Fortaleza Nobre | Resgatando a Fortaleza antiga
Fortaleza, uma cidade em TrAnSfOrMaÇãO!!!


Blog sobre essa linda cidade, com suas praias maravilhosas, seu povo acolhedor e seus bairros históricos.

quinta-feira, 24 de junho de 2010

O bonde (XII) - Praça José Bonifácio

Sim. É verdade e deve ter acolhida o que se diz: quem é saudosista já goza entre os mortais mais direito de sentir saudade; essa dor pungente que vem de dentro do peito apertando nosso doído e combalido coração com o passar do tempo fraqueja, perde as forças quando sente se esvair numa espiral de fumaça que se desfaz no ar, deixando imorredouras lembranças que torturam a memória. São recordações que vêm da infância, da juventude a se apegar na velhice tudo tão repentino deixando tristeza dentro de nós. Haja coração para suportar as ilusões que se afastam e quando voltam para festejar o que ficou para trás, trazem o amargo do sabor dos desenganos marcados pelo tempo que não se compadece nem se comove.

Pois é assim, nós os saudosos do passado, que nos sentimos quando vemos passar o tempo recobramos das nossas mentes os episódios vividos, que modulam e embalam os nossos sonhos e naqueles momentos se colorem com tintas vivas o cenário que ficou para sempre gravado na nossa existência.

Ah, tempo ingrato! Inexorável aos mais sutis rogos, implacável no percurso a que se propõe a fazer não se compadece, não se condói nem dos passageiros dos bondes de nossa cidade - Fortaleza dos anos 20, 30, 40 em que todos se conheciam e tinham suas histórias para contar... até no bonde.

A beleza estava também na paisagem descortinada nas ruas por onde o bonde passava. As pessoas ficavam animadas à espera dos passageiros que desciam e subiam no bonde feericamente iluminado, alegravam nosso coração. As jovens casadoras cujas mãos frias, mas acelerado coração, esperavam que a noite descesse e temerosas suspiravam ansiadas aguardando a chegada do bem amado que, invariavelmente, bem vestido, de preferência paletó acetinado de linho branco bem engomado por antigas passadeiras, cujo brilho cintilante prendia a atenção dos observadores. Desciam do bonde exalando o perfume da época - Royal Briar ou Promessa, Je Revien ou o afamado Chanel n. 5! Dependia da condição econômica de cada qual. Os ricos, endinheirados (arranjados) comerciantes, os plebeus e os estudantes coitados (principiantes ainda não tinham posição definida). Mas todos se utilizavam dos nossos bondes porque a burguesia era composta por minoria que podia possuir condução própria (automóvel) e se contava nos dedos...

O que importava era o passear de bonde nas diversas linhas a se deleitar pelo encantamento que o momento ensejava, deixando as palavras fluir ao ouvido, sob forma de galanteios, cheios de suspiros que eternizavam a alma da amada que se enflorava de desejos.

Assim era a linha de bonde José Bonifácio, a menor em extensão, mas tão importante e opulenta como as demais linhas de bonde que se iniciaram no engrandecimento de nossa cidade. Como a maioria dos bondes, o José Bonifácio saía da Praça do Ferreira - lado oeste da praça - pela Rua Major Facundo (antiga rua da Palma) e numa reta ultrapassava a Av. Duque de Caxias - Praça do Carmo, ao lado da Igreja do Livramento (depois do Carmo) - Associação dos Merceeiros até a rua Domingos Olímpio. No retorno, trocava a posição da lança, virava para frente os bancos e o condutor passava a ocupar a outra parte do bonde (frente), regressava pela mesma rua até alcançar a Clarindo de Queiroz, entrando à esquerda na rua Floriano Peixoto até chegar na Praça do Ferreira - lado leste, contornando a praça pela rua Guilherme Rocha e dobrando à esquerda na rua Major Facundo, reiniciando pelo ponto de partida em frente à Farmácia Pasteur para novo trajeto, como as demais linhas.

A nossa ilustre passageira do bonde José Bonifácio é a muito querida Sra Maristela Benevides de Alencar, viúva do ilustre cientista, doutor, professor Joaquim Eduardo de Alencar, nascida no dia 08 de julho de 1917, filha de Arthur Feijó de Sá e Benevides e Maria do Carmo Eduardo Benevides, irmã do Príncipe dos Poetas - Arthur Eduardo Benevides. São seus filhos: Vera de Alencar Moreira Pinto, casada com Dr. Djacir Moreira Pinto, médico; Eduardo Sérgio de Alencar, formado em Geografia pela Universidade Autônoma do México, casado com Ana Maria Xenofonte Barreto de Alencar; Sílvio César de Alencar, formado em Economia pela Universidade Federal do Ceará, casado com Norma Targino de Alencar.

Por ocasião dos 80 anos do tão querido e amado irmão Eduardo - Príncipe dos Poetas, sua irmã Maristela escreveu esta mensagem: 

“A estação de Pacatuba outrora era grande... mas, hoje, tudo mudou; a nossa infância se tornou adulta, cresceu, o trem com seu apito varando o céu e abrindo estradas perdeu-se no tempo. E a nossa estação tão pequenina permanece grande dentro da nossa saudade. Se eu fosse poeta lhe ofereceria hoje o mais belo poema feito de amor, de saudade e recordações da nossa infância e da nossa querida e inesquecível Pacatuba, onde vivemos todos os dias sem previsões para o amanhã e embalados pelos nossos sonhos jovens. Ah! O espinho que mais fere é o espinho da saudade. E parafraseando a nossa prima Cecília Meireles, cantemos a passagem dos tempos!” (Maristela - julho de 2003).

E no dia do seu aniversário - dia 08 de julho de 2000 - escreveu este monólogo:

“Já vivi o que tinha de viver, Provei na vida glórias e tristezas, Andei pelas estradas fazendo minhas trovas E continuo cantando as minhas alegrias e o meu sofrer. Mágoas nunca guardei, Só de Deus encho meu coração. Passando agora a minha vida a limpo Vejo que nada fiz de extraordinário A não ser cultivar o amor e a esperança” (Maristela)

Agora o nosso último percurso de linha de bonde que encerra uma série de doze - a de José Bonifácio, que desde 1912 até os dias idos de 1947, juntamente com as outras linhas circularam na nossa cidade durante 35 (trinta e cinco) anos. Já faz muito tempo (56 anos de sua retirada) e as saudades continuam vivas e persistem gravadas no besunto de todas as ruas, quarteirão por quarteirão (quadras), casas, locais panorâmicos que embeveciam nossas mentes, colocando cada coisa no seu devido lugar, como se estivesse a rever o mostruário de um bazar que se armazenou na nossa lembrança, que se desenrola para avivar as saudades do tempo que se foi e não volta mais. Até as tristezas tomaram nova roupagem - para se manifestar na saudade, amenizando a dor da partida; porque o tempo também não pára e na sua corrida tudo desfaz.

Assim, em breve relato, lembremos aquele transporte movido a eletricidade pelos diversos bairros Jacarecanga, Soares Moreno, Via Férrea, Benfica, Praia de Iracema, Prainha, Aldeota, Alagadiço, Farias Brito, São Gerardo, Joaquim Távora - Visconde do Rio Branco e José Bonifácio e dizer éramos felizes e não sabíamos.

Não poderia deixar agora de exaltar o único excelente trabalho até agora conhecido sobre A História da Energia no Ceará, que nos legou o ilústre professor universitário, jornalista e pós-graduado pela École Nationale d’Administration de Paris, e South Dakota University, onde obteve o título de Master in Government - Ary Bezerra Leite - in “História da Energia no Ceará”, In verbis:

“Existem 39,7 kms de cabo-trolley montados em 308 postes roliços e 341 postes de grade de ferro. Linhas aéreas de luz e força: linha de alta tensão, 6.600 volts, 3 fases, 36.156 metros, construídas sobre 788 postes de madeira de 6'' por 10 metros, 19 postes de aço roliço e 3 postes de grade de ferro; linhas subterrâneas de alta tensão: 2.460 metros; linhas de baixa tensão de corrente alternada: 2 fios, 1 fase - 28.292 metros; 3 fios, duas fases - 2.425 metros; 4 fios, 3 fases - 88.376 metros; linhas de baixa tensão e corrente contínua: 3 fios, 500 volts - 28.985 metros; 2 fios, 500 volts - 2.200 metros. Estas linhas foram construídas sobre 838 postes de madeira, 84 postes de aço roliço, 417 postes de trilho, 22 postes de grade de ferro. Linhas subterrâneas de baixa tensão, 440 volts - 990 metros”. Pág. 69.

“A paralisação dos bondes elétricos ocorreu a 19 de maio de 1947, em caráter ‘provisório’ e, definitivamente, a 17 de agosto do mesmo ano, por decisão do interventor federal na empresa capitão Josias Ferreira Gomes, após 33 anos de serviços que marcaram o cenário da cidade e, de forma indelével, a lembrança dos que foram seus usuários. Diversos fatores contribuíram para esse final, ocorrido quando, no período de transformações do após-guerra, o Brasil vivia uma fase de redemocratização, conhecendo novas lideranças políticas e novos valores culturais. No parecer apresentado pelo interventor, foram oferecidas as seguintes razões para a desativação definitiva dos bondes:

- Redução da capacidade de usina em caldeiras, ocasionada pela retirada de serviço para conserto, de conformidade com o parecer de técnicos do Estado, de duas caldeiras, o que provocou imediatamente a paralisação de duas máquinas de C.C. destinadas à tração elétrica;

- o estado precaríssimo em que se achavam o material rodante e trilhos que não mais correspondiam às exigências de tráfego e nem a necessária segurança dos passageiros;

- impossibilidade de manutenção do serviço por falta de estoque de trilhos e peças sobressalentes;

- deficiência econômica e financeira da companhia em organizar o serviço com seus próprios recursos ou adquirir sobressalentes para manutençào do atual serviço;

- efeitos perturbadores e malévolos do serviço de bondes sobre o serviço de fornecimento de energia, por ser aquele um serviço pesadamente deficitário, obrigando o funcionamento de máquinas antiquadas e antieconômicas e, principalmente, por anular a possibilidade de reduzir o preço do kilowatt, bem como desviar saldos obtidos no serviço de fornecimento de energia elétrica de sua melhoria de instalação para a manutenção do serviço de bondes;

- inexequibilidade de reorganização do serviço em face das insuperáveis dificuldades em levantar o capital necessário ao empreendimento (Cr$ 60.000.000,00), quer no ambiente nacional, quer no estrangeiro; tendo ainda evidenciado a mesma autoridade que o capital acima era superior várias vezes ao que já foi remetido, sob qualquer título que não fosse para aquisição de material à sede da companhia em Londres e que, com a paralisação do serviço de bondes, poderia ser imposta uma multa à companhia para quando houvesse interrupção de fornecimento de energia à cidade por culpa da mesma.” (Pág. 73-74)


Zenilo Almada Advogado

Condutor - Trata-se, na verdade, do motorneiro, que dirigia o bonde; condutor é o nome dado ao cobrador de passagens. Para maiores detalhes a respeito do procedimento de inversão de sentido do veículo, bem como dos componentes envolvidos, ver as notas ao fim do artigo “O bonde (V) - Benfica - Igreja dos Remédios”.

Porque o tempo também não pára e na sua corrida tudo desfaz - De fato, conforme nos relata o Dr. Almada, tudo que é suprimido de modo abrupto e total gera nostalgia e sensação de perda, e é natural sentir essa tristeza ante a substituição devastadora, isto é, o conceito de modernização ou progresso que não inclui a adaptação e o aproveitamento de coisas existentes e/ou antigas ainda úteis e não obsoletas. A supressão total dos sistemas de bondes, que ocorreu nas cidades brasileiras - e de alguns outros países - deve-se a uma visão administrativa de pouca abrangência. Em muitas outras nações, no entanto, os bondes - ou trans, ou “light rail vehicles”, ou, em Português, “veículos leves sobre trilhos”, VLT - nunca foram legados ao rol das “coisas passadas”, evoluindo da mesma forma que evoluíram os ônibus e demais meios de transporte, e, em alguns casos, veículos tradicionais receberam adaptações modernas; há também circuitos que mantém e preservam seus bondes antigos praticamente tal e qual sempre foram, como ocorre no sistema de Santa Teresa (Rio de Janeiro). Realmente, o tempo passa, ou nós passamos por ele, no entanto depende de nós a escolha entre o desfazer tudo ou combinar seletivamente o que seja bom, útil e agradável do antigo e do novo. O Tempo, por si mesmo, é neutro.


Veja também:
Crédito: Artigo publicado no Diário do Nordeste - Fortaleza. Ceará - Domingo, 14 de dezembro de 2003

quarta-feira, 23 de junho de 2010

O bonde (XI) - Prado

Bonde em 1943, linha Prado - Arquivo Nirez

Naquele tempo só se falava em bonde, quando se queria passear. Era o que havia de mais “chic” subir, tomar assento no bonde. Às vezes os admiradores, hoje “paqueras” já estavam de olho e coincidentemente (sofismas) se encontravam no mesmo local, e daí se iniciava o diálogo, quase sempre a costumeira linguagem dos principiantes do namoro. Geralmente se comentava que a jovem era muito presa aos princípios e costumes da casa dos pais, não tinham nenhuma “folga”, liberdade para sair com o namorado mesmo que fosse o jovem mais disputado da urbe (cidade), porque muitas vezes pesavam fortes acusações de ser um Dom Juan, que só pensa em iludir as incautas donzelas deixando-as muitas vezes na “peça” ou no caritó, como forma de condenação se dizia das moças que haviam ultrapassado a faixa dos trinta anos. Tão diferente de hoje... a começar pela liberdade sob todos os aspectos. Enfim não é necessariamente a prisão dos pais aos filhos, o exagero do recatamento que propicia a felicidade conjugal ou sirva de garantia para êxito dos jovens nubentes. Mesmo porque muito antigo é o refrão que diz: “Casamento e mortalha no céu se talha”. Hoje, modernamente se proclama - “quem ama com fé, casado é...”, até porque hoje mesmo se “casado na igreja verde” tem-se assegurado direitos de companheira, porque o concubinato está ficando em desuso. É letra morta na convivência conjugal, não está mais adstrito ao concúbito, porque os casais dormem até em camas separadas, quanto mais em domicílios... Há outros modos de comprovar a convivência de fato. Mas, deixemos de lado o concubinato, companheirismo e outros tipos de liames, e vamos percorrer de bonde a linha do Prado, carregado de saudades. Talvez por alusão ao local das corridas de cavalos, tenha sido denominado o bairro com referência ao hipódromo, porque se tem conhecimento que de lá se partia para a corrida de cavalos, por apostadores e tangerinos que vinham dos sertões. Dizem que o maior criador de gado que havia naquela época era o Cel. Antônio Diogo, que dominava o mercado da “carne verde”, como assim era chamada para diferenciar da “carne velha”, carne do sol ou salgada. Já naqueles tempos havia uns com tanto e outros com tão pouco... Foi também doado Leprosário Antônio Diogo, que deu origem ao município com o mesmo nome.

Rua Guilherme Rocha - Anos 20

Mas voltemos à vaca fria e subamos no bonde do Prado cujo ponto de partida era o seguinte: - “No início dos anos 1930, as linhas de bonde já estavam ampliadas para diversas áreas da cidade, como Praia de Iracema, Av. Epitácio Pessoa, Praça José Bonifácio e Prado, e outras tinham sido prolongadas como Fernandes Vieira (até a Escola de Aprendizes de Marinheiros), Alagadiço, Via Férrea e Estação (Joaquim Távora)”.

Todas as linhas operadas por bondes elétricos partiam da Praça do Ferreira, onde existia um posto de controle, ou da Travessa Morada Nova (por trás do atual Museu do Ceará). Assim, a linha do Prado - o bonde se deslocava da Praça do Ferreira - fazia o contorno da praça e seguia pela rua Guilherme Rocha até a rua General Sampaio à altura do antigo Bar Americano, dobrando à esquerda na Praça José de Alencar para alcançar a Av. Visconde de Cauípe, dobrando à esquerda na Av. 13 de Maio, prédio da Reitoria - antiga vivenda da família Gentil - chegando à rua Marechal Deodoro - (antiga Cachorra Magra) defronte ao Bar do Bola de Ouro, onde predominava o jogo de sinuca nas confluências do Prado - hoje Estádio Presidente Vargas, com separação das duas áreas. O percurso de volta era feito pela Marechal Deodoro, passando em frente ao Ponto Chic e à Mercearia Esporte Clube, entrando à direita na rua Domingos Olimpo até chegar à Floriano peixoto, alcançando a Praça do Ferreira.

Parece que a ideia de ainda se ter de volta os tão saudosos bondes não desapareceu da cabeça dos nossos administradores, como o prefeito Juraci Magalhães, que afirmou na imprensa que iria a Portugal com o objetivo de conhecer vários projetos urbanísticos desenvolvidos naquele país e, principalmente, trazer “know-how” do chamado VLT - Veículo Leve Sobre Trilhos -, espécie de bonde refrigerado que segue concepção de um metrô de superfície. O prefeito o considera viável para a capital cearense e diz que quer implantar um VLT no trecho Parangaba - Mucuripe. É, por conseguinte, uma ideia louvável que por certo terá a mais ampla aceitação por parte dos seus munícipes que desde já aplaudem tão necessária e imperiosa iniciativa que muitos benefícios trará à população.

Mas, enquanto não chega o “bonde refrigerado”, vamos anunciar a nossa passageira ilustre do bonde do Prado, nossa tão querida e estimada professora Irene Barbosa de Arruda, que deu inequívoca e valiosa contribuição ao ensino médio desta capital durante longos anos à frente da Escola Normal Pedro II.

Irene nasceu em 4 de abril de 1917, em Rio Branco - Acre, filha dos cearenses - José Macário Barbosa e Cecília Cabral Barbosa. Com o falecimento de sua mãe veio residir em Fortaleza, em 1929, na companhia de sua tia Cleonice Cabral Nunes de Melo, concluindo o curso normal.

Postal de 1925 - Foto do livro Lembranças do Brasil - As capitais brasileiras nos cartões-postais e álbuns de lembranças. Trecho muito antigo da Praça do Ferreira, vemos ao fundo e a direita, o antigo sobrado do comendador Machado, hoje substituído pelo Excelsior Hotel.

Num dia marcado pelo destino, a passageira do bonde que fazia a linha do Prado conheceu o cavalheiro de alto bordo - Raimundo Leopoldo Coelho de Arruda Filho, conceituado advogado, com quem veio a casar-se em 1938. São seus filhos Vera Sílvia, casada com Sílvio Roberto de Almeida e Castro, Regina Alice, em segundas núpcias com Danísio Dalton da Rocha Correia, Francisco Roberto, casado com Cássia Azevedo Fernandes e Teresa Lúcia, engenheira de pesca, solteira.

Com sua vocação para o magistério começou a acalentar o sonho de ser professora e cooperar com a educação do Ceará e após a conclusão de seus estudos, já nomeada professora substituta efetiva do Grupo Fênix Caixeiral, ministrou durante oito anos aulas às crianças, comprovando o amor e a dedicação, reafirmando que escolhera a profissão certa. Nasceu para ser professora. O magistério foi o seu ideal. Sua identidade com a sala de aula e suas alunas se misturava entre transmitir o saber, experiência cujo aprendizado tomava forma e proporção numa simbiose que no tempo não demorou a fluir os loiros, agigantando-se de conhecimentos naquela professorinha que só amor, dedicação e obstinação reinava na sua mente já direcionada ao ensino público. Foi o ceará, a terra mãe por ela escolhida, para servir de berço ao cabedal de jovens que dela se aproximavam ávidos de receber orientação, ensinamentos, para também saírem a propalar o bálsamo da sabedoria que lhes fora transmitida pela mestre Irene Arruda, como era chamada.

Submetendo-se a vários concursos para o cargo de professora, obteve sempre ótima classificação, assumindo o cargo de Técnica Auxiliar de Educação, com responsabilidade de lecionar aulas em diversos grupos escolares da capital.


Parada de bondes na rua Guilherme Rocha, foto Aba Film, 1939

Obteve o primeiro lugar no concurso para professora de Economia Doméstica, vindo a integrar o corpo docente como catedrática da Escola Normal Pedro II, exercendo depois por nomeação o cargo de professora de Trabalhos Manuais e Economia Doméstica nos quais tornou-se titular.

Em 1956 foi nomeada 1a vice-diretora da Escola Normal Pedro II. Em 1958, galgou todos os degraus que a levaram a ser diretora do Colégio Estadual Justiniano de Serpa durante seis anos, deixando comprovado o seu amor e a sua dedicação ao ensino do Ceará, o que valeu para especialização de vários cursos inclusive nos Estados Unidos.

Em 1966 aposentou-se como professora e diretora. Mesmo assim, não parou de estudar e prestou vestibular para o Curso de Pedagogia na Universidade Federal do Ceará, concluindo em 1970 e aclamada para ser a oradora da turma, coroando com êxito os 38 anos dedicados ao Magistério e assumiu a Secretaria de Educação do Estado.

Hoje, a professora Irene representa um dos ícones da sociedade cearense, participando ativamente de todos os movimentos intelectuais, numa evidente demonstração da sua cultura, sobretudo dedicada ao ensino, colaborando com desvelo para o engrandecimento do Ceará, colocando à causa da educação os princípios básicos para o desenvolvimento intelectual e sobretudo cultural, base que solidifica o ensino do aprendizado.

Ainda se pode atribuir ao bonde, o mais importante meio de transporte, que durante muitas décadas prestou inestimáveis serviços à coletividade, carregando passageiros para os diversos locais da cidade, atendendo numerosa classe de estudantes e de outras categorias sociais, facilitando a aproximação, interligando bairros mais distantes e proporcionando com baixos preços cobrados pelo transporte, que comparados aos auto-ônibus e carros de praça (aluguéis) eram bem convidativos por serem mais acessíveis ao bolso da população.

Bondes; postal aspecto em 1925 do Livro Lembranças do Brasil, as capitais brasileiras nos cartões-postais e álbuns de lembranças.

Era fascinante por ser agradável aproveitar nas manhãs de junho e carruajar, recebendo aquela brisa amena nos bondes das diversas linhas da nossa capital, cuja tranqüilidade deixava uma autarcia própria da cidade que ainda engatinhava, mas com ares de metrópole, porque já aportava vasto lastro cosmopolita emigrado de Portugal, França, Itália, Inglaterra, Japão e do mundo árabe que aqui se fixou por ser o Ceará considerado - o Eldorado.

Zenilo Almada Advogado


Portugal - Em Portugal, bem como na Turquia, há cidades (em particular Lisboa e Istambul) que incluem sistemas de bondes antigos e modernos (VLT), geralmente funcionando os antigos nas regiões tradicionais e os modernos nas partes novas das cidades.

VLT - Veículo Leve Sobre Trilhos - O conceito de VLT aplica-se tanto à concepção do metrô de superfície (via seletiva) quanto ao bonde moderno que trafega em meio ao trânsito urbano (via compartilhada).

Juraci Magalhães morreu no dia 21 de Janeiro de 2009


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Veja também:




Crédito: Artigo publicado no Diário do Nordeste - Fortaleza. Ceará - Domingo, 07 de setembro de 2003


terça-feira, 22 de junho de 2010

O bonde (X) - Joaquim Távora Hoje Av. Visconde do Rio Branco - antiga Estrada de Messejana


Bondes perto do Hotel Excelsior, início dos anos 30

Era a segunda mais extensa linha de bonde a da Avenida do Joaquim Távora, também conhecida como estrada ou calçamento de Messejana, hoje Avenida Visconde do Rio Branco, perdendo apenas para a linha do Alagadiço.
Com rigor ainda se pode observar esse logradouro, apesar de ser quase em linha reta, tem várias denominações as ruas que se sequenciam. Tem início na Av. Alberto Nepomuceno seguindo pela Rua Conde D’Eu, prossegue pela Rua Sena Madureira, atingindo a Avenida Visconde do Rio Branco - (antiga Joaquim Távora, Calçamento ou Estrada de Messejana), numa direção quase reta cuja maior extensão continua pelo Alto da Balança (Ministério da Aeronáutica - Base Aérea de Fortaleza - Av. Aerolândia). Ah! E a Lagoa de Messejana, a admirar a linda estátua de Iracema que será construída a se banhar de cuia naquelas águas lacustres; e sentir de perto a beleza da mansão Castelo, da nossa tão querida D. Lúcia Dummar, a lembrar e recitar os poemas de seu pai, o escritor Demócrito Rocha.
Isso é apenas para avivar a memória dos habitantes desta linda Capital e termos uma ideia deste bairro que se interligava a outros.
Não era todo esse, o trajeto do Joaquim Távora, pois o ponto final da linha era em frente do casarão do Sr. Alberto Costa Sousa, respeitável cidadão de fino trato, muita religiosidade e um dos diretores do antigo Banco Frota Gentil S/A.
Entretanto, desde o Centro da Cidade, a Avenida Joaquim Távora tinha abrangência com os Bairros José Bonifácio, Fátima e adjacências, interligando-se com os bairros de São João de Tauape, Alto da Balança, Aerolândia. E por uma estrada estreita, margeando o rio Cocó com suas águas perenes onde predominava uma vegetação que transpirava o perfume de mata-pasto. de manjerioba, chanana, melão caetano, quebra-pedra, pega-pinto e outros arbustos e ervas que exalavam agradável perfume que envolvia a retentiva dando ao olfato o sabor a contemplar com a visão do lugar vivido na essência do seu puro cheiro - de terra orvalhada; chegava-se a Messejana.

Bonde próximo ao Cine Majestic

Mas deixemos de lado as dilacerantes saudades que, sem avisar nem pedir permissão, invadem ocupando todas as dependências da nossa mente e, de repente, sem agradecer se vão; deixando indelevelmente gravada a figura de um inesquecível panorama a confortar o coração combalido pelo tempo. Mas como as saudades não matam, apenas maltratam, matemo-las.
Ao toque repicado da sineta, o motorneiro dava partida no bonde, assim saía o bonde Joaquim Távora da Praça do Ferreira pela Rua Major Facundo, entrava a esquerda na Rua Pedro I, continuava até ultrapassar as ruas Floriano Peixoto, Assunção, General Bizerril - lado norte, à direita lado sul, rua Solon Pinheiro, contornando o Parque da Cidade da Criança; passava em frente ao Colégio São José do Prof. José Leopoldino da Silva, também professor do Liceu, bem como seu filho José Leopoldino da Silva Filho - Engenheiro Agrônomo e Professor. Depois de alcançar as ruas Pinto Madeira, Pero Coelho e ultrapassar a Av. Duque de Caxias - Heráclito Graça - iniciava a Av. Joaquim Távora - hoje Visconde do Rio Branco - antiga Estrada de Messejana, como era no século passado conhecida - até o número 2.800 - residência do Sr. Alberto Costa Sousa.
Nosso passageiro ilustre do bonde Joaquim Távora, hoje Av. Visconde do Rio Branco e, à sua época Estrada de Messejana, nasceu na aprazível vivenda da família Caracas, de no 736, depois de no 2.008, e é o nosso muito estimado primo, o engenheiro José Euclydes Caracas - filho do professor Francisco Dias da Rocha e D. Leopoldina Caracas. Avós maternos: capitão Pacífico da Costa Caracas, abastado agricultor na serra de Baturité, de grande descortino econômico, fundador da família Caracas, e Ana Felícia de Lima Caracas. Avós paternos: Joaquim Dias da Rocha, negociante português e abolicionista, pertenceu ao partido Libertador - da Sociedade Cearense Libertadora - e entidade Perseverança e Porvir, e D. Francisca de Paula Cavalcanti (solteira), após o casamento Francisca de Paula Dias da Rocha.
Nasceu no dia 22 de maio de 1900 em Fortaleza, na vivenda no 736, do Calçamento Messejana, depois Avenida Joaquim Távora no 2.008 - hoje Avenida Visconde do Rio Branco, vizinho ao Colégio das Dorothéias, local hoje desapropriado pela Prefeitura Municipal para alargamento da Rua Domingos Olímpio.
O ilustre Dr. José Euclydes Caracas, após concluir os preparatórios no Colégio São Vicente de Paula - em Petrópolis, formou-se em engenharia civil pela Escola Politécnica do Rio de Janeiro em 1925. Trabalhou na construção da Estrada de Ferro Centro-Oeste de Minas, em 1931; passou a integrar o quadro de engenheiros do Departamento de Portos, Rios e Canais, com elevado cargo de chefia; membro do Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura - CREA - CE; conselheiro na implantação do Plano Rodoviário do Estado do Ceará; membro da Delegacia do Trabalho Marítimo, credenciado pelo antigo I.A.P.C.. Desempenhou suas funções como engenheiro no acababamento das obras de construção do Edifício São Luís.
Casou com Ana Gouveia Mota, filha de José Porfírio da Mota, Fiscal de Consumo na região Norte do Ceará e de Francisca Barros de Gouveia - todos da cidade de Granja-CE. São seus filhos: Hélio Mota Caracas, engenheiro pela Universidade de Fortaleza, e Heliana Mota Caracas, tendo exercido funções na Companhia Docas do Ceará, ambos com muita projeção na sociedade local.

A foto é de 1936 e pela Rua Major Facundo vemos, por trás do bonde elétrico, a Casa Almeida, o edifício Majestic que tinha um bar, a Farmácia Pasteur, os escritórios de Luiz Severiano Ribeiro, o "Polytheama", o Menescal e na esquina, A Pernambucana. Em frente, o passeio, onde ficavam estacionados os ônibus, os carros de aluguel e onde havia os bancos de duas faces entre árvores e combustores de iluminação a gás.

Ary Bezerra Leite - em História da Energia no Ceará, no capítulo - Os bondes a burro, diz:

“O sonho dos bondes a serviço da população de Fortaleza parecia quase impossível. E, mais uma vez a concessão é transferida pela Lei no 1.631, de 5 de setembro de 1875, agora favorecendo o comendador Francisco Coelho da Fonseca e Alfredo Henrique Garcia. Finalmente, a 3 de fevereiro de 1877, esses concessionários fundam a Empresa Ferro-Carril do Ceará.
Da instalação da empresa para o aparecimento em operação dos bondes transcorreram três anos. Isto porque somente em 1879 são concretizadas as obras civis de construção da estação e sede da companhia, e, a partir de novembro, cumprida a etapa de assentamento dos trilhos, com bitola de 1,40m, que ainda eram de madeira revestida na parte superior por cantoneiras de ferro.
Na manhã do domingo 25 de abril de 1880, a Ferro-Carril do Ceará inaugura sua primeira linha, com 4.210 metros, da Estação na estrada de Messejana (Boulevard Visconde do Rio Branco) à chave na Rua São Bernardo (atual Pedro Pereira), e, a partir desta, interligando a Praça da Assembléia ao matadouro modelo (bairro do Prado).”

Agora, estimados leitores, estamos chegando ao término dos nossos passeios de bonde por esta Fortaleza de antigamente com tantas recordações que ainda permanecem vivas em nós. Com o próximo capítulo sobre os bondes teremos a linha do Prado, e concluiremos nossas reminiscências por esta cidade que nos viu nascer, crescer e, se me for dado a escolha, espero com a morte deitar meu corpo ao solo, a cabeça, ter como travesseiro a pura argila de minha terra natal, deixando-me transformar em pó “porque tu és pó e em pó te tornarás”, e merecer de Deus o perdão e a Mansão dos Justos.

Bonde na Praça do Ferreira - Anos 30

Zenilo Almada
Advogado



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Crédito: Artigo publicado no Diário do Nordeste - Fortaleza.
Ceará - Domingo, 20 de julho de 2003 e fotos Fortal

segunda-feira, 21 de junho de 2010

O bonde (IX) - Alagadiço

Bondes na rua Major Facundo - Anos 30 (Foto: OPovo)

Hoje vamos recordar o bonde que fazia o maior percurso de linha. Vamos nos transportar ao lado oposto da cidade, ou seja, zona Oeste no aprazível bairro do Alagadiço, conhecido por seu mangueiral, cajual, bananeiral e outras fruteiras próprias daquele solo. Como em quase sua totalidade as linhas servidas por bondes elétricos saíam da Praça do Ferreira, com raras exceções, como é o caso da Prainha e da Praia de Iracema. O bonde Alagadiço saía da Praça do Ferreira, seguia pela Rua Major Facundo, até alcançar a Rua Clarindo de Queiroz, percorrendo-a até encontrar a Rua Dona Tereza Cristina, hoje Tereza Cristina; dobrava à esquerda (um quarteirão do Mercado São Sebastião) até chegar na Rua Meton de Alencar, quando em direção à direita contornando o Mercado São Sebastião, tomava a Rua Juvenal Galeno (1a seção); Farias Brito - em frente à Igreja de Nossa Senhora das Dores, Av. Bezerra de Menezes até a Igreja São Gerardo (2a seção); daí em diante ainda pela Av. Bezerra de Menezes até o Colégio Santa Isabel - próximo à Escola de Agronomia era a 3a seção e última. Por ser a linha mais extensa de todas, o bonde estava sempre superlotado. Os bancos quase sempre com excesso de sua capacidade. Muita gente segurando nos balaústres - com os pés nos estribos (plataforma ou degrau), com certo perigo de vida, aguardando a chegada das seções seguintes para conseguir assento nos bancos. Nos idos dos anos 1940, era costumeiro ao cair da tarde, quase todas as pessoas que trabalhavam no Centro e que moravam nos bairros de Farias Brito, Otávio Bonfim, São Gerardo e Alagadiço, adquirirem nas padarias situadas nas diversas ruas centrais, pães, bolachas, biscoitos - ainda quentes do forno com inconfundível, agradável e denunciador aroma, que aguçava logo o apetite de qualquer um! Ah tempo bom! Das inigualáveis bolachinhas “Ceci”, feitas com “leite condensado da Holanda”, vendidas na Padaria Duas Nações - cujo proprietário - o distinto português, pai do nosso amigo - desembargador Raimundo Bastos. Tudo era acessível a todos. Mais fácil. Não pairava a existência de qualquer desigualdade econômica ou hegemonia social. Todos eram iguais, resguardados pelo respeito mútuo próprio da época. Na etapa do ano que se comemorava a Semana Santa, pobres e ricos tinham como comprar o pão de coco, bacalhau, vinho mesmo em pequena quantidade, até o vinho a granel vendido na Padaria Modelo - do português João Martins Canito, na Rua General Sampaio, entre as ruas Senador Alencar e São Paulo, mesmo sendo pobres, também participavam dos atos religiosos celebrados com muito respeito. Recordando ainda as padarias que se localizavam no Centro, vem-nos à mente a Padaria Palmeira - situada na esquina da Rua Guilherme Rocha com Senador Pompeu, onde grande número de fregueses se dirigia a um recanto no qual se encontrava um nicho com vulto de tamanho pequeno de Santo Antônio, conhecido como santo casamenteiro e, abaixo, incrustado na espessa parede um cofre para colocar moedas como esmola, às vezes com pedidos escritos das moças donzelas, que haviam dado os primeiros pulos da “macaca” e, por isso, se valiam com muito fervor nas súplicas ao santo, para não receber, coitadas, a peja de titia, solteirona, coroa, balzaquiana, e o pior de todos esses qualificativos, o de terem ficado na “peça” e receber o apelido de “vitalina” porque ficara no “caritó”. Era na inesquecível Padaria Palmeira que as jovens que se consideravam ultrapassadas pela idade se postavam a pedir a santo antônio recitando além da oração os versos trazidos de Portugal que diziam:

Santo Antônio de Lisboa que em Lisboa foste nado, em Roma coroado, em Pádua visitado, pelo hábito que vestistes, pelo cordão que cingistes, eu vos peço uma graça pelo poder que adquiristes.

Assim, após a oração ficavam mais confortadas e esperançosas de arranjar um “gajão” enviado pelo santo casamenteiro, ou fazendo outras tentativas no dia 13 de junho, por ser-lhe o dia consagrado e, como última esperança o responso, ou ceia de São Pedro no dia 29 de junho.

Além dessas, outras padarias existiam no Centro e ruas contíguas, como a Lisbonense, Aliança, Triunfo, Nordestina, Globo, Santa Teresa, Ideal, Lisboa, Benfica, ou por onde o bonde passava...

Major Facundo, final dos anos 30 início dos anos 40

No caso da linha Alagadiço, por ser muito longo o seu trajeto, algumas pessoas cochilavam com o agradável balanço do vaivém que o bonde fazia. Tinham os passageiros, por sua vez, o cuidado de descer nos pontos certos que serviam de orientação. no caso da 1a seção - a Fábrica Siqueira Gurgel, após a Praça Otávio Bonfim e o Grupo Escolar Presidente Roosevelt; o Instituto dos Cegos e a Igreja de São Gerardo - 2a seção; e, Secretaria de Agricultura do Ceará, próximo à 3a seção, quando chegava na grande propriedade do Dr. Rocha Lima.

O nosso passageiro ilustre da linha do Alagadiço é o falecido humanitário médico - Dr. Abnegado da Rocha Lima, nascido em Fortaleza aos 17 de fevereiro de 1887. Residia numa casa de sua propriedade quase no final da linha do bonde da Av. Bezerra de Menezes, cujo sobrado ocupava mais de uma quadra com fundos pertencentes. Ao lado, uma capela da família onde todos assistiam às missas aos domingos.

Em 1913, contraiu matrimônio com Maria Braga da Rocha Lima, conhecida como D. Filhinha, nascida em 12 de outubro de 1892. Do enlace, o casal teve os seguintes filhos: Paulo, Afonsina, Hélio e Alberto. Dentre seus filhos, destacou-se o general Paulo Braga da Rocha Lima, um dos componentes da Força Expedicionária Brasileira que, em Monte Castelo, na península itálica, soube elevar com brilho e galhardia o nome de nossa pátria.

Foi o percursor da implantação da manutenção de orfanatos no Ceará. Sempre mantinha de 80 a 100 crianças internadas sob suas expensas. Fundou, dirigiu e era o principal mantenedor, durante muitos anos, do Instituto de Proteção e Assistência à Infância.

Para doutorar-se em medicina, a 28 de dezembro de 1911, defendeu tese perante a Faculdade Médica do Rio de Janeiro, atual Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio de Janeiro, versando a dissertação sobre Rachistovanização e suas vantagens.

Foi inspetor de higiene do estado do Ceará. Organizou e publicou o Boletim Trimestral de Estatística Demográfico-Sanitário da Cidade de Fortaleza, no ano de 1912, primeiro ano de sua publicação.

Antes de sua morte, fez um levantamento em seu fichário de atendimento gratuito de nada menos que 75 mil crianças, conforme dados estatísticos constantes do arquivo do Instituto de Proteção à Infância. Faleceu em Fortaleza aos 24 de outubro de 1954. (Dicionário Bibliográfico Cearense - Pág 39/40 - Barão de Studart - 2a edição - Organizado por Newton Jacques Studart - Vol. I).

Na administração do general Murillo Borges, a Avenida Bezerra de Menezes passou por grande modificação, dando maior amplidão à visão, com a retirada de todos os pés de “ficus-benjamins” - árvores de porte robusto, de copa densa e com muitas raízes aéreas e aventícias, que ali cresceram ao longo de toda a avenida formando canteiros e alamedas, no centro, dividiam a avenida, fazendo separação de toda sua extensão.

Assim, os antigos pés de “ficus-benjamins”, que na sua vetustez sombreavam a avenida em quase todo comprimento, onde famílias inteiras ali residentes se abrigavam como passatempo debaixo das copiosas árvores, que ia além do apreciar o constante descer e subir dos passageiros, se refrescavam do calor do nosso verão abrasador e, para deleite de todos, uma imensa visão da avenida junto ao canteiro central servia de divisória ornamentada pelas árvores altaneiras.

Realmente, deve ter sido a Av. Bezerra de Menezes, uma das principais obras da administração Murillo Borges (1963 a 1967), porque modernizou e mudou o antigo aspecto de uma avenida extensa, sombria, com árvores envelhecidas ao longo do tempo, testemunha de variados episódios onde a lembrança e a saudade são companheiras inseparáveis.

Como dizia, a Av. Bezerra de Menezes teve na gestão Murillo Borges o seu ponto alto, quando mudou para camada asfáltica toda a malha que compõe a avenida.

Assim, a inauguração teve a singularidade de congraçamento dos moradores e de todos que percorriam aquela avenida, unindo-se a um só, numa quilométrica mesa posta pelos moradores da avenida que promoveram um grande banquete, em que cada um expunha suas iguarias, guloseimas e acepipes dos mais variados tipos. Com o corte da fita simbólica pelo general Murillo Borges, teve início a grande festa de inauguração da Avenida Bezerra de Menezes, que daí em diante trouxe outra imagem que a modernidade transformou no apreciável centro de comércio.

Ah! se o tempo retrocedesse ou não deixasse apagar da nossa imaginação as coisas boas que a vida nos dá. Seria o céu na Terra com tudo que tem direito um pecador temente a Deus e que Dele recebe sublime inspiração para divulgar o estado de espírito...

O bonde na rua Major Facundo

Mas, fora da caçoada! - Quem teve a oportunidade de se transportar nos bondes pela Avenida do Alagadiço nas manhãs de inverno, com céu pardacento carregado de nuvens plúmbeas embruscando o tempo, contemplando aquela imensa paisagem, acolhe no peito as saudades, nos olhos marejam as lágrimas, a lembrar do que se foi na poeira do tempo a que tudo se reduz, só sente o pulsar do velho coração que continua fiel e resistindo aos percalços do cotidiano.

Zenilo Almada Advogado


quase sua totalidade as linhas servidas por bondes elétricos saíam da Praça do Ferreira - Era freqüente em algumas cidades brasileiras esse sistema de todas (ou quase todas) as linhas convergirem a um ponto determinado, geralmente uma praça. Por exemplo, em Niterói (RJ) o ponto geral de partida era a Estação das Barcas. No Rio de Janeiro, como sugere o porte da cidade, os pontos de convergência eram diversos, localizados de acordo com as seções (o termo seção pode significar tanto a subdivisão da linha, que define a variação dos preços de passagem, quanto a seção administrativa do sistema, que abrange determinado número de linhas que atendem especificamente um espaço ou região da cidade), definidas nos centros dos bairros ou num ponto de saída específico para determinada região, como no caso dos bondes da Zona Sul, que se dirigiam aos bairros do Catete, Humaitá, Praia Vermelha, Copacabana, etc., partindo todos do célebre “Tabuleiro da Bahiana”, uma estação localizada numa extremidade do Largo da Carioca (onde hoje passa a Avenida Chile, próximo ao atual ponto de partida dos bondes de Santa Teresa), cuja cobertura deve ter-lhe gerado o apelido, devido ao formato.

Todos eram iguais, resguardados pelo respeito mútuo próprio da época - É interessante notar que este fenômeno social ocorria - e talvez ainda ocorra - com freqüência em ambientes provincianos ou semi-provincianos, nos quais, paradoxalmente, costuma existir uma certa valorização das hierarquias. Acontece que, apesar disso, o espírito ameno desses ambientes gera uma atmosfera de amizade e consideração geral e mútua entre as pessoas, ocorrendo, de forma espontânea, uma condição na qual as desagradáveis “barreiras sociais” tornam-se flexíveis e às vezes abertas. Em ambientes ferroviários do interior, por exemplo, pelo menos até a década de 1960, eram comuns (e talvez ainda o sejam) as visitas mútuas entre operários e diretores de oficina e todos eram mutuamente convidados (e compareciam) às festas familiares.

o agradável balanço do vaivém que o bonde fazia - O balanço característico dos bondes, como de qualquer veículo ferroviário, tem um efeito de “berço”, que provoca uma agradável sensação de repouso, às vezes de letargia. Principalmente nos trens dormitório é comum sentirmos esse efeito e chegarmos ao destino após uma ótima noite de sono.





Crédito: Artigo publicado no Diário do Nordeste - Fortaleza.
Ceará - Domingo, 08 de junho de 2003


domingo, 20 de junho de 2010

O bonde (VIII) - Linha Outeiro/ Aldeota - Santos Dumont


Fotografia antiga do bonde Outeiro

O jornalista de primeira água, poeta, escritor, romancista e sociólogo Jader de Carvalho, desassombradamente escreveu o romance - Aldeota, na década de 1960. Na sua obra magistral - (13o capítulo, pág. 286) com muita propriedade proclama: “Não dizem que o tempo tem asas? Pois tem mesmo. Na Aldeota levantaram-se riquíssimos bangalôs, agora chamadas ‘casas funcionais’. Quase todos brancos, bela estupidamente brancos numa terra de sol. Doem na vista? Mas ficam bem na paisagem entre o verde do mar e o azul do céu, num suave lombo de terra, que se abaixa cautelosamente em busca da praia.”

Mais adiante exclama: “Numa topografia diferente, microgeográfica, Aldeota se personaliza, assume limites certos, cria a sua própria alma, amadurece enfim ‘Aldeota’”.

As evidências provam que muitas das famílias antigas que moravam noutros bairros, ou mesmo no Centro da cidade, passaram a residir no aristocrático bairro da Aldeota, embora outros continuassem fiéis, e não se deixaram atrair pela zona Leste da cidade até por questão de bairrismo, ou saudosismo.

Mudavam de status, mas o bonde, impassível ao tempo, continuou a transportar seus passageiros indiferente a tudo. Percorria na sua trajetória conduzindo passageiros de todos os recantos da cidade e de todos os matizes, credo, profissão, cor, pobres e ricos enfim, indistintamente. Até porque havia entre todos humildade, condescendência e mútuo respeito acima de tudo. Quando por ventura algum passageiro se exagerava no beber, e, se ousasse tratar mal ao cobrador e mesmo passageiro, - o fiscal conduzia um apito, e logo - parava o bonde, pedia para o molestador descer e se não atendesse - apitava novamente e todos os passageiros - gritavam - “Chama o guarda” era na realidade “o passe mágico” para que o guarda da Polícia Estadual, encarregado na manutenção da ordem pública, colocado entre vários quarteirões da cidade, e, que se comunicavam e atendiam rapidamente com o chamado do guarda pelo apito para de repente restabelecer a paz, o silêncio e a proteção no coletivo.

Postal antigo da Rua Floriano Peixoto

Embora muito se tenha comentado, propalado, comensurando valor, divulgando a celeridade do crescimento populacional, em espiral no que se refere ao progresso dos valores imobiliários, comparado a outros bairros - e até com certa irinia, se dizia: “Que o bairro Aldeota, cheira a dólar”, em confronto com outros bairros que não tiveram ascensão rápida, mesmo porque àquela época a extensão territorial não ia além da Av. Desembargador Moreira à altura do Hospital Militar do Exército.
Na sua exuberância o bonde Outeiro - Aldeota, fazia aprazível percurso: saía da Travessa Morada Nova, por trás do prédio da antiga Assembléia, dobrava à direita na Rua Floriano Peixoto até chegar à Travessa Crato, quando entrava à direita, seguia até a Rua São José (antigo Beco das Almas) e entrava na Rua Visconde de Sabóia ao lado do Colégio da Imaculada Conceição, entrando à esquerda na Av. Santos Dumont, e, seguindo em linha reta até a Rua Silva Paulet.
O nosso ilustre passageiro escolhido da linha Aldeota - Outeiro, é o médico, ex-professor e foi diretor da Escola Normal Justiniano de Serpa - por mais de 50 anos, cujos dados biográficos abaixo, em notas de registro - Barão de Studart no volume primeiro do seu Dicionário Bio-Bibliográfico Cearense (Ed. de 1910 - fl.491).

João Hippolyto de Azevedo e Sá - nasceu em Fortaleza a 13 de agosto de 1881,” - se vivo fosse iria completar 122 anos - “filho de Jeronymo Vieira de Azevedo e Sá, e neto paterno de João Batista de Azevedo e Sá e Anna Vieira de Azevedo e Sá e materno de Domingos Pereira Façanha e Ana Bayma Façanha".

Fez o curso de preparatórios no Ginásio Nacional, atual Colégio Pedro II, e matriculando-se a princípio na Faculdade da Bahia, em que fez o primeiro ano, e depois na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, defendeu tese em 22 de janeiro de 1904.

Sua tese foi aprovada com distinção, versou sobre segredo médico. A 1o de março de 1904, foi nomeado professor interino de Física e Química na Escola Normal do Estado e efetivo a 30 de fevereiro de 1908.

Bonde na Rua Floriano Peixoto

À 7 de dezembro de 1905, foi nomeado para a Secção de operações e partos no Hospital de Misericórdia de Fortaleza.
Permaneceu várias décadas como diretor da Escola Normal Justiniano de Serpa, cujo cargo se aposentou. Após sua aposentadoria, foi convidado a exercer em comissão o cargo de diretor do Instituto de Educação no qual ficou por alguns anos, era avô do meu amigo Márcio de Azevedo e Sá Livinio de Carvalho, já falecido.
Dr. Hipólito, como era conhecido, residiu por muitos anos na Av. Santos Dumont No 2110, esquina com a Rua Silva Paulet, ponto final do bonde Aldeota. Nesse local, se acha instalado o Banco Mercantil de São Paulo.”
A Avenida Santos Dumont, antes fora denominada - Av. Nogueira Acióli - 1933, de No 9 - 1890, “Do Colégio” 1888 - Registra João Nogueira - Fortaleza Velha, pág. 43.

No dia 14 de fevereiro de 1914, começou a funcionar a linha do Outeiro (Santos Dumont/Aldeota). “Nesse ano, chegavam ao nosso porto, dentre outros navios estrangeiros, 34 ingleses, comprovando a contínua hegemonia britânica em nosso porto, seguido em número por 14 vapores alemães, e que seriam os últimos, em razão do início da Primeira Guerra Mundial, a visitarem nosso porto até 1923 - Ary Bezerra Leite - História da Energia no Ceará, pág. 70.”


A linha do bonde Outeiro tinha início no Colégio da Imaculada Conceição e numa reta rumo ao Leste, passava em frente ao Colégio Militar, e para quem sobe a Avenida Santos Dumont vê-se à direita, dentre outros, o bangalô do Dr. Edmilson Barros de Oliveira, local hoje da clínica que leva o seu nome, dirigida por seus ilustres filhos - Francisco José Motta Barros de Oliveira e Edmilson Motta Barros de Oliveira, ao lado esquerdo bonito sobrado de Gutemberg Teles, proprietário das lojas de tecidos “Casas Novas”, instaladas também em boa parte no interior do Ceará; o casarão de Manuel Cavalcante, a casa da família do Gal. Eudoro Correia, Demóstenes Brígido, Abel Ribeiro, seu filho Humberto Ribeiro, Dr. Paulo Torcápio Ferreira, Mystil Meyer, o inolvidável e majestoso Palácio de Carvalho, cercado por inúmeros bangalôs, cada qual no seu estilo próprio, construídos por seu arquiteto Emílio Hinko, que após sua morte convolou núpcias com a viúva D. Pierina. Hoje no local ergue-se o Centro de Artesanato D. Luíza Távora, seguindo ainda as elegantes casas e sobrados dos milionários da época; das famílias Joaquim Eduardo de Alencar, Sr. Vicente de Castro Filho - Sr. Bené; Inácio Capelo, da Sapataria Belém, casa que servia de residência do Gal. da 10a Região Militar, palacete do Dr. João Hippolyto de Azevedo e Sá, depois mais modernamente dos irmãos Salomão de São Domingos Pinheiro Maia e Vesúvio de São Domingos Pinheiro Maia, Sr. Célio Fontenele Filho, Thomas Pompeu de Souza Brasil, Paschoal de Castro Alves etc.

Rememorando o início dos bondes elétricos, que substituíram os bondes puxados a burro na nossa Cidade, tivemos como conseqüência no salto do progresso da nossa civização urbana. - Mozart Soriano Aderaldo - no seu livro História Abreviada de Fortaleza - às pág. 41 - assevera com percuciência:

“Em 1914, teve início a era dos bondes elétricos. Havia bondes de ‘tostão’ e de ‘dois tostões’ isto é, de cem e de duzentos réis, que eram identificados pela cor de suas testadas: - O de segunda classe era prateado e o de primeira classe era pintado de verde. Os cupões das passagens, destacados pelos cobradores (condutores, como eram chamados) à vista dos passageiros, eram a estes entregues porque valiam a centésima parte de seu preço, desde que resgatados em favor de associações de caridade, como a Santa Casa, o Asilo de Alienados, o Leprosário etc. Dessa forma, a empresa concorria para aquelas filantrópicas entidades e, ao tempo, controlava o movimento de passageiros, para efeito de tomada de contas”.

O grande historiador e engenheiro João Franklin de Alencar Nogueira - João Nogueira - no seu livro Fortaleza Velha - destaca capítulo sobre “O bonde Velho” - pág.165 e no “Carro de borracha” - Era o famoso bonde puxado a burro, que antecederam os bondes elétricos. Esse transporte eminentemente rudimentar, movido por asinino.

A inauguração do bonde velho marcou época na vida de Fortaleza

"Os que ainda restam daquele tempo se recordarão, talvez, da admiração e dos aplausos com que foi recebido, nesta cidade, tão grande progresso. No domingo, 25 de abril de 1880, a Companhia Ferro Carril do Ceará inaugurou as linhas de Estação e do Matadouro Público. Às 7 horas da manhã, quatro bondes embandeirados partiram da frente do Mercado Público, à Praça da Assembléia, e foram até Matadouro; e, de volta, chegaram à Estação do Depósito, na estrada de Messejana.

No primeiro iam o presidente da Província, Sr. José Júlio, e convidados; nos dois seguintes, acionistas da Ferro Carril; e no último a música da Polícia. Ao chegarem àquela estação, ali tocava a banda do 15o e subiram ao ar inúmeras girândolas.

Houve sessão solene da diretoria, da qual era presidente o engenheiro José Pompeu de Albuquerque Cavalcante, diretor secretário o Dr. Rufino Antunes de Alencar e tesoureiro, o negociante João Cordeiro”.

Lavraram uma ata especial consignando o memorável acontecimento, assinado, que foi, pelo presidente da Província, pelos diretores e acionistas da companhia e por quantas pessoas gradas ali se achavam.

O engenheiro José Pompeu declarou, então, abertas ao tráfego as duas linhas inauguradas e agradeceu, ao presidente José Júlio, os favores dispensados à empresa.

As linhas inauguradas eram, como ficou dito, as da Estação e do Matadouro.

A primeira, partindo da frente do Mercado, seguia pela Praça da Assembléia (lado L), passava em frente à Assembléia, ganhava a Rua da Boa Vista, dobrava na de S. Bernardo e, entrando por um beco, hoje fechado, cortava a Rua da Alegria; passava ao lado N. e em frente aos Artigos Bélicos e pela Rua do Conde d’Eu entrava ao Largo do Garrote, donde pela estrada da Messejana ia em linha reta à Estação, construída em 1879.

O ramal do Matadouro começava no cruzamento da Rua da Boa Vista com a de São Bernardo. Seguia por esta até a Rua Amélia, pela qual subia até a Praça de Pelotas.

Dobrando na esquina do Formiga, seguia pela Rua do Livramento, atravessava em diagonal a Praça S. Sebastião e entrando pela entrada do Soure chegava ao Matadouro.

O bonde de Pelotas seguia este mesmo itinerário, partindo, porém, do Mercado a fazer ponto naquela praça, junto à Rua General Sampaio. A extensão total dessas duas linhas era avaliada em 7.500 metros.

Um anúncio avisava o público de que os carros partiriam do Mercado, de meia em meia hora, e enquanto houvesse passageiros.

As passagens eram de cem réis, a bitola a mesma de hoje, 1,40m e tração animal. Os carros eram desiguais: havia os de 4, de 5 e de 7 assentos, com as lotações correspondentes de 16, 20 e 28 passageiros.

Os trilhos constavam de longarinas de madeira, pregadas nos dormentes, forradas por cima de cantoneiras de ferro sobre cuja face superior corriam as rodas. Foram depois substituídas por trilhos de ferro tipo Vignole.

A planta de Fortaleza de 1888 consigna as alterações feitas nas linhas inauguradas em 1880 e os ramais então existentes.”

Tivemos também as linhas do Outeiro e da Porangaba, das quais detalhes e datas se encontram no Almanaque do Ceará para o ano 1906.

Antes da inauguração do bonde, a carne verde vinha, pela tarde, do matadouro para a feira em costas de burros tangidas pelos carniceiros (magarefes) que vestiam longas blusas de baeta encarnada e traziam barretes da mesma fazenda e cor.

À boca da noite, voltando do Mercado, montados em disparada, que fazia tinirem os ganchos de ferro em que haviam trazido a carne, aqueles homens, vestidos de encarnado metiam medo aos meninos, que neles viam demônios, matadores ou lobisomens.

A Ferro Carril acabou com este transporte anti-higiênico da carne verde, construindo bondes fechados especiais, destinados ao mesmo fim.

Já muito depois de inaugurada a nossa viação urbana, apareceram os bondes chamados João-cotoco. Eram carros sem coberta, com uma lanterna multicor em cada frente, que só trafegavam à noite, especialmente nas de luar.

Era nesses bondes que os fiotas e notívagos do tempo andavam acima e abaixo contando anedotas e desfrutando a fresca da noite, até ficarem de nariz entupido, tal como acontecia aos prosistas, que demoravam, até tarde, nas nossas antigas rodas de calçadas.

Outeiro, mais precisamente Aldeota, é na realidade de hoje o bairro mais contemplado pelo progresso da nossa cidade, porque seu aspecto arquitetônico diferencia dos demais bairros da nossa Fortaleza; se sobressaindo com as modernas edificações tornando-o independente do resto da metrópole por ter vida própria.

Bonde elétrico 1930 - A imagem mostra o bonde elétrico, na Floriano Peixoto, aberto, prefixo 76, na linha do Outeiro, passando ao lado de uma bomba de gasolina. Reparem na arquitetura dos prédios... Banco do Brasil, na época... (por volta dos primeiros cinco anos da década de 1930)

A Avenida Santos Dumont vai do Centro da cidade à Praia do Futuro. Começando na altura da Rua Cel. Ferraz, terminando na Av. Dioguinho, se interligando desde o Centro, Aldeota, aos bairros Varjota, Papicu, Praia do Futuro. Outrora, somente uma ampla dimensão de terra virgem e inóspita formava a paisagem do Outeiro - hoje Aldeota - com alguns sítios, matagal espesso, cuja copagem, com predominância de arbustos, carrapicho-da-praia, servia de moradia das diversas espécies de pássaros - como os bem-te-vis-de-gamela, galos de campina, graúnas, sabiás, canários, da terra, dessa imensa fauna que os repetidos estribilhos despertavam novos moradores, tornando Aldeota essa “selva de pedra” que se ergue em desafio ao céu, mas, tudo isso tem clássico nome de modernidade.

Sabemos que muitas ruas e lugares mudaram a fisionomia da Aldeota. Mas se os tempos mudaram e tomaram rota diferente, sob certos aspectos, tornando desiguais as pessoas na concepção dos seus entendimentos, destinos e caminhos, somente Deus na Sua onipotência pode mudar o curso de todas as coisas ou perpetuar segundo Sua vontade, porque pode dispor e transpor -

Amém.

Zenilo Almada
Advogado






Crédito: Artigo publicado no Diário do Nordeste - Fortaleza.
Ceará - Domingo, 23 de fevereiro de 2003


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