Fortaleza Nobre | Resgatando a Fortaleza antiga
Fortaleza, uma cidade em TrAnSfOrMaÇãO!!!


Blog sobre essa linda cidade, com suas praias maravilhosas, seu povo acolhedor e seus bairros históricos.

domingo, 2 de dezembro de 2018

Os Jardins de Fortaleza II

Nos jardins de Fortaleza, os cata-ventos estavam geralmente associados a caixas d’água metálicas, adquiridas provavelmente de países europeus como parte do rico universo de edificações, instalações, equipamentos e componentes arquiteturais importados em massa por países latino-americanos em processo de urbanização a partir do século XIX. Esses reservatórios d’água “destinavam-se à irrigação dos jardins públicos por gravidade” e “formavam binário com cata-ventos destinados a elevar a água das cacimbas adjac
entes”. (T. Lindsay Baker - 2012, p. 120).
 

Nos Estados Unidos, embora predominantes no contexto rural, cata-ventos eram instalados em áreas urbanas em várias partes do país, já que governos locais financiavam a escavação de poços e a construção de moinhos para uso público. Cavalos e mulas usados em meios de transporte anteriores à era do automóvel demandavam consumo regular de água, de modo que “próximos aos poços construíam-se cochos de concreto, madeira ou aço com lados de altura apropriada para os animais beberem confortavelmente”. (Cf. ibidem, p. 120).

Esse sistema foi registrado no país a partir do final do século XIX e desapareceu após a década de 1920, com a era do veículo automotor. As imagens que o autor T. Lindsay Baker fornece de distritos urbanos dos Estados Unidos - Kansas City, no Kansas, e Ruskin e Farnam, em Nebraska - mostram poços e moinhos semelhantes às cacimbas e cata-ventos de Fortaleza, mas nenhum deles instalado em jardins. Tais ilustrações - entre outras de San Diego, na Califórnia, e Canyon, no Texas - retratam cochos, carroças, vias sem pavimentação e áreas livres cobertas por terra, sem tratamento paisagístico, indicando que os moinhos bombeavam água para os animais ou para a população, mas não para a irrigação de jardins públicos.


Em Fortaleza, a exemplo do que ocorria em áreas urbanas dos Estados Unidos, a municipalidade era responsável pela instalação e manutenção de cata-ventos em logradouros públicos, segundo consta na seção de finanças municipais sob a rubrica “conservação de cataventos e motores” no Anuário Estatístico do Estado do Ceará relativo aos anos de 1922, 1923 e 1924.

No entanto, no começo do século, ao comentar a seca de 1900, Raimundo Girão afirma que, àquela época, Fortaleza revelava uma “simplicidade provinciana de praças ainda sem jardins, antes monótonos quadros de pastagem do gado à solta”. Naquele tempo, a cidade contava com o Passeio Público, mas ainda não haviam sido ajardinadas as praças do Ferreira e Marquês do Herval, o que veio a ocorrer entre 1902 e 1903.
 


Sobre a Praça do Ferreira, diz Gustavo Barroso (1888-1959) que, durante a seca de 1877-1879, foi aberta em seu centro uma cacimba em pedra lioz para provisão d’água, ao lado da qual se instalou “um chafariz do sistema que os franceses denominavam fontaine Wallace”. Essa peça parece ter sido substituída posteriormente, já que, na época de seu ajardinamento, em 1902, a praça dispunha de cata-vento e caixa-d’água e bacias para irrigação, conforme postagem anterior.

Até então, a Praça do Ferreira era um antigo areal chamado Feira Nova com um “cacimbão no centro”, ponto de parada dos comboios vindos do interior, a que se mostrariam úteis “as mongubeiras e as castanholas floridas, enchendo o solo da frescura das sombras doces e dos frutos gostosos”, bem como a água da cacimba, em palavras de Raimundo de Menezes (1903-1984).

É possível que cacimbas perfuradas para obtenção d’água doce tenham sido aproveitadas quando do ajardinamento de praças, dotadas de cata-ventos e reservatórios. Segundo Liberal de Castro, escavavam-se cacimbas de uso público no ponto central das praças, que, uma vez “ajardinadas, ganhavam caixas-d’água e cataventos, instalações usadas na elevação e na rega dos jardins”.



Contudo, segundo iconografia da época, a Praça General Tibúrcio, ajardinada entre 1913 e 1914, não tinha cata-vento, de modo que desconhecemos quais teriam sido as soluções adotadas para sua irrigação. Por sua vez, a Praça José de Alencar (hoje Waldemar Falcão, que não deve ser confundida com a atual José de Alencar, antiga Marquês do Herval), embora não ajardinada, era dotada de um cata-vento e de um reservatório, além de um chafariz.


Dessa maneira, supomos que a água bombeada pudesse servir para o consumo dos moradores ou dos animais que trafegavam na cidade anteriormente à popularização do automóvel ou vinham do Sertão - nesse último caso, assemelhando-se ao que ocorria em localidades urbanas dos Estados Unidos.
A partir dos anos 1930, a iconografia urbana da capital cearense, nela incluindo-se as fotos do Álbum de Fortaleza, de 1931, mostra que os logradouros urbanos não mais possuíam cata-ventos. Naquela época, a cidade já dispunha do novo serviço de abastecimento d’água, o qual compreendia captação, adução por tubulação, armazenamento em duas caixas d’água localizadas na Praça Visconde de Pelotas e rede de distribuição.

Esses reservatórios eram remanescentes da década de 1910, pois coube ao governador Antônio Pinto Nogueira Accioly (1896-1900, 1904-1912) iniciar as obras do sistema de abastecimento d’água, o qual foi inaugurado somente posteriormente, na gestão estadual de José Moreira da Rocha (1924-1928).62 O novo serviço, todavia, tinha “capacidade de abastecimento parcial à população”.



Fotos daquela época indicam que, se por um lado os cata-ventos já haviam desaparecido das praças ajardinadas, sua existência resistia nos quintais das casas, pois ainda deviam desempenhar importante papel no fornecimento d’água para o consumo doméstico. Segundo Emy Falcão Maia Neto, em 1927, os cata-ventos continuavam sendo anunciados pelas funilarias, sinalizando que faziam “circular água aonde a rede ainda não chegava ou como uma fonte alternativa para fugir dos preços cobrados”.


Naquela década, após a reforma completa que lhe foi imputada, em 1925, no governo do prefeito Godofredo Maciel (1924-1928), a Praça do Ferreira, que antes possuía cata-vento e caixa-d’água, aparece destituída de ambos em fotos da época. Tais imagens ainda deixam ver a presença de fícus-benjamim  no contorno da praça, exemplificando o plantio de espécies arbóreas resistentes, conforme postado anteriormente.


O desaparecimento do sistema de irrigação por moinho eólico também se verifica na Praça José de Alencar. Em 1929, em seu espaço central, antes ocupado por pavilhão, cata-vento e reservatório d’água, foi instalada a escultura do escritor que nomeia o logradouro.


Portanto, admitimos que os anúncios veiculados pelo jornal O Povo entre 1928 e 1930 e antes referidos ofereciam, de fato, cata-ventos usados, tendo particulares como possíveis interessados. Esse é um marco cronológico razoável para o seu desaparecimento dos jardins públicos da cidade, ainda que permanecessem nas propriedades privadas.


Leia também a Parte I

Créditos: Aline de Figueirôa Silva (Arquiteta e urbanista) - Artigo: À procura d'água: cata-ventos americanos nos jardins de Fortaleza, Folha do Litoral de 1918, Jornal A Lucta de 1922, Jornal A Razão de 1931, Jornal A Ordem de 1930, Revista do Instituto do Ceará de 1899, Arquivo Nirez, Arquivo Fortaleza Nobre e Museu da Imagem e do Som.

sexta-feira, 30 de novembro de 2018

Os Jardins de Fortaleza


Em Fortaleza, a alta incidência de sol foi um fator importante na seleção e nos modos de plantio da vegetação arbórea, em razão da necessidade de sombra como condição favorável à permanência nos jardins públicos. A vegetação constituía um recurso de amenidade climática e remodelação da fisionomia da cidade, trazendo benefícios diretos ao bem-estar da população, à estética e à salubridade urbana.

Desse modo, a seleção das espécies botânicas, especialmente das árvores, nativas ou exóticas, que identificamos nos jardins, podia vincular-se tanto aos seus aspectos ornamentais (floração, atributos das copas, troncos e folhagens) quanto utilitários (sombreamento, rápido crescimento e resistência à estiagem).

Revistas e jornais dos anos 1920 e 1930 ressaltavam a arborização das vias e jardins da cidade, ora enaltecendo as ações realizadas pelo poder público, ora reclamando contra sua escassez, prescrevendo seus benefícios ou ainda apelando à população para conservá-la.

Exemplo disso é uma matéria publicada no Ceará Ilustrado de janeiro de 1925 que enfatizava a necessidade “duma praça intensamente arborisada, onde nas horas de canicula a população pudesse abrigar-se á sombra das arvores”, recomendando o plantio de “mangueira ou outras plantas fructiferas e exóticas” no Parque da Liberdade.¹ A mesma matéria abordava as vantagens do plantio de árvores, bem como apresentava justificativa para a escolha de algumas espécies. Apontava a chegada da estação chuvosa como oportuna para avançar no serviço de arborização da cidade, a fim de facilitar “a péga das arvores”, que deveriam ser “de especies resistentes ás seccas”, citando o oitizeiro, o fícus-benjamim ou a figueira e a canafístula.



De fato, entre as espécies arbóreas, o exótico fícus-benjamim encontrava-se em vários jardins de Fortaleza - espécie de rápido crescimento e copa densa, atributos importantes para garantir a necessária provisão de sombra.


Documentamos ainda a existência dos nativos oitizeiros no Passeio Público e no Parque da Liberdade, castanholas e mongubeiras. Estas últimas, também nativas, já estavam presentes em alguns logradouros da cidade, mesmo antes de serem ajardinados, e eram muito referidas nas crônicas e memórias de escritores locais. Trata-se de espécies umbrosas, portanto, apropriadas ao clima quente. A nativa canafístula, por sua vez, estava presente na Praça Visconde de Pelotas, ajardinada em 1933.


Famoso na crônica histórica fortalezense era o oitizeiro existente junto à Igreja de Nossa Senhora do Rosário, na Praça General Tibúrcio, pois, conforme conta o cronista Otacílio de Azevedo (1892-1978), “sob sua fronde, procuravam refrescante abrigo contra os ardores da canícula” aqueles que ali paravam para conversar sobre arte, política, religião ou a vida alheia.

A presença da vegetação nos logradouros da cidade também foi registrada no Correio do Ceará por um viajante oriundo do Recife em passagem pela capital cearense em 1930, ao ressaltar “suas praças ajardinadas com esmerado gosto” e “a arborização vasta e elegante, que muito concorre para a amenidade do seu clima”.² Uma nota que circulou no mesmo jornal durante o mês de julho daquele ano dirigia às mães de família “o instante appello de, todos os dias, pela manhã, mandarem deitar um jarro d’agua ao pé das tenras arvores e inclinar os seus filhinhos a serem amigos das plantas”. O excesso de sol e a necessidade d’água eram, enfim, desafios postos à implantação e à conservação dos jardins.

Observamos também nos jardins públicos de Fortaleza a exiguidade de elementos aquáticos contemplativos, talvez em razão da evaporação causada pela predominância de dias quentes ao longo do ano, ou por deficiências nos serviços regulares e infraestruturas de abastecimento d’água e/ou por seu custo de manutenção.

A região foi afetada por períodos de estiagem, a exemplo das secas de 1877-1879, 1888, 1900, 1915 e 1919, ensejando medidas como a perfuração de poços de uso público e a criação de obras emergenciais a fim de empregar retirantes sertanejos, provendo-os de trabalho e alimento. A grande estiagem de 1877-1879 impôs dificuldades à operação da Ceará Water Work Company Limited, concessionária que realizava o serviço de fornecimento d’água em Fortaleza, mas que já se encontrava em crise.

Nesse sentido, há relatos que indicam o aproveitamento de recursos naturais para a criação de um lago decorativo no terceiro plano do Passeio Público e de um lago navegável no Parque da Liberdade, em detrimento de fontes e lagos que precisariam ser alimentados artificialmente.



O Passeio Público foi inaugurado por fases a partir de 1880 e, durante muito tempo, constituiu o principal logradouro público ajardinado de Fortaleza. Era estruturado em três planos, correspondentes a três níveis topográficos, entre a cidade e a praia. Porém, segundo o engenheiro e cronista João Nogueira (1867-1947), o negociante Antônio Tito Rocha, que já o explorava para a prática de patinação por volta de 1879, efetuou melhoramentos no “terceiro plano, que foi ajardinado, construiu um lago, que era alimentado pelas águas do riacho Pajeú.



O Parque da Liberdade, por sua vez, começou a ser estruturado em 1890 e foi remodelado e rebatizado de Parque da Independência em 1922. A primeira intervenção consistiu no aproveitamento da Lagoa do Garrote, que “se viu aprisionada em margelas de cimento, para se tornar o lago central de belo jardim público”, descrição correspondente às fotos publicadas no álbum Fortaleza 1910. A lagoa delimitava uma “minúscula ilha”, na qual, já no século XX, foi erguido um pavilhão conhecido como Templo do Cupido. O parque tornou-se um dos espaços de recreação da população, e a antiga lagoa, um de seus atrativos, recanto de contemplação e local para o passeio de barcos.


O Jardim 7 de Setembro, criado na Praça do Ferreira em 1902, dispunha de um conjunto de bacias como parte do seu sistema de irrigação, demonstrando, portanto, sua função utilitária.


Posteriormente, na década de 1930, algumas praças foram dotadas de peças aquáticas na ocasião de seu ajardinamento. Em 1930, foi instalada uma fonte luminosa no Jardim Tomás Pompeu da Praça Comendador Teodorico ou da Lagoinha. A peça foi importada da Alemanha e inaugurada naquele ano, quando a cidade já possuía redes de energia elétrica³, coexistindo com o sistema a gás, e de abastecimento d’água, embora este último serviço atendesse apenas parcialmente a população quando de sua inauguração, em 1926.

Finalmente, a Praça Visconde de Pelotas, onde haviam sido erguidas duas grandes caixas d’água como parte do novo serviço de abastecimento, foi ajardinada em 1933 e dotada de um lago central, de modo que afirmamos a interdependência entre as características do meio e os recursos infraestruturais necessários à implantação e manutenção dos jardins.


Antes que o referido sistema de fornecimento d’água, inaugurado em meados dos anos 1920, pudesse ser disponibilizado para a irrigação de jardins e a alimentação de lagos e fontes, o uso dos cata-ventos foi uma solução significativa no tocante à rega e à manutenção de tais espaços.


CATA-VENTOS PARA A IRRIGAÇÃO DOS JARDINS

À procura de água doce: os cata-ventos nas memórias e no espaço da cidade
Em Fortaleza, deu-se o notável aparecimento de cata-ventos ou moinhos de vento nos quintais das residências e espaços públicos da cidade, os quais utilizavam a energia eólica como força motriz para puxar água de poços e cacimbas.
Embora tais equipamentos estejam fartamente ilustrados na iconografia fortalezense, há poucas informações bibliográficas extensas sobre sua origem, aquisição, funcionamento e contexto de onde foram importados.



Testemunha ocular de sua presença na Praça do Ferreira, Otacílio de Azevedo recorda que, quando chegou à cidade, por volta de 1910, ali, “à falta de óleo, gemia um velho catavento, sobre uma cacimba gradeada. Enchia uma imensa caixa d’água pintada de roxo- terra”. Deparava-se com “um belíssimo jardim - rosas, dálias, papoulas - enfim uma imensa variedade das mais belas flores”. Noutra crônica sobre a Praça do Ferreira, o autor informa a existência de “uma caixa d’água e um catavento, que puxava água para aguar os jardins”.

Em outro registro, o escritor Mozart Soriano Aderaldo (1917-1995), com base em reportagens de época, descreve a feição do logradouro quando ajardinado, em 1902. O autor afirma que “um catavento puxava água para um depósito que abastecia oito tanques destinados a manter viridentes os canteiros floridos situados nas partes em que se dividia o trecho central”.

Segundo ambos os relatos, embora stricto sensu destituído de qualquer função decorativa, o cata-vento da Praça do Ferreira era visivelmente importante para manter viçosos e vistosos os canteiros do jardim.



Enquanto o cata-vento da Praça do Ferreira comparece nas lembranças e escritos de Otacílio de Azevedo e Mozart Soriano Aderaldo, o arquiteto José Liberal de Castro articula a dificuldade de obtenção de água doce em Fortaleza à concepção projetual do Passeio Público. A despeito de sua filiação às matrizes paisagísticas europeias, o passeio adaptava-se às condições topográficas e hídricas locais, visto que “minguava a água na Cidade, obtida de cacimbas, com dificuldades, e elevada às caixas de distribuição por meio de bombas movidas a braço ou por cataventos”. Liberal de Castro afirma que “o agenciamento em patamares procedia do aproveitamento da disposição rampada do terreno, sem quaisquer vínculos com os jardins à italiana, estes animados pela fartura hídrica, em canais, lagos, fontes e cascatas”.



Informações sobre a procedência de tais equipamentos constam na obra do escritor e ex-prefeito (1933-1934) Raimundo Girão (1900-1988). O autor afirma que, no início do século XX, os cata-ventos de Fortaleza, “em geral, eram de fabricação norte-americana, quase todos dos tipos Dandy e IXL”, e, em razão do seu crescido número, ofereciam “sugestivo aspecto” à cidade. Ainda segundo o autor, a população supria-se de água por meio de “cacimbas escavadas nos quintais das casas e elevada por moinhos de vento a rodarem desesperadamente dia e noite”, ao passo que a água potável “era distribuída pelas residências em cargas de quatro ancoretas ou canecos, transportados por jumentos”.
Reafirmando a informação de Girão, José Liberal de Castro registra que os cata-ventos metálicos, existentes “em número incontável” na cidade, eram utilizados nas moradias antes da instalação da rede de distribuição d’água domiciliar, mas também serviam para a irrigação dos jardins públicos. Em suas palavras, “os cata-ventos na quase totalidade exibiam, nas pás, o logotipo da marca Dandy, americana, embora alguns exemplares fossem de fabricação local”, produzidos pela Fundição Cearense.

A arborização da cidade era uma preocupação constante: 









Continua...

¹ É importante lembrar que, naquele ano, a cidade de Fortaleza contava com pelo menos seis jardins públicos: o Passeio Público, o Parque da Liberdade, o Jardim 7 de Setembro da Praça do Ferreira, o Jardim Nogueira Accioly da Praça Marquês do Herval, o Jardim Pedro Borges (ou Caio Prado) da Praça da Sé e a Praça General Tibúrcio, não se dispondo, contudo, de informações sobre seu estado de conservação.

² Nota originalmente publicada em 6/8/1930 sob o título Fortaleza no Jornal Pequeno, editado na capital pernambucana. Cf. Correio do Ceará (16/8/1930, p. 7).

³ No caso do sistema elétrico, para o funcionamento da fonte, foi necessário, contudo, fazer uma instalação especial por um engenheiro inglês.


Créditos: Aline de Figueirôa Silva (Arquiteta e urbanista) - Artigo: À procura d'água: cata-ventos americanos nos jardins de Fortaleza, Mensagens do Governador do Ceará para Assembleia em 1927/1943, Jornal Pátria (1915), Jornal O Ceará (1928), Jornal A Razão (1931), http://bndigital.bn.gov.br, Acervo Lucas, Acervo Fortaleza Nobre e Arquivo Nirez

domingo, 4 de novembro de 2018

Centro de Turismo do Ceará



O Centro de Turismo do Ceará funciona num prédio onde na Fortaleza de outrora, funcionou a cadeia pública da cidade.
“Ocupa a quadra circunscrita pelas ruas do Senador Pompeu, da Misericórdia, do General Sampaio e o lado norte em confrontação com o mar.
É um grande prédio assobradado no centro e dividido em dois raios no pavimento inferior, onde estão as prisões ou células em número de 28, medindo nesta parte 6m.de altura e no andar superior 11m. tendo todo ele 78m. de comprimento e 18.20m. de largura.

Na parte superior estão o alojamento do carcereiro, o arquivo e as enfermarias, que recebem ar e claridade por grades de ferro que as fecham, e duas janelas que olham para o mar.

Cada una dessas células que contem ordinariamente de 12 a 20 presos, é fechada por una janela alta com grossos varões de ferro, que deita para o pátio, e grade de ferro para os corredores.

Contorna o edifício una alta muralha que mede em quadro 396m2. E serve de fundo a una cozinha espaçosa a diversos quartos para oficinas e o corpo da guarda que fica em médio do lanço setentrional. Em u pátio um poço que fornece água para a lavagem e outros misteres.

El ano de 1850 se ordenou ao engenheiro Manuel Caetano de Goiveira que organizasse a planta e desse começo aquela obra. Mais solo se terminam as mesmas em 1866.

A Cadeia Pública foi desocupada, na gestão do Governador Plácido Aderaldo Castelo. Restaurado o velho prédio e preparado sim modificações de sua estrutura, para nele funcionar Emcetur - Empresa Cearense de Turismo desde 1971.”


 
Antônio Bezerra de Menezes “Descrição da Cidade de Fortaleza” 1992.


Descrição geral dos melhoramentos que o prédio necessitava/recebeu no início dos anos 2000:

  • Praticamente a totalidade das lojas do Centro de Turismo, agregavam em seu interior mezaninos e novos forros de madeira ou materiais inflamáveis, que somando-se a precariedade das instalações elétrica (gambiarras) elevava muito os riscos de incêndio. Foi sugerido uma revisão neste aspecto.

  • As instalações telefônicas com o crescimento da demanda foram sendo executadas pelo o exterior do edifício formando um emaranhado de cabos sem direção ou sentido. Foi sugerido ordena-los apoiando-os sobre elementos do próprio prédio, como por exemplo, as linha de cornijas.

  • Normas sobre a propaganda no exterior das lojas servia para evitar placas que desfiguravam a fachada ou marquises feitas com telhas de amianto, como as que se podiam encontrar na rua Dr. João Moreira.

  • Era preciso erradicar por completo os elementos agregados ao edifício, tais como tabique de blocos de cimento para esconder vasilhames do restaurante ou pequenos quartos.

  • Os pátios interiores necessitavam serem reprojetados, para receber novos mobiliários e nova iluminação.

  • O Museu de Arte Popular, dotado de peças de real importância, encontrava-se necessitando de urgente atenção. A cobertura do salão era de telhas de capa e canal de barro, sobre caibros e ripas e desprovido de forro. A água pulverizada nas horas de chuva e a constante poeira sobre as peças, em sua maioria de madeira, provocaram um envelhecimento precoce e um deterioro acelerado do acervo em geral.


Recomendações para a pintura:

  • Antes de iniciar-se a pintura era necessário uma recuperação dos elementos de arquitetura, tais como: frisos, cornijas, molduras, grades e outros. Alguns destes elementos precisavam ser repostos, pois estavam rotos ou desaparecidos, como os pináculos do edifício da administração e da portada principal, bem como as gárgulas ( jacarés ) das fachadas.
  • Como segundo passo, a limpeza das fachadas com a lavagem com água à pressão ( 14,5 Kg/cm2 ) para a remoção da sujeira acumulada e das capas de pinturas anteriores que estavam se desprendendo. As pinturas anteriores, por não terem sido preparadas satisfatoriamente se desprenderam do suporte (parede) criando um espaço entre as mesmas e a parede gerando condições ideais para o aparecimento de limo, fungos e outras formações orgânicas que aceleraram o estado de deterioro das superfícies pintadas conferindo-lhe um aspecto geral de abandono.
  • Feita a limpeza geral das superfícies a pintar, era preciso passar ao processo de regularização das paredes.
  • Para garantir a durabilidade e integridade da pintura, era preciso revisar com atenção o sistema de drenagem pluvial, pois em alguns pontos do conjunto de edifícios se notavam infiltrações provenientes das calhas dos telhados.
  • Para a preparação dos elementos de ferro, ( portões, grades ) o procedimento adequado seria o de jateamento com areia para a remoção completa das camadas de oxido de ferro e das sucessivas camadas de pintura anteriormente aplicadas. Após a limpeza, o recobrimento da superfície dos elementos executados em ferro, com prime anti-oxidante com base ativa de oxido de alumínio para posterior aplicação da pintura indicada.



Crédito: Ofipro
 

quinta-feira, 25 de outubro de 2018

Maraponga: paisagens do ontem e do hoje


Uma estradinha de terra, árvores de verdes copas frondosas, o azul-lilás das serras ao longe, um caminho de água de cristalino azul, tudo isso rodeando uma morada que se instala na paisagem, como se fosse um elemento da natureza. A casa com seu amplo telhado, muitas janelas e a cor branca, que cobre as paredes, desperta um saudosismo bucólico na sensibilidade do espectador do quadro, como se o tempo tivesse dito adeus a esse tipo de cenário. 

Esta tentativa de descrição, que aqui se coloca, é a da imagem, que figura na capa de um disco de grande importância para a música popular brasileira e para a cearense, em particular, Maraponga, do cantor, compositor e músico Ricardo Bezerra, igualmente autor da capa. E lá se vão 35 anos, daquele hoje distante 1978.  (Para escutar o Lp no YouTube)

Atualmente, os moradores da localidade, ou os visitantes que a percorrem, não mais se deparam com essa atmosfera de remanso. A imagem, contudo, pode servir de guia para se conhecer a Maraponga – as várias Marapongas, seria uma melhor formulação – que vêm contando a história desse lugar: um bairro da cidade de Fortaleza

Lagoa da Maraponga na década de 70. Acervo Jornal O Povo.
Contar um pouco da história de Maraponga é falar, de início, na etimologia da palavra, que remonta a nossas origens indígenas e tem o significado de “mar agitado”; derivando-se de MBARÁ (mar) + APONG ou PONG (soar, emitir som, bater). 

Maraponga é um dos cento e dezessete bairros de Fortaleza, estando vinculado à Regional V. Dentro de Fortaleza, o bairro ocupa o seguinte quadrante: limita-se ao norte com o distrito de Parangaba; ao sul, com o Mondubim e o Jardim Cearense; a leste com o Jardim Cearense e o Dendê; e, a oeste, com o Manoel Sátiro

Inicialmente, Maraponga era um sítio ligado ao distrito de Porangaba. Hoje, pertence ao distrito do Mondubim, sendo dividida em: Carlos Studart, Lagoa da Maraponga, Luxemburgo e Maraponga.

E o bairro da Maraponga existe desde quando? Alguém curioso em justapor datas, criando um encadeamento temporal para a existência do lugar, deveria recuar no calendário até o ano de 1937. 
Na história mais antiga do bairro, assinala-se a cerimônia de lançamento da pedra fundamental da estação radioautomática, como tendo ocorrido no dia 18 de maio de 1937, com as presenças de autoridades federais, estaduais, municipais, eclesiásticas e da imprensa. À solenidade esteve presente também o Dr. Antônio Vieira, construtor da obra. A estação, há pouco referida, somente viria a ser inaugurada no dia 13 de dezembro de 1938, contando com as presenças do capitão Faria Lemos, chefe dos Correios e Telégrafos no Ceará, Edgard Teixeira, Jorge Moreira Borges e a de muitas outras autoridades. 

O Bairro que nasceu dos sítios”, conforme título da matéria da seção “O Povo nos bairros”, de 17/12/2012, redigida pelo repórter Geimison Maia, vem experimentando profundas modificações ao longo desses 76 anos. A fisionomia campestre foi cedendo à pressão da urbanização e, em decorrência da explosão demográfica, o comércio, partindo da principal artéria do bairro, capilariza-se pelas ruas, travessas e mesmo pelos becos. A especulação imobiliária vai interferindo na horizontalidade do lugar e as construções verticais vão despontando, dando conta da explosão demográfica da cidade e desvelando as soluções o mais das vezes canhestras, por vezes, perversas, encontradas pelo poder público e pela sociedade, que não atinam quanto ao paralelismo entre oikós (casa) e a noção de bairro: nossa casa na cidade. Ai de Vós, grandes centros urbanos, que as advertências do “velho Braga” encontrem eco, antes que a sentença final se torne irrevogável: “Então quem especulará sobre o metro quadrado de teu terreno? Pois na verdade não haverá terreno algum.” (BRAGA, 1979, p. 221) 

Da Maraponga antiga, dos sítios e das chácaras, faz parte um relato misto de triunfo e de tragédia pessoal, que é a história da Leila, cujo nome ficou atrelado ao lugar durante um bom período de tempo.
Já nos finais dos anos 60, e por toda a década de 70 o melhor cabaré de Fortaleza era a CASA DA LEILA, na Maraponga.

Hoje, para quem quer excursionar pelo bairro, saindo da Aldeota, a recomendação é tomar a Avenida Raul Barbosa, passando pelo viaduto do Makro, Avenida Carlos Jereissati, entrando na Bernardo Manoel, por meio da alça do viaduto, e logo em seguida na Avenida Dedé Brasil (Dr. Silas Munguba). Chegando-se ao Terminal de Parangaba, está-se a dois passos do início da Avenida Godofredo Maciel, via que corta o bairro, sendo importante ponto de referência da área. O trecho que vai do terminal de ônibus até a lagoa da Maraponga é reconhecido pela Prefeitura como Parangaba, dado que vale como fator de ordenação para a cobrança de IPTU e de outras taxas. 

O marco zero da Maraponga propriamente dita é a lagoa. Antes dela, há pontos comerciais diversificados: restaurantes, supermercados padarias, farmácias, motéis. 

Em Fortaleza de ontem e de hoje, Miguel Ângelo de Azevedo (Nirez) comenta: 

Antigamente Maraponga era um sítio muito distante da Capital, pertencente ao distrito de Porangaba, tendo como atração principal sua bela e grande lagoa de águas límpidas. A estrada que ia de Fortaleza para as cidades do centro do Estado passava ao seu lado. Era carroçável. Ou de terra batida, a chamada piçarra.

Em seguida, o pesquisador faz um cotejo entre duas fotografias, de um mesmo local, uma mais antiga e outra da época da publicação do Fortaleza de ontem e de hoje, 1991. Na primeira, revela que “havia apenas uma grande casa à margem da lagoa, pelo lado norte, e o restante era arborização natural”.


Estrada de Mondoig Atual Godofredo Maciel. Vemos a Lagoa da Maraponga. Assis Lima
Na segunda, a estrada já aparece “pavimentada de asfalto, já é bem larga e de linhas bem definidas. Várias construções existem e ninguém mais viaja a pé. A arborização sofreu muito e restam poucas árvores, principalmente do lado de Fortaleza.” Por fim, acrescenta, a título de conclusão: Maraponga deixou de ser um longínquo sítio pertencente ao distrito de Parangaba para ser hoje um bairro da Grande Fortaleza, servido de transporte coletivo como qualquer outro. É verdade que a lagoa diminuiu e que está muito mais poluída que antes, mas recente Lei preserva-a do avanço da especulação imobiliária. (AZEVEDO, 1991, p. 19).
Foto de 1991.

A lagoa de Maraponga está localizada a oeste da Bacia Hidrográfica do Rio Cocó e tem a Avenida Godofredo Maciel como principal meio de acesso. Caracteriza-se por apresentar uma paisagem natural de grande porte. Após a urbanização de suas margens, tornou-se um ambiente bastante frequentado pela população da cidade para atividades ligadas ao esporte e ao lazer. A grande área em torno da lagoa foi preservada no governo Ciro Gomes, no quadriênio 1991 - 1994. Centro de convergência do bairro, aos domingos, muitas famílias vêm aproveitar o espaço natural como ponto de divertimento e passatempo, ocasião em que exercem o caráter espontâneo da sociabilidade, aspecto que a vida nas metrópoles não costuma incentivar. 



Maraponga/Fernanda Coutinho - Fortaleza: Secultfor, 2014. (Coleção Pajeú)
 
NOTÍCIAS DA FORTALEZA ANTIGA: