Fortaleza Nobre | Resgatando a Fortaleza antiga : O povoamento do Pirambu - Parte II
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sábado, 14 de julho de 2012

O povoamento do Pirambu - Parte II


A influência do Partido Comunista no Pirambu

As indústrias presentes na Zona Oeste da cidade foram importantes para o fortalecimento do Partido Comunista Brasileiro, pois o mesmo passou a atuar diretamente na organização dos operários, principalmente no bairro do Pirambu.

O Partido Comunista Brasileiro (PCB) nasceu em Niterói (Rio de Janeiro), em março de 1922. Esse partido foi fundado por ex-anarquistas, operários, estudantes e intelectuais entusiasmados com o extraordinário acontecimento baseado nas idéias do socialismo científico de Marx e Engels, a revolução socialista na Rússia em 1917.

Na década de 1920 o PCB era um pequeno partido que atuava na clandestinidade e disputava a liderança sindical com os anarquistas. Mesmo sendo um grupo pequeno, os comunistas tinham uma incrível capacidade de se organizar e lutar. Eles editavam jornais, livros e revistas que explicavam e defendiam suas idéias e que eram distribuídos em escolas e portas de fábricas. Atuavam nos sindicatos, tentando ganhar eleições para direção e influenciar os trabalhadores.

Por atuar na clandestinidade o Partido Comunista criou o BOCBloco Operário Camponês, uma fachada legal para poder concorrer às eleições. Conseguiram até eleger dois deputados federais. Aos poucos foi ganhando forças nos sindicatos de todo o país.

No Ceará, as idéias marxistas começaram a entrar com grande intensidade por volta de 1926, quando simpatizantes do comunismo reuniram-se na antiga sede da União dos Pedreiros do Ceará para discutir as “idéias revolucionárias” e acabaram sendo influenciados pelas lideranças de tal partido.

Em 1927 foi fundado em Fortaleza o BOC - Bloco Operário Camponês, tendo a frente José Joaquim de Lima e outros sindicalistas. Nesse mesmo ano as idéias do partido começaram a se espalhar por vários municípios do Ceará.

Em 1945 o PCB foi autorizado a funcionar como partido e seus membros puderam atuar livremente. Um partido de muito sucesso graças à espetacular vitória Soviética sobre os Nazistas. Nessa época o PCB conseguiu dezenas de milhares de adeptos entusiasmados.

Nas eleições de 1945, o PCB foi um partido bem votado nas grandes cidades, chegando a eleger um senador, Luís Carlos Prestes (o mais votado do país) e 17 deputados federais. Era o quarto maior partido do país.

O crescimento do PCB passou a incomodar a classe dominante brasileira, principalmente os políticos conservadores do PSD e da UDN. Os comunistas tiveram uma participação importante na Assembléia Constituinte de 1946, defendendo a reforma agrária e outros projetos que beneficiariam a classe trabalhadora brasileira. Suas propostas não foram aceitas pela elite que governava o país. Em 1947 o presidente Dutra proibiu o seu funcionamento.
   
No Ceará o autoritarismo também predominou e cresceu entre os conservadores o movimento de combate aos comunistas, tendo a Igreja Católica como grande aliada. Apesar da perseguição os comunistas conseguiram adquirir o jornal O Democrata, que passou a ser porta-voz do PCB local. 



Com a aquisição do jornal O Democrata, os marxistas cearenses puderam veicular diariamente sua ideologia e denunciar abertamente a aviltante exploração de quem eram vítimas os operários e camponeses.

Dentre as discussões tratadas pelo O Democrata, estava a questão da terra, do transporte, da água potável e da eletricidade. Por isso, ele teve uma grande penetração nos bairros habitados por pobres e operários. Nestes bairros, o jornal possuía postos de vendas nas mecearias e nas farmácias, promovendo debates e procurando conscientizar a população a lutar por seus direitos fundamentais e da importância da organização para reivindicar melhorias como, luz, calçamento, água, segurança, etc. Combatia também a carestia, promovia campanhas de alfabetização e defendia atividades recreativas para os pobres. Por isso, o PCB teve ampla penetração nos bairros da periferia de Fortaleza, notadamente, no Pirambu, um bairro esquecido pela classe dominante local.

No Pirambu, o jornal ganhou muitos leitores e apoiadores, visto que, a presença do PCB já era um fato concreto no bairro, principalmente a partir da criação do Comitê Democrático de Libertação Nacional e da Sociedade de Defesa do Bairro do Pirambu.

Por estar ao lado dos moradores na luta por terra, trabalho e pão. O Democrata tornou-se um importante veículo de informação e de incentivo para a população do Pirambu no processo de organização. Isso pode ser evidenciado na reportagem abaixo:

“(...) os moradores não devem ter uma ilusão nos chamados ‘canais competentes’ porque o governo está com os exploradores do povo. A solução, portanto, está nas mãos dos habitantes, na sua luta contra a expulsão e por outras reivindicações de seu bairro como transporte mais abundantes, higiene, luz, calçamento, etc.” (O Democrata, 1958).

Por sua postura crítica e demonstrar estar preocupado com as necessidades dos moradores da periferia, o jornal teve uma boa circulação no Pirambu e em outros bairros de Fortaleza.

A Igreja Católica e a campanha anticomunista

O crescimento das idéias comunistas no Ceará deixou preocupada a elite dominante do estado, que rapidamente iniciou uma ferrenha campanha anticomunista. Essa se fez sentir por duas frentes. A primeira com mais intensidade foi articulada pela imprensa, notadamente pelo jornal Correio do Ceará, órgão local dos Diários Associados - pertencente a Assis Chateaubriand – que diariamente transcrevia ásperos artigos de periódicos do sul atacando os comunistas.



 

A segunda frente de combate ao comunismo foi encabeçada pela Igreja Católica, uma instituição muito poderosa, cujo anticomunismo chegara a ser algo doentio. Sob a orientação do bispo de Fortaleza, dom Antônio de Almeida Lustosa, o Clero cearense, aliado aos políticos de direita e aos latifundiários locais, passou a combater de corpo e alma o comunismo. Para tal projeto, se utilizou de todos os instrumentos possíveis. Sendo o jornal O Nordeste, um dos meios de comunicação bastante usado, além de outras instituições sob sua influência, como: os Círculos Operários Católicos, o Centro Social Arquidiocesano, a Ação Católica e a União dos Moços Católicos, promovendo uma série de palestras e seminários; intensificando, inclusive, obras de caráter assistencialistas e de caridade nos bairros pobres de Fortaleza.
   
Sendo a Igreja uma instituição anticomunista, seu objetivo com as obras assistencialistas e de caridade era:

“(...) resguardar para si a nobre função de proteção e apoio à classe operária, o que faz através de esclarecimentos constantes acerca das leis trabalhistas; de denúncias, de situações em que estas leis são violadas, de advertência à classe empresarial em relação às suas maquinações de abuso à classe obreira; e de aplauso ao real cumprimento dos direitos do trabalho. Na realidade, busca a Igreja conquistar a classe operária e mantê-la sob controle, longe das influências das esquerdas que no período de redemocratização se expandem no seio do movimento operário cearense." (ARAGÃO, 1987, p.9).

Seguindo sua estratégia de desestruturação do trabalho que o Partido Comunista vinha desenvolvendo no Pirambu, a Igreja enviou para o bairro o Padre Hélio Campos.

De acordo com o depoimento de Carlos Careca:

“Quando o Padre Hélio chegou em 1958, no Pirambu, a cidade se encontrava em poder dos comunistas, bem organizados. Ele não foi recebido de braços abertos pelas lideranças da época. (...) Não custou muito, o novo pároco contou com a ajuda de 72 homens, dispostos a passar até pelo fogo por ele. Cada semana o Padre dava aulas de formação e os representantes do bloco de casas, em número de 247, juntos com o seu vigário, prestavam contas publicamente, sobre tudo, que durante a semana fizeram em favor do Pirambu. No espaço de quatro anos converteu-se o Pirambu comunista, numa comunidade cristã fervorosa. Todo o poder passou a se concentrar nas mãos do Padre Hélio.” (Carlos Careca. Antigo morador do Pirambu e organizador do grupo Quadrilha Raízes Sertanejas).

Pelo depoimento, podemos perceber que um dos objetivos da Igreja Católica era desarticular o Partido Comunista, negando sua influência e combatendo seu trabalho na periferia da cidade.

O Padre contou logo com o apóio da classe dominante local, que ao ajudar as famílias do Pirambu, poderia propiciar um telhado seguro para muitas famílias que habitavam os casebres, deixando as crianças bem nutridas, isentas de tuberculose, podendo brincar e sorrir novamente. Por trás desse assistencialismo estava o interesse de preparar homens e mulheres decididos a combater junto com o zeloso vigário o comunismo.
Leia a parte I




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Crédito: Artigo “O Pirambu e seus atores sociais: Do povoamento em 1930 até a Marcha de 1962.”  de Raimundo Nonato Nogueira de Oliveira.

2 comentários:

  1. Uau, excelente trabalho Leila. Sou moradora do Pirambú desde a década de 70 e testemunhei durante todos esses anos a ganância de alguns políticos partidários em nos despejar daqui, óbvio que para satisfazer o desejo do comércio imobiliário. Hoje temos vivido bons tempos. Muitas famílias que resistiram e têm feito deste lugar um cantinho melhor a cada dia. Estava procurando na internet fotos antigas do local, mas especificamente o Kartódromo para mostrar aos meus sobrinhos como era quando nasci, meu tempo de infância, e acabei achando o seu post. Parabéns. Gostei da sua apresentação: - Técnica em contabilidade por profissão e PESQUISADORA POR AMOR - Parabéns por tamanha dedicação.

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    1. Muito obrigada, Adelaide! :)

      Fiquei feliz demais em saber que gostou do Fortaleza Nobre!
      Na nossa Fanpage, vc encontrará muitas fotos, inclusive do Kartódromo:
      facebook.com/fortalezanobreoficial

      Beijo grande

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