Fortaleza Nobre | Resgatando a Fortaleza antiga
Fortaleza, uma cidade em TrAnSfOrMaÇãO!!!


Blog sobre essa linda cidade, com suas praias maravilhosas, seu povo acolhedor e seus bairros históricos.

 



domingo, 24 de julho de 2016

Os espaços de lazer na Fortaleza de outrora - Parte II



Em 1910, Fortaleza contou, pela primeira vez, com uma grande casa de espetáculo, o Theatro José de Alencar. As negociações para a construção do Theatro José de Alencar foram mediadas em 1908 pela filial cearense da casa Boris Frères, de Paris. Aliás, esta casa costumava intermediar as negociações financeiras de toda a cidade com a França, inclusive as do Estado. Assim, o Theatro José de Alencar teve sua estrutura metálica fabricada na Escócia pela firma Walter MacFarlane & Co. Embora a administração da oligarquia Accioly, como era conhecida por estar desde 1896 no poder, já não gozasse de prestígio e popularidade, o teatro foi um ponto de convergência entre os partidários e opositores do
governo. Vinha corroborar os ideais de modernidade, dos bons costumes e representação de
poder como aponta Carlos Câmara no jornal A República, de 21 de janeiro de 1910:  


“Vai Fortaleza possuir um theatro, uma casa de espetáculos vasta e confortável, que não a
envergonhará aos olhos do estrangeiro. [...] O Theatro é um elemento de civilização e
progresso”
.


 

A inauguração do Theatro José de Alencar foi comentário de muitos impressos do período. Otacílio de Azevedo, por exemplo, que esteve no dia da inauguração, abordou em seu livro de memórias, as sensações daquela noite:

A primeira vez que transpus as portas do Teatro José de Alencar foi na noite de 17 de setembro de 1910 – era a sua inauguração artística, pela célebre Companhia de Operetas Leopoldo Fróes e Lucila Pérez. [...] Três meses antes, a 17 de junho, a casa de espetáculos havia sido entregue ao público da província pelo presidente Acióli, através de um longo discurso proferido por Júlio César da Fonseca, um dos maiores oradores da época. Realizou-se umconcerto pela Banda de Música do Corpo de Segurança do Estado, sob as
batutas dos maestros Luis Maris Smido e Henrique Jorge. [...] No centro da Praça, um enorme e belo coreto, onde a Banda da Polícia Militar executava todas as quintas-feiras belas partituras dentre as quais se destacava a valsa mais querida de todos – “A Norma”.



 Fortaleza e a era do cinema

Curiosamente, não foi encontrada nenhuma nota em jornal, revista ou livro de crônicas da época que anunciassem uma apresentação de música popular. Apareciam, como se observa na citação, apenas apresentações operísticas, de bandas militares ou de orquestras.
Os artistas, por mais que gostassem das diversões noturnas mais ecléticas, demonstravam
deslumbramento para com os divertimentos nos teatros. Ramos Cotôco e Paula Ramos, por exemplo, não só frequentavam ininterruptamente esses locais, como participaram da sua
construção estética, pintando o teto do palco principal e o do foyer.
O cinematógrafo foi outro espaço de entretenimento que “abrigou” um público bastante heterogêneo, sendo, muitas vezes, alvo da crítica das elites. O primeiro cinematógrafo foi instalado em Fortaleza no ano de 1907, por Vitor de Maio, o mesmo que inaugurou no Rio de Janeiro em 1884 o primeiro cinema brasileiro. Ele foi montado na rua Cel. Guilherme Rocha, nos fundos da Maison Art-Nouveau. Em 1909, outros seguiram os seus passos. Henrique Mesiano, que inaugurou o cinema Rio Branco, e Júlio Pinto, que fundou o Cassino Cearense.


Cinema Rio Branco na rua Barão do Rio Branco. A placa do cinema foi percebida pelo pesquisador Nirez -  Fortaleza e a era do cinema

 Fortaleza e a era do cinema

As instalações do Cassino Cearense eram mais modestas se comparadas às do Cinema Rio Branco. No começo, o Cassino Cearense possuía orquestra, na sala de espera inclusive, mas depois passou a ter apenas uma pianista na sala de projeções. Essa presença de instrumentistas e/ou cantores no cinema se explica pelo fato de que os filmes, nesse período, eram mudos. Apesar da presença de camadas abastadas nos cinemas, no início das instalações das salas, os
indivíduos iam apenas ver esses filmes pelo dever social, ou seja, por acharem que essa
prática simbolizava um elo com a modernidade. Havia dificuldade desses cinemas sobreviverem na capital devido à falta de espectadores.


 Majestic - Fortaleza e a era do cinema


Em 1917, um cinema-teatro foi inaugurado em Fortaleza. O Majestic Palace foi descrito pelo memorialista Otacílio de Azevedo como a maior expressão do fino gosto que atraía a fina flor da sociedade. Entre essa “fina flor”, encontravam-se no dia da inauguração seus amigos boêmios Ramos Cotôco, José de Paula Ramos e Antônio Rodrigues. A presença desses indivíduos ligados à boemia na casa de espetáculo é um alerta sobre a importância de se conhecer a fundo as estratégias, sobretudo de Ramos Cotôco, de mediar e condensar suas
experiências nas modinhas que produzia. Ainda, segundo Azevedo, a estreia dos espetáculos
foi feita por músicos profissionais, um deles vindo de fora, como se pode observar abaixo:
 

Da segunda porta do belíssimo cenário, surge Fátima Míris, vestida como japonesa e, após entrar rapidamente na primeira porta, voltou a sair, desta vez na forma de um pastor. Era inacreditável tudo aquilo. [...] Ao levantar-se o pano, no segundo intervalo, a violinista deslumbrantemente trajada apareceu, imitando um dueto com tamanha habilidade e perfeição que o maestro Henrique Jorge, subindo ao palco, ajoelhou-se e beijou-se as mãos.
[...] ficaram todos boquiabertos e assombrados diante da excelsa intérprete de Paganini. [...] Ao cair o pano, em meio à maior chuva de aplausos, gritavam a todos a uma só voz: “bis, bis”, ao que ela entendeu.


Os clubes também contribuíram para a institucionalização das diversões. No fim do século XIX, eles foram tomando o lugar dos bailes que ocorriam nos sobrados e palacetes da capital. A narrativa de Raimundo Girão adverte que, aos olhos dos estrangeiros, aos poucos os clubes se tornaram vulgarizados. Fortaleza foi denominada por eles como “A cidade dos clubes”. No
entanto, acredita-se que esse comentário foi uma forma pejorativa de encarar os habitantes
como indivíduos dispostos ao gosto por “coisas efêmeras”.




O Clube Cearense, que surgiu no ano de 1867, e estava localizado num sobrado residencial da Rua Senador Pompeu, de propriedade de D. Manuela Vieira, foi, segundo Girão, um clube bastante seleto, que comportava os indivíduos mais “ilustres” da sociedade.
Nesse tempo, era predominante a atuação de estrangeiros na Capital, notadamente ingleses,
franceses e portugueses, afeitos às “exigências” das grandes cidades europeias e, por essa
razão, frequentadores assíduos do clube. Essa seleção social fez surgir uma reação de grupos
intelectuais que se sentiam agredidos por não terem a entrada permitida no clube, surgindo
assim, no ano de 1880, o Clube Iracema. Essa agremiação era composta, em sua maioria, por moços do comércio, um número pequeno de estrangeiros, empregados públicos. Esses indivíduos que pertenciam à agremiação do Clube Iracema, embora tivessem sofrido preconceito de classe, não deixaram de fazer o mesmo recebendo apenas “todos os dignos da cadeia social da cidade”.  Um dos comentários feitos por Girão em defesa do Clube Cearense é revelador:


Não há aristocracia dos bailes do Clube Cearense, nem essa grandeza de nobiliarquia, nem as deslumbrantes toilettes do clássico noblesse oblige, mas em compensação há vida, mocidade e prazer, que fazem do baile, não um agrupamento convencional de etiquetas e exposição de tipo e trajes, mas uma assembléia jovial, familiar, alegre, buliçosa, ativa, forte e robusta, que
enche os pulmões de prazer e desenvolve-se, marcha, evolui, por meio dessa higiene moral que faz das sociedades o fator da civilização, do progresso e da grandeza da humanidade.


 
As confraternizações no Clube Cearense eram pensadas para ter funções além da de entreter. Percebemos que as diversões, como os concertos, recitais e sessões literárias, tinham a finalidade de educar e, ao mesmo tempo, moralizar os espectadores. A família nuclear deveria ser mantida a todo custo, ou, do contrário, não se era visto com “bons olhos” pelos outros pertencentes à agremiação. Quando o Clube Cearense fechou suas portas, coube ao Clube Iracema manter esses ideais de valorização da família e dos “bons costumes”, com a finalidade de “civilizar” os habitantes da capital. O Clube Iracema aumentou a sua fama após inúmeras apresentações de companhias internacionais, entre elas as italianas, além da presença do compositor Alberto Nepomuceno, que, por ter completado seus estudos musicais na Europa e possuir certo renome, passou a ser um símbolo de indivíduo civilizado:

Ficou afamado, tido e havido com o primeiro grande concerto presenciado pelos fortalezenses aquele tão bem descrito pelo cronista Pery e no qual (1884) tomaram parte amadores prata-de-casa e artistas da Companhia Lírico-Cômica Italiana, de Luigi Milone, que representava no Teatro São Luis: Salões literalmente cheios, uma miríade de olhos divinos constelando um  jardim de rosas sob as cintilações dos candelabros num giorno fantástico, ideal, celeste. [...] O jovem maestro Ciro Ciarlini e o grande orquestrante Joaquim Franco ao piano arrebataram, como arrebataram com as suas gargantas privilegiadas a prima-dona Sidônia Springer, na Serenata de Braga, e os barítonos Cesare Baracchi e Dominici, cantando este a Balo in maschera, romanza de Verdi. Dos nossos, deram desempenho maravilhoso Celina Rolim e a irmã Branca Rolim, “as jóias queridas do calor de Iracema”, as senhoras Maria Abreu Albano e Maria Amélia Teófilo, e o diletante José Marçal, grande vocações artísticas que era. [...]E o renome do Clube Iracema, nos domínios da ate, cresceu com o fulgor que lhe vieram dar, com as suas admiráveis interpretações, virtuosos do valor de Alberto Nepomuceno, Henrique Jorge, Moreira Sá, Frederico do Nascimento, Galiani Vincenzo Cernicchero, Artur Napoleão, Adrés Dalmau, Ladário Teixeira [...]

 
Com o passar do tempo, outras agremiações nasceram como, por exemplo, A Fênix Caixeiral (1894), o Reform Club (1886), entre outras. Algumas dessas agremiações eram modestas e se fixaram em locais distantes da área central da cidade. Outro grande clube em Fortaleza, que só abriu em 1913, levou o nome de Clube dos Diários por seus fundadores
João Garcia Árêas, Francisco da Costa Freire, Martiniano Silva, José Mendonça Nogueira, João Mar-Do-well Guerreiro Lopes, César Cals de Oliveira e Henrique Jorge.




No fim do século XIX, outros pontos de encontro foram instalados na cidade de Fortaleza. Os cafés afrancesados e os bares eram frequentados por um público bem distinto, entre eles estavam presentes intelectuais, boêmios, caixeiros, políticos, estudantes, entre outros. Estes locais aguçavam debates fervorosos sobre assuntos do dia a dia, críticas políticas ou, até mesmo, mexericos sociais. Os cafés locais eram inspirados nos de Paris. Café de La Paix, o Café de La Regence eram representações do gáudio e glamour e, por isso, serviram de
modelo para a construção dos quatro cafés instalados na Praça do Ferreira: O Café Iracema, Café Elegante, Café do Comércio e Café Java, este último, lugar de encontro dos intelectuais da Padaria Espiritual. Seu proprietário era conhecido como Mané Coco, um homem espirituoso, que adorava frequentar circos e teatros.


O Café Riche teve vida curta mais intensa. Curiosamente intensa, porque essa intensidade não significava movimento comercial de receita para os proprietários. Funcionava na esquina mais famosa da cidade, em plena Praça do Ferreira, na Rua Guilherme Rocha, antes Municipal e 24 de Janeiro. Na hora do almoço, a parte do Café Riche que era bar enchia-se dos fregueses que trabalhavam no comércio. Já à tarde, os frequentadores eram mais estudantes, artistas e literários. Os cafés eram espaços de sociabilidade mais democráticos do
que os clubes e os salões da elite, consequência da não necessidade de consumir para sentar
nas cadeiras do estabelecimento.



As discussões nesses cafés geravam frutos, pois, segundo Azevedo, muitas agremiações, revistas e jornais foram fundados nas rodas de conversas nos bares e cafés da cidade. O Café Java, por exemplo, era sede de discussões políticas fervorosas. Entre seus frequentadores estavam Amâncio Cavalcante, Leonardo Mota, Eurico Pinto, Gérson Faria, William Peter Bernard, Ramos Cotôco, Chamarion, Carlos Severo, Gilberto Câmara, Quintino Cunha, o Rocinha, da farmácia, o Pilombeta, muitos deles boêmios.
Enfim, percebe-se que a circulação de artistas e uma parcela menor de intelectuais nos variados espaços da cidade foi imprescindível na tentativa de diminuir o controle sobre as diversões públicas. O “lugar da música” foi relativamente controlado por indivíduos preocupados com o progresso da capital, pois havia o lugar para tocar as fanfarras militares
(em coretos de praças), o lugar das orquestras (em teatros e clubes), o lugar dos pianistas (em
cinemas e bailes suntuosos), entre outros. Porém, a improvisação, marca de grupos que se esforçavam para manter vivas suas manifestações culturais, resignificavam dia a dia o “lugar
da música”, fazendo-as em bodegas, quiosques, residências e, principalmente, no meio da rua.


Alguns escritores advertiram que os lugares de música podem ser bem inusitados e que as pessoas podem transitá-los de acordo com suas necessidades. Oliveira Paiva em seu romance de ficção A afilhada, por exemplo, percebe que, na sociedade de que fazia parte,
havia, embora em número muito reduzido, homens que garantiam a circulação das práticas
musicais. Embora fosse um personagem criado pelo autor no século XIX, Coutinho era fruto
da sociedade fortalezense, que serviu como modelo para o romance:


Desta vez ia falar o alferes Coutinho, quartel-mestre do batalhão, um moreno, de costeletas, cabelo penteado em pastilhas, certo ar arrogante de pelintra acostumado a todas as festas, desde os sambas do Outeiro aos bailes do Clube Iracema, magricela, olhos cavados. Nas horas d’ ócio dava-se ao luxo de fabricar sonetos do gênero piegas dos últimos trovadores de salão.
[...] Arrastava ao piano as valsas em moda e dizia-se exímio tocador de flauta. [...] Convidado a toda parte, não perdia ocasião de exibir-se na poesia ou na música. Tinha fama de primeiro recitador do Ceará. Ninguém como ele sabia marcar uma quadrilha, todo enfezado, sempre de lenço na mão, metido invariavelmente na sua farda de alferes com um colete branco.





Crédito: Ana Luiza Rios Martins - Entre o piano e o violão: A modinha e a cultura popular em Fortaleza (1888-1920). /Biblioteca Nacional 

domingo, 17 de julho de 2016

Estoril -Antiga Vila Morena (Vídeo)

 

Ícone da “boemia” da Praia de Iracema, a antiga Vila Morena, ou residência dos Porto, foi construída pelo comerciante pernambucano, descendente de portugueses, José Magalhães Porto, entre 1920 e 1925, e foi a primeira construção de destaque da então Praia do Peixe. O português desafiou os conselhos de amigos, que o alertavam sobre os perigos da praia, com suas ondas fortes. A teimosia fez com que ali instalasse sua moradia. O nome, como era usual à época, foi dedicado à esposa, Francisca Frota Porto, conhecida como ‘Morena’. A residência conservava ao redor um belo jardim onde também eram criadas algumas aves. Dizem que foi a primeira moradia com piscina de Fortaleza…


Veja a matéria completa no Vós



Crédito: Vós

Agradecimento especial: Paulo Maranfon e equipe

Sobrado do Dr. José Lourenço - História e Vídeo

Tido como a primeira edificação de três andares do Ceará, o sobrado do médico sanitarista Dr. José Lourenço de Castro Silva foi construído na segunda metade do século XIX, na então Rua da Palma, hoje Rua Major Facundo, para servir de residência e de consultório.

Dr. José Lourenço era natural de Aracati, nascido em 1808. Formou-se médico no Rio de Janeiro. Em seu sobrado, mantinha no térreo o consultório, onde clinicava à moda popular e nos andares superiores, vivia com a família. Morador de uma Fortaleza em clara expansão, sua casa era sinônimo de status e poder, construída numa época intitulada pelos cronistas como o mais longo período sem estiagem da história de Fortaleza [1846 a 1876 – A construção do sobrado data desse intervalo], em que a cidade se consolidou como capital, esvaziando Aracati, até então porto, entreposto comercial, sede de oficinas de charqueadas e ponto de ligação com Pernambuco, a quem fomos atrelados, politicamente, até 1799. Empolgada com o rápido crescimento de Fortaleza, as famílias abastadas começam a modernizar a cidade, construindo suas casas nos moldes dos padrões europeus. 

Conforme o professor de Mestrado em História Social da UFC, Gilmar de Carvalho, o sobrado era uma espécie de farol que irradiava a ordem médica, representado pelo seu proprietário, Doutor José Lourenço, uma figura respeitável na província, do ponto de vista de sua credibilidade como médico e de sua ética como homem público. Era o mais alto, esguio e, por isso mesmo, elegante. Trazia uma escultura em seu topo, da qual restaram apenas vestígios de mármore. Provavelmente uma figura mitológica, mas não se tem totalmente certeza como esclarece o professor do curso de Arquitetura e Urbanismo da UFC, Liberal de Castro. José Lourenço faleceu em 13 de agosto de 1874 em Fortaleza.
O sobrado na década de 70. Foto de Nelson Bezerra
No ano seguinte à morte do médico, a família alugou o sobrado ao Tribunal de Relação do Ceará (repartição judicial hoje correspondente ao Tribunal de Justiça do Estado), que funcionou no local por longos anos. Depois abrigou (por breve período) a Prefeitura Municipal de Fortaleza, uma oficina de marcenaria, bordel, casa de sombrinhas... Tudo isso pode ser encontrado, não apenas na crônica histórica ou nos anúncios de jornais, mas nas paredes, como inscrições que camadas de tintas superpostas deixam entrever no trabalho paciente do restaurador.
Fortaleza, 13 de agosto de 1874. Jornal Fraternidade, maçom, comunica o falecimento do seu membro, médico mais famoso da época, José Lourenço de Castro e Silva. Ele se tratava no seu sítio em Messejana.  Acervo Lucas
Foto de Isabela Rodrigues

Pintura em uma das paredes do sobrado, quando este funcionou como bordel. Foto de Claudecir Azevedo
A situação lamentável que estava o sobrado.
Situado no número 154/156 da Rua Major Facundo, foi protegido pelo tombo estadual (segundo a lei n° 9.109 de 30 de julho de 1968) em 2004 pela Secretaria de Cultura do Ceará. Dois anos depois, o Governo do Estado, com apoio do Instituto Oi Futuro, começa o trabalho de restauração, tendo a frente o arquiteto Domingos Linheiro, que repaginou cores e formas do belíssimo imóvel. A restauração também contou com o auxílio dos alunos da Escola de Artes e Ofícios Thomaz Pompeu. Era devolvido a Fortaleza o luxuoso casarão, de traços neoclássicos, ornado por azulejos, florões e rosáceas e telhado prismático de quatro águas. A fachada principal é coroada com um frontão triangular, com o tímpano preenchido por motivos ornamentais fitomórficos, e apresenta janelas de rasgo e de peito envoltas em arcos plenos nos segundo e terceiro pavimentos, respectivamente. A edificação se destaca também pelo tratamento dado às fachadas laterais, que possuem janelas que dão para telhados vizinhos e cornijas acompanhadas por frisos de azulejos, algo atípico para um sobrado unido às suas divisas.

O Sobrado antes da restauração. Foto: José Rodrigues
O Sobrado antes da restauração. Foto: José Rodrigues
O Sobrado antes da restauração. Foto: José Rodrigues
O Sobrado antes da restauração. Foto: José Rodrigues
Foto: José Rodrigues

Foto: José Rodrigues
O pleito amparou-se nos seguintes fatos para solicitar o tombo do sobrado:

° Evidente mérito arquitetônico da edificação.

° Valioso exemplar remanescente de uma tipologia
arquitetônica quase desaparecida na cidade.

° Precariedade na conservação do imóvel.

° Referência para a história judiciária do Ceará.

° Recentes entendimentos feitos para aquisição do imóvel pelo Governo Estadual, sem dúvida, em face das razões acima arroladas.

O trabalho de restauração foi difícil, pois muitas das técnicas construtivas do Sobrado se perderam com o passar do tempo. Azulejos tiveram de ser refeitos, o mosaico hidráulico era de procedência europeia, o lodo cobria detalhes e engastes, parte da pintura decorativa interna precisou ser refeita, o tempo corroeu as tábuas corridas e fez interferências que precisavam ser corrigidas para que tivéssemos o Sobrado de volta ao seu esplendor, explicou à época Domingos Linheiro, o arquiteto que coordenou os trabalhos.

Foto: Isabela Rodrigues
Em 31 de julho de 2007, o Sobrado Dr. José Lourenço é inaugurado ao público com nova identidade: um novo Centro Cultural aglutinador das artes visuais do Ceará. O espaço abriga salas para exposição, auditório e café, consolidando-se como local de convivência e difusão das artes visuais, possibilitando o acesso gratuito da população a uma programação comprometida com a criatividade artística e a inclusão cultural. 

Foto: Isabela Rodrigues

Foto: José Rodrigues
Teve como primeira exposição, a 4ª Mostra Cariri das Artes, intitulada “O Cariri Aqui!”. Nela, obras de artistas nascidos ou radicados na sub-região cearense foram reunidas. Na ocasião, também houve o lançamento do livro “O sobrado do Dr. José Lourenço”, organizado pelo pesquisador Gilmar de Carvalho e realizado pela Associação dos Amigos do Museu do Ceará. A publicação traz fotos das etapas da restauração, textos de renomados estudiosos cearenses sobre o ilustre médico, além da reflexão sobre os múltiplos usos do sobrado e sua significação.

Com seus mais de 150 anos, o sobrado é uma espécie de sentinela do tempo!

Horário de visitação:

Terça à sexta-feira das 09h às 19h
Sábado das 10h às 19h
Domingo das 10h às 14h.


Entrada Gratuita.



Texto publicado originalmente na minha coluna no Vós.
Agradecimento especial: Paulo Maranfon e equipe

sexta-feira, 1 de julho de 2016

Os espaços de lazer na Fortaleza de outrora


Na virada do século XIX para o XX ocorreram planos de modernização em Fortaleza que incluíram a “remodelação” do espaço urbano, ou seja, a “disciplinarização” do crescimento da cidade. Com o intuito de evitar a expansão desordenada, Adolfo Herbster preservou o traçado xadrez de Silva Paulet, vislumbrando a possibilidade de ocupação das áreas periféricas, fato que não custou a se tornar realidade, enquanto as novas elites econômicas e intelectuais, compostas por comerciantes ligados ao comércio interno e externo, de profissionais liberais como médicos e advogados, em sua maioria bacharéis formados no exterior ou na conceituada Faculdade de Medicina da Bahia, e a classe média de pequenos comerciantes, artistas, poetas e os demais trabalhadores letrados, ocupavam e valorizavam as áreas centrais da cidade, as regiões mais afastadas e com menores condições de infraestrutura foram legadas aos pobres, negros e migrantes do interior do Estado.


Esse sistema de ocupação dos espaços, inspirado nas reformas do Barão de Haussmann em Paris, contribuiu para que as diversões das camadas abastadas fossem isoladas em clubes e salões. Nesses ambientes as elites tentavam se distinguir socialmente se apropriando de bens culturais trazidos da Europa, como os pianos Essenfelder e Doner & Sohn, que eram encontrados em um número reduzido e ritmos europeus como a valsa, a polca, o schottisch e a quadrilha. Já nos areais das zonas periféricas, a “arraia miúda” (designação degradante que os grupos elitistas faziam das camadas empobrecidas, sobretudo aqueles que bebiam e frequentavam bordéis na cidade) se divertia com suas manifestações tradicionais como os fandangos e maracatus. No entanto, essas festas eram, em grande parte, desmanchadas pelas autoridades policiais, com a justificativa que causavam muitos tumultos. Essa condição suburbana imposta a uma parcela da população cearense desfavorecida economicamente, de fato, contribuiu para o surgimento de uma cultura “à margem” do “afrancesamento” e do requinte aclamados pelas elites locais.



Porém, essas “restrições” não foram suficientes para conter a aproximação dos artistas, sobretudo os boêmios, com os mais humildes nas zonas periféricas ou à noite nos espaços públicos. Dos cronistas pesquisados, Otacílio de Azevedo foi o que mais se preocupou em analisar esses episódios. Apesar de Azevedo ser um memorialista e olhar o passado com saudosismo, trouxe em sua escrita um olhar diferencial sobre o movimento musical de seu tempo, que pode ser confrontado com as outras fontes. Ele mesmo foi um grande frequentador dos ambientes relatados, junto com os seus companheiros boêmios.
Foi encontrado em seus escritos o Café do Pedro Eugênio, localizado na segunda seção da linha do Benfica. Esse café “abrigava”, nas noites de sábados e domingos, seresteiros, arruaceiros e intelectuais, como Quintino Cunha, Virgílio Brandão, Carlos Severo, Carlos Gondim, Raimundo Ramos e Mamede Cirino. Pedro Eugênio residia em um casarão ao lado do estabelecimento, antigo Dispensário dos Pobres.


Outro recanto de artistas era o sítio de Pedro Dantas, localizado no logradouro “Mata Galinha”. Estava situado entre Fortaleza e Messejana, local que hoje é chamado de Dias Macedo. Observa-se nos relatos que músicos como Rossini Silvia, Artur Fernandes, Edgar Nunes, Aristides Rocha, Antônio Moreira, Júlio Azevedo, Alfredo Martins e Boanerges Gomes, esse último contrabaixista da orquestra do Cine Majestic, misturavam-se com “gente de todo o tipo”.




A Barbearia de João Catunda foi um lugar, um tanto excêntrico, que serviu de divertimento para poetas, músicos, pintores e teatrólogos reconhecidos pelas suas obras
artísticas em nossa capital. O “salãozinho pobre” de João Catunda era localizado na Rua Floriano Peixoto. A simplicidade do ambiente de teto de estopa caindo, onde os fregueses se
equilibravam em velhos bancos e se refletiam em espelhos mofados e carcomidos, não impedia de se criar um ambiente de debates calorosos. A preferência por esse local era tanta
que passou a ser sede da Academia Rebarbativa, composta por Carlos Severo, Josias Goiana, Luís de Castro, Genuíno de Castro, João Coelho Catunda e José Gil Amora. Otacílio de Azevedo aponta que após as reuniões da academia os boêmios se embebedavam e terminavam a noite na Praça do Ferreira, sentados num banco diante do Café Iracema, de Ludgero Garcia, onde discutiam literatura, “metendo a lenha nos medalhões da época”, como o Barão de Studart, Papi Junior, Antônio Sales, entre outros.


No entanto, é na “Lapinha” (Denominação popular do pastoril) do Paula Ramos que se percebe a intensidade desse contanto com os diferentes grupos, pois encontramos também figuras femininas, cujos relatos dos cronistas eram escassos a respeito da participação delas em divertimentos desse tipo em Fortaleza no período. Empregadas domésticas e lavadeiras tiveram acesso à maioria das músicas que embalaram suas vidas nesse ambiente como foi observado por Azevedo. A Lapinha do velho Paula Ramos se tornou bastante famosa em Fortaleza. Estava situada na Rua do Imperador, para onde se dirigiam à noite centenas de pessoas. Elas costumavam pagar duzentos réis pela entrada no presépio construído sobre o dorso de uma serra, talhada em latas velhas amassadas e cobertas de papel grosso pintado, imitando pedras. Uma pequena máquina rodava sobre os trilhos soltando fumaça, apitando insistentemente e levando atrás um comboio. Um velho gramofone fazia a parte musical, tocando “valsas chorosas” à luz da meia dúzia de lampiões de acetileno.





É notável o empenho de Otacílio de Azevedo em demonstrar que os divertimentos acompanhados por música aconteciam em locais inusitados, e não somente nos clubes, nos
salões e nos teatros. Outro cronista, que também publicou livros documentais e analíticos
sobre música e que analisou a interação entre diferentes tipos sociais nesses locais foi Edigar
de Alencar
. A bodega, por exemplo, foi destacada pelo escritor como um ambiente catalisador e divulgador da criatividade musical entre seresteiros e ex-cativos cantadores.

 


A bodega na Fortaleza de anteontem foi sempre nota de realce da vida pacata da sua gente. Ponto de convergência e reduto de importância acima das rotineiras e modestas atividades mercantis. Assim com a farmácia era o local destacado – e ainda hoje deve ser – dos vilarejos e burgos do interior, a bodega nas cidades maiores era sem dúvida elemento catalisador e divulgador dos acontecimentos que merecessem essa qualificação.
As bodegas mais famosas da cidade eram do Mané Boi (Imperador), do Zé Ramos (Santa Isabel), do Gambetá Bruno (Imperador), Do Maracanã (Imperador), do Zé Macieira e do Chico Ramos (na Tristão Gonçalves, ou Trilho de Ferro), a do Lopicínio, do Eduardo Garcia e do Chico da Mãe Iza. A maioria das bodegas citadas estava localizada em terrenos centrais da cidade e não nos areais. Esse dado é revelador, já que as sociabilidades entre indivíduos empobrecidos podiam ocorrer também em terrenos fora da periferia. Lugar de música e de boemia, a bodega do negro Chico da Mãe Iza foi muito frequentada por seresteiros e violeiros. Francisco Borges da Silva, conhecido como Chico da Mãe Iza nasceu no Icó e possuía uma bodega localizada na Rua 24 de Maio.
Era na bodega famosa que os seresteiros imprevidentes se iam suprir, quando lhe rebentavam de súbito as primas e os bordões: - Ih! Rebentou a terceira! Temos que ir bater no Chico da Mãe Iza! E mesmo que se encontrassem em pontos distantes da Rua 24 de Maio, vinham pela madrugada, batiam na porta e o bodegueiro aparecia, mal refeito pelo sono, para servi-los já ai não só de cordas de violão, mas de generosos tragos de pinga do Acarape, do anis e da genebra ordinária da fábrica de Paulino de Oliveira da Rocha.



A frequência dos boêmios nesse tipo de estabelecimento era tanta que Raimundo Ramos dedicou uma estrofe de seus versos: Palestra de bodega é bebedeira. Os comerciantes, acostumados com a circulação da boemia, abriam seus estabelecimentos fora do horário comercial. O bodegueiro Rato, por exemplo, só abria as portas com a condição de que os músicos tocassem “Zé-Pereira”.* Sua bodega era localizada nos areais da cidade, ou seja,
nos trechos não calçados. Os quiosques situados nos logradouros serviam também de estimulante opção para a boêmia. Nesses ambientes tudo indica que havia exagero de consumação alcoólica.



Os seresteiros, também conhecidos como modinheiros, foram responsáveis pelas resignificações culturais que ocorreu fortemente nessa virada de séculos. No entanto,
observando os relatos de cronistas, periódicos e partituras editadas, percebemos que os
seresteiros pertenciam a “boas famílias” e não encontravam proibição em circular desde
espaços de lazer “da fina flor da sociedade” até os areais. Apesar dessa abertura, os modinheiros não deixavam de ser escrachados pelos familiares das moças galanteadas, que os
viam como irresponsáveis por causa do gosto pela bebida, pela polícia, que os rotulavam como desordeiros por andarem nas ruas de madrugada tocando o violão, e pela Igreja, que não acreditava que as posturas tomadas por esses indivíduos fossem condizentes com a
moralidade da época.

Os bancos das praças públicas em noites de luar serviam para o lazer e a criatividade desses boêmios que se juntavam a mulheres de toda sorte e a todo tipo de gente “degradante” da sociedade. A troca de experiências desses grupos em alguns momentos era produtiva, pois, enquanto os modinheiros se utilizavam dos exemplos de vida dessa gente para compor suas músicas, os habitantes das zonas periféricas aprendiam esse novo saber musical, ou seja, uma nova estética para adicionar a suas manifestações tradicionais. Também propagadoras desse saber musical eram as seresteiras domésticas, mulheres que atenuavam seus problemas cotidianos com o canto de modinhas. Sobre isso Edigar de Alencar comentou:

“Das cozinhas e dos quintais do casario humilde as modinhas subiam aos ares, através da voz
nem sempre afinada das mulheres e das moças lavando e engomando roupa, ou atenuando a
dureza dos afazeres domésticos”.



É possível observar que as diversões dos sujeitos de posses, sobretudo as dos grandes comerciantes, grupos ligados ao regime oligárquico e estudantes recém formados na faculdade de Recife, buscavam se isolar criando suas próprias diversões. Os bailes eram realizados, em sua maioria nos poucos palacetes existentes em Fortaleza, sobretudo nos do Mendes Guimarães, do Capitão-mor Joaquim Barbosa e do cônsul Manuel Caetano de Gouveia. Os salões particulares se denominavam soirée, partida ou sarau, mas todos queriam
dizer a mesma coisa: um evento musical em casas privadas que incluía, em geral, mais do que
apresentações musicais. Normalmente ocorria a leitura de poesia, seguida de número musical,
canto e piano ou peças instrumentais e, por vezes, até peças cômicas estavam entre as atrações da noite. Após o evento, um jantar era oferecido, seguido do baile.
Raimundo Girão narrou alguns dos episódios que ocorreram nos bailes realizados no sobrado do Coronel Eustáquio, em comemoração à vinda do presidente da província
Fausto Aguiar e de sua esposa. Percebemos na descrição de Girão que apresentar “boas
maneiras” nesses eventos era essencial para que os indivíduos fossem aceitos pelos grupos.
Essas “boas maneiras” podiam ser entendidas naquele período como um conjunto de práticas
sociais que incluía a forma de se pôr a mesa, de vestir, de falar, de dançar, de declamar versos
para os convidados, entre outros.




Das sete horas da noite em diante começaram a concorrer os convidados, e à proporção que se aproximava qualquer família, era sua vinda anunciada pela música que, postada na portada do edifício, fazia ouvir agradáveis sons, enquanto os mestres-sala recebiam as senhoras à entrada e as conduziam às salas, onde o bom gosto, com que se achavam vestidas, de tal modo fazia realçar as graças com que a natureza as dotou, que atraiam sem cessar as vistas de todos os assistentes, os quais, com a presença de tantos encantos, aumentavam a alegria de que se achavam dominados. [...] No curso do baile houve mui bem desempenhadas contra-danças, que tinham lugar ao mesmo tempo em ambas as salas, dançando em cada uma, uma vez, dezesseis ou doze pares; os intervalos foram cheios ou por modinhas que algumas senhoras se dignaram cantar com geral aplauso, ou valsas desempenhadas com toda agilidade, tendo também em um deles a exmª Senhora do sr. Presidente, por sua bondade e cedendo às instâncias do Dr. Fernandes Vieira, tocando com todo primor no piano algumas variações da Norma. Antes de concluir-se o baile, foi recitado um soneto e para maior brilhantismo haviam preparado não pequena porção de fogos de artifício, a saber: bastante fogo no ar, figuras, rodas, um balão, etc., O chá foi servido a contento de todos, havendo nele muita riqueza e profusão, notando-se em tudo uma admirável variedade. Finalmente, todo o baile esteve excelente, tendo sido o único inconveniente o de não ter casa bastante cômodo para os
concorrentes.

Os motivos pelos quais Raimundo Girão lançou o olhar sobre essas práticas e espaços estão intrinsecamente relacionados ao lugar social com que ele se identificava. O historiador concebeu suas crônicas a partir das experiências como diretor do Instituto do Ceará, prezando a racionalização dos espaços e dos “bons costumes” como metas para alcançar o progresso. De uma forma geral, os bacharéis em Direito, dos quais Raimundo Girão fazia parte, desempenharam papel fundamental na construção dessa nova ordem urbana.
Assinaladas pela racionalidade cientificista em voga na Europa, formaram instituições de saber, compartilharam dos mesmos anseios civilizatórios das classes dominantes e colaboraram estreitamente com o Estado ao conferir a competência técnica que o poder então
carecia. Galgando prestígio científico e político, esses grupos de letrados pretendiam instaurar
novos conhecimentos e representações sobre a cidade, fazendo circular um campo de diversificadas “verdades” e medidas voltadas para o ajustamento da população às novas
regras de vida e trabalho urbanos.


No entanto, pequenos vestígios da interação social entre grupos distintos aparecem brevemente na obra Geografia Estética de Fortaleza, de Raimundo Girão. Ao tratar das diversões tradicionais da pequena província entre os anos de 1830 e 1870, Girão tece um pequeno elogio saudoso às antigas festinhas domésticas de que “todos” participavam e que
ocorriam no meio da rua, como as noites de São João nos arruados térreos e as brincadeirinhas de cirandas e pastorinhas nas praças encobertas de areia e embora termine seu comentário aclamando o estilo de vida europeu, que proporcionou ensinamentos que, segundo ele, eram postos em prática nos bailes mais luxuosos da cidade.



Continua...

* “Zé Pereira”, marcha que, segundo Edigar de Alencar, há muito ganhara o status de hino do carnaval brasileiro. A sua quadrinha se tornou célebre como grande grito do carnaval: “Viva o Zé Pereira/ que a ninguém faz mal./ Viva a pagodeira/ nos dias de carnaval.” Cf.: ALENCAR, Edigar de. 1967. Op., cit., p. 25.


Crédito: Ana Luiza Rios Martins - Entre o piano e o violão: A modinha e a cultura popular em Fortaleza (1888-1920). /Biblioteca Nacional

segunda-feira, 27 de junho de 2016

Palácio do Bispo - Paço Municipal




Casarão construído na primeira metade do século XIX pelo Sargento Mor e comerciante português Antônio Francisco da Silva, que lá instalou o seu armazém de alimentos. O prédio depois foi vendido ao comendador e rico negociador, Joaquim Mendes da Cruz Guimarães, proprietário até 1860. Foi um dos primeiros casarões de Fortaleza, originalmente de linhas neoclássicas. O sobrado destacava-se pelas aberturas encimadas com arcos plenos, apresentando uma predominância de cheios sobre vazios e um aspecto compacto, este expresso pelos altos muros que cercavam a edificação. Situado a Rua das Almas – Hoje Rua São José, entre as ruas Rufino de Alencar e Costa Barros.

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Crédito: Vós

Agradecimento especial: Paulo Maranfon e equipe

terça-feira, 21 de junho de 2016

Palácio da Luz - Academia Cearense de Letras (Vídeo)


 

Construído com o auxilio de mão-de-obra indígena, o Palácio da Luz serviu inicialmente de residência ao capitão-mor Antônio de Castro Viana. Pertenceu posteriormente à Câmara Municipal, sendo depois vendido ao Estado para abrigar o Governo, pela Provisão Régia de 27 de julho de 1814.

Edificação do século XIX, o Palácio é um polígono com frentes para a rua Sena Madureira, Praça General Tibúrcio e Rua do Rosário e fundos para a rua Guilherme Rocha.



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Agradecimento especial: Paulo Maranfon e equipe

O Centenário prédio do Museu da Indústria

 

 


O prédio já abrigou clube, Hotel e até a primeira sorveteria do Ceará.
Um museu, muitas histórias!

Durante o período imperial, mais precisamente em 1871, foi construído o belo sobrado da Rua Dr. João Moreira, 143 (esquina com a Rua Floriano Peixoto). Situado em frente ao Passeio Público, emoldurando o logradouro mais elegante da cidade, foi inicialmente a segunda sede do primeiro clube social de Fortaleza, o Sociedade União Cearense (Club Cearense), que antes esteve instalado num sobrado residencial na rua senador Pompeu.


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Agradecimento especial: Paulo Maranfon e equipe



terça-feira, 31 de maio de 2016

Tipos Populares - Manezinho do Bispo ( V+D )




Manuel Cavalcanti Rocha, figura da mais ridicularizadas da galeria de tipos populares do Ceará, deu de comparecer as páginas do Correio do Ceará a partir de 1918, através da opção da seção "Ineditoriais", subordinando sempre os seus escritos a legenda V + D (Viva mais Deus), a começar do dia 29 de abril. É o conhecido Manezinho do Bispo, de quem a referir-se ao bispo Dom Joaquim José Vieira, relatou o escritor Gustavo Barroso em seu terceiro livro de memorias, Consulado da China: “Também nos visitava a miúde Manuel Cavalcanti Rocha, o celebre Manezinho do Bispo, débil mental (sic), magro, pálido, anzolado, que publicava uma vez por outra folhetos de pensamentos os mais disparatados do mundo. No meio, alguns deliciosos: “Rapaz moço e sem emprego que se casa com uma moça de dinheiro, da um tiro com a pistola da besteira nos miolos do futuro”.

Segue o autor de Terra de Sol: “Meu pai tratava-o com a maior tolerância, por causa do Bispo, seu amigo e compadre. Meu padrinho troçava dele e provocava-o a asneira. Eu achava-lhe graça. O coitado era inofensivo. Empregado na Cúria, costumava acompanhar o Bispo, envergando uma batina coçada e coberta com um velho chapéu de padre. Na rua,andava a paisana, carregando jornais e um maço de folhetos de pensamentos debaixo do braço”.

No livro Geografia Estética de FortalezaRaimundo Girão traça-lhe o
perfil: “Do Manezinho do Bispo e possível extrair matéria para um grosso
livro. Manuel Cavalcanti Rocha ou, literalmente, M. da Rocha (Sic), eis
como se chamava. Do Bispo, dos seus escritos, na imprensa e em libretos,
e o seu estilo tornaram-se prato delicioso dos espíritos galhofeiros. As
suas Máximas e Pensamentos tiveram repetidas edições. Já houve quem
aventurasse a hipótese de que daí nasceu o futurismo. Manezinho, diz Pedro Sampaio, “afamou-se não só por suas lucubrações literárias, expressão de que servia quando falava dos opúsculos literários que publicava, com pensamentos, máximas e mil coisas estapafúrdias e ridículas”.

Aquele seu aludido livro - continua o escritor Raimundo Girão - Máximas e Pensamentos, ele o ofereceu a todos os porteiros e eiras do universo, e traçou, noutro a biografia de sua ex-mãe, pois que ela já havia morrido.

Uns pensam que era espertalhão, haja vista Monsenhor Quinderé, que o conheceu intimamente, e afirma, entre outras coisas, que o Manezinho, “quando servia a mesa, ia jeitosamente afastando dos comensais os pratos que mais apeteciam”. Desnecessário é examinar-lhe a personalidade depois que lhe fizeram este perfil.

“Raquítico, bisonho, enfermiço e amarelo,
Débil corpo atrofiado ao divino cilício;
Amarfanhado rosto imitando um chinelo
Imprestável, caído em já findo exercício...

Alma simples, cristã; coração largo e belo;
Vida pura de santo afeito ao sacrifício
Dos segredos jejuns... Filósofo singelo:
Porteiro e a sua missão: pensar - seu ofício:

Literato de escol, pensador incansável.
Biografou sua mãe, editou "Pensamentos”...
E honra a terra natal com as produções mais ricas...

É um devoto de ideia, um gênio inquebrantável,
O melhor escritor dos hodiernos momentos
E o maior Maricão de todos os Maricas!...



Manezinho era o homem de confiança do Bispo Dom Joaquim e valia-se da seção “Ineditoriais”, que a imprensa da época reservava às colaborações dos leitores, para publicar seus confusos escritos sem pé nem cabeça. Simplório, divertido e bem intencionado, praticando as letras com ingenuidade e despretensão.
Andava sempre empacotado num desbotado e surrado terno de alpaca, gravata preta e chapéu. Os bolsos do paletó, abarrotado de papeis, seus escritos. Dias e noites, era comum avistá-lo na abençoada portaria do Palácio.

Simples e humilde porteiro da Arquidiocese de Fortaleza, de veleidades literárias, pueris, alvo do deboche de seus coevos nada indulgentes, acabaria por conseguir legenda de histórias curiosas, anedotas e peças “literárias” que, deturpadas ou não, mas certamente reconstruídas em alguns casos pela parceria irreverente e ardilosa de terceiros, conseguiram transformar o autor em figura das mais populares, senão na maior delas, da cidade de Fortaleza, há três quartéis de século passados, quando a vida provinciana podia entreter-se melhor com os tipos de sua convivência comunitária, afetiva.

O seu folheto Máximas e Pensamentos, referido por comentadores de sua simplória existência, na versão que conhecemos, intitula-se Novos Pensamentos. Obra rara, publicada em 1903, muito antes da dedicada colaboração do autor no Correio do Ceará, exercida por seis anos seguidos até onze dias antes de morrer, em 1923.

Naquela edição referida, o pensador escreve dedicatória que se tornou famosa: “A segunda edição de meus toscos Novos Pensamentos eu faço em homenagem a todos os porteiros e porteiras de estabelecimentos do mundo inteiro, especialmente os que tem o meu nome de batismo; e um trabalho recreativo e simples, feito só por minha conta, em sinal de amizade aos meus companheiros de literatura que melhor sabem usar da caridade com quem vive da pena em tempos críticos”.

Todos os exemplares de Novos Pensamentos de Manoel Cavalcanti Rocha recebiam sua assinatura precedida deste aviso:

“São considerados falsos os exemplares que não tiverem o emblema e a firma do autor”.



Animado por insofreada ingenuidade, Manezinho do Bispo edificou-se à contemplação da vida religiosa de sua área de trabalho, insistindo sempre em que todos praticassem o bem, e permanentemente submetido a São José, santo de sua especial devoção.

Não são incomuns seus conceitos abrangendo certa reflexão moral. Em 2 de março de 1923, por exemplo, em nota divulgada pelo Correio do Ceará, adverte os leitores:
“A economia e a temperança:São os bens da prosperidade e riqueza”

Por ocasião de seu sepultamento, em 31 de julho de 1923, o Correio do Ceará inseriu com destaque à ilustração fotográfica extenso necrológio entretecido de considerações extremamente simpáticas sobre o extinto, a quem se referiu da maneira que se segue:

“A sua extrema simplicidade, a ingenuidade de sua alma, que foi sempre pura, jamais lhe acarretou um animadversão. Na desconexão de suas 'sentenças' palpitava a virginal candura de um bom. O público, que sempre se deliciou com as 'máximas' do Manezinho, lia, às vezes, incrédulo, os escritos deste e suspeitava que por perversidade atribuíssem ao nosso Colaborador coisas mais ou menos disparatadas”.

Disparate ou não, o que redigia está mais generosamente divulgado pelo jornal de A. C. Mendes, pois a propria nota esclarece que o cronista
pensador dava-se por “cavaquista com os erros de revisão”, acrescentando:

“O fato seguinte revela inocência e a sua real bondade. Sempre foi vezo no nosso jornalismo, em meio ao acesso das polêmicas dizer-se desdenhosamente que Fulano ou Sicrano e um rival de Manezinho do Bispo.
Fê-lo, certa vez, a A Tribuna com relação a alguém. Lendo o paralelo e
compreendendo o motejo da comparação, o Manezinho queixou-se:

"- Eu só admiro o Dr. Távora deixar fazerem isso comigo: ele é meu médico e devia saber que isso me faz mal”.

A pergunta que não quer calar: Teria Manezinho do Bispo nascido em Fortaleza? No interior do Ceará?
Nada do que escreveu, nos leva a imaginá-lo nascido no Ceará, que, em nenhum momento de seu canhestro exercício “literário” está registrado objetivamente o lugar de seu nascimento, a não ser o que se pode ler na crônica do dia 8 de agosto de 1919 (in Correio do Ceará), mencionando a assinatura do Armistício,comemorado efusivamente em todo o Brasil, e, para ele em particular, em Pernambuco:

“... hoje, 25 de julho de 1919, a bela capital do Recife participa destas alegrias e festa; é motivo de felicitar as autoridades eclesiásticas e civis
e nosso amado e querido torrão natal (grifo nosso). É justo quanto louvável assim proceder,dando boas novas de gratidão ao bom Deus, que quer nos fazer sempre o bem a todos...


Ao tempo em que viveu Manuel Cavalcanti Rocha (nascido em 12 de maio de 1866, e criado sem se saber como, saindo da capital pernambucana, veio parar no então Palácio do Bispo), não se pode dizer que ingênuo e medíocre, em sua maneira de pensar e escrever, fosse ele só.
Outros, não fazendo exceção, compareciam aos jornais da época (principalmente os editados de 1902 a 1923), acolhidos pela seção Ineditoriais bastante frequentada ao tempo, onde se viam acusações grosseiras, versos de louvação, ou insultosos, elegias e ridículas notas de falecimento ou de aniversário como esta:


”ANIVERSÁRIO NATALÍCIO:

Desabrochou mais uma pétala o botão de rosa, Julieta Carneiro Monteiro, desprendendo impetuosamente, hoje, que decorre mais um ano de sua preciosa e encantadora existência.” (In Correio do Ceará, 27-10-23.)

Em 12 de maio de 1923, o jornal Correio do Ceará, dirigido pelo jornalista A. C. Mendes, em duas colunas, com foto conferindo destaque à notícia, registrava o aniversario de Manuel C. Rocha (e não M. C. Rocha):

“Completa hoje 57 anos de uma existência toda consagrada a literatura astronômica e as funções árduas, porém honrosas, de porteiro do Palácio Arquiepiscopal, o popularíssimo pensador cearense Manuel C. da
Rocha, autor de vários apreciados opúsculos de Máximas e Pensamentos,
um dos quais dedicado “a todos os porteiros e eiras do Universo” (seus
colegas) e outro “a minha ex-mãe (porque já era falecida)”.

Pela manhã de hoje, documentando mais uma vez a sua originalidade,
o aniversariante veio à nossa redação deixar-nos uma caixa de fósforos cheia
de coupons da Ceará Tramways para os pobres de S. Vicente de Paulo.

Duvidamos que haja com quem com mais efusão de alma felicite hoje o Manezinho, agradecido que lhe somos pela preferência que ele dá ao Correio para a divulgação de suas muito sérias cogitações literárias.



Antes de ir residir no Palácio do Bispo, onde exerceria as funções de porteiro, Manuel Cavalcanti Rocha morou em modesta casa, de sua propriedade, na Estrada do Gado, depois ocupada por compadre seu,José Rodrigues Cordeiro, casado com D. Maria Rodrigues d'Andrade. Nesse local, às 10 horas do dia 16 de junho de 1916, segundo relato divulgado no dia 23 de janeiro de 1919, Manezinho do Bispo procedeu a entronização da imagem do Sagrado Coração de Jesus, benta por D. Manoel. Na ocasião explicava para os leitores: “O espírito de rebelião matou grande parte de anjos e homens. Humildade no caso.”

Festejado com recepção no jornal Correio do Ceará pelos seus trinta e cinco anos de trabalho exercidos na portaria do Palácio do Bispo,Manezinho se dirigiu a tipógrafos que o homenageavam:


LEMBRANÇA DO DIA 1° DE MARÇO DE 1919
VIVA SÃO JOSÉ

Os bondosos artistas tipógrafos do Correio do Ceará pedem para aceitar o insignificante presente, em sinal de muita consideração, não reparando o conteúdo.
Dá uma pessoa que ajusta hoje trinta e cinco anos de morada num
estabelecimento. Já é um caso bem raro no Brasil, abracemos a perseverança, e saibamos cumprir os nossos deveres, sobretudo para com o bom Deus, e também para com o próximo. Estes são os meus desejos, ficando às ordens dos amigos, que saberão desculpar a tosca linguagem. Seguindo-se a assinatura: Note bem! O presente e uma dúzia de ótimos pães, Manuel C. Rocha”.



Fonte: O Ideário de Manezinho do Bispo (1992) de Eduardo Campos.

sexta-feira, 6 de maio de 2016

Edificações que contam a história de Fortaleza



 

Nos últimos 80 anos vimos a cidade crescer vertiginosa. Alguns prédios ficaram como verdadeiras joias, testemunhas da passagem do tempo. Vamos conhecer um pouco mais sobre o Excelsior Hotel, Instituto Dr. José Frota, Náutico Atlético Cearense, Edifício Clóvis Beviláqua, Palácio da Abolição, Shopping Center Iguatemi, Mercado Central e Centro de Eventos do Ceará.

Veja a matéria completa no Vós



Crédito: Vós

Agradecimento especial: Paulo Maranfon e Ronaldo Moreira (Café)

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