativas e possibilidades; ou talvez fosse reflexo de uma outra compreensão de diversão. O certo é que essa junção contribuía na formação dos grupos pelo convívio com a diferença, no nascedouro de muitas dessas manifestações como é o caso do rock,do punk, do próprio hip-hop e até do forró, que durante algum tempo frequentam os mesmos pequenos clubes nesses ‘bailes mistos’.

Essa mistura inicial nos pequenos clubes da periferia da cidade criou em Fortaleza uma proximidade entre os diversos grupos que posteriormente se identificam com este ou aquele estilo musical, e, ao mesmo tempo, nesse relacional se identificavam entre si como iguais–diferentes, essencialmente compondo um mesmo campo: o de oposição à sociedade excludente, aspecto que posteriormente será incorporado às suas letras, manifestos, músicas e práticas.



Nesses bailes, nos pequenos clubes dos muitos (e à época distantes) bairros da cidade, integrantes dos diversos grupos se encontravam e aprendiam a se identificar e respeitar:

Inter Dance, no Monte Castelo, era um point dos punks, e em 85, 86, 87 o break estava em ascensão, era de certa forma uma novidade. Lá, o pessoal tinha a festa de rock, punk, e tinha o pessoal que dançava o break, se congregava lá. Aí, alguns deles migraram para o Conjunto Ceará.


Texto de Francisco José Gomes Damasceno 
(As cidades da juventude em Fortaleza)


Aproveito o ensejo para falar do Conjunto Musical Big Brasa.


O Conjunto nasceu em Messejana, em 1967. Foi um marco para a música dos Anos 60 em Fortaleza. Participou de programas de televisão, acompanhou artistas do Ceará, de renome nacional, como Ednardo, Belchior e muitos outros. Foi considerada uma das melhores bandas musicais da época em Fortaleza.
Os integrantes fundadores foram: Lucius, Severino, João Ribeiro, Adalberto, Edson e Luís Antônio Alencar.


Crédito do vídeo: Portal Messejana

"O embrião do conjunto musical Big Brasa foi em nossa casa, na Rua José Hipólito, 698, em Messejana. Durante toda a existência do grupo e de minha vida musical a sede sempre foi a mesma. O local onde foi realizado o primeiro ensaio do grupo foi por algum tempo meu quarto, que dividia com o Carló. Tinha as paredes todas pintadas, com desenhos coloridos, feitos com tinta a óleo. Nele desenhávamos de tudo. Guitarras, pistas de corrida e até mesmo o famoso personagem “Amigo da Onça”, este feito pelo Carló. Até um dia desses, em uma das reformas que fiz em nossa casa, vimos as marcas das pinturas que ainda estão lá, agora encobertas por um tipo de revestimento. Aquele ambiente era nosso mundo. O violão sempre ficava disponível, em cima de uma cama ou cadeira, para facilitar o seu rápido acesso. Tudo o que era de equipamento nós montávamos empilhados, de modo a formar uma “parede de som”. Sem intenção, nós projetávamos o que iria acontecer em um futuro breve.



É importante dizer que nos anos 60 as diversões da vida noturna de Fortaleza se caracterizavam por bailes em clubes, diferentemente do que ocorre hoje em dia, com os mega-shows em casa de espetáculos de grande porte. Quem viveu os “Anos Dourados” certamente tem saudades das festas desse período.



Quem não se lembra dos preparativos que fazíamos para ir a alguma festa e de como os conjuntos musicais eram mais valorizados? E dos festivais, sempre muito frequentados, as paqueras, a dança colada? Para nós músicos não era muito fácil, pois na maioria das vezes estávamos trabalhando nos finais de semana. Em nosso caso, quando o Big Brasa tinha folga nos contratos, saíamos de Messejana para nos divertir um pouco em algum clube. Entretanto, antes de nossa turma completar dezoito anos e poder dirigir, tínhamos que chamar um carro de praça, normalmente uma rural, para que nos conduzisse até o clube e voltasse na madrugada para nos trazer de volta para Messejana.

Para se ter uma ideia do que rolava nas noites de Fortaleza, segue uma relação dos clubes que existiam na época, em ordem alfabética, nos quais o Big Brasa atuou, por várias vezes.




O Balneário Clube de Messejana, a Sociedade Bairro de Fátima, o Clube de Regatas Barra do Ceará. Mais adiante o Iracema, o Líbano, o Iate Clube de Fortaleza, o Ideal Clube, o Náutico Atlético Cearense, o América Futebol Clube, o CRA - Clube Recreativo da Aerolândia, a COFEBA (Colônia de Férias dos Funcionários do Bento Alves), o Recreio dos Funcionários, o Clube General Sampaio, o Vila União, o Massapeense, a Associação Atlética do Banco do Brasil (AABB), o Clube dos Diários, o Clube do Jornal O POVO (Messejana), o Clube da Caixa Econômica, o Maguari e o Memphis Clube, de Antônio Bezerra.

João Ribeiro da Silva Neto

Do livro "O Big Brasa e minha vida musical" (1999)






quinta-feira, 6 de março de 2014

Paizinha - O melhor e mais badalado Stúdio de beleza do Jacarecanga


Quem acompanha o blog, sabe o quanto eu gosto e me identifico com o Jacarecanga, já fiz várias postagens que abordam o bairro. Eu saí de lá, mas o Jacarecanga não saiu de mim! rs
Sem dúvida o bairro guarda parte da história da cidade e como uma apaixonada pela Fortaleza antiga, caminhar pelas ruas do bairro é viajar no tempo e admirar a beleza arquitetônica de casarões, sobrados, bangalôs e chácaras antigas... 

Na Avenida Francisco Sá, 1771, ao lado da Escola de Artes e Ofícios Thomaz Pompeu Sobrinho, fica a Paizinha Stúdio de Beleza, um conceituado salão fundado em 16 de setembro do ano 2000.
Já conhece? Não? Pois precisa conhecer!

Tudo de bom em um só lugar, este é a Paizinha Studio de Beleza! 
A começar pela localização, no coração do Jacarecanga, numa belíssima casa muito bem preservada à Avenida Francisco Sá, 1771
(Clique nas imagens para ampliar)

A Paizinha tem uma equipe de profissionais e oferece o que há de mais moderno e atual em tendências e técnicas para manter nossos cabelos, rosto e unhas sempre saudáveis e bonitos. E é justamente o que queremos, encontrar tudo num só lugar, certo? E o melhor, tudo isso num ambiente super confortável e aconchegante!


Área climatizada para atendimento de cabelo e unha. Zona WIFI.
(Clique nas imagens para ampliar)


São tantas opções que fica difícil falar tudo que eles oferecem, e o melhor, o atendimento é VIP, lá você realmente se sente uma rainha (ou rei)!
Cabelos: Corte, escova, penteados, coloração, balaiagem, reflexos, luzes, mechas, escova progressiva, hidratação, alinhamento de fio, cauterização, permanente, alisamento e relaxamento. Tudo que precisamos! rsrs

Corporal: Massagem relaxante, Drenagem linfática, Massagem modeladora e turbinada, Banho de lua (Composto por: Banho mineral; Descoloração dos pêlos; Banho com sabonete de rosas; Esfoliação corporal com mel; Calmante para pele com beterraba e aveia; Hidratação de morango; Hidratação de chocolate; Banho com óleo de amêndoas...).

Facial: Limpeza de pele e Peeling, Micropigmentação de sobrancelhas e Maquiagem.


Depilação Feminina e masculina e Depilação intima artística.

Manicure e Pedicure: Unhas decoradas; Unhas de porcelana; Unhas postiças; Unhas caviar (super na moda, já quero!!!); SPA das mãos; SPA dos pés; Unhas Metalizadas Fio de ouro, etc.
(Clique na imagem para ampliar)

Ah, e para quem vai casar, lá na Paizinha tem o Dia da Noiva, tudo bem pensado para deixar as noivas tranquilas e relaxadas para o grande dia. Cada detalhe foi preparado com muito carinho!


Suite da noiva - Para um dia de noiva INESQUECÍVEL
(Clique nas imagens para ampliar)


Então é isso, vão conhecer e depois me contem o que acharam, ok?




Pensou em tradição, pensou em Paizinha!








quarta-feira, 5 de março de 2014

Os bancos da Praça do Ferreira - Parte III


AS RODAS E OS BANCOS

A roda composta e liderada pelo então jovens José Elias Bachá e Renê Dreyfus, nela se discutia tudo, inclusive atividades esportivas, em que a maioria era "vidrada", vibrando cada um por seu clube de adesão. Bachá- é claro - torcia pelo "Ceará", do qual viria a ser dinâmico Presidente. A roda se reunia a princípio em torno de mesa do Café Globo e depois se deslocava para um banco da Praça, integrando-a ainda Lívio Bessa Noronha (meu colega de turma no Liceu do Ceará), José Pompeu Gomes de Matos (filho do professor Gomes de Matos), Ivan Paraíba (filho do juiz Hermes Paraíba, que me casaria no civil e seria alçado e desembargador), José Maria Catunda (alto funcionário da Secretaria de Polícia e Segurança Pública), Edilberto Góis Ferreira (dono do referido Café) e mais José Weyne, Clóvis Holanda e Francisco Cordeiro. Eu, às vezes, adejava em torno dela, bem como o então jovem Tarcísio de Oliveira Lima, Secretário do Ceará Sporting Club no período em que meu irmão Tarciso foi presidente dessa agremiação esportiva (1948). 

Em banco fronteiriço à Livraria Alaor sentavam-se alguns estudantes que exploravam a ingenuidade de um rapaz de boa família, costumeiro em dar definições estapafúrdias acerca de tudo, inclusive sobre Deus, que, para ele, era "um invertebrado gasoso, semi-nuvem e semi-além". Refiro-me a Moisés Leitão, irmão do dono da mercearia Joana D'Arc (foto ao lado - de Carlos Juaçaba) e que, por isso, era conhecido como Moisés da Joana D'Arc. Eram integrantes dessa roda Américo Barreira (que viria a ser Vice-Presidente de Fortaleza), Wagner Barreira (que se tornaria brilhante professor da Faculdade de Direito e grande advogado) e o próprio Alaor (filho do dono do estabelecimento em frente e seu atual proprietário). Visceralmente irônicos, os componentes dessa turma quase tornam insano o Moisés da Joana D'Arc, tão constantes eram as instigações, as pilhérias, os trocadilhos e os comentários que faziam a respeito de tudo e de todos, especialmente de sua "vítima" predileta. 

Não propriamente na Praça, mas nas suas imediações reunia-se outro grupo, cujo decano era o bondoso patriarca José Manassés Pontes, pai do juiz Osmundo Pontes e meu antigo vizinho de frente na rua Barão do Rio Branco. "Gente fina", como se diz, haveria Manassés de aglutinar em seu derredor uma plêiade de amigos, tendo como polo a Farmácia Santa Helena (rua Guilherme Rocha nº 167), de Nilo Mendes, seu conterrâneo de Massapê, local da atual Farmácia Confiança
Compunham esse grupo, que vez por outra se deslocava até a praça para uma rodada de cafezinho, Geraldo Lira Aguiar (representante do Laboratório Piam e, depois, alto funcionário da Assembléia Legislativa e do Conselho de Contas dos Municípios), Valdevino Castelo (gerente da Ródia no Ceará e um dos espíritos mais pilhéricos que conheci na vida), José do Nasci­mento (procurador da Fazenda Estadual), Severino César (também agente de laboratório farmacêutico do sul do país no Ceará e genro do Dr. João Saraiva Leão), o Dr. Luís Rolim da Nóbrega (juiz aposentado e pai de José Rolim da Nóbrega, fraterno co­lega meu no Liceu do Ceará e pela vida afora), meu irmão Aluísio (médico pediatra e professor da Faculdade de Medicina do Ceará), Joaquim Morizé de Andrade (depois Conselheiro do Conselho de Contas dos Municípios) e eu, além de outros me­nos assíduos. 


Não em banco, mas na porta da Farmácia Pasteur, com deslocamentos invariáveis ao escritório da empresa, ao andar superior do prédio, pra fruição de gostoso cafezinho, reuniam-se, também, figuras da mais alta projeção político-social, como o Governador Raul Barbosa, O Ministro do T. C. Eduardo Ellery Barreira, o advogado Josias Correia Barbosa e os sócios da firma Moacir Bezerra, Raimundo Freitas Ramos e João Moisés Ferreira, além de outros.
Relativamente à ultima roda, que resiste (1987) à descaracterização da velha Praça do Ferreira, era primeiramente constituída pelo Dr. Rafael de Codes Y Sandoval e por Humberto Patrício Ribeiro, o futuro governador Paulo Sarasate Ferreira Lopes, José Marinho (corretor), João Campos (do Car­tório João de Deus e tio de Luís Campos), Dr. Vinícius Ribeiro (advogado), José Denizard Macedo de Alcântara (professor), Dr. Turbay Barreira, Dr. Carlos Ramos (que seria desembargador no Rio de Janeiro), General Carlos Cordeiro, General Dr. Carlos Studart Filho, desembargador Eugênio de Avelar Rocha, enge­nheiro Hugo Rocha (da Rede de Viação Cearense), Abraão Romcy, Pedro Riquet e Omar dos Martins Coelho, todos faleci­dos, e mais Sebastião Arruda Boto (outro líder do grupo), Ed­gar Patrício Ribeiro, Dr. Elcias Viana Camurça, o jornalista Stênio Azevedo, o professor Geraldo da Silva Nobre, Samuel Tabosa (gerente da Empresa Ribeiro no Ceará), Lourival Pereira (ir­mão do deputado Horácio Pereira), Jaime Leite (dono da "Casa de Borracha"), Francisco Ferreira Costa (Costinha, alto funcionário aposentado do Banco do Brasil, ex-Diretor do Banco Central no Ceará e membro do Conselho Fiscal do Banco do Nordeste do Brasil e do Banco do Estado do Ceará, mercê de seu dotes de inteligência e preparo, e cunhado de meu irmão Aluísio), o Acadêmico João Jacques Ferreira Lopes, Alfredo Moreno (antigo proprietário do Eden Café), Antônio Braga, Jaime Cavalcante, Jaime Ferreira, Nelson Caracas, Sílvio Braga e mais alguns, todos vivos, graças a Deus. Eu, por vezes, ando por lá, fruindo a gostosa prosa desses recalcitrantes, que resistem à massificação da Praça, consequente de sua última reforma (1968/69), pois hoje, não dispondo de um cômodo banco de madeira no logradouro, seus membros se reúnem, mesmo em pé, no início (lado leste) da galeria do Edifício São Luís, pela manhã e principalmente à tarde. 



Que eu não peque por omissão, deixando de registrar a existência de nova roda que teima em formar-se na Praça, em frente ao Cine São Luís, de pé, na proximidade de uma de suas duas bilheterias, a do lado norte do prédio. Compõe-se de funcionários aposentados do Bando do Brasil e do Banco do Nordeste do Brasil, dentre os quais distingo meus amigos Tomás Pompeu Gomes de Matos, José Osmar Nobre e Francisco Ferreira Costa (Costinha), integrante também da roda anteriormente referida. E ainda o professor de direito Alcimor Aguiar Rocha e os bancários José Ícaro Loureiro Maia, Mauro Rodrigues Oliveira, Airton Saboia Valente e Geraldo Coelho de Sousa



Os bancos da Praça não serviam apenas para aglutinar grupos mais ou menos homogêneos. Eram, por vezes, tribunas improvisadas para oradores de todas as colorações políticas, até que o Prefeito Godofredo Maciel construiu, em 1925, o afamado "Co­reto", de vida efêmera, pois já em 1933 o Prefeito Raimundo Girão o derrubaria, para substituí-lo (não no seu exato local) pela também já desaparecida Coluna da Hora
Se podemos classificar de mais românticas a Praça da Lagoinha, se a Castro Carreira sempre mereceu a preferência de tipos exóticos e malandros, se as praças do Coração de Jesus, do Carmo e do Patrocínio notabilizavam-se pelos novenários, a do Ferreira foi, durante muitas décadas, "o centro de atração de intelectuais, políticos e comerciantes, que debateram a crise brasileira"


De zona a princípio residencial (não esquecer que o boticário Ferreira tinha nela, como outros, o seu estabelecimento comercial, mas nela também residiam eles), passou a estritamente comercial e política, social e cultural. E nesta metamorfose seus quiosques, Cafés, casas de pasto, livrarias, cinemas e bancos exerceram papel preponderante. (Abelardo Montenegro, idem, p. 42). 


Tem sido ela, desde o tempo em que disputou e ganhou do Passeio Público a condição de coração da cidade, a sede do Ceará Moleque, de saudosíssima memória, quase inexistente hoje com a influência massificadora dos programas importados de televisão. 


Mozart Soriano Aderaldo

Fim

Leia também:

Parte I
Parte II
Fontes: Portal da História do Ceará (Gildásio Sá), ACL 1995/1996, Nirez


domingo, 2 de março de 2014

Os bancos da Praça do Ferreira - Parte II




Outro banco também se tornou famoso, porque dele fez parte o jovem matuto Joaquim Pimenta, para cá vindo sob a proteção do vigário de Tauá, depois bispo de Pelotas, Dom Joaquim Ferreira de Melo. Veio e depois tornou-se materialista, não obstante sua origem, fazendo jus ao qualificativo de agitador se essa expressão já vigorasse naquele tempo. É dele mesmo o depoimento: - "Na Praça do Ferreira, quando nos reuníamos, tudo se discutia, desde a colocação de pronomes, muito em voga por influência de Cândido de Figueiredo,
até política e religião"
("Retalhos do Passado", Rio de Janeiro, Editor A. Coelho Branco F2., 1949, p. 68). 

Gustavo Barroso dá-nos notícia desse "banco da Praça do Ferreira em frente da Empresa
Telefônica
"
, abrigada esta em prédio de duas portas, com mirante, sito na rua Floriano Peixoto, entre o da Agência Alaor e o Eden Café. Eram principais companheiros de Gustavo os pintores Ra­mos Cotoco e Antônio Rodrigues. ("O Consulado da China", Rio
de Janeiro, Edit. Getúlio Costa, s/d, p. 264). 

Fala-nos ele desse mesmo banco em outro livro seu, quando depõe a respeito da atuação de Joaquim Pimenta e de outros, como Mamede Cirino, "filho do melhor sapateiro da terra", e Oscar Pinto de Lima, "o Pinto Molhado, que morreu médico do Exército, namorando de olhos dengosos uma cadeira de Deputado Federal por obra e graça do Padre Cícero". ("Liceu do Ceará", Rio de Janeiro, Edit. Getúlio Costa, 1940, p. 159).

Assinaladas fiquem, igualmente, as turmas responsáveis pela circulação da revista "Fortaleza", integrada por Mário Linhares, Genuíno de Castro, Raul Uchoa e outros; do jornal "O Demolidor", sob a liderança de Adonias Lima; e da filha "Os Novos", sendo estes Filgueiras Lima, Luís Ábner Moreira (depois oficial do Exército), Walder, Amadeu e Lelando Sá. Todos esses grupos tinham "cadeiras cativas" em bancos da Praça.

Mais ambulante do que sedentário, mas assim mesmo como seu banco preferido, era Artur Sampaio, filho do Delegado Sampaio e irmão do Dr. Pedro Sampaio. Funcionário dos Telégrafos e solteirão impenitente, em volta dele voejavam alguns rapazes da terra, fruindo sua apimentada verve. Eram eles: Hugo de Gouveia Soares Pereira (colega meu desde o curso do professor Martins de Aguiar, em que nos preparávamos para ingressar no Liceu, e igual­mente contemporâneo meu neste estabelecimento de ensino se­cundário, na Faculdade de Direito e no Tribunal de Contas do Estado), Geraldo Lira Aguiar (colega de folguedos na Praça do Carmo), Iran Benevides, José Perales Aires, José Mílton Dias (mais tarde meu consócio na Academia Cearense de Letras), Hermano Frank, Stélio e Hugo Lopes de Mendonça, Francisco e João Aguiar Ximenes, Otacílio Colares (colega de Academia e compadre meu), Gentil Melo, José Newton Barbosa, Francisco das Chagas Cruz, Lucívio Rocha e outros, muitos outros, pois esse grupo variava conforme o horário (matinal, vespertino ou noturno), a ele aderindo Francisco José Novais, Antônio Drummond Filho, Aluízio Medeiros, João Clímaco Bezerra, Américo Barreira, José Bonifácio Câmara, Manuel Albano Amora (compadre e consócio meu na Academia), Ernesto Pedro dos Santos, Mileno Silva The, meu colega de Academia e compadre Antônio Girão Barroso, Álvaro Lins Cavalcante, Edvar Teixeira Férrer, Paulo Botelho, Gregório Calou, Renê Dreyfus, Waldery Uchoa, Wilson e Walter Fontenele, Wagner e Turbay Barreira, além deste cronista, que a integrava vez por outra. Para que se tenha idéia quanto possível exata da personalidade de Artur Sampaio, recordemos dois dos muitos episódios ocorridos na roda. Certa vez, um dos nossos, moreno
carregado, perguntou "inocentemente" qual a idade de Sampaio, calcanhar de Aquiles dessa interessantíssima personalidade de nossas rodas da Praça nas décadas de 1930 a 1950.
A reação foi imediata: Sampaio quase lhe deu as costas, resmungando alguma coisa, vezo muito seu. Pouco tempo após, o malicioso compa­nheiro, que se achava calçado mas sem meias, oferceu-lhe o esperado ensejo para a resposta cabal, cruzando uma perna sobre a
outra e pondo à mostra sua pele morena. Sampaio não perdeu tempo e indagou onde o malicioso havia comprado aquelas mei­as pretas ... Doutra feita, um dos frequentadores da roda, obser­vando que, a respeito de cada um que se ausentava, Sampaio sempre dizia algo negativo, resolveu sair por último, pensando livrar-se assim de comentários assemelhados. Qual não foi a sua surpresa quando, depois de despedir-se de Sampaio, que ficara sozinho, olhou tranquilamente para trás e viu que o temido com­panheiro o estava saudando com as "armas de São Francisco" ...

Dessa curiosíssima personalidade nos deixou sua forte impressão o primoroso cronista Milton Dias, em artigo publicado em "O Povo" de 11 de julho de 1982, dias após o brutal desastre aviatório em que perdeu a vida seu jovem irmão Batista, que viajava para assistir o enterro de uma cunhada de ambos. Sampaio muito tempo antes, amargurado com a morte de sua mãe, confessara a Mil­ton que "a alegria dos outros o ofendia, que o riso alheio lhe feria fundo, que o aspecto de felicidade que descobria de repente numa pessoa qualquer, amiga ou desconhecida, lhe promovia uma re­volta enorme. Tinha ganas de sair atirando, proibindo as manifes­tações de bem-estar, que lhe pareciam um acinte à sua dor. Era um homem sozinho, que escondia sua tristeza, sua solidão, seus preconceitos e frustrações na conversa inteligente, cheia de pilhé­rias que não poupavam ninguém e que depois se distribuíam um pouco por. toda parte - um homem que eu conheci já na meia idade, espirituoso, irreverente, cáustico, um solteirão que toda noite fazia rir seu grupo de ouvintes atentos. Isto ao tempo em que a Praça do Ferreira era o ponto de encontro obrigatório - e ali, sentado naqueles bancos anatômicos de saudosa memória,  ele pontificava, balançando uma perna cruzada sobre a outra, vestido num branco impecável, um anel de brilhante no dedo
mínimo, o olhar travesso por trás dos óculos, o riso matreiro. (. .. ) 
Ele era um homem sofrido, viajado (quem sabe, algumas vezes humilhado pela vida), fazendo questão, no entanto, de parecer muito seguro de si, muito triunfante, falando de um passado social animado, de festas esplêndidas da alta sociedade em que bri­lhara, nos grandes bailes, nos blocos de carnaval, na elegância, nas conquistas, nas fofocas dos tempos de dantes. Era esta a sua glória maior"

Milton, ainda não ferido pelos espinhos da vida, "um menino que ainda não trazia no corpo e na alma as marcas do tempo", haveria de estranhar aquela atitude francamente niilista de Sampaio. "Daí meu choque (escreveu ele) diante daquela afir­mação que me pareceu egoísta, do homem idoso, andado, ampu­tado de muitas pessoas de seu bem-querer, marcado pela convivência com o sofrimento e com a morte, homem que escondia heroicamente as suas depressões, que tinha pudor das suas angústias, que não confessava fracassos nem desgraças, incapaz de fazer alusão até mesmo às dificuldades financeiras, guardando uma constante de orgulhosa dignidade. Falava muito dos outros e pouco de si". A confissão necessariamente pareceria mesquinha, exagerada, e causaria surpresa. "Muito tempo foi preciso até que  o entendesse" - confessou Milton, afinal, ao embalo da dupla
tragédia que levou a cunhada ainda jovem e o irmão cheio de vida que vinha confortar o outro irmão.

Concomitantemente com a roda (ou as rodas) de Artur Sampaio, reuniam-se em outro local alguns rapazes, muitos deles oriundos de Redenção e de Limoeiro. A preferência recaiu, a princípio, na alameda próxima da esquina das ruas Major Facundo e Guilherme Rocha, formada pela calçada existente entre o meio­ fio limitativo da Praça e uma das passagens de carro abertas com sacrifício do espaço do logradouro, e por isso por eles chamada de Ponta-Porã, Território Federal criado pelo Estado Novo e de­pois extinto pela Constituição de 1946. Não havia banco, mas era como se houvesse. Lembro-me bem dos irmãos Vieira (Francisco, conhecido depois por "Senador", Antônio, já falecido, e o Dr. José Moura, futuro advogado); os irmãos Nascimento (Geraldão, Bibiano e César, filhos de Waldemar, ex-Prefeito de Redenção, todos emigrados para o Rio de Janeiro); os irmãos Camarão (Roberto, depois comerciante, e Fernando, futuro advogado); os irmãos Oliveira Qosé Filho e Antônio, o Nozinho); e mais Tarcízio de Oliveira Lima (alto funcionário da Previdência Federal), Lúcio Bonfim, Helano Montenegro (hoje corretor de imóveis), Antônio Emérico de Sousa (depois advogado), o futuro empresário Osmar Pontes, Otacílio Rodrigues (o Tota), Pedro Rogério de Aguiar Fi­lho (aviador civil, hoje em São Paulo), Antônio da Silva Benevides, José Leonardo Caminha, Alexandre Cavalcante (o "Coronel"), e Pedro Moreira de Queirós (futuro dono da Petrojóias, estabelecida na rua Perboyre e Silva nº 186). Eu também frequentei essa roda que, posteriormente, se fixou em um dos bancos da Praça, preci­samente o que se situava ao pé da Coluna da Hora, em sua face oeste, olhando para a Farmácia Pasteur e o Cine Majestic. Como igualmente frequentei outras: a do Grupo Clã, a de líderes católi­cos (especialmente confrades vicentinos), a liderada por José Elias Bachá e Renê Dreyfus, a de Moisés da Joana D'Arc, a do bondoso capitalista José Manassés Pontes, e a do Dr. Rafael de Codes Y
Sandoval
e Sebastião Arruda Boto, que foi a que mais resistiu, ainda hoje se reunindo ao lado do Cine São Luís, embora desfalcada. 


Não me seria lícito, por excessiva ou falsa modéstia, deixar de por em seu devido e alto lugar os frequentadores do banco em que se sentavam os membros do futuro Grupo Clã, de grande e prolongada repercussão cultural no Ceará, o maior dos últimos tempos, sem qualquer dúvida. Compunham-no Fran Martins, An­tônio Girão Barroso, Aluízio Medeiros, João Clírnaco Bezerra, Stênio de Lucena Lopes, Otacílio Colares, Artur Eduardo Benevides, Eduar­do Campos e eu. Esse banco da Praça foi, quando o grupo cresceu, substituído pelas cadeiras e mesas do Eden Café, estabelecido na face leste do logradouro. 

Prestigiavam-no os "mais velhos" Martins Filho, Joaquim Alves e Braga Montenegro, e admiravam no os "novinhos" Eliardo Farias, Durval Aires, Jairo Martins Bastos e Germano Pontes. Como já nos foi dado dizer, esse grupo, com o fechamento do Eden em 1948, emigrou para o Café do Comér­cio em sua terceira fase (rua Major Facundo nº418). 



Já nos foi oferecida a oportunidade de dizer que havia um banco na Praça frequentado pela jovem liderança católica da ter­ra, especialmente "vicentinos". Situava-se também em frente ao prédio da antiga Empresa Telefônica e seus frequentadores se deixaram fotografar para a posteridade. Essa fotografia, divulgada por Miguel Ângelo de Azevedo (Nirez) em "O Povo", mereceu reparos de minha parte, motivo pelo qual foi reproduzida depois. 



Nela se vêem Florêncio Coelho de Holanda (comerciantes de couros), Luís Augusto Caracas (bacharel em Direito), José Moacir Teles (economista e bancário), Francisco Gentil Nogueira (comerciante e funcionário da Ceará Gás Butano), Itamar Santiago Espíndola (ad­vogado e filólogo), Francisco de Assis de Arruda Furtado (advoga­do e escritor), José Eymard de Arruda Furtado (bacharel em Direito e bancário), José Vicente Ferreira, o Cazuza (santo homem e sapa­teiro com oficina em casinha da rua do Pocinho, lado sul; destruída para a organização de um estacionamento de automóveis e posterior construção de mais outro edifício do Grupo Clóvis Rolim, tal como ocorreu com as demais de sua vizinhança), Manuel Aquino dos Santos (dono da Tipografia Santos, sita na rua Floriano Peixo­to, lado de números ímpares, em prédio desaparecido para no local levantar-se a Casa do Jornalista, e líder trabalhista, tendo sido Presidente da Legião Cearense do Trabalho), Ubirajara Borges (comer­ciante e pai do comunicador Augusto Borges e do Cel. Uirandé Borges), Leandro Pimenta Lira (jornalista e estatístico), o cronista que escreve estas relembranças, além de outros.

Mozart Soriano Aderaldo




Continua...
Parte I
Fontes: Portal da História do Ceará (Gildásio Sá), ACL 1995/1996, Nirez


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